Incumbe ao Procurador-Geral de Justiça ou a seus órgãos delegados, no âmbito do Ministério Público de Minas Gerais, ao qual me restringirei no presente estudo, com o fito de melhor compreensão da matéria pelos leitores, analisar a viabilidade do ajuizamento da ação penal em feitos de competência originária.

Para tanto, é instaurado Procedimento Investigatório Criminal - PIC, visando à formação da opinio delicti do Chefe do Parquet. E, em caso, v.g, de manifesta atipicidade da ação penal, o Procurador-Geral de Justiça determina o arquivamento do expediente.

Nessa hipótese, caberia a revisão do decisum? Em caso afirmativo, qual órgão deteria a atribuição?

A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público - 8.625/93, atribuiu ao Colégio de Procuradores de Justiça a revisão da decisão de arquivamento de inquérito policial ou de peças de informação determinada pelo Procurador-Geral de Justiça, nos casos de sua atribuição originária:

[...] Art. 12. O Colégio de Procuradores de Justiça é composto por todos os Procuradores de Justiça, competindo-lhe:

omissis

XI - rever, mediante requerimento de legítimo interessado, nos termos da Lei Orgânica, decisão de arquivamento de inquérito policial ou peças de informações determinada pelo Procurador-Geral de Justiça, nos casos de sua atribuição originária; [...]

Aplicando-se a mencionada previsão legal ao Ministério Público mineiro, incumbiria à Câmara de Procuradores de Justiça a revisão do decisum, órgão ao qual, pelo Regimento Interno do Colégio de Procuradores de Justiça da referida Instituição, caberia, em grau de recurso, na forma da Lei Orgânica estadual, o reexame de ato praticado ou decisão proferida pelo Procurador-Geral de Justiça, inclusive nos casos de delegação de funções administrativas típicas - artigo 14, inciso I.

Ocorre, contudo, que a Lei Complementar nº 34/94 - Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais é omissa, nada dispondo acerca do tema, omissão, a meu ver, que obsta o reexame da decisão pelo Órgão Colegiado.

Veja-se.

A Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, alhures citada, foi editada na forma de lei ordinária, não podendo o seu conteúdo restringir a competência dos Estados de estabelecerem a organização, as atribuições e o estatuto dos ministérios públicos estaduais (artigo 128, § 5º, da Constituição da República), sob pena de ofensa ao princípio federativo. 

Nesse quadrante, conforme explicita Hugo Nigro Mazzilli, só teriam eficácia os dispositivos da Lei 8.625/93 que:

[...] a) não invadam matéria de organização ou estatuto do ministério público dos Estados; b) não contrariem as constituições e leis complementares estaduais; c) disponham sobre atribuições do Ministério Público, matéria sobre a qual pode versar lei ordinária [...].[1]

E, por certo, a divisão de atribuições entre os órgãos dos Ministérios Públicos estaduais configura matéria de organização da Instituição, que não pode ser afrontada ou suprimida por texto de lei ordinária.

Talvez por esse motivo, e encampando o presente entendimento, a Lei Complementar nº 75/93, que dispõe sobre a organização do Ministério Público da União, vai de encontro ao texto da Lei Orgânica Nacional, ao disciplinar que, nos casos de competência originária, não caberá revisão da decisão de arquivamento de inquérito policial, parlamentar ou de peças de informação, por parte das Câmaras de Coordenação e Revisão:

[...] Das Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal

 Art. 62. Compete às Câmaras de Coordenação e Revisão:

omissis

IV - manifestar-se sobre o arquivamento de inquérito policial, inquérito parlamentar ou peças de informação, exceto nos casos de competência originária do Procurador-Geral;

[...] (Grifos nossos).

Nesse contexto, a remissão do Regimento Interno do Colégio de Procuradores de Justiça à Lei Orgânica, ao que se nota, confere exceções à atuação do Procurador-Geral de Justiça, nos feitos de atribuição originária, cuidando-se, portanto, de decisão irrecorrível.

  

[1] Regime Jurídico do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 368. 

 

 

Elaborado em março/2014

 

Como citar o texto:

ROSENBURG, Ana Olívia Faria..A imutabilidade da decisão administrativa de arquivamento de Procedimento Investigatório Criminal - PIC, em feitos de competência originária, no âmbito do Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 22, nº 1153. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-administrativo/2974/a-imutabilidade-decisao-administrativa-arquivamento-procedimento-investigatorio-criminal-pic-feitos-competencia-originaria-ambito-ministerio-publico-estado-minas-gerais. Acesso em 31 mar. 2014.

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