Resumo: A conciliação é um importante meio de tratamento de conflitos, diferenciando-se do tradicional ativismo judicial. Mencionada forma de tratamento ambicionada assegurará celeridade e economia processual, opondo-se a morosidade característica do desenvolvimento da marcha processual. O acesso à justiça é objetivado com a boa aplicação da conciliação no meio jurídico atual, evitando demandas fundadas em questões que comportam o emprego da conciliação como mecanismo apto a abreviar o desgaste da tramitação processual. Entretanto, é necessária que se faça a aplicação de forma correta do instituto para não ocorrer a desvirtuação do instituto em análise, comprometendo, via de consequência, a prestação jurisdicional minimamente satisfatória.

Palavras-Chave: Acesso à Justiça. Conciliação. Ativismo Judicial.

Sumário: 1 Introdução; 2 Conciliação: um breve histórico; 3 O instituto da conciliação como mecanismo de acesso a justiça; 3.1 Direito fundamental ao acesso a justiça; 3.2 Ativismo judicial: A morosidade decorrente do exercício do direito fundamental ao acesso a justiça; 4 Uma alternativa a resolução de conflitos: A conciliação; 5 Uma critica ao desvirtuamento da conciliação no sistema processual brasileiro; 6 Considerações finais; 7 Referências.

1 Introdução

O seguinte trabalho visa discorrer sobre o tema da conciliação, abordando tal instituto como um dos meios de resolução de conflito, que objetiva desobstruir a via judicial, conduzindo o conflito para uma resolução mais célere, com um tramite mais ágil e satisfatório para ambas as partes.

Garantindo um preceito fundamental, o acesso à justiça, aos brasileiros natos e naturalizados, residente neste país. O acesso à justiça busca não somente a celeridade, também a eficiência, para que o cidadão brasileiro consiga chegar a  justiça sem precisar esperar um trâmite processual demorado e não ter  a certeza que a decisão será satisfatória.

O tradicional ativismo judicial vem sofrendo uma crise, no qual se observa que, milhares de processo abarrotam o sistema judicial, bem como são aforadas, diariamente, um número expressivo de demandas. De igual modo, há que se mencionar que o diminuto quadro de recursos humanos, agravado com a inexpressividade de servidores, e com uma quase infinita possibilidade de recursos, dotado, por vezes, de cunho essencialmente protelatório, que contribui, ainda mais, para a longevidade do processo. Ao lado disso, denota-se que esses mecanismos processuais, em muitos casos, prolongam a espera por uma decisão coerente e, assim por se dizer, também, coercitiva pondo fim a fase de conhecimento do processo. Assim, a morosidade encontrada, muitas das vezes, não traz o cunho satisfatório para nenhuma das partes, acarretando o descrédito no Poder Judiciário.

Esse cenário caótico desencadeia uma imprescindível sobre refletindo um meio alternativo como a conciliação, conclui-se que a apreciação por um processo custoso não indica a nenhum momento a satisfação dos litigantes, com isso o meio da conciliação vem buscar uma decisão comum, em conforme acordo ente as partes, onde possa ser satisfatória, não só a uma, mais ambas as partes, e o dever cumprido pelo conciliador, consequentemente a diminuição de processo nos tribunais que vivem abarrotando o judiciário, deste modo tem-se a conciliação como um meio significante para a desobstrução de um sistema superlotado.

2 Conciliação: um breve histórico

  Com o escopo de entender os traços caracterizadores do instituto da conciliação é necessário antes saber qual a sua origem. A palavra conciliar tem sua nascitura etimológica do latim Conciliatione cujo significado ou vertentes nada mais é do que, compor, solucionar, pôr-se de acordo, em harmonia. A conciliação, como se sabe, é um instituto que é usado desde muitos tempos para o tratamento de conflitos decorrentes das relações que o homem desenvolve, como diz um velho brocado jurídico “Ubi homo ibi societas; ubi societas, ibi jus” e, complementando tal brocado, no qual se encontra o direito reside, também, o conflito de interesses, logo, verifica-se, assim, um fértil campo em que a aplicação da conciliação pode ser edificada.

Ao remontar a história humana, tem como parâmetros de soluções de conflito a autotutela, cujo principal característica visa a solução da lide com as próprias mãos, e percorrendo um pouco mais o liame histórico do ser humano em suas relações jurídicas encontra-se a conciliação, meio que tem como principal objetivo o acordo, a harmonização das vontades de ambas as partes dentro de uma determinada situação que esteja pondo ambos em controvérsia.

Na Bíblia Sagrada vários episódios revelam a existência desse instituto entre os antigos hebreus, podemos citar os episódios bíblicos de Jacó e Labão (Gênesis, versículo 36-44, cap. 31) que narra a discussão entre os mesmos e culmina em conciliação; os poderes de Moisés ( Exôdo, versículo 14, capitulo 18) o qual tinha o poder de conciliar, julgar e delegar esse poder a outros homens capazes; Mateus (livro dos apóstolos) versículo 32: “Entre em acordo sem demora com teu adversário, enquanto estás com ele a caminho, para que o adversário não te entregue ao juiz, o juiz ao oficial de justiça e sejas recolhido à prisão”. Há indicações da conciliação na Antiga Grécia, na medida em que suas leis tinham como objetivo tornar impossíveis as lides e para isso eram delegados a algumas categorias os poderes de vigia sobre determinados seguimentos da sociedade, intervindo como conciliadores quando necessário[1]

 

Com isso, comprova-se que “a conciliação é um instituto antigo de direito processual civil, cujas origens remontam às fontes romanas”[2], e o Brasil tem como fonte para suas ordenanças a escola Germânica-Romana, com isso nada mais normal que em 1824 na primeira constituição brasileira já existir de forma explicita ordenamento de conciliação, no artigo 161 da Constituição Política do Império do Brasil diz: Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará Processo algum”[3].  Ora, já se via uma visão de tentar se conciliar antes mesmo de iniciar um processo com força de obrigatoriedade, pois o texto constitucional imperial diz “não se começará processo algum” antes de ocorrer uma tentativa de conciliação, no mesmo sentido vai o artigo 23 do Decreto 737, de 25 de novembro de 1850[4], que determina a ordem do Juízo no Processo Comercial, prevendo que nenhuma causa comercial seria proposta em Juízo contencioso, sem que, previamente, tenha-se tentado o meio da conciliação.

O parâmetro da conciliação no Brasil toma uma nova feição, o Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, quando chefe de governo, por meio do Decreto 359 de 26, de abril de 1890[5], que manda observar o regulamento para execução do decreto n. 169 A de 19 de janeiro de 1890, que substituiu as leis n. 1237 de 24 de setembro de 1864 e n. 3272 de 5 de outubro de 1885, e do decreto n. 165-A de 17 de janeiro de 1890, sobre operações de credito móvel, aboliu a conciliação de forma obrigatória tornando-a facultativa. No período de 1964 a 1985, que foi marcado pelo Golpe Militar, o instituto da conciliação perdeu força uma vez que o lema dos ditadores era concentrar poder para dominar, logo não era interessante as pessoas terem como ferramenta para solucionar suas lides na forma de autocomposição, pois tal instituto afasta o Estado, dando certo empoderamento ao cidadão para fins de solucionar o conflito sem uma interferência tão incisa do Estado.

Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[6], que fez ressurgir o instituto da conciliação, devolvendo ao cidadão o poder de tratar e tentar solucionar suas lides na forma de autocomposição e resgatando direitos que haviam sidos perdidos em decorrência da Ditadura Militar.

3 O INSTITUTO DA conciliação como MECANISMO DE acesso a Justiça

A conciliação é uma das ferramentas que constituem o acesso à justiça que não seja o tradicional ativismo de todo o poder jurisdicional, ou seja, é um meio alternativo que evita toda a movimentação do aparato jurisdicional. Sendo dessa forma é evidente que por se tratar de meio alternativo traz consigo características como a celeridade, pois evita a movimentação de todo poder estatal, pois o processo do atual sistema jurisdicional necessita de tramites que devem ser seguidos em regra, fazendo com que seu andamento fique engessado em uma linha que deve ser seguida e o custo é baixo uma vez que optando para a solução do conflito por meio da conciliação o estado muita das vezes não é acionado para andar, acompanhar e dar prosseguimento a marcha processual, evitando assim o acionamento de varias repartições e consequentemente fazendo com que seu custo caia consideravelmente. No mesmo sentido o doutrinador Luiz Antunes Caetano diz:

Os meios alternativos da solução de conflitos são ágeis, informais, céleres, sigilosos, econômicos e eficazes. Deles é constatado que: são facilmente provocados e, por isso, são ágeis; céleres porque rapidamente atingem a solução do conflito; sigilosos porque as manifestações das partes e sua solução são confidenciais; econômicos porque têm baixo custo; eficazes pela certeza da satisfação do conflito[7].

Sendo assim Cândido Dinamarco diz que “O processo estatal é um caminho possível, mas outros existem que, se bem ativados, podem ser de muita utilidade”[8]. Com isso fez necessário a implementação da política nacional de conciliação com a resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça que tem como fim:

Tornar efetivo o princípio constitucional do acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, Constituição da República) como “acesso à ordem jurídica justa”. A Política Judiciária de Tratamento Adequado dos Conflitos de Interesses busca assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade. A Justiça do Trabalho sempre deu à conciliação lugar de destaque como forma mais adequada de resolução de conflitos. Todavia, é importante que os demais ramos do Poder Judiciário também utilizem a conciliação como instrumento efetivo para se estabelecer uma cultura voltada à paz social, além da solução adjudicada. Saliente-se que a Política Judiciária de Tratamento Adequado de Conflitos de Interesses tem o condão de trazer ao Poder Judiciário formas variadas para a solução do conflito além da adjudicada através da sentença. A perspectiva da Resolução é a  de que tais formas sejam utilizadas na perspectiva de se dar um tratamento ADEQUADO para cada um dos conflitos de interesses que tenham sido trazidos ao Poder Judiciário. De acordo com a Resolução 125, cabe ao Poder Judiciário organizar, em âmbito nacional, não somente os serviços prestados nos processos judiciais, mas também a solução dos conflitos através de outros mecanismos consensuais. Observando as características e previsões legais específicas de cada ramo do Judiciário, a Resolução 125 do CNJ estabelece a criação de Núcleos Permanentes de Conciliação[9].

3.1 Direito fundamental ao acesso a justiça

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988[10] garante a todo cidadão o acesso total à justiça. E no mesmo sentido Alexandre Cesar preleciona dizendo:

A garantia de efetivo acesso à Justiça também constitui um Direito Humano e, mais do que isto, um elemento essencial ao exercício integral da cidadania, já que, indo além do simples acesso à tutela jurisdicional, não se limita ao mero acesso ao Poder Judiciário. Por conta disso é que José Alfredo de Oliveira Baracho afirma que ele ‘é primordial à efetividade dos direitos humanos, tanto na ordem jurídica interna como na internacional. O cidadão tem necessidade de mecanismos próprios e adequados para que possa efetivar seus direitos[11] .

A visão de acesso à justiça não pode ser entendida como o mero direito de acionar o Poder Judiciário, o acesso à justiça vai além de uma simples demanda judicial, o cidadão ao impetrar uma ação com o fim de solucionar seu problema tem mais que a simples pretensão de ter sua demanda julgada. Ao acionar o poder do estado de julgar suas demanda o cidadão esta buscando objetivar outros direitos garantidos constitucionalmente como o ter uma sociedade justa, resguardado no artigo 3º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ou então ter o direito de resposta, resguardado no inciso V do artigo 5º dando margem, ainda, para outro direito fundamental que e englobado pelo acesso à justiça que é o direito a ampla defesa. Ora, garantir o acesso à justiça é essencial, da mesma maneira que assegura aos que estão demandando sua ampla defesa e contraditória, fazendo que o acesso à justiça tremule como paradigma sustentador de um processo legal e principiológico.

Assim, consoante magistério de Ingo Wolfgang Sarlet diz: “os direitos fundamentais, ao menos de forma geral, podem ser considerados concretizações das exigências do princípio da dignidade da pessoa”[12].  Assim, a materialização de tal plexo que direitos desdobram tanto na seara processual quanto na órbita concreta. Diverso não ocorre com acesso à justiça, afigurando-se como incumbência que repousa sobre os ombros do Estado Democrático de Direito por meio da chancela do acesso a justiça como Direito fundamental.

3.2 Ativismo judicial: A morosidade decorrente do exercício do direito fundamental ao acesso a justiça

O sistema jurídico brasileiro sofre com questões que vão além da possibilidade ou não do ingresso do cidadão com o fim de solucionar seus problemas. A justiça brasileira tem em suas veias herança trazida pelo o sistema jurídico adotado, o civil law, que traz todas as suas lei escritas e encontrando semelhança entre o mundo real e a lei vigente aplica-se tal lei, ora essa situação faz com que o autor fique delimitado em padrões que engessam e dificultam a situação de um processo, em contra partida o acesso a justiça é um dos grandes culpados, uma vez que a legalidade decorrida pelo sistema jurídico faz com que ocorra uma grande demanda de ações que muitas das vezes são infundadas. Em questão da morosidade e abarrotamento processual Ada Pellegrini Grinover diz:

 A morosidade dos processos, seu custo, a burocratização na gestão dos processos, certa complicação procedimental; a mentalidade do juiz que nem sempre lança mão dos poderes que os códigos lhe atribuem; a falta de informação e de orientação para os detentores dos interesses em conflito; as deficiências do patrocínio gratuito, tudo leva à obstrução das vias de acesso à justiça e ao distanciamento entre o Judiciário e seus usuários. O que não acarreta apenas o descrédito na magistratura e nos demais operadores do direito, mas tem como preocupante conseqüência a de incentivar a litigiosidade latente, que frequentemente explode em conflitos sociais, ou de buscar vias alternativas violentas ou de qualquer modo inadequadas (desde a justiça de mão própria, passando por intermediações arbitrárias e de prepotência, para chegar até os "justiceiros").

      Por outro lado, o elevado grau de litigiosidade, próprio da sociedade moderna, e os esforços rumo à universalidade da jurisdição (um número cada vez maior de pessoas e uma tipologia cada vez mais ampla de causas que acedem ao Judiciário) constituem elementos que acarretam a excessiva sobrecarga de juízes e tribunais. E a solução não consiste exclusivamente no aumento do número de magistrados, pois quanto mais fácil for o acesso à Justiça, quanto mais ampla a universalidade da jurisdição, maior será o número de processos, formando uma verdadeira bola de neve[13].

 

 

Ocorre, também, que, essas demandas fundadas em um simples aborrecimento ou frustração e que sobrecarregam o Judiciário faça que autor e suposto “detentor” do direito em questão não abra mão de protelar a ação, sendo a conciliação muita das vezes subentendida como um leilão, onde a pretensão é supervalorizada pelo autor. Diante disso, o processo parte para sua próxima fase e para uma demora que se faz desnecessária, haja vista que se o direito realmente se baseia em fundamentos fúteis, como uma simples frustração ou aborrecimento corriqueiro, o juiz indeferirá o pedido, podendo condenar ainda o autor em custas e honorários sucumbenciais.

Muitos dos problemas do judiciário brasileiro decorrem do motivo da Constituição da República Federativa de 1988[14] ter proporcionado a judicialização dos conflitos, decorrente do grande período em que o Brasil ficou em estado de Ditadura, com o fim desse período se supervalorizou os direitos que antes estavam privados e consequentemente fez com que a volta dos direitos antes privados fossem supervalorizados, fazendo com que toda e qualquer lide possa ser solucionada através do judiciário. As exageradas demandas que todos os dias são impetradas, as lides fundadas em questões fúteis, o aparato processual que engessam o andamento do processo, todas essas característica e a utilização do acesso a justiça usada de maneira inadequada fazem com que os números da justiça em relação a processos não julgados só aumente. De acordo com a pesquisa Justiça em Números 2013 do Concelho Nacional de Justiça

O total de processos em tramitação no Poder Judiciário aumenta gradativamente desde o ano de 2009, quando era de 83,4 milhões de processos, até atingir a tramitação de 92,2 milhões de processos em 2012, sendo que, destes, 28,2 milhões (31%) são casos novos e 64 milhões (69%) estavam pendentes de anos anteriores Por outro lado, houve crescimento do total de processos baixados, atingindo-se 27,8 milhões de processos no último ano. Em mais um ano, o número de processos baixados foi inferior ao de casos novos. Isso aponta para uma tendência de que o estoque aumente para o ano de 2013. Em termos relativos, os casos novos são os que mais cresceram, com aumento de 8,4% no ano, enquanto os baixados tiveram incremento de 7,5% e as sentenças em 4,7%. O maior gargalo do judiciário apresenta-se na liquidação do estoque, visto que, inobstante os tribunais terem sentenciado e baixado quantidade de processos em patamares semelhantes ao ingresso de casos novos, o quantitativo de processos pendentes tem se ampliado em função dos aumentos graduais da demanda pelo Poder Judiciário.[15]

Tal pesquisa apenas comprova a necessidade de desjuridicalização dos conflitos, buscando novos meios de tratamento das lides.

4 Uma alternativa a resolução de conflitos: A conciliação

 

A conciliação é uma ferramenta de extrema importância no qual um terceiro neutro e imparcial colabora com as partes com o fim de tratar a lide existente, tal instituto tem como características a celeridade, o que normalmente não se encontra na via do tradicional ativismo judicial, onde uma sentença com o solucionamento da lide, por muitas vezes demora anos. Sendo assim a conciliação e um excelente meio alternativo de tratamento de lides, pois o instituto da conciliação visa:

A ruptura com do formalismo processual. A desformalização é uma tendência, quando se trata de dar pronta solução aos litígios, constituindo fator de celeridade. Depois, dada a preocupação social de levar a justiça a todos, também a gratuidade constitui característica marcante dessa tendência. Os meios informais gratuitos (ou pelo menos baratos) são obviamente mais acessíveis a todos e mais céleres, cumprindo melhor a função pacificadora. Por outro lado, como nem sempre o cumprimento estrito das normas contidas na lei é capaz de fazer justiça em todos os casos concretos, constitui característica dos meios alternativos de pacificação social também a delegalização, caracterizada por amplas margens de liberdade nas soluções não-jurisdicionais (juízos de equidade e não juízos de direito, como no processo jurisdicional)."[16]Com isso vemos que a conciliação é uma das soluções para a atual situação do sistema judicial, assim diz Ada Pellegrini Grinover “As soluções para a crise da justiça se desenvolvem em duas vertentes: a jurisdicional e a extrajudicial.”[17]

Cuida salientar que o instituto da conciliação se divide em duas espécies, a conciliação judicial/obrigatória/endoprocessual e a conciliação extraprocessual/facultativa. A conciliação judicial, também nomeada de conciliação endoprocessual ou obrigatória é compreendida como uma parte do processo jurisdicional esta é uma parte da prestação jurisdicional que o Estado tem que entrega a cada cidadão no momento em que este ingressa no sistema judiciário, ora sendo assim,

A conciliação judicial ou processual é dever do juiz. Pode e deve ser praticada a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, conforme prevê a regra geral contida no art. 125, IV, do CPC. De qualquer modo, o Código de Processo Civil estimula a conciliação em vários momentos, como na audiência prevista nos arts. 277 e 331, as quais, por obvio, não privam o juiz de nova tentativa em outras fases do procedimento, como previsto, por exemplo nos arts. 447 a 449 do CPP.[18]

Ainda acerca do mesmo tema, Humberto Theodoro Júnior preleciona dizendo:

O empenho do legislador brasileiro em estimular a solução conciliatória dos litígios corresponde a uma tendência dominante no direito comparado moderno. Na França, por exemplo, reforma recente do Código de Processo Civil adotou como medidas obrigatórias a conciliação e a mediação. Com isso ficou expressamente declarado em lei que “integra a missão do juiz conciliar as partes (art. 21 do novo Código de Processo Civil)”. Foi mais longe, ainda, a inovação do direito processual francês: criou-se em todo órgão judicial a figura do “conciliador”, que é um agente auxiliar do juízo, cuja função não é julgar, mas simplesmente aproximar as posições dos litigantes. Essa conciliação deve ser tentada antes do ajuizamento da causa e também no curso do processo. Com isso procura-se valorizar a denominada “justiça consensual”, que goza no momento “de todos os favores do legislador francês, que nela enxerga um meio de aliviar os tribunais e de tornar mais humana a Justiça”.

Observa ROGER PERROT que “a preocupação é louvável; liga-se à idéia de que, neste fim do século XX, o jurisdicionado aspira a uma Justiça mais simples, menos solene, mais próxima de suas preocupações quotidianas, àquilo que numa palavra se denomina Justiça de proximidade”.[19]

Ora, tendo a possibilidade de consenso entre as partes

O juiz homologará o ato celebrado entres estas, passando ele a ter a mesma eficácia pacificadora de uma sentença que julgasse o mérito, solucionando questões (art. 331, § 1º, e art. 449, Código de Processo Civil de 1973); extingue-se o processo com julgamento de mérito, o que significa que as disposições ajustadas pelas partes e homologadas pelo juiz ficarão imunizadas pela coisa julgada material e em princípio só poderão ser rescindidas pela via da ação rescisória (art. 269, II,III e V, arts. 467-468 e art. 485, CPC)"[20]

A conciliação também poderá ocorre de forma extraprocessual

Esse procedimento se constitui em um método de prevenção de litígios e funciona como opção alternativa ao ingresso na via judicial, objetivando evitar o alargamento do número de demandas nos foros e a abreviação de tempo na solução das pendências, sendo acessível a qualquer interessado em um sistema simples ao alcance de todos. [...] A principal característica dessa modalidade de conciliação é a promoção de encontros entre os interessados, nos quais um conciliador buscará obter o entendimento e a solução das divergências por meio da composição não adversarial e, pois, ainda antes de deflagrada a ação. [...] É bem-vinda a participação e a integração a essa atividade dos profissionais e dos setores que atuam na área social (equipes multidisciplinares), possibilitando o entrosamento entre os vários serviços existentes. [...] Vale destacar, obtido o acordo em sede de conciliação pré-processual (informal), tem lugar a lavratura do instrumento particular de composição do conflito, ou seja, do ajuste celebrado entre as partes, o qual pode se constituir, desde logo, quando for o caso, em título executivo extrajudicial (art. 585, II, do CPC, com a assinatura de testemunhas), nada obstando, onde admitido, haja encaminhamento à homologação judicial"[21]

A conciliação extraprocessual ocorre com o mínimo de interferência judicial, as partes envolvidas na lide buscam por si mesmo a solução do conflito sem o acionamento da maquina judiciaria, evitando dessa maneira um maior desgaste, perca de tempo gasto e esforço.

[...] a conciliação extraprocessual pode levar as partes à renúncia, à submissão ou à transação e, quando obtida alguma dessas soluções, ela é suscetível de ser homologada pelo juiz competente ou referendada pelo Ministério Público, em atos que têm a eficácia de título executivo (LJE, art. 57). Isso significa que, tratando-se de avença que dependa de cumprimento futuro e não sendo cumprida, o credor dispõe da via da execução forçada para obter a satisfação (CPC, arts. 583, 584, inc. IIl, 585, inc. II, 586 etc.; LJE, arts. 14, 51, 53 etc.)[22]  

Em ambas as situações de conciliação seja ela a judicial ou a extrajudicial os envolvidos na lide terão sua questão totalmente discutidas encontrando a solução de conflito e de forma que irá satisfazer ambas as partes, o que normalmente não ocorre nos casos em que são instaurados processos para a verificação e tratamento da lide em questão. A conciliação traz para si celeridade, eficácia e economia.

5 Uma crítica ao desvirtuamento da conciliação no sistema processual brasileiro

É sabido que a conciliação é uma importante ferramenta para solucionar a atual crise da justiça, cujo aumento é vista diariamente e seu agravamento já sentido pela população jurisdicionada, demandas ajuizada sem fundamento, rigidez do sistema processual brasileiro, todas essas variantes influenciam na carga que o poder judiciário tem em questão da morosidade processual. A conciliação é uma possibilidade de edificação de um acordo, externando, via de consequência, o interesse das partes envolvidas na demanda, rompendo com o paradigma que transfere ao Estado-juiz monopólio da resolução dos conflitos, por meio da emissão de um pronunciamento calcado apenas no convencimento do magistrado, olvidando-se dos interesses dos atores processuais. Entretanto, tal instituto vem sendo negligenciada, muitos juízes na fase da conciliação endoprocessual falham no sentido de fomentar tal instituto por certa falta de maturidade ou intimidade com esse. Nesse mesmo sentido diz o Desembargador aposentado Kazuo Watanabe

O grande obstáculo, no Brasil, à utilização mais intensa da conciliação , da mediação e de outro meios alternativos de resolução de conflitos, está na formação acadêmica dos nossos operadores de Direito, que é voltada, fundamentalmente, para a solução contenciosa e adjudicada dos conflitos de interesses. Vale dizer toda ênfase é dada à solução dos conflitos por meio de processo judicial, onde é proferida uma sentença, que constitui a solução imperativa dada pelo juiz como representante dos Estados. É esse o modelo ensinado em todas as Faculdades de Direito do Brasil. Quase nenhuma faculdade oferece aos alunos, em nível de graduação, disciplinas voltadas à solução não-contenciosa dos conflitos[23].

 

Muitos vão além de não fomentar o instituto e ao invés de agir como um conciliador que deve

Se apresentar de maneira adequada, ouvir a posição dos interessados e intervir com criatividade – mostrando os riscos e as consequências do litígio, sugerindo opções de acordo e incentivando concessões mútuas[24].

Coagem os litigantes em questão, fazendo com que aceite a proposição do acordo mesmo estes não tendo querer na proposta feita, com o objetivo de desencalhar mais um processo perdido nos fóruns e tribunais do país, comprometendo o que o Estado Brasil mais preza, que é a busca da justiça, retirando assim o princípio do empoderamento que o cidadão ganha no momento em que decide conciliar, caso ocorra a manipulação da conciliação, a mesma perde seu efeito e o instituto fica descredibilizado. Questões como a falta de técnica dos conciliadores em questão também poderá fazer com que a conciliação não seja uma boa alternativa para o tratamento da lide, ora colocada em questão em busca do tratamento da lide pelo meio alternativo de tratamentos de lide.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observando o que fora até aqui disposto, a conciliação é um importante meio de tratamento dos conflitos, uma vez ser um instituto que existe desde muito tempo. A conciliação é uma ferramenta de acesso a justiça muito eficaz, uma vez que é um meio que tem como princípios a celeridade e empoderamento das partes visando o melhor tratamento da lide trazida pelo cidadão ao conciliador, ora conclui-se também que tal instituto e de extrema importância para tratar a atual crise do sistema judiciário, que sofre constantemente com o acumulo de processo existentes nos tribunais, entretanto há que se observa a melhor  aplicação da conciliação no sistema jurídico atual, tendo em vista a melhor aplicação do instituto e capacitação dos conciliadores.

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[1]           LOPEZ, Ilza de FátimaWagner; MIRANDA, Fernando Silva Melo Plentz. A conciliação nos Juizados Especiais Cíveis. Disponível em . Acesso em 12 mai. 2014.

[2]           BUZAID, Alfredo. Rui Barbosa processualista civil e outros estudos. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 8-9.

[3]           BRASIL. Constituição Politica do Império do Brasil de 1824. Disponível em . Acesso em 12 abr. 2014: “Art.6º - Sem se fazer constar, que se tem intentado o meio da reconciliação, não se começará Processo algum”.

[4]           BRASIL. Decreto nº 737, de 25 de novembro de 1850. Determina a ordem do Juízo no Processo Comercial. Disponível em . Acesso em 12 abr 2014: “Art. 23. Nenhuma causa commercial será proposta em Juizo contencioso, sem que préviamente se tenhn tentado o meio da conciliação, ou por acto judicial, ou por comparecimento yolun­tario das partes”.

[5]           BRASIL. Decreto nº 359, de 26 de abril de 1890. Manda observar o regulamento para execução do decreto n. 169 A de 19 de janeiro de 1890, que substituiu as leis n. 1237 de 24 de setembro de 1864 e n. 3272 de 5 de outubro de 1885, e do decreto n. 165-A de 17 de janeiro de 1890, sobre operações de credito móvel. Disponível em: Acesso em 12 mai. 2014

[6]           BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro 1988. Disponível em: Acesso em 12 mai. 2014

[7]           CAETANO, Luiz Antunes. Arbitragem e Mediação: rudimentos. São Paulo: Atlas, 2002. p. 104

[8]           DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p.138

[9]           BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho do Estado de Minas Gerais. Disponível em: . Acesso em 11 mai. 2014 

[10]          BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro 1988. Disponível em: Acesso em 12 mai. 2014

[11]          CESAR, Alexandre. Acesso à justiça e cidadania. Cuiabá: Editora Universitária, 2002, p. 46.

[12]          SARLET, Ingo Wolfgang apud BESSA, Leandro Souza. Colisões de Direitos Fundamentais. In: XIV CONPEDI, ANAIS..., Fortaleza, 3-5 nov. 2005. Disponível em Acesso em 14 abr 2014.

[13]          GRINOVER, Ada Pellegrini. Os fundamentos da Justiça Conciliativa. Disponível em Acesso em 10 mai 2014.

[14]             BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 5 de outubro 1988. Disponível em: Acesso em 12 mai. 2014

[15]          BRASIL. Conselho Nacional de Justiça, 2013. Disponível em: Acesso em 10 mai 2014, p. 292-293.

[16]          CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 24 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 32.

[17]          GRINOVER, Ada Pellegrini apud FARINELLI, Alisson. Conciliação e Mediação no Novo Código de Processo Civil (PLS 166/2010). Revista de Processo. São Paulo, ano 36, v. 194, abril/2011.p. 284

[18]          FARINELLI, Alisson. Conciliação e Mediação no Novo Código de Processo Civil (PLS 166/2010). Revista de Processo. São Paulo, ano 36, vol. 194, abril/2011. p. 286.

[19]          THEODORO JUNIOR, Humberto, 2002, p. 147, apud SOUZA, Elizangela Ribeiro de.  Da Importância da Conciliação. Disponível em: Acesso em 20 abr 2014.

[20]          DINAMARCO, Cândido Rangel, 2005, p. 703 apud ALVES, Rafael Oliveira Carvalho. Conciliação e acesso à justiça. Disponível em:.  Acesso em 20 abr 2014.

[21]          CARVALHO, Rafael Oliveira. Conciliação e acesso à justiça. Disponível em: . Acesso em 20 abr. 2014.

[22]          OLIVEIRA JR. Evaldo Rosario de. Acesso a Justiça e as vias Alternativas para a solução de controvérsias: mediação, conciliação e arbitragem. Revista Jus Navigandi, Teresina. Disponível em   Acesso em 11 mai. 2014.

[23]          WATANABE, Kazuo, 2008, p.6 apud LOPEZ, Ilza de FátimaWagner; MIRANDA, Fernando Silva Melo Plentz. A conciliação nos Juizados Especiais Cíveis. Disponível em Acesso em 12 mai 2014.

[24]          BACELLAR, Roberto Portugal, apud MENEGHIN, Laís; NEVES, Fabiana Junqueira Tamaoki. Meios Alternativos de Pacificação de Conflitos – Mediação, Conciliação e Arbitragem. Revista Intertemas. Disponível em Acesso em 11 mai 2014

 

 

Elaborado em março/2014

 

Como citar o texto:

PEREIRA, Reynaldo Batista; SANTOS, Edvelton Salmar dos; RANGEL, Tauã Lima Verdan..Uma Crítica À Conciliação E Sua Aplicabilidade Como Acesso À Justiça. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1222. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/3386/uma-critica-conciliacao-aplicabilidade-como-acesso-justica. Acesso em 2 jan. 2015.

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