Bem, a idéia central do presente ensaio é a verificação da possibilidade de se aplicar a chamada “exceção de pré-executividade” ao processo trabalhista, através de uma análise sistemática do instituto. Logicamente, por ser um ensaio, não se adentrará em minúcias a respeito do instituto, as quais se encontram de forma expressiva em meu trabalho de conclusão do curso de Direito/UNISINOS-2003/2 (aprovação com distinção), sob a orientação do Prof. José Antônio Reich.

Inicialmente será dada uma visão geral do processo de execução, com atenção especial às suas peculiaridades e princípios que o envolvem, tendo em vista que a temática objeto do presente estudo se desenvolve totalmente neste momento processual, mais especificamente na fase de execução trabalhista.

No processo cognitivo ou de conhecimento, o Estado atua verificando a efetiva situação jurídica entre as partes, examinando a lide para formular a norma jurídica que deve reger o caso, enquanto no processo de execução busca-se a efetivação de uma situação jurídica já devidamente apurada. Enquanto o processo de conhecimento é um processo de sentença, o processo executivo é um processo de coação. No primeiro o juiz julga ou decide, no segundo ele executa ou busca dar efetividade ao título executivo diante da falta de cumprimento voluntário da obrigação nele contida.

Na execução, não há discussão sobre o mérito do litígio, o devedor já é citado para cumprir a obrigação, no prazo e modo estabelecido, como bem estatui a Consolidação das leis do trabalho em seu art. 880, caput.

A sua função primordial é pôr em prática a situação jurídica prevista no título executivo, em virtude da certeza do direito do credor. Não há uma decisão de mérito na execução.

Porém, não se pode negar a existência do contraditório no processo executivo, mas de modo bem menos amplo que no processo de conhecimento, já que nesta hipótese o direito já se encontra reconhecido num título.

Embora de forma reduzida, o contraditório se reveste como necessário à execução, para a garantia de um processo justo. A maior expressão deste princípio constitucional está na figura dos embargos do devedor.

Os embargos são a ação do devedor, ajuizada em face do credor, no prazo e formas legais, com o intuito de extinguir, no todo ou em parte, a execução, desconstituindo, ou não, o título em que esta se funda.

Mas, os embargos à execução, onde o devedor buscará a extinção no todo ou em parte da obrigação, tem com requisito indispensável a garantia do juízo, através do depósito de quantia expressa no mandado, ou da penhora de bens suficientes ao pagamento da dívida (CLT, Art. 884).

Esse dispositivo, se for interpretado à risca, pode nos levar à conclusão de que toda e qualquer discussão no processo executivo só ser realizada através dos embargos e conseqüentemente, depois de efetivada a penhora.

Entretanto, admitirmos que o devedor não pode exercer qualquer tipo de defesa, antes da garantia do juízo, é impor um ônus excessivo para o executado, que deverá dispor de parte de seu patrimônio para que tenha sua pretensão apreciada pelo judiciário, praticamente eliminando o contraditório na execução, e muitas vezes sofrendo prejuízos irreparáveis em virtude da constrição.

Assim, sob a ótica de se evitar uma grave infringência ao princípio do contraditório, faz-se necessário admitir meios que possibilitem a defesa do executado, sem que tenha este de dispor do seu patrimônio para ser ouvido, como a exceção de pré-executividade.

A exceção de pré-executividade é o instrumento adequado que o credor possa alegar a existência de vícios fundamentais que afetam o desenvolvimento regular da execução.

Negar ao executado a possibilidade de alertar o juiz quanto à inadmissibilidade da execução seria o mesmo que impor ao executado um ônus não-jurídico ou impossibilitá-lo de ter acesso ao Judiciário, violando a garantia fundamental da justiça, caso ele não disponha de bens suficientes para garantir o juízo. Não parece justo que o executado tenha que submeter seu patrimônio à penhora para apontar vícios que podem extinguir por completo a relação executória. É um grande contra-senso exigir que o demandado se submeta a um ato executivo para poder afirmar que aquele ato não poderia ser praticado.

Ora, os pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo devem ser observados pelo magistrado trabalhista, de ofício, quando do juízo de admissibilidade da execução.

Esse juízo de admissibilidade não se restringe simplesmente ao exame do título executivo em que se funda a execução, mas diz respeito à verificação da presença de pressupostos processuais e das condições da ação, aqueles para que se admita a validade da relação processual executória e estas para que possa ser exercida a atividade jus-satisfativa típica da execução.

Assim, se deve o juiz, de ofício, reconhecer essas irregularidades, temos que admitir o cabimento da exceção de pré-executividade, alertando sobre os citados vícios, antes da penhora dos bens do devedor.

As alegações referentes às irregularidades na execução não devem ser postergadas para a oposição da ação incidental de embargos, enquanto se dispõe de um instrumento hábil para impedir inclusive que uma execução infundada seja iniciada ou tenha prosseguimento, qual seja, a exceção de pré-executividade.

Assim a exceção de pré-executividade ou ainda como preferem alguns, a objeção de pré-executividade, visa impedir que haja comprometimento patrimonial em casos de extrema relevância, tendo caráter de defesa prévia.

Apesar de inexistir em nosso ordenamento jurídico qualquer dispositivo que regule especificamente a exceção de pré-executividade, essa falta de regulamentação não deve servir de óbice para a sua aplicação, seja na esfera civil, seja na esfera trabalhista, já que sua adoção é imposta pela própria necessidade prática, servindo de instrumento que contribui significativamente para a simplificação dos atos processuais e conseqüentemente, para a celeridade e economia processuais.

Convém esclarecer que mesmo sendo cabível em nosso ordenamento jurídico, a exceção de pré-executividade não pode atuar como substituto da ação de embargos, em que se busca a alegação de todo e qualquer tipo de irregularidade. Somente em casos excepcionais, como questionamentos sobre matéria de ordem pública ou outras de iniciativa da parte, em que seja evidente a nulidade ou a inexistência do título, é que se pode fazer uso da defesa sem constrição patrimonial.

Assim, o vício deve ser perceptível, sem exigência de um exame mais apurado. A prova deverá ser pré-constituída, a exemplo do que ocorre em sede de mandado de segurança. Havendo necessidade de dilação probatória, cabível a oposição de embargos à execução, em que há amplo contraditório (natureza jurídica de ação).

Os casos de cabimento da exceção de pré-executividade devem ser restritos para que evite que o devedor faça mal uso da exceção, empreendendo manobras procrastinatórias.

No entanto cabível a seguinte indagação: DISPONIBILIZAR AO EXECUTADO, que na maioria das vezes é o empregador, MAIOR AMPLITUDE DE DEFESA, NÃO CARACTERIZARIA UMA AFRONTA AO PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO JURÍDICA DO TRABALHADOR, que é justamente aquele que se almeja proteger com o direito material e processual trabalhista?

Bem, os títulos executivos admitidos na esfera trabalhista estão no art. 876 da CLT, que foi alterado pela Lei n. 9.958/2000, que instituiu as Comissões de Conciliação Prévia. Com isso, além dos títulos executivos judiciais, ou seja, a decisão passada em julgado ou aquela da qual não tenha havido recurso com efeito suspensivo e os acordos não cumpridos, passaram a Ter força executória também o Termo de Conciliação, firmado no âmbito das Comissões de Conciliação Prévia e o Termo de Ajuste de Conduta, firmado perante o Min. Público do Trabalho, tidos como títulos executivos extrajudiciais.

Com isso aumentou-se a possibilidade de se estar diante de um título que não se encontra revestido de liquidez, certeza ou exigibilidade, condições basilares exigidas no processo de execução, sem as quais não se instaura a relação executiva.

Portando, instituída a execução por título extrajudicial, não cabe mais qualquer discussão quanto ao cabimento da exceção no processo do trabalho, para alegar eventual irregularidade do título, que não foi observada pelo magistrado trabalhista, quando do despacho que admitiu a execução.

O despacho liminar proferido pelo magistrado trabalhista nas execuções por título extrajudicial movidas pelo Ministério Público do Trabalho, ou decorrentes dos acordos provenientes das comissões de conciliação prévia assume agora maior relevância, exigindo grande cautela do Juiz, em virtude dos potenciais efeitos danosos que podem ocasionar no devedor.

O fato da objeção de pré-executividade não estar regulada pela Consolidação das Leis do Trabalho, não pode servir de justificativa para que o devedor tenha de esperar até a propositura dos embargos para o reconhecimento de vícios que extinguirão a ação executiva, até porque o Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho (v. art.769, da CLT: aplicação do direito processual comum nos casos omissos, desde que haja compatibilidade), no artigo 267, § 3º, permite ao juiz conhecer de oficio a ausência dos pressupostos processuais.

O Direito é instrumento para a realização da justiça, a sua finalidade é esta; os formalismos exagerados devem dar lugar à aplicação da justiça efetiva, sendo uma incoerência admitirmos que o devedor sofra prejuízos em virtude de execuções originariamente nulas.

Enfim, o instituto da exceção de pré-executividade deve ser aplicado na esfera trabalhista com redobradas cautelas, já que envolve sujeitos especiais, quais sejam, empregador e empregado, regidos por uma regulamentação também especial (CLT) e por princípios específicos, que devem ser respeitados, exigindo-se a adaptação do instituto às peculiaridades da Justiça do Trabalho.

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Como citar o texto:

LEDEL, Daiana Vasconcellos..A Aplicação do Instituto da Exceção de Pré-Executividade no Processo do Trabalho. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 122. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/559/a-aplicacao-instituto-excecao-pre-executividade-processo-trabalho. Acesso em 11 abr. 2005.

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