O presente trabalho analisa a violência doméstica e familiar sofrida pela mulher. Tem como objetivo principal analisar se as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340 de 2006) são eficientes na proteção dessas vítimas de violência.

INTRODUÇÃO

A mulher tem encontrado, no século XXI, maiores espaços no âmbito da vida pública e também na política. Além disso, posição destacada na vida privada, apresentando-se, até mesmo, como “chefa do lar”.

Muito embora essas evidências sem apresentem, a mulher é vítima contumaz de violências diversas não somente no Brasil, mas por tudo o mundo.

É preciso ressaltar, desde já, assim, conforme Daniela Benevides Essy (2017, p. 5) assevera, a violência é

[...] um ato de brutalidade, abuso, constrangimento, desrespeito, discriminação, impedimento, imposição, invasão, ofensa, proibição, sevícia, agressão física, psíquica, moral ou patrimonial contra alguém e caracteriza relações intersubjetivas e sociais definidas pela ofensa e intimidação pelo medo e terror.[1]

No tocante ao território brasileiro, as origens da violência contra a mulher, nas palavras Vitória Etges Becker Trindade (2016, p. 87) “[...] se confundem com as próprias origens da nação e estão diretamente relacionadas à antiga família patriarcal, que tinha a mulher como cidadã de segunda classe”.[2]

Por isso, entende-se que o modelo patriarcal fortaleceu a errônea percepção de que a mulher deveria se manter “no lugar” que fora imposto pela sociedade, ficando calada mesmo que sofrendo qualquer tipo de violência.

Segundo Mércia Cardoso de Souza e Luiz Fernando Baracho (2015, p. 89):

Tal sistema se perpetuou ao longo de todo o Brasil colônia, influenciado também pelo controle do Estado Português, que não apenas o praticava como atuava de modo que qualquer tentativa de rebeldia ou mesmo pensamento contrário fosse combatido de modo contundente.

No entanto, em meados do século XIX essa realidade tem um impulso no sentido de se alterar, devido tanto às modificações de pensamento até então existentes, quanto pelas atitudes de algumas mulheres que, corajosamente, se insurgiram contra o que se pode chamar de descaso da sociedade.

Esse grupo de mulheres deu, de acordo com Renata Barros (2018, p. 91), “[...] início a uma revolução silenciosa, que foi tomando forma e ganhado força à medida que se buscavam garantias devido á violação dos direitos da mulher”.[3]

Nesse diapasão, muito embora abusos ocorrerem para além da época mencionada até os dias atuais, a mulher foi conquistando direitos aos poucos. Segundo Vitória Etges Becker Trindade (2016, p.102): “O voto feminino, por exemplo, só foi instituído durante os anos trinta”.

Entretanto, uma real proteção legal para a mulher que se encontra em situação de violência só foi adotada tempos depois.

Primeiramente, em âmbito internacional, devido às denúncias, como Alexandre Salim e Marcelo André Azevedo (2017, p. 58) afirmaram, “[…] dos movimentos feministas em esfera global, a Comunidade Internacional acabou adotando certas providências”.[4] Sendo criadas, concluem:

a) Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), de 1979, ou Convenção da Mulher (Promulgada pelo Decreto n° 89.460, de 20/03/1984); […] b) Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (promulgado pelo Decreto no 4.316, de 30/07/2002); […] c) Declaração sobre a Eliminação da Violência contra as Mulheres (Proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas na sua resolução 48/104, de 20/12/1993); […] d) Convenção lnteramericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, chamada de "Convenção de Belém do Pará", de 1994 (Promulgada pelo Decreto nº 1.973, de 01/08/1996). [5] (SALIM; AZEVEDO, 2017, p. 58).

Na seara brasileira, entretanto, a mulher teve um respaldo mais efetivo, conforme Daniela Benevides Essy (2017, p. 104) aduz “[…] com a promulgação da Constituição de 1988 e da Lei n. 11.340/2006, que ficou conhecida como Lei Maria da Penha”.[6]

A Lei nº 11.340 de 2006 surgiu da incansável luta de Maria da Penha Maia Fernandes, que sofreu uma tentativa de homicídio pelo seu marido, no ano de 1983. Após uma grande batalha jurídica que ultrapassou os tribunais brasileiros e chegou à cortes internacionais, Maria da Penha teve uma vitória, quando em 22 de março de 2006 seus anseios foram convertidos em lei. A Lei Maria da Penha busca coibir e prevenir toda e qualquer forma de violência doméstica praticada contra a mulher. E para atingir tal finalidade, introduziu importantes mecanismos de prevenção e combate à violência contra a mulher.[7]

É importante salientar que essa norma também se aplica quando a violência doméstica resulta em morte, lesão corporal ou se configure como violência sexual, psicológica, moral e até mesmo patrimonial.

Além disso, por meio desta foram instituídos os juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher. Tais juizados buscam oferecer um atendimento mais ágil e personalizado à mulher que ingresse com ações cíveis ou criminais.

A lei, nesse ínterim, conforme Daniela Benevides Essy (2017, p. 106) ressalta:

Aplica-se também ao âmbito da unidade doméstica, onde se dê o convívio de indivíduos, que tenham ou não vínculo familiar, e que se reúnam eventualmente, bem como ao âmbito familiar composto por pessoas que são ou se consideram aparentados, quer sejam unidos por laços naturais, afinidades ou mesmo vontade declarada. Aplica-se ainda a qualquer relação íntima de afeto, em que haja ou tenha havido a convivência entre agressor e ofendida, mesmo sem que tenha existido coabitação.

Inclusive, segundo Renata Barros (2018, p. 108) “[…] o crime de lesão corporal leve se tornou objeto de investigação e consequente processo, mesmo contra a vontade da ofendida”.[8]

A propósito, Mércia Cardoso de Souza e Luiz Fernando Baracho (2015, p. 110) elucidam ficar “[...] vedado que a vítima possa entregar intimação ou notificação ao acusado”.[9] Sinalizando: “Caso a agressão tenha sido praticada por indivíduo estranho à ofendida, como um vizinho ou prestador de serviço, os termos a serem seguidos são os termos circunstanciados”. (SOUZA; BARACHO, 2015:110)

Nesses termos, a garantia de proteção policial se tornou obrigatória, como Vitória Etges Becker Trindade (2016, p. 112) explica, “[…] quando necessária, bem como a comunicação imediata do Ministério Público e do Poder Judiciário. Além disso, deve-se também informar à vítima os seus direitos”.[10]

Dessa forma, percebe-se que a Lei Maria da Penha instituiu uma grande quantidade de ferramentas que contribuem para o efetivo combate à violência praticada contra as mulheres, que podem acontecer de várias maneiras, conforme se demonstrará no tópico seguinte.

 

1. OS TIPOS DE VIOLÊNCIA

A Lei nº 11.340/2006 define violência doméstica em seu art. 5º:

Art. 5° Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. (BRASIL, 2006, p. s/n)

O dispositivo reivindica maiores explicações sobre os termos da ação ou omissão e a necessidade ou não de agressor e vítima coabitarem. Segundo Maria Berenice Dias (2010, p. 52):

É obrigatório que a ação ou omissão ocorra na unidade doméstica ou familiar, ou em razão de qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. De modo expresso, está ressalvado que não há necessidade de que vítima e agressor vivam sob o mesmo teto para a configuração de violência como doméstica ou familiar. Basta que agressor e agredida mantenham, ou já tenham mantido, um vínculo de natureza familiar.

Assim, a violência doméstica não é somente aquela que ocorre no espaço privado da casa ou do lar, mas caracteriza-se por envolver pessoas que possuem laços sanguíneos ou partilham da convivência no mesmo espaço familiar.

As vítimas desse tipo de violência têm uma grave violação de seus direitos fundamentais, e podem carregar consigo além de traumas físicos, também psíquicos e sociais.

Veja-se, é uma situação complexa pois, geralmente, os agressores são identificados como homens com os quais as mulheres tiveram algum tipo de relacionamento, seja afetivo ou sexual, o que faz com que os autores conheçam bem suas vítimas, sabendo onde são vulneráveis e como podem dominá-las e ameaçá-las para dificultar a denúncia.

Vejamos, à luz do art. 7º da Lei 11.340/2006, as diversas formas de violência doméstica e familiar contra a mulher:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Percebe-se, então, que a lei Maria da Penha, no dispositivo supracitado, divide a violência doméstica em cinco formas, quais sejam: as violências física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

Não se irá, neste trabalho, contudo, analisar referidas espécies de violência profundamente, pelo fato de seu foco se tratar de refletir a (in)eficiência das medidas protetivas trazidas pela lei em estudo.

 

2. MEDIDAS PROTETIVAS ELENCADAS NA LEI MARIA DA PENHA

As medidas protetivas que estão dispostas no Capítulo II da Lei nº 11.340 de 2006 objetivam promover a proteção física, moral, psicológica e patrimonial das mulheres, principalmente, em termos jurisdicionais, conforme Alessandra de Souza (2008, p. 77) fomenta:

O Juiz, para garantir o cumprimento das medidas protetivas deferidas, poderá, a qualquer momento, requisitar o auxílio de força policial. Tais medidas ficam subordinadas aos requisitos constantes da Lei 11.340/06, aos requisitos das medidas cautelares em geral e a um determinado prazo de duração, podendo sofrer dilação, no caso de ser verificada a necessidade de sua prorrogação.

Entende-se, logo, que essa norma busca, ao fazer uso dessas medidas protetivas, dar providência jurisdicional pertinente às mulheres, protegendo-as e garantindo-lhes seus direitos fundamentais.

Tais medidas são colocadas em prática quando ocorra qualquer tipo de violência doméstica e familiar contra uma mulher, seja uma ação ou omissão tendo como base o gênero.

Com efeito, Maria Berenice Dias (2010, p.79) alude que “[...] deter o agressor e garantir a segurança pessoal e patrimonial da vítima e de sua prole está a cargo da polícia como do juiz e do próprio Ministério Público. Todos precisam agir de imediato e de modo eficiente”.[11]

É necessário destacar, como ressalta Gustavo Jaime (2006, p. 81):

Antes da promulgação da Lei Maria da Penha, a mulher que sofresse qualquer tipo de violência (até então só era reconhecida a violência física) e que recorresse à delegacia de polícia lavrava um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), pelo qual, geralmente, ao autor do fato era imposto o pagamento de uma cesta básica ou a prestação de serviço à comunidade.

Assim, atualmente, ao registrar o boletim de ocorrência, abre-se uma investigação policial que buscará reunir provas e depoimentos, a fim de enviar os elementos colhidos ao Ministério Público para que este proceda com a denúncia.

Deve-se recordar, nos moldes do § 8º, do art. 226 da Constituição Federal “[...] O estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um, dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.[12] (BRASIL, 1988, p. s/n)

Interprete-se, então, que o princípio da proteção tem o objetivo de defender a integridade de todos os membros da família, contexto em que foi criada a Lei nº 11.340/2006.

Ora, mesmo que o texto constitucional não mencione de forma explícita a violência contra a mulher, mas sim contra qualquer membro da família, sabe-se que casos de mulheres violentadas com mais frequência e esta lei buscou focar suas atenções à mulher que sofre de violência doméstica.

Portanto, a partir do que se desenvolveu, pode-se, resumidamente, entender por medidas protetivas aquelas que tem por objetivo garantir à mulher viver de forma livre uma vez que opte por buscar a proteção estatal contra seu agressor.

 

3. A (IN)EFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

Segundo Wânia Pasinato (2010, p. 84):

As ações e medidas protetivas na Lei Maria da Penha estão organizadas em três eixos de intervenção. O primeiro é a punição, que incide na aplicação de medidas processuais penais, conforme o artigo 5º e incisos da lei; o segundo, a proteção e assistência, que são a aplicação das medidas protetivas para a vítima e as que se aplicam ao agressor visando à proteção da vítima, e o terceiro versa sobre a prevenção, visando à obrigação de um compromisso dos governos na criação de ações integradas que visem à prevenção da violência.

Dessa forma, foram instituídas as medidas protetivas de urgência. A autoridade policial tem o dever de tomar providências legais cabíveis ao caso assim que tiverem conhecimento de uma situação que possa configurar violência doméstica.

Como visto acima, a comunicação ao Ministério Público é obrigatória, e no que se refere ao juiz, este deverá conhecer do pedido de instituição de uma das medidas protetivas no prazo de 48 horas. Veja-se o art. 18 da Lei Maria da Penha:

Art. 18: Recebido o expediente com o pedido, caberá ao juiz no prazo de 48 (quarenta e oito) horas: I – conhecer o expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência; II – determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciaria, quando for o caso; III – comunicar ao Ministério Público para que adotem as providências cabíveis. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Ressalta-se que as medidas protetivas não são incompatíveis entre si. Em outras palavras, uma não exclui a outra. Contudo, com o ritual peculiar da violência doméstica, uma medida que fora concedida pode ser substituída por outra a qualquer momento, objetivando oferecer uma maior proteção à mulher.

Nesses termos, dentre outras questões, prevê o art. 19 da Lei nº 11.340 de 2006:

Art. 19: As medidas protetivas de urgência poderão ser concedas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida. §1º: As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiências das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado. § 2º. As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçadas ou violadas. § 3º. Poderá o Juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário á proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvindo o Ministério Público. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Extrai-se do texto legal a flexibilidade para a aplicação judicial das medidas de proteção, ficando a cargo do juiz acrescentar, ou não, mais alguma àquelas que foram inicialmente concedidas, ou até mesmo rever alguma que já foi deferida, pensando sempre na proteção da vítima.

Nesse contexto, Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto (2009, p. 127) afirmaram que “[...] dada à urgência da situação a exigir, como tal, a adoção de medidas imediatas de proteção à vítima, pode ela mesma se dirigir à presença do magistrado, postulando seus direitos”.

Uma das maiores alterações trazidas pela Lei Maria da Penha é a possibilidade de o pedido de medida protetiva na seara do Direito de Família ser feito perante a autoridade policial. Segundo Maria Berenice Dias (2010, p.145),

A vítima, ao registrar a ocorrência da prática da violência doméstica, pode requerer separação de corpos, alimentos, vedação de o agressor se aproximar dela e de seus familiares ou de frequentar determinados lugares. No entanto, a autora diz ainda que nem sempre condiz desta opinião que as medidas protetivas previstas nos incisos I, II e III do art. 22 são cautelares de natureza penal, que vinculam à infração penal cuja ação seja de iniciativa pública, parecem que só podem ser requeridas pelo Ministério Público, não pela ofendida, até porque são medidas que obrigam ao agressor, não se destinando simplesmente à proteção da ofendida. Sendo assim, não está ela legitimada a requerer tais medidas, o que só pode ser feito pelo titular da ação penal, porque não faria sentido poder ela promover as ações principais.

A referida autora ainda continua, dizendo que “[...] é equivocado tal entendimento, uma vez que não há como reconhecer teor penal da determinação do afastamento do agressor do lar”.[13] (DIAS, 2010, p. 147)

Ademais, os artigos 20 e 21 da Lei Maria da Penha trazem a seguinte redação:

Art. 20: Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de oficio, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial. Parágrafo único: O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivos para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevieram razões que a justifiquem. Art. 21: A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e a saída da prisão, sem prejuízo das intimações do advogado constituído ou do defensor público. Parágrafo único: A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Segundo o art. 20 supracitado, o juiz pode revogar a prisão preventiva do suposto agressor e, também, decretar a prisão preventiva do mesmo a qualquer momento, desde que haja razão que justifique sua decisão.

Neste contexto, Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto (2009, p. 88). aludem que “[...] a prisão preventiva é cabível quando a conduta do agente configurar, além de descumprimento de uma medida protetiva, a prática também de um crime”.[14]

Termos em que Leda Hermann (2008, p. 96) acrescenta:

À agredida a norma declara expressamente a possibilidade legal de privação de liberdade do violador como forma de proteção à sua vida e integridade física. Ao violador pretende intimidar – prevenção específica da criminalidade, uma das falsas promessas de segurança jurídica do Sistema Penal.

Em relação ao art. 21 da Lei Maria da Penha, Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto (2009, p. 98) argumentam que “[...] a intenção perseguida pelo legislador foi a de evitar que a ofendida seja tomada de surpresa, sem chance de se acautelar, principalmente com eventual ordem de soltura do agressor”.[15]

Posto isso, vejamos, agora, a literalidade do art. 22 da Lei 11.340 de 2006:

Art. 22: constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I – suspensão da posse restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II – afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; III – proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) Aproximação da ofendida, de seus familiares e testemunhas, fixa o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) Contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) Frequentarão de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida; IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios: §1º: As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstancias o exigirem, devendo a providencia ser comunicado ao Ministério Público. §2º: na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e inciso do art.6º da Lei nº10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicara aos órgãos, corporações ou instituições as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de arma, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso. §3º Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, o auxilio da força policial. §4º aplica-se as hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5º e 6º do art. 461 da Lei 5,869, de 11 de janeiro de 1973 do Código de Processo Civil. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Importa destacar que na prática a ocorrência de violências contra a mulher, no que tange o inciso I do dispositivo mencionado supra, acaba por ficar excluída, segundo Leda Hermann (2008, p. 85) “[...] pela dificuldade de produção prévia da prova necessária, embora a Lei não imponha positividade de tal restrição”.[16]

Ainda sobre o dispositivo em tela, se o agressor possuir posse ou porte legal de arma de fogo, pode o juiz revogar tal permissão quando da denúncia da vítima à autoridade policial, desde que seja justificada a necessidade de desarmá-lo.

Se for essa a decisão, ao retirar do agressor o direito de continuar com a posse da arma, ou limitando seu uso apenas no trabalho, o magistrado deve comunicar ao órgão que concedeu o registro e a licença.

De mais a mais, Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto (2009, p. 81) advertem que:

Embora a Lei não mencione, a restrição imposta pelo inciso I, imposta pelo juiz, deverá vir acompanhada da respectiva ordem de busca e apreensão da arma. Além disso, deve-se entender que tal apreensão também se estende aos artefatos explosivos e incendiários.

Sobre as medidas protetivas de urgência, examinemos o art. 23 da Lei Maria da Penha:

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento; II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; IV - determinar a separação de corpos. (BRASIL, 2006, p. s/n)

Como observado no artigo acima, o inciso I demonstra uma falha da Lei Maria da Penha, pois são poucos os locais que disponibilizam à mulher e seus dependentes um programa de proteção.

O inciso III traz uma providência que se pode aplicar quando a mulher que foi vítima de violência, demonstrar um medo justificado do retorno do agressor, para tentar retomar a violência, mesmo que o mesmo tenha saído do lar por vontade própria.

Nas palavras de Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto (2009, p. 82):

A Lei Maria da Penha confere ao juiz dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra Mulher a possibilidade de determinar a separação de corpos entre a vítima e o agressor, lembrando que tal disposição abarca, também, as relações homoafetivas.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo estudar a real eficácia das medidas protetivas constantes na Lei Maria da Penha.

Verificou-se que esta lei trouxe mais segurança à mulher, pois trata com mais rigor o agressor, ampliando assim a proteção sua proteção.

Ponto importante, nesse sentido, foi a explicitação das modalidades de violência, não se restringindo apenas à violência física, uma vez que atualmente se reconhece que a violência psicológica também traz grandes danos à saúde mental da mulher.

Demonstrou-se, ao longo do texto a importância das medidas protetivas elencadas na Lei Maria da Penha, que possuem o intuito de garantir a proteção da mulher quanto esta opta por buscar a proteção jurisdicional, entretanto, para que seja possível a concessão de tais medidas, o magistrado deve identificar de fato práticas que caracterizem violência doméstica contra a mulher.

Por outro lado, diversas vezes a solução de alguns casos fica prejudicada por culpa da própria vítima, tendo em vista que esta fica receosa e com medo de denunciar, e os agressor fica impune.

Entretanto, mesmo que os agressores sejam denunciados e a justiça aplique diversas medidas protetivas, a dificuldade na fiscalização das mesmas é difícil, havendo uma certa complexidade em suas aplicações integrais, o que pode fazer com que as medidas concedidas não sejam suficientes para que o agressor se afaste de fato da vítima.

Uma fiscalização no sentido de verificar o real cumprimento das medidas impostas é, assim, muito importante, pois pode ajudar a aumentar a efetividade destas, trazendo cada vez mais segurança às mulheres que sofrem com a violência doméstica.

Ademais, ressalte-se que as medidas protetivas que são determinadas pelo juiz, com o intuito de proteger a vítima de violência doméstica, muitas vezes se mostram ineficientes para resolver casos concretos.

A afirmação nesse sentido se justifica no fato de que a própria vítima é a responsável pela ineficiência dessas medidas, pois reata com o agressor e logo se retrata da acusação. E frise-se, uma vez que a vítima resolva se retratar, as medidas protetivas são revogadas pelo magistrado que as concedeu.

Para finalizar, afirmo que embora se tenham as proteções aqui descritas e os obstáculos para a concretização de suas proteções elencados, temos ciência de que as violências contra a mulher crescem a todo momento e a evidência merece maiores cuidados não somente por parte do Estado, mas por toda a sociedade.

Em outras palavras, conclui-se que a diminuição da violência contra a mulher depende da dedicação da sociedade como um todo. Ou seja, homens e mulheres deverão se dedicar no sentido de obter um convívio mais harmonioso e com menos conflitos, onde possa haver igualdade de gênero e respeito às diferenças.

 

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 de jul. 2019.

BRASIL. Lei nº 11.340 de 7 de agosto de 2006. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm. Acesso em: 9 de out. 2019.

CAMPOS, Alessandra Sousa. A Lei Maria da Penha e a sua efetividade. São Paulo: Saraiva, 2008.

CUNHA, Rogério Sanches. PINTO, Ronaldo Batista. Violência doméstica: Lei Maria da Penha, comentada artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça: a efetividade da Lei 11.340/2006 de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

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HERMANN, Leda. Maria da Penha Lei com nome de mulher: violência doméstica e familiar. Campinas: Servanda, 2008.

JAIME, Gustavo. Lei da violência contra a mulher exige plantão. 2006. Disponível em: https://www.nsctotal.com.br/artigos/lei-da-violencia-contra-a-mulher-exige-plantao. Acesso em: 25 de jul. 2019.

PASINATO, Wânia. Juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher e a rede de serviço para atendimento de mulheres em situação de violência em Cuiabá, Mato Grosso. Salvador: NEIM, 2010.

SALIM, Alexandre; AZEVEDO, Marcelo André. Direito Penal. Vol. 2. Parte especial. 6. ed. Salvador: JusPODIVM, 2017.

SOUZA, Mércia Cardoso de; BARACHO, Luiz Fernando. A lei Maria da Penha: égide, evolução e jurisprudência no Brasil. Belo Horizonte: Del Rey, 2015.

TRINDADE, Vitória Etges Becker. Lei Maria da Penha: violência doméstica e familiar contra a mulher no âmbito da polícia judiciária. Florianópolis: Insular, 2016.

 

Notas:

[1] Supressão nossa.

[2] Supressão nossa.

[3] Supressão nossa.

[4] Supressão nossa.

[5] Supressões nossas.

[6] Supressão nossa.

[7] Conforme dados extraídos de: LOPES, Jaynara Cirqueira. A ineficácia das medidas protetivas de urgência para as mulheres vítimas de violência doméstica. 2018. Disponível em: https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/52405/a-ineficacia-das-medidas-protetivas -de-urgencia-para-as-mulheres-vitimas-de-violencia-domestica. Acesso em: 8 de set. 2019.

[8] Supressão nossa.

[9] Supressão nossa.

[10] Supressão nossa.

[11] Supressão nossa.

[12] Supressão nossa.

[13] Supressão nossa.

[14] Supressão nossa.

[15] Supressão nossa.

[16] Supressão nossa.

Data da conclusão/última revisão: 18/3/2020

 

Como citar o texto:

DUARTE, Hugo Garcez; VILELA, Brena Lorraine da Silva. .A (in)eficácia das medidas protetivas na Lei Maria da Penha. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 18, nº 973. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/10074/a-in-eficacia-medidas-protetivas-lei-maria-penha. Acesso em 7 abr. 2020.

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