Resumo:

Este artigo objetiva realizar uma revisão bibliográfica confrontando o conceito de estigma de Erwin Goffman com o Princípio da Igualdade contido na Constituição Federal. Tendo em vista que esta temática é pouco explorada no meio acadêmico, juga-se necessário um estudo para que se chegue a uma percepção crítica mais aprofundada juridicamente no que se diz respeito a tal comportamento social.

Palavras-chave: princípios; Goffman; estigma

INTRODUÇÃO

É de mister importância fazermos um apanhado a cerca da obra, cujo cerne aponta aspectos sociológicos e psicológicos no tocante de indivíduos que estão a margem da sociedade. Para Goffman estes indivíduos encontram-se marcados por conta de peculiaridades físicas e psicológicas, pois os mesmos são tidos como diferentes e inferiores em relação a maioria da sociedade, posto que para que eles consigam construir a sua identidade social deverão passar por lutas diárias.

Com base nos sentimentos das pessoas que são estigmatizadas, o autor vem explorar as formas estratégicas que os “marginalizados” utilizam para assim sobreviverem. Fazendo todo um apanhado histórico a respeito desse tema, percebemos claramente que tais estigmas, são apenas coisas tidas fora dos padrões da normalidade do mundo que em que nós vivemos, mas porque não indagar sobre o que realmente é normal dentro do âmbito social? A sociedade é totalmente dinâmica assim como o Direito, devemos sempre lembrar que para Miguel Reale de acordo com a sua Teoria Tridimensional, iremos ver claramente que a sociedade é quem faz as suas próprias leis, ditando assim o que seriam também os padrões da normalidade.

FATOR HISTÓRICO

A nomenclatura estigma, surge na Grécia Antiga, mostrando para toda a sociedade local, as castas no qual cada pessoa pertencia, pois essa era uma foram de diferenciar cada cidadão grego.

O apartheid na África do Sul foi uma segregação racial, no qual podemos dizer que os negros foram estigmatizados de forma grotesca e desumana, ficando assim a margem de toda a sociedade africana, sendo impossibilitados até mesmo de votar.  Em diferentes sociedades e em diferentes eras o estigma é fruto do estranhamento inicial que acaba a acarretando uma série de percepções negativas e equivocadas:

Enquanto o estranho está à nossa frente, podem surgir evidências de que ele tem um atributo que o torna diferente de outros que se encontram numa categoria em que pudesse ser incluído, sendo, até, de uma espécie menos desejável [...]. Assim deixamos de considerá-la criatura comum e total, reduzindo-a a uma pessoa estragada e diminuída. Tal característica é estigma, especialmente quando o seu efeito de descrédito é muito grande [...] (Goffman, 1975:12).

A primeira noção que se tem de uma pessoa começa principalmente de onde ela vem, sua ascensão social, qual seu nível intelectual, sua opção sexual, o modo como se veste, dentre outras características que nos vem a mente logo no primeiro contato.

Se pararmos para pensar com um pouco mais de afinco, chegaremos à conclusão de que a sociedade sempre foi pautada nas divisões, nos preconceitos e nos estigmas, se formos relatar o inicio de toda a sociedade para o povo cristão, veremos que no próprio livro sagrado, a bíblia Adão e Eva foram marcados pelos seus pecados sendo expulsos do paraíso pelos seus atos.

Portanto chega-se claramente a conclusão de que as divisões, sempre existiram e sempre existirão no nosso meio, pois é um ato intrínseco ao ser humano, posto que a própria natureza já se encarrega de fazer as suas escolhas entre os fortes e fracos, sobrevivendo sempre aqueles que se adaptam da melhor forma no convívio social.

PRINCÍPIO DA IGUALDADE

No preâmbulo da nossa Constituição Federal, observamos que é assegurado à todos o direito a igualdade, além de uma sociedade livre, pluralista e sem preconceitos, além de ser fundada na harmonia social, ou seja, está escrito na carta magna, que tudo o que se descreve de forma contrária está em desacordo com a soberana lei do povo brasileiro.

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”

O que vem a discursão maior é saber onde realmente se encontra pautado na prática o principio da igualdade, conforme consta na Constituição Federal, tendo em vista que as pessoas tentam sempre se moldarem para serem incluídas no seio social,  ou elas se adaptam ao sistema, seguindo os padrões sociais aceitáveis para a época ou ela serão totalmente esmagadas.

Ser diferente não é tão normal no Brasil, analisa-se primeiramente tal circunstância, baseada na elaboração de leis que regulamentam o racismo e o homossexualismo, deixando claro que se não houvesse uma regulamentação legal vigente, não haveria respeito as diferenças nessas circunstâncias, nos remetendo mais uma vez a Teoria Tridimensional do Direito.

 Por ser princípio não significa que sua aceitação é tão simples, representa um valor social nem sempre assimilado. Para a plena vigência deste princípio deve haver imposição eficaz, sob o risco da sociedade permanecer sempre estagnada, encobrindo sempre as suas faces, faces estas que estão entranhadas em cada ser. Tem-se que colocar em mente que a liberdade não é apenas ir e vir e o pensamento encarcerado, mas a transcendência do eu, a manifestação espontânea da vontade de ser de cada um. Ter diferenças físicas ou psicológicas não é o grande problema da sociedade. A aceitação é o principal impasse social vigente.

A IDENTIDADE PESSOAL

Para Goffman, todos nós temos a identidade real e a virtual, no qual a real é um conjunto de atributos que as pessoas costumam ter, ou seja, a sua identidade pessoal, todos os seus costumes e preferências, já a virtual, é criada como um obstáculo, mostrando para as pessoas alheias todo o conjunto de atributos que fingimos ter, para que assim a sociedade não possa ver o nosso verdadeiro eu, ficando sempre uma verdade maquiada sobre o que realmente é a identidade pessoal de cada um.

As pessoas tidas como normais imputam para os estigmatizados a forma como eles deveriam ser, deixando-os ainda mais marginalizados. O estigma é tido como uma coisa ruim que deve ser sempre combatida de forma repressora, não deixando de forma alguma que esses atributos venham a se destacar. Portanto, percebe-se que o estigma é criado com a incongruência do estereótipo criado pela sociedade com os atributos de um indivíduo.

Para Goffman o estigma é uma identidade deteriorada, devendo portando ser combatida e evitada, pois é tida como um mal dentro da sociedade.

CONTROLE SOCIAL

Se analisarmos de forma mais minuciosa, iremos perceber que o estigma é uma forma de controle social, no qual seleciona-se de acordo com os princípios da sociedade o que se é adequado a luz do pensamento da época e o que é tido como anormal. O homem sempre fez a sua seleção natural, buscando sempre justificar as diferenças com as próprias diferenças.

Para o direito, o desigual é para ser tratado com desigualdade, ou seja, as leis deverão ser mais benéficas para os mais necessitados, tendo em vista a disparidade de necessidades entre as pessoas além de suas condições.         

Em concordância com Goffman, para Martin (1986), estigma:

“são marcas desacreditáveis que são estabelecidas por outras pessoas em encontros sociais e em envolvimentos afetivos [...]. Estigma é produto da aprendizagem, e é na interação social onde se dá, geralmente, a estimulação ou iniciação do processo de aprendizagem social” (Martin, 1986:147).

No meio social é que se difunde as ideias que estigmatizam os diferentes, tendo em vista que o meio é propício para tal questionamento e disseminação, pois mostram aos marginalizados quais as suas diferenças, diferenças estas que serão visíveis a todos a partir daquela analise, pois é somente nesse momento que o individuo irá se questionar acerca de suas peculiaridades.  

CONCLUSÃO

Através deste estudo, concluímos que o meio social, juntamente com os valores impostos pela sociedade é um fator determinante para a geração e perpetuação do estigma, assim como a história e a cultura considerando todas as categorias e pessoas que os compõem. E ainda, a variação da percepção e prática de estigma é variante de acordo com o histórico, social e cultural de cada sociedade. O Princípio da Igualdade deveria sobrepor todos esses conceitos sociais de marginalização do ser humano, posto que todos nós somos iguais perante a lei e perante todo nosso ordenamento jurídico, ordenamento este que é responsável por regularizar todas as relações sociais. 

BIBLIOGRAFIA

Goffman, E. (1975). Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes (Trad.). Rio de Janeiro: LTC

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,DF,Senado,1998.

Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado, 14ª Edição, Saraiva, 2012.         

Martin, L. G. Stigma: a social learning perspective. (1986). En Ainlay, S. C.; Becker, G.; Colman, L. M. A. (Ed), The Dilemma of Difference (145-161). New York: Plenum.

 

 

Elaborado em junho/2013

 

Como citar o texto:

DAMASCENO, Amanda Nara Soares..O estigma na visão de Ervin Goffman e o Princípio da igualdade. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1120. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/2899/o-estigma-visao-ervin-goffman-principio-igualdade. Acesso em 18 nov. 2013.

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