RESUMO: O presente artigo analisa a eficácia da sentença prolatada em sede de ação civil pública, abordando aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais quanto ao tema.

PALAVRAS-CHAVE: Ação civil pública. Coisa julgada. Efeitos da sentença. Artigo 16 da LACP. Artigo 103 do CDC.

SUMÁRIO: I – Introdução. II - A ação civil pública. III – O microssistema da ação civil pública. IV – A coisa julgada. V – A legitimação extraordinária na ação civil pública. VI – A competência territorial no processo coletivo. VII – Os efeitos da sentença proferida em sede de ação civil pública: a) A Lei da Ação Popular; b) A Lei da Ação Civil Pública; c) O Código de Defesa do Consumidor; d) O novo posicionamento do Superior Tribunal de Justiça. VIII – Conclusão.

I. INTRODUÇÃO.

A ação civil pública, na medida em que tutela interesses transindividuais, possui inúmeras peculiaridades, podendo-se destacar a eficácia da sentença proferida em seu bojo.

Para compreender o real alcance de tais efeitos, deve-se analisar não apenas o interesse objeto da lide, isto é, se difuso, coletivo “stricto sensu” ou individual homogêneo, mas também as pessoas atingidas pelo ato decisório e o resultado da ação, conforme a técnica denominada “secundum eventum litis”, com a possibilidade do seu transporte em benefício (“in utilibus”) das vítimas e seus sucessores.

II. A AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

Em primeiro lugar, convém esclarecer que a ação civil pública não figura uma nova espécie de ação, tampouco um procedimento específico, pois pode assumir qualquer forma ou rito, com exceção da ação por improbidade administrativa, que, por imposição legal (artigo 17 da Lei nº 8.429/92), deve observar o ordinário.

Apenas para corroborar tal afirmação, convém mencionar, quanto ao ponto, que o artigo 83 da Lei Consumerista afirma, expressamente, que, “para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela”.

Não importa, assim, o “nome” conferido a uma demanda, pois, em se tratando de ação de natureza não penal que tenha por objetivo tutelar interesses difusos, coletivos estritos ou individuais homogêneos proposta pelos legitimados do artigo 5º da Lei nº 7.347/85 ou do artigo 82 do Código de Defesa do Consumidor, ou, no que se refere aos direitos metaindividuais dos idosos, também pela Ordem dos Advogados do Brasil (artigo 81 da Lei nº 10.741/2003), trata-se de ação civil pública.

Insta, aqui, registrar que, como cediço, os direitos metaindividuais podem ser classificados em difusos, coletivos “stricto sensu” e individuais homogêneos, utilizando-se, para tanto, dos critérios da titularidade, da divisibilidade do objeto e da origem.

Assim, os direitos difusos são aqueles transindividuais, com indeterminabilidade absoluta de seus titulares, dotados de objeto indivisível, reclamando, portanto, uma solução uniforme para todos e oriundos de uma mesma circunstância de fato.

Os direitos coletivos, por sua vez, também são transindividuais, mas a indeterminabilidade de seus titulares é relativa, já que identificados ou com possibilidade de identificação. Também são dotados de objeto indivisível e têm por origem uma relação jurídica base.

Por fim, os direitos individuais homogêneos são direitos acidentalmente coletivos, porque, na realidade, não são metaindividuais, mas sim individuais.

Com efeito, além de decorrerem de uma mesma origem, seus titulares são determinados e o objeto é divisível, todavia, recebem o mesmo tratamento jurídico conferido aos direitos metaindividuais ante sua relevância social, democratizando o acesso ao Poder Judiciário.

Realizadas tais considerações, pode-se afirmar, então, que a ação civil pública consiste em um aglomerado de princípios específicos relacionados à defesa de interesses transindividuais, o qual forma o denominado “microssistema da ação civil pública.”

III. O MICROSSISTEMA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

De fato, o artigo 21 da Lei nº 7.347/85 e o artigo 90 da Lei nº 8.078/90 remetem-se reciprocamente, determinando a aplicação conjunta dos dispositivos previstos em ambos os diplomas legais na proteção dos interesses transindividuais.

Introduzido, assim, em nosso ordenamento jurídico, o princípio da integração da Lei da Ação Civil Pública e do Código de Defesa do Consumidor, também conhecido como “microssistema” ou “sistema da ação civil pública”, pois tais leis se complementam, em autêntico diálogo das fontes.

Registre-se, entretanto, que, embora a Lei nº 7.347/85 e a Lei nº 8.078/90 sejam os principais diplomas aplicados no âmbito da ação civil pública, não são os únicos, pois a Lei de Ação Popular, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, entre outras leis, também integram o “microssistema da ação civil pública”, de acordo com uma interpretação sistemática.

Como decorrência do princípio da integração, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, determinou que, tendo em vista a omissão da LACP e do CDC em relação ao prazo prescricional para ajuizamento da ação civil pública, aplica-se, por analogia, o prazo de cinco anos previsto no artigo 21 da Lei nº 4.717/65 (Lei da Ação Popular), já que referido diploma legal também faz parte do “sistema”. (STJ – 3ª Turma - RESP 1.273.643/PR – Rel. Min. Sidnei Benti – j. 01/09/2013)

Ressalte-se que referido prazo não se aplica aos danos causados ao meio ambiente e ao erário, porque, como cediço, são imprescritíveis, nos termos dos ditames constitucionais.

Cite-se, aqui, outra decisão de extrema relevância proferida pelo Tribunal da Cidadania, qual seja, aquela proferida em sede do julgamento do REsp 1237893, em que se determinou a inversão do ônus da prova em desfavor do pretenso poluidor, no âmbito de ação civil pública por responsabilidade civil ambiental, com fundamento em direito básico do consumidor, previsto no inciso VIII do artigo 6º do Estatuto Consumerista. (STJ – 2ª Turma - REsp 1237893/SP – Rel. Min. Eliana Calmon – DJe 01/10/2013)

Pode-se observar que referido acórdão, além de ter aplicado o princípio da integração, conferiu interpretação teleológica aos dispositivos legais supramencionados, seguindo o entendimento da doutrina especializada, no sentido de que a complementariedade em comento ocorre não apenas quanto aos dispositivos processuais, previstos, em especial, no Título III do CDC, mas também no que se refere às demais normas, inclusive as de direito material, já que “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum” (artigo 5º da LINDB).

IV. A COISA JULGADA.

Pois bem. Após tais esclarecimentos, faz-se necessária, para a adequada análise do tema cerne do presente artigo, a análise da coisa julgada.

Todo ato decisório é apto a produzir efeitos jurídicos, entretanto, só a sentença é alcançada pela coisa julgada.

Mas o que é coisa julgada?

Nos termos do artigo 467 do Estatuto Processual Civil, “denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.

Portanto, para o legislador ordinário, a coisa julgada relaciona-se aos efeitos da sentença.

Todavia, esse conceito sempre foi extremamente criticado pela doutrina, pois, como bem alertava Enrico Tullio Liebman, a coisa julgada não consiste nos efeitos da sentença, que variam conforme os sujeitos envolvidos e o pedido acolhido, mas, sim, na qualidade de referidos efeitos, qual seja, a imutabilidade do “decisum”.

Portanto, para Liebman, a eficácia somada à imutabilidade corresponde à coisa julgada; a eficácia é “erga omnes”, tendo em vista o comando da decisão, mas a imutabilidade é restrita às partes do processo.

Assim, a coisa julgada, qualidade dos efeitos da sentença e direito fundamental, prevista no inciso XXXVI do artigo 5º da Lei Maior, assegura a definitividade ou imutabilidade de tais efeitos e fundamenta-se na segurança jurídica, isto é, na “necessidade de estabilidade das relações jurídicas” (Vicente Greco Filho, p. 275), contribuindo, assim, com a pacificação social.

Quanto ao ponto, convém distinguir a coisa julgada meramente formal da coisa julgada material, já que, enquanto a coisa julgada formal consiste na irrecorribilidade da decisão, com efeitos endoprocessuais apenas, a material, na imutabilidade da sentença, que não mais poderá ser discutida em qualquer outro processo.

É lição comezinha do Direito que a identificação de uma ação leva em consideração três aspectos, quais sejam, partes, causa de pedir e pedido.

Sendo assim, os efeitos ‘naturais’ da sentença devem ser analisados sob o enfoque objetivo (extensão objetiva da coisa julgada) e subjetivo (extensão subjetiva da coisa julgada).

Os limites objetivos da sentença são determinados pela parte dispositiva da sentença, que reflete o pedido/objeto da ação.

Já os limites subjetivos relacionam-se às pessoas atingidas pelo ato decisório.

No processo individual, baseado na teoria clássica, a coisa julgada só produz efeitos entre as partes formais do processo, não prejudicando nem beneficiando terceiros estranhos à relação processual, em conformidade com o disposto no artigo 472 do Código de Processo Civil.

Portanto, em princípio, somente são atingidos pelo ato decisório o autor, o réu, o opoente, o denunciado, o chamado ao processo e o assistente litisconsorcial.

Dessa forma, o máximo que se admitia, tendo em vista uma reconhecida concepção menos individualista do processo, era a ampliação dos efeitos da sentença perante terceiros, vale dizer, o alcance ‘erga omnes’ da eficácia natural da sentença, mas sempre restringindo-se a autoridade da coisa julgada às partes, com o objetivo de não se prejudicar os terceiros que não puderam expor as suas razões diretamente em juízo.” (Pedro Lenza, p. 219)

Em relação ao processo coletivo, as partes formais não correspondem aos titulares dos direitos materiais.

De fato, quando há atuação de legitimado extraordinário, como age em nome próprio, mas na defesa de direito alheio, o substituto processual é parte meramente formal, razão pela qual substituto e substituído, na qualidade de titulares dos direitos materiais objeto da lide, são atingidos, igualmente, pela coisa julgada material.

Assim, a inspiração individualista do Estatuto Processual Civil, promulgado na década de 1970, à evidência, não se coaduna com as ações civis públicas, que visam, exatamente, solucionar conflitos de massa e, como quaisquer outras ações, buscam, em última análise, a pacificação social.

Surgiu, então, a necessidade manifesta de mecanismos próprios para a garantia dos princípios constitucionais da inafastabilidade da jurisdição e da adequada e eficaz prestação jurisdicional no âmbito da ação civil pública, principalmente em relação à legitimidade ativa, à competência e aos efeitos da sentença.

V. A LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA NA AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

De fato, dispõe o artigo 6º do Código de Processo Civil que “ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.”

Conforme se pode depreender do dispositivo legal acima colacionado, a legitimação ordinária independe de autorização legal, pois o titular da ação defende direito próprio. Já a legitimação extraordinária, na medida em que há defesa, em nome próprio, de direito alheio, exige permissivo legal.

Assim, para solucionar a questão, o artigo 5º da Lei º 7.347/85 e o artigo 82 da Lei nº 8.078/90 trouxeram um amplo rol de colegitimados à propositura da ação civil pública, tratando-se, conforme a doutrina, de legitimidade concorrente e disjuntiva.

A legitimidade é concorrente porque atribuída, de forma concomitante, a mais de um ente ou pessoa.

Igualmente é disjuntiva, uma vez que os colegitimados podem agir isoladamente, não se exigindo, assim, anuência dos demais, tampouco litisconsórcio para a atuação, embora esse seja possível e, conforme o caso, até desejável. Trata-se, portanto, de litisconsórcio facultativo e não necessário.

Ressalte-se que, em relação ao “Parquet”, a propositura de ação civil pública para a defesa de interesses sociais – em razão da dimensão, natureza ou qualidade da parte - e individuais indisponíveis, logo, dotados de relevância social, é função institucional, daí a necessidade de atuação do órgão ministerial na qualidade de fiscal da lei sempre que não for o autor da ação.

VI. A COMPETÊNCIA TERRITORIAL NO PROCESSO COLETIVO.

Mas não é só. A competência territorial, no sistema tradicional, que tem por foco o processo individual, é tratada pelo Código de Processo Civil, que, em regra, leva em consideração o domicílio do réu (artigo 94 do CPC), fixando-se, dessa forma, o Juízo competente para dada ação.

Entretanto, na hipótese de ação coletiva, tendo em vista suas particularidades e com o objetivo de facilitar a colheita das provas, a competência territorial é fixada conforme o local do dano, que pode ser local, regional ou nacional, em atenção ao disposto no artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor, “in verbis”:

Art. 93 - Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a Justiça local:

I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito local;

II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concorrente.”

Há, entretanto, regras específicas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, que fixou, como competente, o Juízo do local em que ocorreu a ação ou a omissão que gerou o dano/risco de dano objeto da ação (artigo 209), e no Estatuto do Idoso, que determinou a competência do Juízo do local do domicílio do idoso (artigo 80).

VII. OS EFEITOS DA SENTENÇA PROFERIDA EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

Já no que se refere à eficácia da sentença prolatada no bojo de uma ação civil pública, imprescindível, para sua correta análise, uma prévia consideração histórica do ordenamento jurídico e da jurisprudência pátria.

a) A Lei da Ação Popular.

Com efeito, a ação popular, antes do advento da Lei da Ação Civil Pública, consistia no único instrumento eficaz à defesa dos interesses transindividuais, tendo sido utilizada pelo legislador infraconstitucional, já naquela época, a festejada técnica da coisa julgada “secundum eventum litis.”

Nessa seara, assim dispõe o artigo 18 da Lei nº 4.717/65:

Art. 18. A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível ‘erga omnes’, exceto no caso de haver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova; neste caso, qualquer cidadão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.”

Apesar da eficácia para todos, a ação popular possui duas grandes restrições, a saber, a limitação quanto à legitimação ativa, pois apenas o cidadão pode intentá-la, bem como aquela relacionada ao seu pedido e objeto, uma vez que o autor tão somente pode pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de ato lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural (artigo 1º da LAP e artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal).

Tornou-se, necessária, então, a criação de um novo instrumento que protegesse de forma mais ampla e eficaz os direitos transindividuais, em especial ante a multiplicação das demandas de massa e a consequente necessidade de facilitação de acesso ao Poder Judiciário.

b) A Lei da Ação Civil Pública.

Atendendo aos anseios da sociedade, foi editada, em 1985, a Lei da Ação Civil Pública, que não apenas ampliou o rol de legitimados ativos, nos termos já levantados, como também expandiu o objeto da ação e as espécies de provimentos jurisdicionais.

Em sua redação original, dispunha o artigo 16 da LACP que “a sentença civil fará coisa julgada ‘erga omnes’, exceto se a ação for julgada improcedente por deficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova”, assim, inexistia qualquer espécie de limitação aos efeitos da sentença, valendo para todos em igual situação jurídica.

Todavia, os Juízes e Tribunais, em um primeiro momento, talvez pela novidade dos preceitos referentes ao sistema coletivo, limitavam os efeitos da sentença à competência territorial.

Aos poucos, contudo, especialmente a partir do advento do Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência começou a assegurar o caráter regional e nacional das decisões proferidas nas ações coletivas.” (Pedro Lenza, p. 262)

Ocorre que, em razão da Medida Provisória nº 1.570/1997, posteriormente convertida na Lei nº 9.494/97, editada com o nítido objetivo de restringir os efeitos de decisões proferidas em ações civis públicas, muitas das quais proferidas contra atos da própria Administração, a redação do dispositivo legal supramencionado foi alterada, de forma que foi limitado expressamente o efeito “erga omnes” aos limites da competência territorial do órgão julgador.

De fato, o artigo 16 da LACP passou a ter a seguinte redação: “Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada ‘erga omnes’, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.”

Foi proposta, então, pelo Partido Liberal, a ADIN nº 1576-1, com o escopo de declarar inconstitucional a inovação legal, sob os fundamentos de que a limitação territorial em comento fere o princípio da isonomia - pois pessoas em uma mesma situação jurídica receberiam tratamento diverso - e o direito fundamental à inafastabilidade da jurisdição – já que inviabilizado o controle jurisdicional efetivo de danos transindividuais.

Entretanto, foi indeferido o pedido de liminar e o exame do mérito foi julgado prejudicado posteriormente, uma vez que houve reedição da Medida Provisória objeto da ação e não houve o devido aditamento à exordial.

A jurisprudência, de uma maneira geral, reconheceu a validade da restrição territorial então introduzida e, portanto, aplicava a norma restritiva nos exatos termos expostos na Lei, conforme se pode observar dos arestos abaixo colacionados:

Agravo de instrumento - Liquidação de sentença proferida em ação civil pública - Sentença proferida pela 12a Vara Cível do Distrito Federal/DF - Ação de liquidação ajuizada na Comarca de Itápolis - Competência do órgão prolator - Tema pacificado na Corte Especial do STJ no sentido de que a sentença prolatada em ação civil pública faz coisa julgada ‘erga omnes’ apenas dentro dos limites de competência territorial do órgão prolator, com base no art. 16 da Lei 7.347/85, alterado pela Lei 9.494/97. Preliminar de incompetência acolhida. Sentença anulada. Recurso provido, com determinação de remessa dos autos à 12a Vara Cível do Distrito Federal.”

(TJ/SP – AI 0546440-51.2010.8.26.0000 - Rel. Des. Francisco Giaquinto – 20ª Câm. Dir. Privado – j. 14/02/11)

“PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – DIREITO DOS TITULARES DE CONTAS DE POUPANÇA RECONHECIDO PERANTE A 12ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BRASÍLIA/DF, EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA – EFICÁCIA DA DECISÃO ‘ERGA OMNES’ DENTRO DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DO ÓRGÃO JUDICIÁRIO QUE A PROFERIU – COMPETÊNCIA DA VARA DE ORIGEM – DECLINATÓRIA QUE SE HARMONIZA À JURISPRUDÊNCIA - DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO EM FACE DO ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO COLENDO STJ – ART. 557 DO CPC - AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. ‘A sentença civil fará coisa julgada ‘erga omnes’, nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.’ (art. 16 da Lei 7.347/85 - LACP); A coisa julgada proveniente do julgamento de ação civil pública opera-se, por imperativo legal, nos limites da competência territorial do órgão judiciário que o proferiu. Então, se o órgão prolator do título exeqüendo é o Poder Judiciário do Distrito Federal, a sua eficácia ‘erga omnes’ confina-se nos respectivos limites, não sendo aplicáveis, nesse contexto, os dispositivos do CDC invocados pelos Agravantes. Precedentes do STJ e desta Corte. Agravo Regimental a que se nega provimento.”

(TJ/BA – Ag Reg 0013149-05.2010.8.05.0000 – Rel. Des. Maria da Graça Leal – j. 31/01/12)

O Tribunal da Cidadania, em consonância com o entendimento acima exposto, também reduzia a eficácia da sentença proferida em ação civil pública, embora permitisse a ampliação de tais efeitos aos limites da competência territorial do Tribunal competente para julgar eventual recurso ordinário.

Ocorre que a doutrina, desde a edição da Medida Provisória em questão, posteriormente convertida em Lei, sempre criticou severamente referida alteração legislativa, na medida em que o legislador, ao assim dispor, além de ter estimulado a multiplicação de processos, confundiu, lamentavelmente, conceitos absolutamente distintos, quais sejam, limites da coisa julgada com competência territorial, uma vez que restringiu a eficácia externa da coisa julgada aos limites da competência territorial do Juízo que proferir a sentença.

Quanto ao ponto, insta transcrever algumas críticas contundentes da doutrina especializada em relação à alteração realizada no artigo 16 da Lei nº 7.347/85:

“(...) um retrocesso inominável, uma vez que se pretende dar à ação civil pública o mesmo tratamento que é dado à defesa dos direitos individuais. É evidente que os interesses transindividuais não poderão ter seus efeitos circunscritos à base territorial, sob pena de neutralizar os feitos da ação civil pública, visto que, v.g., num derramamento de petróleo em Santos, com o espraiamento dos danos por todo o litoral, a ação deveria ser proposta em cada comarca, o que é um absurdo, com a possibilidade de sentenças diversas sobre o mesmo tema.” (Francisco Antonio de Oliveira, p. 895)

A inovação é manifestamente inconstitucional, afrontando o poder de jurisdição dos juízes, a razoabilidade e o devido processo legal. A jurisdição, como se sabe, não se confunde com a competência. Todos os juízes são investidos na jurisdição, estando limitada tão somente, a sua competência para conhecer, processar e julgar os processos. Por outro lado, a jurisdição é um poder, decorrente diretamente da soberania, razão pela qual guarda aderência sobre o território nacional, ainda quando o órgão seja estadual. As regras de competência fixarão, sim, quem deva ser responsável pelo processo, não se prestando, portanto, para tolher a eficácia da decisão, principalmente sob o prisma territorial.” (Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, p. 74)

Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 103, trata dos efeitos da sentença proferida no âmbito da ação civil pública, não trazendo a restrição territorial introduzida pela Lei nº 9.494/97, e que, por força do artigo 21 da LACP – princípio da integração -, possui aplicação no âmbito da ação civil pública que verse sobre qualquer interesse transindividual, e não apenas quanto a interesses individuais homogêneos, tal como reconhecido pelos ensinamentos amplamente majoritários.

Por todos, confira-se as palavras do ilustre professor Hugo Nigro Mazzilli:

“É um só o sistema da LACP e do CDC, em matéria de ações civis públicas e coletivas, pois ambos os diplomas legais se interpenetram e se completam, ensejando um todo harmônico (LACP, art. 21, e CDC, art.90). Pois bem, de um lado, o CDC estende a competência territorial do juiz prolator a todo o Estado ou a todo o País em caso de dano regional ou nacional (art. 93, II); de outro lado, o CDC disciplina adequadamente a coisa julgada na tutela coletiva (art. 103) – e seus princípios aplicam-se não só à defesa coletiva do consumidor, como também à defesa de quaisquer interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, tenham ou não origem nas relações de consumo (como os interesses ligados ao meio ambiente, ao patrimônio cultural, às pessoas portadoras de deficiência etc.). Naturalmente, em face dessa conjugação de normas, restou ineficaz a alteração que o art. 2º da Lei n. 9.494/97 procedeu no art. 16 da LACP.” (Hugo Nigro Mazzilli, p. 582)

Aliás, para muitos, o artigo 103 da Lei nº 8.078/90 revogou tacitamente o artigo 16 da Lei nº 7.347/85, pois tratou da matéria de forma distinta e exaustiva.

Isso porque, nos termos do artigo 2º, parágrafo 1º, do Decreto-Lei nº 4.657/42, “a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.”

Mas não é só: é cediço que a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, em seu artigo 2º, parágrafo 3º, veda o efeito repristinatório, salvo no caso de a lei nova for expressa nesse sentido, o que, definitivamente, não ocorreu no caso concreto.

Também não se pode olvidar que a restrição territorial cerne da questão é incompatível com o instituto da competência jurisdicional trazido pelo Estatuto Processual Civil, pois se o Juiz apenas possui jurisdição na Comarca, inexistiria a competência concorrente.

Ademais, o critério territorial da competência limita o exercício da jurisdição, definindo o Juízo competente para certa ação, mas nunca os efeitos ou limites da coisa julgada.

Isso porque a jurisdição é função estatal de composição de lide, enquanto a competência corresponde aos limites da jurisdição, isto é, à parcela da jurisdição atribuída a cada Juízo. Assim, a jurisdição é exercida nos limites da competência territorial do Juízo, ou seja, todo Juiz possui jurisdição, mas nem todo Juiz é competente para certa causa.

Portanto, “a imutabilidade da coisa julgada, quando obtida em ação civil pública ou coletiva, sempre alcançará todo o território nacional enquanto decisão de soberania do Estado; o que poderá ter maior ou menos extensão é o dano, que, este sim, poderá ser nacional, regional ou apenas local.” (Hugo Nigro Mazzilli, p. 583)

c) O Código de Defesa do Consumidor.

Com razão, o artigo 103 do CDC introduziu uma nova sistemática dos efeitos da sentença, especialmente formulada para o processo coletivo, diferenciando a eficácia da sentença em razão da categoria do interesse metaindividual objeto da lide e do resultado do processo (técnica “secundum eventum litis”).

Quanto ao ponto, insta transcrever o dispositivo legal em comento:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I – ‘erga omnes’, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II – ‘ultra partes’, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81;

III – ‘erga omnes’, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.;

§ 1°. Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe.

§ 2°. Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3°. Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99.

§ 4º. Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória.

Assim, analisando o texto legal, pode-se afirmar que, em se tratando de sentença procedente em ação que versa sobre direitos difusos, há formação da coisa julgada material e com eficácia para todos (“erga omnes”), beneficiando quaisquer terceiros lesionados pelo mesmo fato. A liquidação, nesse caso, é “sui generis”, pois o particular lesado deve provar não apenas o “quantum” devido, mas também a própria qualidade de lesado, ou seja, a própria existência do dano.

Na hipótese de sentença de procedência de ação relativa a direito individual homogêneo, também há formação de coisa julgada material com eficácia contra todos, mas apenas para beneficiar as vítimas e sucessores, razão pela qual há quem afirme que, na realidade, se trata de eficácia “ultra partes” e não “erga omnes”, uma vez que as pessoas lesadas não são indetermináveis.

Já no que se refere aos direitos coletivos estritos, a coisa julgada material possui eficácia além das partes (“ultra partes”), mas limitada ao grupo, classe ou categoria de pessoas, não beneficiando, contudo, os particulares autores de ações individuais que não requereram a suspensão processual no prazo de trinta dias a partir da ciência do ajuizamento da ação coletiva, restrição essa também aplicável aos direitos individuais homogêneos.

Em relação à sentença de improcedência por falta de provas em relação a qualquer direito transindividual, não há eficácia “erga omnes” ou “ultra partes”, sendo possível a propositura de nova ação por qualquer colegitimado, desde que apresentada prova substancialmente nova.

A formação da coisa julgada, nessa hipótese, é peculiar. Para uns, trata-se de coisa julgada meramente formal. Para outros, entretanto, há coisa julgada material, pois a sentença resolve o mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, porém, é cabível o ajuizamento da mesma ação com fundamento em novas provas, dispensando-se, assim, a necessidade de ajuizamento de rescisória.

No que tange aos particulares lesados, a propositura de ação individual não exige a apresentação de prova nova.

Por sua vez, na hipótese de sentença de improcedência por outro motivo, diverso da insuficiência probatória, há eficácia “erga omnes” ou “ultra partes”, conforme se trate, respectivamente, de interesse difuso ou coletivo estrito, impedindo nova ação coletiva, mas permitida a propositura de ações individuais pelos lesados, já que interesses individuais não são prejudicados.

No que tange ao direito individual homogêneo, a coisa julgada da sentença de improcedência não prejudica as pessoas lesadas individualmente, que podem ajuizar ações individuais visando à reparação dos danos sofridos, salvo aquelas que intervieram na ação coletiva na qualidade de litisconsortes, quando, então, estão sujeitas à soberania da coisa julgada.

Ressalte-se, quanto ao ponto, que apenas são atingidos pela coisa julgada material os lesados individuais que tenham se habilitado na ação civil pública como litisconsortes, não abrangendo aqueles que apenas requereram a suspensão de suas ações individuais, os quais podem retomar seus andamentos, já que, embora possam ser beneficiados, nunca poderão ser prejudicados.

Por fim, cumpre ressaltar que as ações civis públicas não induzem litispendência em relação às ações individuais, nos termos expressos do artigo 104 do CDC, mas os efeitos da coisa julgada “erga omnes”, na hipótese de direito individual homogêneo, ou “ultra partes”, em relação a direito coletivo estrito, não beneficiarão os autores das ações propostas individualmente se não for requerida a suspensão da ação individual no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos de seu ajuizamento.

O pedido de suspensão em comento é facultativo, isto é, o autor da ação individual pode optar por não realizar tal pedido, todavia, não será beneficiado na hipótese da ação coletiva ser julgada procedente.

d) O novo posicionamento do Superior Tribunal de Justiça.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em decisão inédita, proferida na sistemática de recurso repetitivo, alterando seu posicionamento anterior, foi ao encontro dos ensinamentos da doutrina, tendo definido que os efeitos da sentença proferida em sede de ação civil pública serão de âmbito local, regional ou nacional conforme a extensão do dano e a indivisibilidade do objeto (dano ou ameaça de dano) reconhecidas no “decisum”, pois é o pedido que fixa os limites da sentença e da coisa julgada, e não a competência territorial, em consonância com o disposto no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor.

Com efeito, o problema atinente a saber ‘quais pessoas’ ficam atingidas pela ‘imutabilidade’ do comando judicial insere-se na rubrica dos ‘limites subjetivos’ desse instituto processual dito ‘coisa julgada’, e não sob a óptica de categorias outras, como a jurisdição, a competência, a organização judiciária. Aqueles ‘limites’, quando se trata das lides intersubjetivas, no plano da jurisdição ‘singular’, ficam contingenciados às ‘partes’, ‘não prejudicando, nem beneficiando terceiros’ (CPC, art. 472), mas no âmbito das ações de tipo coletivo – justamente porque aí se lobrigam ‘sujeitos indeterminados’, concernentes a um ‘objeto indivisível’ – o critério deve ser outro, cabendo atentar para a ‘projeção social’ do interesse metaindividual judicializado. Tudo assim conflui para que a resposta judiciária, no âmbito da jurisdição coletiva, desde que promanada de juiz ‘competente’, deva ter eficácia até onde se irradie o interesse objetivado, e por modo a se estender a todos os sujeitos concernentes. Assim se dá por conta do caráter ‘unitário’ desse tipo de interesse, a exigir ‘uniformidade’ do pronunciamento judicial.” (Rodolfo de Camargo Mancuso, p. 323)

É o que se pode observar dos trechos colacionados a seguir:

“DIREITO PROCESSUAL. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ART. 543-C, CPC). DIREITOS METAINDIVIDUAIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APADECO X BANESTADO. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. EXECUÇÃO/LIQUIDAÇÃO INDIVIDUAL. FORO COMPETENTE. ALCANCE OBJETIVO E SUBJETIVO DOS EFEITOS DA SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO TERRITORIAL. IMPROPRIEDADE. REVISÃO JURISPRUDENCIAL. LIMITAÇÃO AOS ASSOCIADOS. INVIABILIDADE. OFENSA À COISA JULGADA.

1. Para efeitos do art. 543-C do CPC:

1.1. A liquidação e a execução individual de sentença genérica proferida em ação civil coletiva pode ser ajuizada no foro do domicílio do beneficiário, porquanto os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC).

(...)

VOTO:

(...) A bem da verdade, o art. 16 da LACP baralha conceitos heterogêneos - como coisa julgada e competência territorial - e induz a interpretação, para os mais apressados, no sentido de que os ‘efeitos’ ou a ‘eficácia’ da sentença podem ser limitados territorialmente, quando se sabe, a mais não poder, que coisa julgada - a despeito da técnica do art. 467 do CPC - não é ‘efeito’ ou ‘eficácia’ da sentença, mas qualidade que a ela se agrega de modo a torná-la ‘imutável e indiscutível’.

É certo também que a competência territorial limita o exercício da jurisdição e nãos os efeitos ou a eficácia da sentença, os quais, com é de conhecimento comum, correlacionam-se com os ‘limites da lide e das questões decidas’ (art. 468, CPC) e com as que o poderiam ter sido (art. 474, CPC) – ‘tantum judicatum, quantum disputatum vel disputari debebat’. A apontada limitação territorial dos efeitos da sentença não ocorre nem no processo singular, e também, com mais razão, não pode ocorrer no processo coletivo, sob pena de desnaturação desse salutar mecanismo de solução plural das lides. (...)

A questão principal, portanto, é de alcance objetivo (‘o que’ se decidiu) e subjetivo (em relação ‘a quem’ se decidiu), mas não de competência territorial.

Pode-se afirmar, com propriedade, que determinada sentença atinge ou não esses ou aqueles sujeitos (alcance subjetivo), ou que atinge ou não essa ou aquela questão fático-jurídica (alcance objetivo), mas é errôneo cogitar-se de sentença cujos efeitos não são verificados, a depender do território analisado. (...)

Nessa linha, o alcance da sentença proferida em ação civil pública deve levar em consideração o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor acerca da extensão do dano e da qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo.

O norte, portanto, deve ser o que dispõem os arts. 93e 103 do CDC.

(STJ - REsp 1243887/PR – Corte Especial - Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 12/12/2011 recurso repetitivo)

Essa inovadora decisão passou, então, a ser usada como parâmetro não apenas no âmbito do Sodalício, mas igualmente pelos Tribunais locais:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART. 535 DO CPC. VIOLAÇÃO. AUSÊNCIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EFICÁCIA SUBJETIVA. INCIDÊNCIA DO CDC. EFEITOS ‘ERGA OMNES’.

(...) 3. No que se prende à abrangência da sentença prolatada em ação civil pública relativa a direitos individuais homogêneos, a Corte Especial decidiu, em sede de recurso repetitivo, que ‘os efeitos e a eficácia da sentença não estão circunscritos a lindes geográficos, mas aos limites objetivos e subjetivos do que foi decidido, levando-se em conta, para tanto, sempre a extensão do dano e a qualidade dos interesses metaindividuais postos em juízo (arts. 468, 472 e 474, CPC e 93 e 103, CDC)’ (REsp 1243887/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado sob a sistemática prevista no art. 543-C do CPC, DJ 12/12/2011).

4. Com efeito, quanto à eficácia subjetiva da coisa julgada na ação civil pública, incide o Código de Defesa do Consumidor por previsão expressa do art. 21 da própria Lei da Ação Civil Pública.

5. Desse modo, os efeitos do acórdão em discussão nos presentes autos são ‘erga omnes’, abrangendo todas as pessoas enquadráveis na situação do substituído, independentemente da competência do órgão prolator da decisão. Não fosse assim, haveria graves limitações à extensão e às potencialidades da ação civil pública, o que não se pode admitir. (...)”

(STJ - REsp 1344700/SC – Rel. Min. Og Fernandes – 2ª Turma – DJe 20/05/14)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. LIQUIDAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. CARÊNCIA DE AÇÃO. REJEIÇÃO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. 1. É patente o interesse e a legitimidade ativa do autor em pleitear o cumprimento da sentença proferida em ação civil pública, pois na qualidade de correntista ele está querendo receber os expurgos inflacionários decorrentes do plano verão. 2. A sentença proferida em ação civil pública na defesa de direitos individuais homogêneos de todos os consumidores, movida pelo IDEC em Brasília, faz coisa julgada ‘erga omnes’ em todo o território nacional. 3. Dessa forma, o consumidor pode ajuizar o cumprimento individual da sentença no juízo da comarca de seu domicílio. 4. O prazo prescricional para o ajuizamento de cumprimento individual de sentença coletiva é de cinco anos. 5. A execução de título judicial depende do preenchimento dos requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade. 6. Dependendo a apuração do ‘quantum’ devido ao consumidor de meros cálculos, e constando dos autos todos os elementos necessários para a sua realização, não há que falar em iliquidez do título.

(TJ/MG – AI 1.0525.13.020304-1/001 0052101-89.2014.8.13.0000 – Rel. Des. Wagner Wilson – j. 10/06/2014)

(...) COISA JULGADA SOBRE O TÍTULO EXEQUENDO QUE NÃO LIMITOU O ÂMBITO DE ABRANGÊNCIA DA CONDENAÇÃO. HIGIDEZ DO ART. 467 DO CÓDIGO INSTRUMENTAL CIVIL. SEM EMBARGO, LEITURA DO ART. 16 DA LEI N. 7.347/1985 QUE NÃO PODE SER EFETUADA ISOLADAMENTE, MAS, SIM, INSERIDA NA SISTEMÁTICA DO MICROSSISTEMA DO PROCESSO COLETIVO. DISTINÇÃO ENTRE COMPETÊNCIA E EFICÁCIA ‘ERGA OMNES’ DA COISA JULGADA. APLICAÇÃO DO ART. 93 COMBINADO COM O ART. 103, INCISO III, AMBOS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ADEMAIS, PRESCINDIBILIDADE DO POUPADOR PERTENCER AOS QUADROS ASSOCIATIVOS DAQUELE QUE AJUIZOU A AÇÃO COLETIVA, POIS A POSTULAÇÃO ESTENDE-SE EM BENEFÍCIO A TODA A CATEGORIA NAS CONDIÇÕES DA LIDE JULGADA. (...)”

(TJ/SC - AI 2014.013023-4 – Rel. Des. Rosane Portella Wolff – j. 26/06/14)

Dessa forma, pode-se observar dos arestos acima transcritos que a jurisprudência atual, em bom tempo, passou a seguir os ensinamentos doutrinários, no sentido de que os efeitos da sentença proferida no âmbito de ação civil pública são aqueles previstos no artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor.

VIII. CONCLUSÃO.

Chega-se, assim, à conclusão de que é o artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor que rege a eficácia da sentença proferida no bojo de ação civil pública, o qual leva em consideração os limites subjetivos e objetivos do pedido devidamente reconhecidos pelo Juízo, bem como o resultado da ação, e não o artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública, que, além de confundir institutos diversos, posto que restringe seus efeitos à competência territorial, foi revogado implicitamente pelo advento da Lei Consumerista e não está de acordo com os princípios que regem o processo coletivo.

BIBLIOGRAFIA:

(i) DE OLIVEIRA, Francisco Antonio. Da ação civil pública: instrumento de cidadania – Inconstitucionalidade da Lei 9.494, de 10.09.1996. Revista LTr, volume 61, nº 7. São Paulo: LTr, julho de 1997;

(ii) GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. Volume 2. 17ª edição. São Paulo: Saraiva, 2003;

(iii) GRINOVER, Ada Pellegrini e outros. Código brasileiro de defesa do consumidor. 7ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2001;

(iv) LENZA, Pedro. Teoria Geral da Ação Civil Pública. São Paulo: RT, 2008;

(v) MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública: em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores: Lei 7.347/1985 e legislação complementar. 11ª edição. São Paulo: RT, 2009;

(vi) MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 23ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010;

(vii) MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. A coisa julgada e os processos coletivos no Direito vigente e no Projeto de nova Lei da Ação Civil Pública (PL n. 5.139/2009) ‘in’ Em defesa de um novo sistema de processos coletivos: estudos em homenagem a Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: Saraiva, 2010; e

(viii) RAGAZZI, José Luiz; HONESKO, Raquel Schlommer; LUNARDI, Soraya Gasparetto. Processo Coletivo ‘in’ Manual de Direitos Difusos. Coordenador: Vidal Serrano Nunes Júnior. São Paulo: Verbatim, 2009.

 

 

Elaborado em julho/2014

 

Como citar o texto:

HERNALSTEENS, Thinneke..Os Efeitos Da Sentença Proferida Em Sede De Ação Civil Pública. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 22, nº 1195. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-consumidor/3212/os-efeitos-sentenca-proferida-sede-acao-civil-publica. Acesso em 16 set. 2014.

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