A internet rompe barreiras, fronteiras e qualquer tentativa de regulamentação. Empresas e o próprio Estado (União, Estados e Municípios) utilizam-na como meio de comunicação. Basicamente, por ela é possível navegar por páginas, receber correspondência (e-mail) e ainda "baixar" arquivos e programas que estão no mundo virtual.

O abuso do e-mail e da Internet no ambiente corporativo vem sendo uma constante, principalmente mediante o acesso pelos empregados de sites não relacionados ao trabalho e conversas particulares em e.mail´s de grupos, durante a jornada laboral, atitudes estas contrárias à produtividade. Ato ilícitos também são praticados pelos empregados que, ao baixarem programas contaminados por vírus, são responsabilizados civil e criminalmente pelos danos causados à empresa. Esta, igualmente, responde nas esferas criminal e civil, pelos danos causados pelos seus empregados a terceiros. Explica-se: se o funcionário utiliza o computador da empresa para praticar atos ilegais, causando, desta forma, prejuízos a outrem, responsabilizada pode ser a empresa, inclusive na pessoa de seu sócio, caso não consiga individualizar o agente criminoso.

Recentemente, diversos meios de comunicação têm veiculado o "controle" exercido por empresas nacionais e multinacionais sobre a utilização da Internet por empregados. Programas não permitem acesso a certos sites (pornográficos, na maioria das vezes), bem como verificam o conteúdo dos arquivos que são baixados e os e-mails enviados e recebidos. O maior problema reside no artigo 5º da Constituição Federal que dispõe que todas as pessoas são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, sendo-lhes garantido o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade nos termos legais, sendo que em seu inciso XII preconiza que é

é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Por isso, questiona-se se haveria violação do sigilo das comunicações de dados por parte das empresas ao verificarem o conteúdo do e-mail dado aos seus funcionários para o desempenho de suas funções, ou dos sites visitados, bem como os arquivos eventualmente baixados?

Acredita-se que não. Ao fornecer aos empregados o acesso à internet, a empresa visa otimizar seus negócios, objetivando lucros. É um instrumento de trabalho colocado à disposição para a consecução dos fins para os quais a empresa foi criada, assim como o é o telefone, o fax e o seu veículo. Além do fator segurança, que é crítico na internet (vírus, ataques dos chamados hackers), há o poder diretivo do empregador, que permite, dentre outras coisas, elaborar normas e aplicar penalidades quando violada a ordem interna e os princípios estabelecidos pela empresa.

A empresa é a destinatária de qualquer mensagem enviada, posto que disponibilizou o meio de comunicação com a finalidade de otimizar seus negócios e incrementar seu lucro. O funcionário é um interposto que a representa, e como tal, está sujeito a direitos e obrigações de ordem legal e do poder diretivo do empregador. Se ficar claro que o acesso ao meio de comunicação tem por finalidade o uso em serviço e as suas limitações, como por exemplo, a transmissão de declarações sexualmente ofensivas, agressivas, difamatórias, visita a sites de pornografia, pedofilia, que tratem de discriminação de um modo geral, enfim, todo e qualquer assunto que não diga respeito ao negócio e à empresa, o empregado tem a obrigação de observar tais determinações e o empregador tem o direito de monitorar e interceptar tais dados, pois como dito acima, são dirigidos primordialmente à empresa em função de sua atividade.

Assim, não há que se falar em violação do sigilo, pois a empresa, enquanto destinatária, pode verificar o conteúdo e coibir abusos de seus interpostos. Não há violação do sigilo da própria comunicação de dados. Esta só ocorre quando terceiros têm acesso à comunicação de dados sem anuência das partes envolvidas (transmissor e receptor). É um direito da empresa, que deve ser exercido com responsabilidade e em conjunto com seus funcionários na busca de um melhor relacionamento, coibindo desta forma eventuais abusos.

Em recente julgamento proferido no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Turma da 10ª Região, (RO 504/2002), reconheceu-se de forma unânime a justa causa na demissão de ex-funcionário acusado de enviar fotos pornográficas por e-mail utilizando o provedor da empresa.

A juíza Márcia Mazoni entendeu, neste caso, que todos os instrumentos são de propriedade da empresa e disponibilizados aos empregados para suas atividades, não existindo "confidencialidade", motivo pelo qual não se configuraria a suposta violação à garantia da intimidade e à obtenção de provas por meio ilícito. O controle do e-mail seria a forma mais eficaz, tanto de proteção e fiscalização das informações que tramitam na empresa, inclusive sigilosas, quanto de evitar o mau uso da internet, que pode até mesmo atentar contra a moral e os bons costumes, causando à imagem da empresa prejuízos imensuráveis. Ela enfatizou a responsabilidade solidária que recai sobre a empresa pelos atos de improbidade ou delitos praticados por seus funcionários.

Para a juíza, a utilização pessoal de e-mail funcional para fins estranhos ao serviço e de conseqüências nocivas à reputação da empresa é ato grave suficiente para a dispensa por justa causa, tendo em vista a total quebra de confiança entre empregador e empregado, tornando impossível a relação de emprego.

Entretanto, este caso ainda é matéria controvertida na doutrina e jurisprudência, devendo a empresa agir com cautela a respeito da verificação de e-mails e sites utilizados por funcionários, pois em determinados casos pode ocorrer a infração preconizada acima, conforme determina a Constituição Federal.

(Elaborado em outubro de 2005)

 

Como citar o texto:

WANTOWSKY, Giane..O mau uso da internet pode ensejar dispensa por justa causa. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 149. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-trabalho/859/o-mau-uso-internet-pode-ensejar-dispensa-justa-causa. Acesso em 24 out. 2005.

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