Resumo: O presente estudo debruça-se em torno de uma análise do status jurídico das uniões homoafetivas diante da legislação brasileira, do Direito de Família e das decisões proferidas pelos Tribunais Superiores. Para tanto é de suma importância tecer breves considerações acerca da Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça, bem como dos princípios constitucionais que norteiam o tema proposto. A Resolução 175 do CNJ surgiu diante de um estado de insegurança jurídica, obrigando os Cartórios de Registro Civil a realizar a coversão das uniões estáveis homoafetivas em casamento civil. A metodologia empregada na elaboração do presente estudo pautou-se na utilização do método dedutivo. Em relação à técnica de pesquisa, optou-se pela revisão de literatura sistemática, analisando-se doutrinas e a legislação referente ao tema proposto.

Palavras-Chave: Uniões Homoafetivas; Casamento Civil; Direito de Família; Resoluçao 175 CNJ.

 

INTRODUÇÃO

O estabelecimento de um quadro de direitos básicos aos casais homoafetivos é muito recente, sendo isso um reflexo da influência das religiões judaico-cristãs que durante muitos séculos exerceram um papel de domínio sobre os indivíduos. À medida que essa influência começa a se esvair, a sociedade avança de forma significativa na discussão de temas como sexo, orientação sexual e sobre os direitos inerentes aos casais homoafetivos.

Os direitos aqui discutidos são oriundos de diversos princípios constitucionais como a igualdade, a dignidade da pessoa humana, a liberdade de expressão e a busca pela felicidade. Acima de tudo, o que se discute é o direito a livre orientação sexual que pode se manifestar nas demonstrações de afeto e na busca pela vida conjugal seja na união estável homoafetiva ou no casamento civil. No ano de 2011 o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável homoafetiva como válida e geradora de direitos e deveres. Em 2013, ante a um estado de insegurança jurídica, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a resolução 175 que versa, entre outras determinações, acerca da conversão da união homoafetiva em casamento civil.

Ainda assim, diversos casais homoafetivos encontravam dificuldades no processo de conversão da união estável em casamento civil, e isso ocorria por conta da fragilidade da decisão do STF, a Resolução 175 do CNJ foi editada com escopo de solucionar esse problema. O presente busca discutir o status jurídico das uniões homoafetivas diante do direito de família e da resolução 175 do CNJ. Na elaboração dessa pesquisa foi de suma importância o levantamento de bibliografia e a realização de uma revisão documental especializada na busca pelos conceitos basilares necessários a construção do tema proposto.

 

1 CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DA HOMOSSEXUALIDADE E DAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS

A mesma sociedade que se auto-intitula sectária da isonomia ainda sustenta uma série de posicionamentos discriminatórios em relação à homoafetividade. Existe ainda, por parte da sociedade, uma oposição injustificável com relação a “livre orientação sexual”. O direito de manter uma relação homoafetiva é amparado pelos princípios constitucionais, da igualdade, da liberdade de expressão e da busca pela felicidade. O exercício dessa garantia individual se encontra no rol de direitos da personalidade, mais especificamente no que diz respeito à “identidade pessoal” e a “integridade física e psíquica”. É importante destacar que a proteção da vida íntima e das condutas privadas é a “base jurídica para construção do direito à orientação sexual, como direito personalíssimo, atributo inerente e inegável da pessoa humana” (FACHIN, 1999, p. 95 apud DIAS, 2010, p. 5).

Na Grécia e Roma Imperial as relações homoafetivas eram bem aceitas e tidas com naturalidade. Sob outras nomenclaturas, naquela época, a homossexualidade “se apresentava na estrutura social como um ritual sagrado”. Entretanto o reconhecimento e o respeito pelas relações homoafetivas esvaiu-se com o surgimento e ascensão das religiões judaico-cristãs. Ante a grande influência do cristianismo, os preceitos greco-romanos ruíram, o que permitiu a propagação de mitos como a história de “Sodoma e Gomorra”, que é usado até hoje para justificar “opiniões” carregadas de preconceito em relação à homoafetividade. Com o cristianismo surge a marginalização do sexo, que passa a ser entendido como um pecado se praticado fora do casamento e sem a finalidade de procriação (MEDRADO, 2018, s.p.).

Após a segunda metade do século XIX a “criminalização” social das relações homoafetivas começa a perder força e no século XX as relações não heteroafetivas passam a ser mais bem toleradas, o que é reflexo do surgimento de um conjunto de normas de direitos humanos. É nessa pós-modernidade que começam a surgir novos conceitos de família ante ao respeito às diferenças, e ao entendimento diverso do vocábulo família. Origina-se então o “Direito das Famílias” (DIAS, 2016, p. 66 apud MEDRADO, 2018, s.p.). No compasso em que a religião começa a perder sua influência, o prazer e até mesmo as relações homoafetivas começam a deixar de serem vistas como pecado. “O afeto passou a ser valorizado e a orientação sexual passou a ser vista como uma “opção”, como um direito, e não como um crime” (DIETER, 2012, p. 6).

A ciência antropológica demonstra que as relações homoafetivas não eram apenas permitidas como também possuíam um papel relevante nos rituais relativos à masculinidade. Alguns escritos egípcios documentam a existência da homossexualidade não apenas com relação aos homens na sociedade, mas também entre as divindades Horus e Seth, o que de certa forma influenciou as relações sociais daquele período e a forma que a homoafetividade era vista. Na Grécia antiga inexistia qualquer tipo de discriminação com relação às uniões homoafetivas, “o casamento hétero era visto como uma maneira de assegurar a descendência legítima e adquirir poder, não o objeto de convergência para o amor, afeto ou emoção” (MENCATO, 2012, s.p.).

O Código de Hamurabi, instrumento pioneiro na organização social e positivação de leis, não faz qualquer menção à proibição ou repressão à homossexualidade. Em Roma (69 a.c.), a homoafetividade era respeitada e incentivada, sendo o próprio Imperador Júlio Cesar habitualmente chamado de “omnium virorum mulier, omnium mulierum virum”, ou seja, “mulher de todos os homens e homem de todas as mulheres” (MENCATO, 2012, s.p.). Após a ascensão do Cristianismo tem início a perseguição aos homossexuais, em Roma (533 d.c.) os homossexuais eram punidos com a fogueira e castração. Em 1893 a comunidade médica passa a defender a ideia de que a homossexualidade era uma doença psíquica, defendendo o “tratamento” com “choques elétricos, lobotomias, injeções hormonais e até mesmo castração”. Na Alemanha Nazista os homossexuais eram um dos grupos sociais perseguidos pelo Partido Nazista, estima-se que 15 mil homossexuais foram mortos em campos de concentração (MENCATO, 2012, s.p.). Conforme preleciona Medrado:

Na antiguidade as relações homoafetivas entre homens recebiam destaque, e a bissexualidade encarada com naturalidade. Nas duas vultosas civilizações antigas – Grécia e Roma Imperial – responsáveis por definir a cultura ocidental, a homossexualidade sempre foi largamente aceita, chegando a representar um avanço na sexualidade. Sob a nomenclatura de pederastia, a homoafetividade se apresentava na estrutura social como um ritual sagrado. Apesar da aceitação que os antigos tinham para o amor entre homens, somente o “polo ativo” da relação era estimado, sendo que tal fato pode ser atribuído ao machismo, já presente naquela época, que considerava o ato sexual ativo como postura masculina, enquanto a prática sexual no “polo passivo” era tida como postura feminina. Na Grécia, a liberdade sexual estava presente no cotidiano da população, descrita entre deuses, reis e heróis. Na mitologia grega, destacou-se o casal masculino constituído por Zeus e Ganimede. Lendas se referiam ao amor de Aquiles por Pátroclo e dos recorrentes raptos de jovens rapazes realizados por Apolo. A bissexualidade fazia parte do contexto social, enquanto a heterossexualidade era vista como escolha, de certo modo, inferior e destinada à procriação. A homossexualidade era tida como uma necessidade natural, verdadeira manifestação do desejo. Não era vista como uma degradação moral, um acidente ou um vício (MEDRADO, 2018, s.p.).

Em 1993 a homossexualidade deixa de ser considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em 1999, no Rio Grande do Sul, uma decisão “pioneira fixa competência às varas de família para julgar ações decorrentes de uniões homoafetivas”. Em 2001 a Holanda torna-se o primeiro país a reconhecer o casamento civil homoafetivo (MENCATO, 2012, s.p.). O termo homossexualidade surgiu, entre outros motivos, para extinguir o termo homossexualismo haja vista sua inadequação ante a realidade fática (SILVA, 2017, p. 12). O entendimento da homossexualidade como orientação sexual serviu para afirmar que a homossexualidade é tão válida quanto à heterossexualidade. “O termo homoafetividade começou a surgir de modo a caracterizar os relacionamentos de pessoas de orientações sexuais voltadas à” pessoas do mesmo sexo. Portanto, deve-se compreender que a homossexualidade se manifesta como a orientação sexual de um indivíduo, já a homoafetividade é um modo de exercer essa orientação, onde estarão presentes aspectos emocionais no relacionamento de indivíduos do mesmo sexo (SILVA, 2017, p. 17). Quanto à definição do vocábulo “família” nota-se que o conceito de família mudou com o passar dos anos, o que decorre da aquisição de direitos e do avanço da sociedade, podendo ser definida a partir da literatura de Antoine de Saint-Exupéry como “a responsabilidade decorrente do afeto” (DIAS, 2015, p. 2).

 

2 AS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS FRENTE AO DIREITO DE FAMÍLIA: AVANÇOS NA GARANTIA DE DIREITOS

Em 2011 o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu o status de grupo familiar às uniões de casais homoafetivos, ampliando o rol de proteção do art. 226, § 3º, da CF/88 e art. 1733 do Código Civil de 2002, de modo a abarcar as uniões homoafetivas (MIRANDA, 2011, s.p.). Diante da discriminação e ausência de amparo legal aos casais homoafetivos, foram impetradas a ADPF 132 e a ADI 4277 que objetivavam a materialização da igualdade de direitos. Em suma, a ADPF 132 solicitava a aplicação por equivalência do art. 1723 do Código Civil às uniões homoafetivas, já que a diferenciação atribuída aos casais homoafetivos e heteroafetivos violava uma série de princípios fundamentais. A ADI 4277 tinha como escopo o instituto do reconhecimento familiar aos casais homoafetivos, conferindo-lhes os mesmos direitos e deveres civilmente previstos aos casais heteroafetivos (FUJITA, 2018, s.p.). Ainda conforme preleciona Miranda:

Deste julgamento, proferido na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4277, direitos fundamentais até então negados aos casais formados por pessoas do mesmo sexo foram-lhe estendidos, com fundamento nos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, da liberdade, da intimidade e privacidade, privilegiando como consequência a proteção contra quaisquer tipos de discriminação. Destarte, o ato do Tribunal da instância máxima do país serviu como resposta à inércia do Poder Legislativo em regular, por meio dos projetos de lei que há muito estão parados em suas pastas, a marginalidade sob a qual os casais homossexuais e toda a comunidade LGBT se encontravam frente à base jurídica fundamental conferida, distintamente, às uniões heterossexuais. Ou seja, o referido Poder não cumpriu com a sua simples obrigação de reconhecer às mencionadas minorias o que a lei jamais proibiu ou previu: que as "sociedades de fato" reguladas pelo direito das obrigações, como as relações homossexuais até então eram tratadas juridicamente, passassem a ser dignas de direitos e deveres previstos no direito da família (MIRANDA, 2011, s.d.).

As relações homoafetivas constituem um fato estritamente legal e que somente diz respeito à vida privada desses casais. O Estado Democrático de Direito tem o dever de respeitar e promover a diversidade e a tolerância, superando assim as manifestações de preconceito e intolerância (BARROSO, 2011, p. 138). A união entre pessoas do mesmo sexo foi reconhecida então pelo STF, via ação direta de inconstitucionalidade, cuja decisão permeada pela eficácia erga omnes e pelo efeito vinculante, reinterpretando o art. 1723 do Código Civil de 2002 com base no novo entendimento, deve-se portanto “riscar” os vocábulos homem e mulher substituindo-os por pessoas ou por alguma expressão melhor aplicável ao entendimento (SANTANA, 2012, s.p.).

No ano de 2011, o Supremo Tribunal Federal, se posicionou no sentido de “excluir qualquer interpretação do art. 1 723 do Código Civil que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar”. A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao STF o dever de interpretar o texto constitucional em caso de divergências, nessa ocasião a corte foi demandada para solucionar tal questão, uma norma de Direito de Família marginalizava determinado grupo social. O posicionamento do STF é, portanto legítimo e pautado em princípios como a isonomia e a dignidade humana (FRANZONI, 2015, s.p.). As regras oriundas do direito de família são inteiramente aplicáveis aos casais homoafetivos (FRANZONI, 2015, s.p.). De acordo com Castro:

Hoje, com a possibilidade de realizarem seu casamento civil sem quaisquer obstáculos legais, os cônjuges passam a ter as mesmas garantias e direitos que aquelas já conhecidas dos casamentos entre homens e mulheres, muito importantes, tais como a pensão por morte do marido/esposa, comunhão de bens (de acordo com a opção feita pelos cônjuges no momento da celebração do matrimônio, além do direito à sucessão, plano de saúde familiar (nos casos em que a empresa ofereça; os cônjuges podem ser indicados como beneficiários, sem qualquer tipo de discriminação), também o seguro de vida, pensão alimentícia, etc. (CASTRO, 2017, s.p.).

Outra decisão de grande relevância com relação à garantia de direitos aos casais homoafetivos é oriunda do julgamento do REsp 1.183.378/RS, onde ficou decidido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que aos casais homoafetivos se estendem “os mesmos direitos derivados da união estável” heteroafetiva, o que viabilizou ainda a conversão dessa união estável em casamento (o que será discutido mais adiante nesse estudo). Embora não produza efeitos erga omnes ou vinculantes, tal “decisão serviu como precedente jurisdicional na fundamentação de Tribunais e juízes de primeiro grau” (MEDRADO, 2018, s.p.).

 

3 A CONVERSÃO DAS UNIÕES ESTÁVEIS HOMOAFETIVAS EM CASAMENTO CIVIL PELA RESOLUÇÃO 175 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

Ante a recusa de diversos cartórios em converter a união estável homoafetiva em casamento civil, sob a justificativa de que “a questão não está totalmente pacificada”, em 2017 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) firmou entendimento ao editar a Resolução nº 175, que dispõe acerca da habilitação, realização de casamento civil e conversão da união estável em casamento para casais homoafetivos (MEDRADO, 2018, s.p.). Conforme a resolução nº 175 do CNJ:

Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013

Dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo.

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais,

CONSIDERANDO a decisão do plenário do Conselho Nacional de Justiça, tomada no julgamento do Ato Normativo no 0002626-65.2013.2.00.0000, na 169ª Sessão Ordinária, realizada em 14 de maio de 2013;

CONSIDERANDO que o Supremo Tribunal Federal, nos acórdãos prolatados em julgamento da ADPF 132/RJ e da ADI 4277/DF, reconheceu a inconstitucionalidade de distinção de tratamento legal às uniões estáveis constituídas por pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO que as referidas decisões foram proferidas com eficácia vinculante à administração pública e aos demais órgãos do Poder Judiciário;

CONSIDERANDO que o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do RESP 1.183.378/RS, decidiu inexistir óbices legais à celebração de casamento entre pessoas de mesmo sexo;

CONSIDERANDO a competência do Conselho Nacional de Justiça, prevista no art. 103-B, da Constituição Federal de 1988;

RESOLVE

Art. 1º É vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo.

Art. 2º A recusa prevista no artigo 1º implicará a imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis.

Art. 3º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação (BRASIL, 2013, s.p.).

Ao passo que a resolução obstou a possibilidade das autoridades indeferirem os pedidos de habilitação, celebração de casamento civil ou conversão da união estável em casamento, tal resolução “contribuiu para derrubar barreiras administrativas e jurídicas que dificultavam as uniões homoafetivas no país” (BANDEIRA, 2017, s.p.). Os casamentos no que se refere ao procedimento para celebração, homoafetivos ou heteroafetivos, são iguais legalmente. A “burocracia” é a mesma no trâmite, os documentos exigidos são os mesmos, sendo iguais também os direitos e deveres (BANDEIRA, 2017, s.p.). De acordo com Vecchiatti:

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal reconhecendo o status jurídico-familiar da união homoafetiva enquanto merecedora da proteção da união estável constitucionalmente consagrada com absoluta igualdade de direitos relativamente à união estável heteroafetiva (STF, ADPF n.º 132 e ADIn n.º 4277) fez surgir a “polêmica” sobre a possibilidade de conversão da união estável homoafetiva em casamento civil homoafetivo, por força da parte final do art. 226, §3º, da CF/88, que aduz que a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento civil. Contudo, trata-se de uma falsa polêmica, na medida em que somente o preconceito (juízo de valor arbitrário) poderia impedir a conversão da união estável em casamento civil pelo simples fato de termos um casal homoafetivo solicitando tal conversão, seja do ponto de vista material, seja do ponto de vista meramente formal, pois temos uma união estável em ambos os casos, donde a união estável deve ser passível de conversão em casamento civil em ambos os casos, seja quando formada por um casal heteroafetivo quanto quando formada por um casal homoafetivo (VECCHIATTI, s.d., p. 1).

Sendo assim, conforme a interpretação do art. 1726 do CC/02 é possível realizar a conversão da união homoafetiva em casamento da mesma forma empregada as uniões heteroafetivas. Todas as referências à “união estável” e ao “companheiro” presentes no NCPC se estendem a união homoafetiva e ao casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, não havendo restrições (TARTUCE, 2019, p. 584). Atualmente, os casais homoafetivos tem direito tanto à união estável quanto ao casamento. Na união estável homoafetiva a regra é a do “regime de comunhão parcial de bens”, salvo se o casal optar por regime diverso. O reconhecimento do casamento civil homoafetivo foi de suma importância no sentido da garantia de direitos, antes só disponíveis aos casais heteroafetivos. São direitos que decorrem do casamento homoafetivo: o direito de requerer alimentos, os direitos referentes à herança, a pensão no caso de falecimento de um dos cônjuges, a declaração conjunta no imposto de renda, aqueles referentes aos planos de saúde e muitos outros (CASTANHEIRA, 2017, s.p.).

Se ocorrer, por parte do Cartório de Registro Civil, a negativa em celebrar a conversão da união estável em casamento civil homoafetivo, o casal deve imediatamente acionar o judiciário local, para que seja determinado o cumprimento da Resolução 175 do CNJ e assim realizar o casamento (CASTRO, 2017, s.p.). Embora o poder legislativo não tenha se manifestado no sentido de aprovar lei regulamentando o tema, a jurisprudência garante o casamento civil homoafetivo e a união estável aos casais homoafetivos. Não existem, portanto diferenças jurídicas entre o casamento e união estável heteroafetivo ou homoafetivo, sendo garantidos todos os direitos e estabelecidos todos os deveres previstos em lei (ANTUNES, 2018, s.p.).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da inércia do poder legislativo em editar uma norma no sentido de reconhecer a validade da união estável e do casamento civil homoafetivo, coube ao STF no julgamento da ADI 132 e da ADPF 4277 garantir aos casais homoafetivos o direito a união estável, o que foi de suma importância para a concretização de outros direitos inerentes a esse instituto do Direito Civil, antes só garantido àqueles pertencentes à união estável heteroafetiva. Outra medida de grande importância foi a edição da Resolução 175 pelo Conselho Nacional de Justiça que regulamentou o casamento civil homoafetivo, até então os cartórios do país se negavam a realizar tais casamentos sob justificativa de não pacificação da matéria, esses mesmos cartórios após a determinação do CNJ não podem se negar a realizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Muito se discute o fato da união e casamento homoafetivo não serem previstos em um dispositivo legal, entretanto pode se entender que tudo o que não é proibido por lei é permitido, a ausência de uma lei não significa que um direito não exista, os direitos devem ser compreendidos enquanto um valor sumo as leis.

 

REFERÊNCIAS

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FRANZONI, Larissa. CASAMENTO HOMOAFETIVO NO BRASIL E DIREITO DE FAMÍLIA LGBTT. Disponível em:. Acesso em 08 de out. 2019.

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Data da conclusão/última revisão: 10/10/2019

 

Como citar o texto:

GUEDES, Douglas Souza; BARTOLAZI, Kamille Gabri; FERREIRA, Oswaldo Moreira..O status das uniões homoafetivas frente ao Direito de Família e a Resolução CNJ nº 175. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1661. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-civil-familia-e-sucessoes/4593/o-status-unioes-homoafetivas-frente-ao-direito-familia-resolucao-cnj-n-175. Acesso em 25 out. 2019.

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