Sumário: 1. Introdução - 2. O Teor da Súmula Vinculante n°13 do Supremo Tribunal Federal sob Críticas - 3. Princípio Constitucional da Moralidade Administrativa - 4. A Incidência da Vedação do Nepotismo de Forma Esparsa e Como Enfrentá-lo no Mundo Jurídico – 5. Conclusão

Resumo: O Nepotismo, conteúdo chave da súmula vinculante n.13, será o cerne da discussão, onde não apenas haverá críticas, mas também uma busca por soluções para coibir o problema. Modo qual, serão abordados os perigos desta prática na atualidade e como vive este mal no pálio da súmula.

Palavras-chave: Súmula Vinculante; Nepotismo; Moralidade Administrativa

1.                  INTRODUÇÃO

O termo nepotismo é derivado do latim nepos, que significa neto, sobrinho, e foi ampliado com o decorrer do tempo, reportando a descendentes, já o vocábulo ismo, é um sufixo que remete à ação, na qual muito embora seja bastante discutido atualmente, esta prática é secular na administração brasileira, típica do patrimonialismo herdado da tradição colonial portuguesa.

Aonde transitando no texto, verá a nítida falha da súmula vinculante, podendo gerar danos a coletividade, sendo também abordado a não necessidade de regras específicas proibitivas do nepotismo, cuja a força para tanto se perfaz em um princípio constitucional.

2.                  O TEOR DA SÚMULA VINCULANTE N° 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOB CRÍTICAS

A súmula vinculante nasceu de uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o Nepotismo no dia 20 de agosto de 2008, onde fora declarado constitucional a Resolução do Conselho Nacional de Justiça, a qual proíbe o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, em que ainda acrescentaram o termo “chefia”.

A citada decisão possui natureza vinculante, logo, deve ser seguida por todas as instâncias do judiciário, como ainda extensivo aos Poderes Legislativo e Executivo (tanto a Administração Direta quanto Indireta).

Possui a 13 ? Súmula Vinculante, a seguinte redação:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Como pode-se perceber no enunciado da súmula, a nomeação para cargos políticos não s objeto da mesma, abrindo esta exceção, sendo estes cargos para: Ministros dos Estados, Secretários dos Estados, Municípios e do Distrito Federal. Assim sendo, esta não menção a cargos políticos deixa aberta uma brecha interpretativa, onde a prática nepotista acaba sendo recorrente, com o trivial argumento que, “o que não é proibido é permitido”, além do mais, é utilizado o termo cargo de confiança, para pôr um parente seu à função pública.

A prática nepotista é bastante ampla, e pode ocorrer de duas formas: direto ou indireto (cruzado). Para ratificar estas perpetrações, ratifico expondo o artigo 2° da Resolução N°7 do Conselho Nacional de Justiça, que aduz o seguinte:

Art. 2° Constituem práticas de nepotismo, dentre outras:

I - o exercício de cargo de provimento em comissão ou de função gratificada, no âmbito da jurisdição de cada Tribunal ou Juízo, por cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juízes vinculados;

II - o exercício, em Tribunais ou Juízos diversos, de cargos de provimento em comissão, ou de funções gratificadas, por cônjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, de dois ou mais magistrados, ou de servidores investidos em cargos de direção ou de assessoramento, em circunstâncias que caracterizem ajuste para burlar a regra do inciso anterior mediante reciprocidade nas nomeações ou designações.

No artigo 2° da supramencionada Resolução N°7 que deu surgimento a Súmula Vinculante n.13, destaco o inciso II, que trata do Nepotismo Cruzado ou Indireto, pois é de difícil descoberta quando ocorre por este meio, aonde determinada pessoa revestida pela função pública, com poderes para nomear ou designar alguém a determinado cargo, opta por escolher o parente de algum colega teu, afim de auferir o mesmo deste (nomeação de um parente daquele), estaria configurado neste caso o nepotismo cruzado, havendo reciprocidades de nomeações ou designações.

Diante o exposto, minha crítica vai ao fim deste citado inciso, que diz o seguinte: “reciprocidade de nomeações ou designações”, ao corolário modo de ver não pode-se ficar restrito a esta forma de reciprocidade apenas, pois favores, benefícios, etc., também devem ser levados em consideração, porque queira que não, havendo regalias, independente de qual seja, pela nomeação de parente de um colega, está assinalado o nepotismo cruzado. Todavia, este tipo de abordagem é muito delicado, e deve ser analisado minuciosamente para que não haja equívocos.

Para dar corpo ao expresso modo de pensar, será alocado uma decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, acerca do nepotismo cruzado, assevera que:

EMENTA: Mandado de Segurança. Indicação por desembargador do Tribunal de Justiça de parente (sobrinha) de juiz de direito da primeira instância, para ocupar cargo de confiança no segundo grau. Não configurada a hipótese normativa definida como nepotismo. Nepotismo: designação por autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, com favorecimento de familiares (cônjuge, companheiro ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau) para cargos e/ou funções públicas em detrimento de pessoas mais qualificadas, sem vínculo parental. Servidora indicada que reúne as condições técnicas para ocupar a função, não possui parentesco com a autoridade nomeante, não possui parentesco com servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, e não se trata de nepotismo cruzado. Não configurada a hipótese da Súmula Vinculante n. 13 do STF. Observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência no serviço público. CR/88, art. 37, "caput". Direito líquido e certo, do impetrante, ferido com a suposta incompatibilidade, vez que não configurada a hipótese classificada como nepotismo. Necessidade de razoabilidade do julgador ao aplicar a norma ao caso concreto, vez que deve estar atento e sensível à dinâmica dos fatos sociais, sob pena de cega afronta aos direitos fundamentais individuais e sociais, pilares da Constituição da República de 1988 e do Estado Democrático de Direito. Concessão da ordem em atenção aos princípios da igualdade e do direito ao trabalho, além da aplicação do princípio da vedação ao retrocesso social. CR/88, arts. incisos III e IV, , inciso I, 170, 193. Conceder a segurança, com a confirmação da liminar.

Conforme a jurisprudência, não houve beneficiamento recíproco, restando ao Tribunal reconhecer a validade do ato, pois, não havendo reciprocidade de favorecimento, subentende-se que a nomeação tenha sido em virtude de suas qualificações, sendo apropriada para a tarefa a qual lhe será designada.

3.                  PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA

Um dos princípios mais relevantes para o direito, sobretudo para administração pública, está previsto no artigo 37, Caput, da nossa Carta Magna, tendo em vista sua importância, ressalto as distinções entre moral comum e moral administrativa, onde a moral comum concerne as ações humanas convergentes ao caráter, modo qual, engendra uma reputação social, por outro lado, temos a moral administrativa, que nem sempre condiz com caráter, mas na maioria das vezes com interesses, em que, no caso em tela, o que se analisa acerca dela é a qualidade da administração e os meios utilizados.

Como bem asseverou Diogo de Figueiredo Moreira Neto:

“a moral comum é orientada pela distinção entre o bem e o mal, ao passo que a moral administrativa é orientada pela diferença prática entre boa e má administração”.

Seguindo o raciocínio, saliento a classificação das normas e regras e do princípio, em que se considera a norma o gênero, enquanto que as regras e princípios são espécies, como muito bem tece o ilustre Paulo Bonavides:

(...) não há distinção entre princípios e normas, os princípios são dotados de normatividade, as normas compreendem regras e princípios, a distinção relevante não é, como nos primórdios da doutrina, entre princípios e normas, mas entre regras e princípios, sendo as normas o gênero, e as regras e os princípios a espécie.

Em conseguinte do exposto acima, podemos afirmar que, pelo fato do princípio e da regra jurídica serem espécies de normas jurídicas, suas aplicações se condicionam em si, bastando para tanto, conferir elementos suficientes que permitam densificação e concretização do significado do princípio jurídico. Sendo o princípio constitucional da moralidade administrativa, uma norma jurídica de eficácia plena.

Hely Lopes de Meirelles, sintetizando as lições de Maurice Hauriou, o principal sistematizador da teoria da moralidade administrativa, assim se manifesta:

“A moralidade administrativa constitui hoje em dia, pressuposto da validade de todo ato da Administração Pública (Const. Rep., art. 37, caput). Não se trata – diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como “o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”. Desenvolvendo a sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de direito e de moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos – non omne quod licet honestum est. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para a sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve, e a finalidade de sua ação: O bem comum. O certo é que a moralidade do ato administrativo, juntamente com a sua legalidade e finalidade, constituem pressupostos de validade, sem os quais toda atividade pública será ilegítima”.

Como de forma coesa, coerente e congruente é abordado o entendimento de Hely Lopes acerca das distinções de Moral, fica claro que a Moralidade tratada pela nossa Constituição Cidadã é a jurídica, e não a comum, por conta da relação de confiança (implícita) criada entre o povo (coletividade) e o agente público, no qual este deverá se portar com um comportamento padrão objetivo, pautado na transparência, impessoalidade e honestidade. Desta forma, muito embora confunda as duas morais na ótica do leigo, uma vez violado o constitucional princípio da moralidade pelo agente público, será esta moral, a administrativa (jurídica).

4.                  A INCIDÊNCIA DA VEDAÇÃO DO NEPOTISMO DE FORMA ESPARSA E COMO ENFRENTÁ-LO NO MUNDO JURÍDICO.

Neste tópico abro margem a uma discussão desnecessária acerca de se criar uma lei federal específica para reprimir o nepotismo, ora, já temos resoluções, como a n. 7 do Conselho Nacional de Justiça; princípios constitucionais, como o da moralidade administrativa; e inclusive lei, como a 8.112/90 que em seu artigo 117, VIII, que condenam esta prática, sem mencionar a súmula vinculante n.13.

Perante isto, havendo denúncia de um caso de nepotismo, já se percebe que fundamentos legais para coibi-la não falta, no entanto, evoco aos leitores que no tópico 1, trouxe à tona, o fato de o meio mais forte de se vetar esta prática, que é súmula vinculante, não abordar em teu texto restrições a cargos políticos, abrindo precedente para que se nomeie parentes para este fim. Malgrado, não abarcando expressamente os cargos de Ministros de Estado e Secretários, nada obsta que seja reconhecido a ilegitimidade, mediante a não razão de diferença de tratamento, sendo assim, muito embora o Supremo Tribunal Federal entenda que não à imoralidade em nomear parentes para estas funções, isso não impede que instâncias inferiores conheçam e decidam de modo diverso.

Visto que, estamos tratando de um direito positivado, não havendo decisão vinculante a contrario sensu, é totalmente viável a livre apreciação de magistrados de primeiro e segundo grau.

O fulcro para preencher a ausência de cargos políticos na súmula, é o respaldo no princípio constitucional da moralidade administrativa, em razão dos cargos serem de função pública, é evidente que suas finalidades de ações serão em prol de terceiros, sendo estes a coletividade.

À vista disso, entre aquele que exerce a função pública e a coletividade, se cria uma relação fiduciária (relação de confiança, de lealdade), o que Locke denominava de trust. Em virtude desta confiança, quando nomeado um parente próprio (nepotismo direto) ou um de algum colega, desde que haja algum tipo de vantagem (nepotismo cruzado), estar se vilipendiando o princípio da moralidade administrativa, com grande risco de causar dano ao erário público, pelo mero fato de não ter posto alguém formado e qualificado na área, para exercer determinada função com primor. Além do mais, é esperado de quem exerce a função pública, um comportamento com padrão objetivo de honestidade, transparência e impessoalidade, portanto, como se pode observar, é permitido invalidar a nomeação feita com este irremediável vício jurídico.  

5.                  CONCLUSÃO

Mediante os fatos expostos, é notável que há uma lacuna na súmula, e ela pode ser interpretada para proveitos pessoais, até mesmo porque ocorre de haver entendimentos no Supremo Tribunal Federal de que não há incidência de imoralidade na prática de nepotismo para cargos políticos, como os de Ministros de Estado e Secretários. Entretanto, esta interpretação pode ser contrária ao entendimento do Supremo, uma vez que, não há restrição vinculante, desta forma podem instâncias de primeiro ou segundo grau, decidirem pela imoralidade, e invalidarem o ato.

De tal modo, reitero a afirmação na qual junto aos cargos públicos, nasce perante à coletividade um laço de confiança, onde devem os agentes públicos se portarem de forma digna, honesta, transparente, impessoal, e acima de tudo agir conforme a moral, sendo esta, administrativa.

Portanto, embora nossa súmula vinculante n.13 não proíba por completo a prática nepotista, há outros meios de coibir este crime social, onde o agente devendo atuar em prol dos cidadãos, pensa em beneficiar-se, acoplando teus familiares para esta corja, deste modo, temos o poderoso princípio da moralidade administrativa, que no corpo do Caput do artigo 37 da nossa Lei Maior, tem força de norma jurídica de eficácia plena, restando aqueles que repudiam este tipo de ato, aplicar as sanções com respaldo neste princípio constitucional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Florivaldo Dutra de. Corrupção, Ética e Moralidade Administrativa. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 11. Ed. São Paulo: Malheiros, 2001.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 15. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.

NETO, Diogo de Figueiredo Moreira. Curso de Direito Administrativo. 11. Ed. São Paulo: Forense, 1997.

PIRES, Luis Manuel Fonseca. Corrupção, Ética e Moralidade Administrativa. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008.

 

 

Elaborado em novembro/2014

 

Como citar o texto:

GOIS, Emerson Santos de. .Súmula Vinculante N° 13 – O Nepotismo e a Aplicabilidade do Princípio Constitucional da Moralidade Administrativa. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1216. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-administrativo/3339/sumula-vinculante-n-13-nepotismo-aplicabilidade-principio-constitucional-moralidade-administrativa. Acesso em 10 dez. 2014.

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