RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo analisar como está sendo a aplicação do instituto da Responsabilidade Civil no âmbito da Justiça do Trabalho, considerando-se a fase pré-contratual da relação trabalhista. Busca-se verificar a aplicação da “Teoria da Perda de uma Chance”, nos casos em que o empregador comete um ato ilícito durante as negociações com o seu futuro empregado, o que, por vezes, tem causado prejuízos gigantescos não apenas para o trabalhador, mas para a própria confiança no mercado de trabalho. Dessa forma, analisam-se os casos nos quais o empregado direito a indenização por dano moral, nesta fase contratual formalizado ou não o seu contrato de trabalho, visto que, a reparação por esta espécie de dano é tida como uma forma de coibir a livre contratação e a livre demissão, enquanto uma arbitrariedade do empregador, sem que o mesmo seja responsável por um ato que se configura como ilícito civil.

PALAVRAS-CHAVE: Dano Moral, Contrato; Responsabilização; Justiça do Trabalho.

ABSTRACT: The purpose of this paper is offer an analysis of the convergence between the animus of the Work Justice and the notion of Civil Responsibility, considering the pre contractual phase of the Work Relationship. As a first objective, a important question is the recognition of the Loss of a Chance Theory on the situations in which the entrepreneur commits a civil illicit during the course of the negotiation of the Work Relationship, violation that may cause an unproportional loss to the worker and also the loss of confidence in the work market. The fundamental question is the possibility of the recognition of the right to an indenisation in this contractual phase. The indenisation represents a kind of warrant to the respect of the social rights that the Bill of Rights determines to the worker.

KEYWORDS: Moral Damage, Contract; Responsibility; Work Justice.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho trata da possibildiade de aplicação de elementos da Responsabilidade Civil associados à “Perda de uma Chance” durante a fase pré-contratual das relações de trabalho. O direito do trabalhador é um direito fundamental, regido por lei e princípios próprios. Após a promulgação da Emenda Constitucional nº 45, foram introduzidoa no artigo 114, da Constituição Federal os incisos I e VII. Por meio deles, foram afastadas quaisquer discussões relativas à competência para julgar ações por danos morais nas relações de trabalho, uma vez que o conteúdo de tais incisos torna claro que a competente em relação a tal matéria é da Justiça do Trabalho.

Analisando-se os danos morais ocorridos nas relações de trabalho, pode-se observar que muitos destes danos ocorrem antes mesmo da concretização do Contrato de Trabalho. Ou seja, muitas das perdas significativas no curso do estabelecimento de uma relação de trabalho ocorrem no momento das tratativas entre os futuros empregador e o empregado. Por diversas vezes ocorre de o empregador, realizada uma concreta proposta de emprego ao trabalhador, simplesmente fornecer ao quase-empregado a noticia que lhe fora negado o emprego prometido. Porém, para que pudesse aceitar a proposta originalmente concebida, este abre mão de seu atual emprego, muda de cidade, entre outros fatores e, após toda essa movimentação, acaba vendo frustrado o seu esforço.

Fica evidente, nesses casos, que ocorre uma violação da boa-fé, um princípio tão fundamental que deve ser aplicado e reconhecido até mesmo nas relações de trabalho. Porém, trata-se de reconhecer essa tese em uma fase de indeterminação,uma vez que o contrato de trabalho propriamente dito ainda não foi concrretizado. No entanto, resta clara a existência de um dano sobre o qual alguém, que não aquele que agiu de boa-fé, deve ver restituído.

Para a resolução destes casos, o judiciário, em particular a Justiça especializada do Trabalho vem reconhecendo esse prejuízo. Para regular a questão,deixada emaberto no ordenamento jurídico brasileiro, foi “importada” a “Teoria da Perda de uma chance”. Por meio dela se estabelce que caso empregador não respeite, passadas as negociações preliminares e que determinam a existência de uma base mínima de confiança entre as partes, o princípio da boa-fé, deva este indenizar o trabalhador. Nesses casos, conta-se a formalização do contrato de trabalho, da promessa de emprego, mesmo que não tenha havido a efetiva cristalização da proposta em contrato, uma vez que a realização se determina pela manifestação contínua e indelével do animus de contratar.

Isso ocorre para evitar a livre contratação e demissão por parte do empregador, pois seu exercício deve respeitar, dentre outros, o principio da boa-fé contratual, sob pena de não ser cumprida a função social dos contratos. Assim, o presente estudo, visa analisar e discutir a possibilidade da ocorrência do dano moral antes mesmo da formação do contrato de trabalho, com a aplicação da responsabilidade civil do empregador pela perda de uma chance devida a negativa da promessa do emprego após a realização das negociações entre o empregado e o futuro empregador.

Ainda nesse aspecto, imperioso a realização de um estudo para verificação de como irá se proceder à quantificação do dano gerado em decorrência realização do ilícito pelo empregador, que, após realizar a promessa de emprego, frustra o empregado negando-lhe o mesmo, sem justificativa justa, violando a boa-fé contratual.

O estudo, precisa, então, analisar a possibilidade da indenização tanto na esfera material como na esfera moral. No caso da reparação do dano material, este seria referente aos prejuízos que o pretendente da vaga teve em decorrência da frustração do contrato de trabalho. Com relação ao dano moral, a indenização como já mencionada pela perda de uma chance, sem contar com os fatores psicológicos que são afetados em decorrência da possibilidade real de obter uma melhor condição financeira, desaparecer sem qualquer justificativa plausível.

2. OBRIGAÇÃO, REPARAÇÃO DO DANO MORAL E RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL

A Responsabilidade Civil é um tema relevante para o desenvolvimento da sociedade. Ela reforça as seguranças e proteções que indivíduos possuem frente ao exercício arbitrário dos direitos de outrem. A vida em sociedade é regida por uma lógica própria, que envolve a noção de disponibilidade e direito.

Hoje, se entre duas pessoas há um conflito, caracterizado por uma das causas de insatisfação descritas acima (resistência de outrem ou veto jurídico à satisfação voluntária), em princípio o direito impõe que, se se quiser pôr fim a essa situação, seja chamado o Estado-juiz, o qual virá dizer qual a vontade do ordenamento jurídico para o caso concreto (declaração) e, se for o caso, fazer com que as coisas se disponham, na realidade prática, conforme essa vontade (execução). Nem sempre foi assim, contudo. (CINTRA, 2005, p. 22)

Para tanto, é importante entender que a responsabilidade civil tem a ver com a ideia de obrigação civil. Dessa forma,

Costuma-se conceituar a “obrigação como “o vínculo jurídico que confere ao credor o direito de exigir do devedor o cumprimento de determinada prestação”. A característica principal da obrigação consiste no direito conferido ao credor de exigir o adimplemento da prestação. É o patrimônio do devedor que responde por suas obrigações. (GONÇALVES, 2007, p. 2)

Descrição similar faz Maria Helena Diniz, quando expressa que obrigação surge como um dever jurídico. A responsabilidade obrigacional acaba se tornando, em função do sistema aquiliano:

[...] um princípio geral regulador da reparação do dano. Embora se reconheça que não continha ainda “uma regra de conjunto, nos moldes do direito moderno”, era, sem nenhuma dúvida, o germe da jurisprudência clássica com relação à injúria, e “fonte direta da moderna concepção da culpa aquiliana, que tornou a Lei Aquília o seu nome característico. (DINIZ, 1993, p.64)

A partir desse momento jurídico, a responsabilidade civil só ocorre se comprovado o dano efetivo. Nesse mesmo senso, a Constituição de 1988 preocupou-se com a figura do dano de natureza moral, inserido nos incisos V e X do artigo 5º. Para Yussef Said Cahali, ele pode ser definido como

[...] a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem [...] classificando-se desse modo, em dano que a afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.), dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (tristeza, dor, etc.). (CAHALI, 1998, p. 17)

Trata-se, portanto, de um abalo nos sentimentos da pessoa, que tem violada sua integridade física, moral e intelectual, afetando sua autopercepção. Em resumo, violam, como bem informa José Affonso Dallegrave Neto (DALLEGRAVE NETO, 2005, p. 114), a dignidade da pessoa. Sua natureza é extrapatrimonial, uma vez que a compensação pecuniária da dor, do sofrimento, da humilhação, não transforma o dano em patrimonial, para Alexandre Belmonte. (BELMONTE, 2004, p. 35)

Levando-se em consideração que esse dano pode ocorrer em qualquer lugar, em qualquer âmbito, não há óbica para que seja reconhecido no local de trabalho. Vez que, mesmo lá, podem ocorrer ofensas que afetam a dignidade da pessoa, como uma decorrência da relação de trabalho. Assim, o dano moral pode ocorre tanto ao empregado como ao empregador. Analisando a questão, afirma Nehemias Domingos de Mello que “Com muito maior freqüência, se pode identificar a prática de atos ilícitos perpetrados pelo empregador contra os seus empregados, tais como a falsa imputação de um crime como forma de justificar, de maneira, mesquinha, uma dispensa imotivada sem a obrigação de indenizar;” (MELLO, 2007, p. 22)

No que se refere ao momento de ocorrência do dano, a mais comum é durante a vigência do contrato de trabalho, pois pode um empregador deixa de cumprir certas obrigações derivadas do contrato, como a observância as normas atinentes a medicina e segurança e higiene, bem como no tratamento constrangedor do empregado. Findo o contrato, nota-se que o empregador pode fornecer fatos inverídicos aos concorrentes, imputando qualidades negativas ao ex-empregado, como uma forma de puni-lo, visando que o mesmo não obtenha mais sucesso na carreira após se desligar do antigo emprego.

A dúvida persiste acerca de sua ocorrência na fase precontratual, ou seja, quando empregado e empregador estão na fase de negociação e não existe ainda um contrato firmado. Um exemplo claro de dano moral na fase pré-contratual ocorre quando um empregador pré-ajusta a contratação de um empregado, que avençou salário, fez exames médicos, enviou sua carteira de trabalho para a anotação. Este empregado para iniciar suas atividades na empresa pede demissão de seu atual trabalho, aluga um imóvel na cidade da empresa contratante, e, de repente é surpreendido com o cancelamento da contratação.

            Nas hipóteses elencadas fica evidente a ilicitude do ato patronal, justamente pelo fato de abusar de seu direito subjetivo e ofensa ao dever geral de boa-fé objetiva, conforme o disposto nos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. A boa-fé impõe o dever dos contratantes agirem com lealdade e confianças recíprocas, fazendo prevalecer o interesse social de segurança das relações jurídicas. Isso fica evidente, quando se observa que na jurisprudência, essa percepção encontra amparo, uma vez que

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. INDENIZAÇÃO PELOS PREJUÍZOS DECORRENTES DA FRUSTAÇÃO DA FORMAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO. Indenização amparada na perpetração de ato ilícito pela reclamada, consubstanciado na quebra de boa-fé objetiva que deve pautar a atuação das partes também na fase pré-contratual, bem como na evidência do nexo causal entre a conduta da reclamada e os prejuízos experimentados pelo reclamante. Recurso Improvido. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Acórdão do processo nº 00639.2008.302.04.00-6. (RO) Redator: Ana Rosa Pereira Zago Sagrilo. Participam: Maria da Graça Ribeiro Centeno, Cleusa Regina Halfen. Data: 26/03/2009. Origem: 2ª Vara do Trabalho de Novo Hamburgo.

Importa destacar que o dano moral nestes casos existe in re ipsa, ou seja, independe de prova, sendo presumido pela análise das circunstâncias e da possível agressão, que deve ser demonstrada. Nesse sentido, na lição de Sérgio Cavalieri Filho “[...] existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que provada a ofensa, ipso facto, está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum. (CAVALIERI FILHO, 2010, p. 83)

Outro fato que deve receber destaque é a diferenciação entre a não confirmação das negociações preliminares da fase pré-contratual e o não cumprimento de um pré-contrato. Ambos geram dano moral para a parte prejudicada, mas, no segundo caso, o dano decorre da violação do pré-contrato. Para poder reconhecer o dano moral durante na fase pré-contratual, está sendo aplicada pela Justiça do Trabalho a “Teoria da Perda da Chance”, o que é o conteúdo do próximo item.

4. A TEORIA DA PERDA DA CHANCE NA JUSTIÇA DO TRABALHO

Imperioso é destacar que a Responsabilidade Civil tem a ver com a Obrigação Civil. Nos casos da responsabilização durante a fase a pré-contratual, ela existe em decorrência da violação da obrigação existente para com o empregado, a partir do momento em que lhe fora prometido a concretização da oferta de um contrato de trabalho. O dano pode ocorrer, na esfera cível, quer pela ação, quer pela omissão, como evidencia Belmonte. (BELMONTE, 2004, p. 444)

Indenizar significa reparar o dano causado á vítima, integralmente. Se possível, restaurando o statu quo ante, isto é, devolvendo-a ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito. Assim, o dano, em toda a sua extensão, há de abranger aquilo que efetivamente se perdeu e aquilo que se deixou de lucrar: o dano emergente e o lucro cessante, como indica Gonçalves. (GONÇALVEZ, 2007, p. 588)

Sergio Cavalieri conceitua o dano emergente da seguinte forma:

O dano emergente, também chamado positivo, este, sim, importa efetiva e imediata diminuição no patrimônio da vítima em razão do ato ilícito. O Código Civil, ao disciplinar a matéria no seu art. 402 (reprodução fiel do art. 1059 do Código de 1916), caracteriza o dano emergente como sendo aquilo que a vítima efetivamente perdeu. A mensuração do dano emergente, como se vê, não enseja maiores dificuldades. Via de regra, importará no desfalque sofrido pelo patrimônio da vítima; será a diferença do valor do bem jurídico entre aquele que ele tinha antes e depois do ato ilícito. Assim dano emergente é tudo que se perdeu, sendo certo que a indenização haverá de ser suficiente para a restitutio in intefrum. (2010, p. 74)

Referente ao lucro cessante, o mesmo autor traz a seguinte definição:

O ato ilícito pode produzir não apenas efeitos diretos e imediatos no patrimônio da vítima (dano emergente), mas também mediatos ou futuros, reduzindo ganhos, impedindo lucros, e assim por diante. Aí teremos o lucro cessnte. É a conseqüência futura de um fato já ocorrido.

Consiste, portanto, o lucro cessante na perda do ganho esperável, na frustração da expectativa de lucro, na diminuição potencial do patrimônio da vítima. Pode decorrer não só da paralisação da atividade lucrativa ou produtiva da vítima, como, por exemplo, a cessação dos rendimentos que alguém já vinha obtendo da sua profissão, como, também, da frustração daquilo que era razoavelmente esperado. (2010, p. 75)

A Responsabilidade Civil por perda de uma chance é uma teoria que reconhece a possibilidade de indenização nos casos em que alguém se vê privado da oportunidade de obter um lucro ou de evitar um prejuízo. Essa teoria tem a característica de reconhecer uma nova categoria de dano indenizável, um dano autônomo, consistente na oportunidade (ou chance) perdida, o qual independe do resultado final. Atribui-se um valor econômico, de conteúdo patrimonial, a probabilidade de obter um lucro, sem que jamais se saiba se aquela probabilidade efetivamente se verificaria no caso concreto, pois um fato interrompe o curso normal dos acontecimentos antes que se pudesse constatar se aquela oportunidade se concretizaria.

Normalmente, a própria vítima do dano formulava inadequadamente a sua pretensão. Ao invés de buscar a indenização da perda da oportunidade de obter uma vantagem, requeria indenização em razão da perda da própria vantagem. Ao assim proceder, a vítima esbarrava no requisito de certeza dos danos, tendo em vista que a realização da vantagem esperada será sempre considerada hipotética, em razão da incerteza que envolve os seus elementos constitutivos. (BIONDI, 2008)

Se a perda de uma chance for enquadrada como dano emergente ou lucro cessante, terá o autor da ação que comprovar de forma inequívoca que, não fosse a existência do ato danoso, o resultado teria se consumado, com a obtenção da chance pretendida, o que é impossível. Ora, se a vitória não pode ser provada e confirmada, o mesmo ocorre em relação ao insucesso da obtenção do resultado esperado. (MELLO, 2007, p. 22)

Conforme afirma Sérgio Savi:

[...] no caso de lucros incessantes, o autor deverá fazer prova não do lucro cessante em si considerado, mas dos pressupostos e requisitos necessários para a verificação deste lucro. Já nas hipóteses de perda de uma chance, permanece-se no campo do desconhecido, pois em tais casos, o dano final é, por definição, indemonstrável, mesmo sob aspecto dos pressupostos de natureza constitutiva. (SAVI, 2006, p. 18)

Não se deve, todavia, olhar para a chance como perda de um resultado certo porque não se terá a certeza de que o evento se realizará. Deve-se olhar a chance como a perda da possibilidade de conseguir um resultado ou de se evitar um dano; devem-se valorar as possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado para ver se são ou não relevantes para o ordenamento. Essa tarefa é do juiz, que será obrigado a fazer, em cada caso, um prognóstico sobre as concretas possibilidades que o sujeito tinha de conseguir o resultado favorável. A perda de uma chance, de acordo com a melhor doutrina, só será indenizável se houver a probabilidade de sucesso superior a cinqüenta por cento, de ode se conclui que nem todos os casos de perda de uma chance são indenizáveis, como preleciona Cavalieri Filho. (CAVALIERI FILHO, 2010, p. 77-78)

O foco da indenização, portanto, não é a vantagem perdida, mas sim pela possibilidade séria e real de não se conseguir ter acesso a essa chance de obter a vantagem. Deve-se fazer uma distinção entre o resultado perdido e a real possibilidade de consegui-lo. A possibilidade de vitória terá valor menor que a vitória futura e isso devem ser analisadas no momento da quantificação do dano.

Assim, o enquadramento da indenização pela Perda de uma Chance não cabe exatamente como no dano emergente nem nos lucros cessantes, antes a probabilidade, e não certeza, de obtenção do resultado aguardado. Por isso, trata-se de uma terceira espécie intermediária de dano, entre o dano emergente e o lucro cessante (TÚLIO, 2009). O art. 402 do Código Civil, conclui o raciocínio legal, quando preceitua que: “Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”. É nesta parte final, como terceira espécie de dano que se enquadra a indenização pela perda de uma chance.

Agora, como se observa, não há mais entrave algum para o reconhecimento á indenização pela perda de uma chance. Assim, as chances perdidas, desde que reais e sérias, deverão ser indenizadas quando restar provado o nexo causal entre o ato do ofensor e a perda da chance, uma vez que no novo Código Civil Brasileiro, a exemplo de outros sistemas jurídicos estrangeiros, ao prever cláusula geral de responsabilidade pela indenização de qualquer espécie de danos, inclui aquela decorrente da perda de uma oportunidade. (MELLO, 2007, p. 22)

Assim, não basta, que o agente tenha praticado uma conduta ilícita; tampouco que a vítima tenha sofrido um dano. É preciso que esse dano tenha sido causado pela conduta ilícita do agente, que exista entre ambos uma necessária relação de causa e efeito. Em síntese, é necessário que o ato ilícito seja a causa do dano, que o prejuízo sofrido pela vítima seja resultado desse ato, sem o que a responsabilidade não ocorrerá a cargo do autor material do fato. Daí a relevância do chamado nexo causal. Cuida-se, então, de saber quando um determinado resultado é imputável ao agente; que relação deve existir entre o dano e o fato para que este, sob a ótica do Direito, possa se considerado causa daquele. (CAVALIERI FILHO, 2010, p. 47)

O nexo causal é a relação de causa e efeito entre a conduta do agente e o prejuízo causado, devendo o segundo ser em decorrência do primeiro, para Belmonte (BELMONTE, 2004, p. 78). Com relação a necessidade de comprovação do nexo causal entre o ato ofensor e a perda da chance, percebe-se que, para o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região:

EMENTA: DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. Para ser configurada a obrigação em reparar o dano moral ou material sofrido pela vitima, deverá haver a comprovação de três requisitos: a prova da ocorrência do dano, o nexo de causalidade e a culpa do agente causador do infortúnio. BAHIA. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Acórdão do processo 0080400-42.2009.5.05.0027. (RO) Redator: Norberto Frerichs. Data: 01/06/2010. Origem: 27ª. Vara do Trabalho de Salvador.

Similar senso é encontrado quando se analisam as decisões exaradas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Seu entendimento é de que:

EMENTA: DOENÇA OCUPACIONAL – NEXO CAUSAL - INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. Havendo prova do dano e do nexo de causalidade entre a moléstia e o trabalho desempenhado pelo trabalhador, e da culpa do empregador, impõe-se a este último o dever de indenizar. RIO GRANDE DO SUL. Regional do Trabalho da 4ª Região. Acórdão do processo 0014700-56.2009.5.04.0251. (RO) Redator: Herbert Paulo Beck. Participam: Denise Pacheco e Emílio Papaléo Zin. Data: 20/05/2010. Origem: 1ª Vara do Trabalho de Cachoeirinha

Na jurisprudência acostada, visível é que são encontrados diversos casos nos quais o Poder Judiciário apreciou a questão da Responsabilidade Civil, levando em consideração a Teoria da Perda da Chance, aplicando o novo Código Civil, que acolheu a possibilidade de reparação de qualquer dano injusto causado a vítima. Para tanto houve uma combinação entre os conteúdos dos artigos 186, 187, 927 e 402, já citados, bem como com o artigo 949, cujo conteúdo é “Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa a saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.”

Sobre essa teoria, é necessário confirmar que a sua aplicação não é mera seleção de jurisprudências determinadas. É antes um verdadeiro movimento que alega a pertinência da mesma, uma vez que no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, consolida-se o entendimento de que:

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. “PERDA DE UMA CHANCE”. A reclamante invoca a “perda de uma chance” - espécie de dano material -, segundo o qual, para que haja direito à reparação, não basta a presunção do prejuízo - é necessária a comprovação das chances de alcance da situação futura dita frustrada (certeza da chance e alcance altamente provável), não sendo suficiente a alegação genérica de perda de oportunidades para que seja determinada a indenização por danos materiais. RIO GRANDE DO SUL. Regional do Trabalho da 4ª Região. Acórdão do processo 0120400-44.2005.5.04.0030. (RO) Redator: Fabiano de Castilhos Bertolucci. Participam: Ricardo Tavares Gehling e Hugo Carlos Scheuermann. Data: 08/04/2010. Origem: 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

Do mesmo modo, confirma-se entendimento semelhante no Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, uma vez que lá se decidiu que, com referências à aplicação da Teoria da Perda da Chance que:

EMENTA: PROCESSO SELETIVO. BOA-FÉ OBJETIVA. PERDA DE UMA CHANCE. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. O empregador tem o dever de agir com lealdade, lisura, respeito e consideração com o empregado, sobretudo ante o seu estado de necessidade econômica e sua condição de hipossuficiente, de modo que o fomento a uma expectativa de direito a um contrato de trabalho causa prejuízos não apenas financeiros, mas também afeta a moral de permanecer na situação de desemprego e faz emergir o dever de reparação baseado na perda de uma chance. BAHIA. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Acórdão do processo 00581-2009-122-05-00-4. (RO) Redator: Cláudio Brandão. Data: 11/12/2009. Origem: 2ª Vara do Trabalho de Candeias

 

Semelhante senso foi observado em outro julgamento, uma vez que também se decidiu no mesmo tribunal, acerca da possibilidade da aplicação da Teoria da Perda da Chance, que:

EMENTA: PERDA DE UMA CHANCE: A perda de uma chance como modalidade de dano material, deve ser reparada, não pelo que efetivamente se perdeu, mas pela perda da oportunidade de ganho. Em tais situações, o Julgador avalia o possível aumento patrimonial que a vítima teria se não houvesse o evento danoso. BAHIA. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Acórdão do processo 01237-2007-492-05-00-6. (RO) Redator: Cláudio Brandão. Data: 03/12/2009. Origem: 2ª Vara do Trabalho de Ilhéus.

Assim diante os argumentos acima expostos, concluímos pela possibilidade de reparação de danos morais e materiais em decorrência da responsabilidade civil do empregador durante a fase pré-contratual e a aplicação da Teoria da “Perda de uma Chance” nos casos em que não é respeitada a aplicação do principio da boa-fé e a função social dos contratos.

5. CONCLUSÕES

Foi verificada no presente artigo a importância da existência da responsabilidade pré-contratual na fase das negociações entre o empregador e o empregado, demonstrando a necessidade de respeito entre os contratantes para a realização do contrato. A partir do que foi abordado, foi possível concluir que ocorrem violações ao direito dos trabalhadores mesmo antes de firmado o contrato de trabalho, podendo-se afirmar a existência da responsabilidade civil do empregador já durante a fase pré-contratual.

Esse dano não é decorrente da violação do contrato, mas da ofensa a um dever de conduta, ou seja, a violação do princípio da boa-fé. Nessa linha de raciocínio, deve-se distinguir o pré-contrato da negociação prévia, pois o primeiro é um ato jurídico perfeito e acabado com o objetivo da promessa da celebração de um contrato futuro com efeito vinculante as partes. Já as negociações premilinares são constituídas de fatos e tratativas em fase incipiente que objetivam tratar as condições e o objetivo de um contrato ou pré-contrato.

Assim, existe a responsabilidade pré-contratual ocorre quando uma pessoa realiza negociações com a outra, induzindo-a a preparar-se para a contratação e após, injustificadamente, deixa de celebrar a contratação.

A aplicação deste instituto na justiça do trabalho tem enorme importância, tendo em vista que, serve como um fator educativo para as empresas dos atos praticados na fase de tratativas com o empregado, permitindo a conscientização de toda a sociedade do direito a respeito da dignidade do trabalhador em todas as fases do contrato do trabalho, principalmente na pré-contratual.

Assim, realizado o ilícito pelo empregador, este deve responder pelos danos causados ao candidato a vaga. Para a efetuação deste ressarcimento, que é tanto na esfera moral quanto material, os Tribunais passaram a adotar a teoria da Responsabilidade Civil por Perda de uma Chance.

A perda de uma chance como modalidade de dano, deve ser reparada, não pelo que efetivamente se perdeu, mas pela oportunidade de ganho. Nestes casos, o Julgador avalia o possível aumento patrimonial da vítima se não houvesse o evento danoso. Tal instituto não se trata de reparação por uma vantagem que não foi alcançada, pois o futuro é incerto, mas sim pela perda da oportunidade de obtenção de um beneficio. O enquadramento deste dano não cabe nos lucros cessantes nem no dano emergente, mas sim de uma terceira espécie intermediária de dano.

Portanto, Concluiu-se neste trabalho, pela existência da responsabilidade civil do empregador pela Perda de uma Chance durante a fase a pré-contratual, tendo em vista, o ilícito realizado pelo empregador e a necessidade de reparação pelo dano causado ao empregado.

6. REFERÊNCIAS

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_____. Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região. Acórdão do processo 01237-2007-492-05-00-6. (RO) Redator: Cláudio Brandão. Data: 03/12/2009. Origem: 2ª Vara do Trabalho de Ilhéus.

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_____. Regional do Trabalho da 4ª Região. Acórdão do processo 0120400-44.2005.5.04.0030. (RO) Redator: Fabiano de Castilhos Bertolucci. Participam: Ricardo Tavares Gehling e Hugo Carlos Scheuermann. Data: 08/04/2010. Origem: 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

SAVI, Sérgio. Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo: Atlas, 2006.

TÚLIO, Marco. Indenização pela perda de uma chance. Blog do Professor Marco Túlio, 16, mar. 2009. Disponível em: . Acesso em: 10 jun. 2010.

 

 

Elaborado em dezembro/2012

 

Como citar o texto:

DUTRA, Luiz Henrique Menegon..A perda da chance na justiça do trabalho: o dano moral na fase pré-contratual enquanto garantia fundamental. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 19, nº 1038. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/2685/a-perda-chance-justica-trabalho-dano-moral-fase-pre-contratual-enquanto-garantia-fundamental. Acesso em 26 dez. 2012.

Importante:

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