O princípio da busca da verdade real (regra do processo do trabalho) não prescinde da prestação jurisdicional do Direito do Trabalho, pois este é definido como pressuposto de existência do processo justo. Isto Porque a relação fática deve prevalecer sobre qualquer formalidade, pois cumpre às partes a observância da instrução processual.

Desse modo, segue a análise do referido princípio no precedente abaixo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. HORAS EXTRAS. INVALIDADE DAS FOLHAS INDIVIDUAIS DE PRESENÇA E DOS REGISTROS DE PONTO ELETRÔNICO. VALORAÇÃO DA PROVA. SÚMULA 338, II/TST.  Processo: AIRR - 2540-92.2005.5.05.0612 Data de Julgamento: 11/06/2008, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 6ª Turma, Data de Publicação: DJ 13/06/2008.

Neste sentido, incumbe aos juízes do trabalho a plenitude do princípio da primazia da realidade, ou seja, trata-se de uma regra dos corolários do devido processo legal, contribuindo para o fortalecimento de um núcleo indissociável de direitos trabalhistas.

Sob esta perspectiva, é importante registrar o raciocínio de Didier Jr. (2013, p.45):

A locução “devido processo legal” corresponde à tradução para o português da expressão inglesa “due processo f law”. Law, porém, significa Direito, e não lei (“statute law”). A observação é importante: o processo há de estar em conformidade com o direito como um todo, e não apenas em consonância com a lei. “Legal”, então, é adjetivo que remete a “Direito”, e não a lei.  

Deste modo, a jurisprudência em comento, em sede de agravo de instrumento, sob relatoria do Ministro Maurício Godinho Delgado teve o seguinte posicionamento: “o simples fato de as folhas de presença constituírem documentos e de sua exigência ter previsão no artigo 74, § 2º, da CLT não confere, por si só, credibilidade quanto aos horários nelas registrados, se o exame da prova oral demonstra que tais registros não atendiam à realidade da jornada praticada”.

O agravante, Banco do Brasil/SA alegou que a jornada real do reclamado está prevista em folhas individuais de presença, cujos requisitos de validade foram expressamente estabelecidos por meio de instrumento coletivo.

Assim, a decisão recorrida, ao não reconhecer o valor probante das FIP’s (folhas individuais de presença) e dos registros de ponto eletrônico, afrontou os arts.7°, XXVI, da CF e 74, § 2º, 818 e 832 da CLT.

Por outro lado, em prol do princípio da primazia da realidade sobre a forma, o relator aduziu que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência do TST, pois com fundamento no disposto da “Súmula 338 desta Corte, assim redigida: I. (...) II - A presunção de veracidade da jornada de trabalho, ainda que prevista em instrumento normativo, pode ser elidida por prova em contrário”.

Isto porque, a ideia relatada na prova oral não é compatível com as FIP’s (folhas individuais de presença), sendo necessário registrar que o TST não se submete aos reexames de fato e prova. Este entendimento está consolidado na súmula 126 da Corte, assim transcrito: “Recurso Cabimento. Incabível o recurso de revista ou de embargos (arts.896 e 894, b, da CLT) para reexame de fatos e provas”.

Nos termos do Ministro Relator:

O Regional, com fulcro na prova oral produzida, ao desconsiderar a jornada de trabalho constante das folhas de presença individuais e dos registros de ponto eletrônico, aplicou à lide o princípio da primazia da realidade sobre a forma.  Aliás, não se pode atribuir presunção absoluta (juris et de jure) aos controles de ponto apresentados pela defesa, ainda que previstos em norma coletiva, sem o devido cotejo com os elementos fáticos trazidos na instrução processual.  Desse modo, se a decisão recorrida entendeu que as folhas de presença e os registros de ponto eletrônico não se coadunam com a jornada reconhecida pela prova oral, resta impossível o reexame do conjunto probatório, no sentido de que esta Corte aprecie novamente as provas, dando-lhe moldura fática diversa daquela proveniente do Regional e, por conseguinte, negue o direito às horas extras, nos termos das Súmulas 126/TST. Incólumes, portanto, os arts. 7º, XXVI, da CF e 74, § 2º, 818 e 832 da CLT. Por todo o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.

Neste tocante, Leite  (2012, p.86) leciona ao citar um precedente do TRT/ES:

PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE- PREVALÊNCIA DA PROVA. Um dos princípios que rege o processo do trabalho é o da primazia da realidade. Assim, se a prova documental é contraditória, prevalece, então, a prova testemunhal. (RO 770/2002 (6752/2002), TRT da 17° Região/ES, Rel. Juiz Geraldo de Castro Pereira. j. 09.07.2002, unânime, DO 02.08.2002).

Como se vê, a busca da verdade real deve prevalecer entre as contradições probatórias, no sentido de outorgar a interpretação mais favorável ao processo equitativo. Desta forma, este princípio autoriza aos juízes a liberdade no direcionamento do devido processo legal.

Diante da prova oral produzida, a validade das anotações individuais devem ser afastadas, pois não se pode admitir presunção absoluta às FIP’s. Isto porque, segundo TRT os horários previstos nas folhas individuais de presença e dos registros de ponto eletrônicos restringiam-se aos horários contratados, excluindo a jornada efetivamente trabalhada pelo Reclamante.

Isto demonstra que, a prova elencada nas folhas individuais e no registro de ponto não prescinde da observância quanto à instrução processual, configurando-se o previsto nos precedentes judiciais do TST.

Com acerto, aduz Almeida (2009, p.75):

A dificuldade de alcançar a verdade não e suficiente para que as partes e o juiz deixem de assumi-la como parâmetro de atuação e finalidade do processo, especialmente porque, como adverte Aristóteles, “julgar acertadamente é julgar segundo a verdade”, e não significa que ela não exista e não pode conduzir à indiferença em relação a ela. A verdade não será alcançada quando a ela as partes e o juiz renunciarem previamente.

A decisão do Tribunal implica na estrita obediência a regra da busca da verdade real, vez que seria incoerente uma decisão em desconformidade com os precedentes desta Corte. Isto porque a prova testemunhal prevalece sobre a documental, pois esta é contraditória em relação àquela, logo, aplica-se a primazia da realidade sobre os fatos.

Agora, passa-se a investigar a seguinte jurisprudência:

EMPREGADO DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. ADESÃO AO PLANO DE CARGOS E SALÁRIOS DENOMINADO ESTRUTURA SALARIAL

UNIFICADA DE 2008. CONDIÇÕES NEGOCIADAS EM ACORDO COLETIVO. LEGITIMIDADE E VALIDADE DA NEGOCIÇÃO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DE DIREITO ADQUIRIDO E DE ALTERAÇÃO PREJUDICIAL DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO. TRT da 3.ª Região; Processo: RO - 373/09; Data de Publicação: 04/03/2009; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Joao Bosco Pinto Lara; Revisor: Ricardo Antonio Mohallem; Divulgação: 03/03/2009. DEJT. Página 86.

O princípio da indisponibilidade ou irrenunciabilidade do direito material do trabalho incide na prevalência dos direitos sociais independentemente de manifestação dos sujeitos processuais, ou seja, não há voluntariedade quanto aos direitos trabalhistas. Trata-se de direitos fundamentais imprescindíveis de toda relação de trabalho.

Deste modo, na sentença proferida pela 2° Vara do Trabalho de Varginha, segue a descrição fática, a saber: “a reclamante busca o direito de aderir ao novo Plano de Cargos e Salários da CEF, sem as restrições impostas pelas reclamadas, quais sejam: adesão ao novo plano de benefícios da FUNCEF e opção pelo saldamento REG/PLAN; para adesão ao novo plano de benefícios da FUNCEF, a desistência de ações judiciais e a renúncia ao direito sobre o qual se fundamentam, com base nas regras do seu plano anterior, na forma prevista no Termo de Adesão e Novação de Direitos Previdenciários”.

Como se vê, as particularidades do novo plano não implica na renúncia dos direitos trabalhistas, isto porque é assegurado no artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, que inclui no rol dos direitos do trabalhador, o direito ao reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.

Neste sentido, com acerto salienta Leite (2012, p.86):

Justifica-se a peculiaridade do princípio nos domínios do processo do trabalho, pela considerável gama de normas de ordem púbica do direito material do trabalho, o que implica a existência de um interesse social que transcende a vontade dos sujeitos do processo no seu cumprimento e influência a própria gênese da prestação jurisdicional.

Não há ofensa ao princípio em análise, isto porque a FUNCEF (Fundação dos economiários federais) não extinguiu o plano salarial dos trabalhadores, apenas concedeu melhorias à aposentadoria complementar alterando as condições de salário. Isto demonstra que, o empregado poderá optar pelo novo plano ou permanecer com o anterior, pois trata-se de mera faculdade e não de renúncia aos direitos trabalhistas.

Desta forma, segue o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho da 3° Região:

(...) ao se implantar plano que incremente melhorias salariais para os empregados da CEF, é perfeitamente possível e legítimo que se imponha, para aqueles que a ele pretendam aderir, a conseqüente e necessária alteração das regras de aposentadoria complementar, tendo em vista os inexcedíveis princípios atuariais, e também aqueles da contributividade e da paridade que regem o instituto da aposentaria complementar privada. Tanto que a matéria já é objeto de entendimento jurisprudencial estratificado na segunda parte da Súmula 51/TST: “havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro”. Se assim não fosse, a majoração salarial decorrente da adesão ao novo plano implicaria em que a aposentadoria se dará com proventos de patamar mais elevado, para os quais o trabalhador não contribuiu ao longo do contrato de trabalho.

(...) Nem se vislumbra aqui malferimento ao princípio da indisponibilidade, porque FUNCEF não extinguiu o plano anterior a que se vinculava, tendo apenas lhe dado opções de escolha. (TRT da 3.ª Região; Processo: RO- 373/09; Data de Publicação: 04/03/2009; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Joao Bosco Pinto Lara; Revisor: Ricardo Antonio Mohallem; Divulgação: 03/03/2009. DEJT. Página 86).

Como se vê, o empregado tem o direito de migrar para o novo plano de benefícios (PCS 98) ou permanecer com o anterior (PCS 89). Assim, esta opção não enquadra-se numa restrição aos direitos do plano anterior e de qualquer abuso de direitos, mas apenas uma interpretação restritiva das condições mais benéficas aos empregados.

Na sentença, a juíza da 2° Vara do Trabalho de Varginha julgou procedentes os pedidos da inicial, alegando a possibilidade da Reclamante aderir aos direitos do novo plano da CEF sem que haja adesão ao respectivo plano de benefícios.

É constitucional a negociação coletiva que não obriga os empregados a fazer valer a adesão ao novo plano de benefícios, pois a CEF não extinguiu o plano anterior, pois mediante o pact sant servanda a  cláusula coletiva válida não afastou o direito de escolha pelo novo plano.

Neste contexto, o princípio da indisponibilidade, ora em comento, constitui direito fundamental, inarredável do núcleo basilar de direitos trabalhistas, vez que esta condição decorre do princípio da proteção mínima.

Assim, com precisão, aduz Nascimento (2012, p.134-135) acerca do mencionado princípio, a saber:

O princípio protetor, criado pelo direito do trabalho, nele cumpre um papel fundamental com realce para aspectos dos mais relativos aos direitos de personalidade da pessoa que trabalha subordinadamente numa organização alheia e como forma de compensar a inferioridade em que se encontra o empregado no contrato de trabalho, pela sua posição de dependência ao empregador, o que exige a sua tutela jurídica, e evitar o desnivelamento entre os dois sujeitos do contrato de trabalho, desdobrando-se, na teoria de Plá Rodriguez, em outros três também básicos: o in dubio pro operário (na dúvida deve-se pender para o operário), a prevalência da norma favorável ao trabalhador (regra de hierarquia na aplicação de normas conflitantes sobre a mesma matéria) e a preservação da condição mais benéfica para o trabalhador (teoria do direito adquirido).

Deste modo, o Tribunal interpretou procedente o pedido de reforma da sentença, negando os efeitos da tutela antecipada e os pedidos da exordial. Vez que, é necessário a estrita observância aos precedentes normativos do TST, pois merece atenção à súmula 51 desta Corte: “(...) havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro”.

 Os acordos coletivos devem ser submetidos à supremacia constitucional, pois é necessário registrar o direito dos empregados pela escolha de um ou outro regime, conforme prescreve na decisão do recurso em análise:

Não violam as garantias do direito adquirido e da inalterabilidade do contrato de trabalho as regras e condições negociadas entre a Caixa Econômica Federal e as entidades sindicais representativas de seus empregados para a implantação do Plano de Cargos e Salários denominado Estrutura Salarial Unificada de 2008, negociação esta que conta com a legitimidade e a validade hauridas do artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, que inclui no rol dos direitos do trabalhador o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho. Exatamente por isso, ao se implantar plano que incremente melhorias salariais para os empregados da CEF, é perfeitamente possível e legítimo que se imponha, para aqueles que a ele pretendam aderir, a consequente e necessária alteração das regras de aposentadoria complementar, tendo em vista os inexcedíveis princípios atuariais, e também aqueles da contributividade e da paridade que regem o instituto da aposentaria complementar privada (TRT da 3.ª Região; Processo: RO - 373/09; Data de Publicação: 04/03/2009; Órgão Julgador: Nona Turma; Relator: Joao Bosco Pinto Lara; Revisor: Ricardo Antonio Mohallem; Divulgação: 03/03/2009. DEJT. Página 86).

Neste cenário, cumpre registrar o pensamento de  Marinoni (2012, p.52-53) quanto à regra dos princípios:

Os princípios, por sua natureza, devem conviver. A sua pluralidade, e a consequente impossibilidade de submetê-los a uma lógica de hierarquização, faz surgir a necessidade de uma metodologia que permita a sua aplicação diante dos casos concretos. Fala-se, nesse sentido, de ponderação dos princípios ou se aplicação da “proporcionalidade” como regra capaz de permitir a sua coexistência ou de fazer prevalecer um princípio diante do outro sem que um deles tenha que ser eliminado em abstrato, ou sem que o princípio não preferido em determinada situação tenha que ser negado como capa de aplicação em outro caso concreto.

Assim, a decisão do TRT, acera do princípio da indisponibilidade do direito substancial, incide na aplicabilidade do disposto no artigo 5° §1° da Constituição da República, sendo imprescindível a efetividade dos direitos e garantias fundamentais. Logo, os direitos trabalhistas esculpidos no artigo 7° da Constituição Federal são qualificados como direitos mínimos (direitos fundamentais) de toda reação jurídica processual.

Pelo exposto, a adesão ao novo plano não caracteriza uma ofensa aos direitos adquiridos do plano anterior, pois em conformidade com os precedentes do TST, cabe ao empregado a opção entre um ou outro regime.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Cleber Lúcio de. Direito Processual do Trabalho. 3°ed.Belo Horizonte:  Del Rey, 2009.

LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho.10°ed. São Paulo: LTr, 2012.

JUNIOR, Fredie Didier. Curso de Direito Processual Civl. 15ª ed. Salvador: Editora JusPodivm, 2013.

MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 27°ed. São Paulo: Saraiva,  2012.

 

 

Elaborado em novembro/2013

 

Como citar o texto:

MARQUES, Fernando Cristian..Uma Leitura Acerca Dos Dissídios Trabalhistas Na Justiça Do Trabalho. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 22, nº 1162. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/3019/uma-leitura-acerca-dissidios-trabalhistas-justica-trabalho. Acesso em 8 mai. 2014.

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