RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar e estudar colaboração premiada como forma de elucidação de crimes praticados mediante organizações criminosas, entendidas como tal, aquelas definidas na Lei 12.850/13, onde se impõem, às mesmas, sofisticados instrumentos de investigação para a atuação do Estado. A análise da lei das organizações criminosas não é tarefa fácil, porém, se impõe ante a premente necessidade, inclusive, de se esclarecer o que vem a ser uma organização criminosa e a sua mais efetiva forma de investigação, que se baseia na colaboração premiada. A Lei 12.850 de 02 de agosto de 2013 institui um conceito que define o que são as organizações criminosas, dispondo ainda sobre a investigação criminal e os meios para obtenção de prova, onde se inclui a colaboração premiada.

PALAVRAS-CHAVE: Organizações criminosas, colaboração premiada, Criminalidade, Colaboração premiada.

 

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por objetivo analisar a aplicabilidade da colaboração premiada como meio de investigação e elucidação de crimes praticados em organizações criminosas.

O método utilizado na elaboração deste trabalho será o de compilação ou o bibliográfico, que consiste na exposição do pensamento de diversos autores que escreveram sobre o tema escolhido. Desenvolver-se-á uma pesquisa bibliográfica, utilizando-se como apoio e base contribuições de diversos autores sobre o assunto em questão, por meio de consulta a livros e artigos publicados em plataformas digitais.

Desta maneira, buscar-se-á pesquisar o maior número possível de obras publicadas sobre o assunto, com o fim de se organizar as várias opiniões, antepondo-as logicamente quando se apresentarem antagônicas, com vistas a harmonizar os pontos de vista existentes na mesma direção. Enfim, tal metodologia propõe apresentar, de maneira clara e didática, um panorama das várias posições existentes adotadas pelas doutrinas, jurisprudências dos Tribunais Pátrios, assim como em artigos publicados na Internet.

Visando uma melhor análise e, consequentemente, compreensão por parte do leitor, este trabalho se divide em três capítulos. O primeiro cuida de expor a definição de organização criminosa, seguindo a conceituação dada pela Lei nº 12.850/13, bem como uma breve análise do histórico de organizações criminosas em âmbito mundial e, ainda, nacional.

Na segunda parte serão apresentados os requisitos mínimos para se configurar uma organização criminosa, delimitando, portanto, o âmbito de aplicação da lei em questão, e ainda as formas de atuação das organizações criminosas na atualidade.

No terceiro e última será realizada uma análise do instituto da colaboração premiada como meio de investigação de organizações criminosas, cuja previsão legal está nos artigos 4º ao 6º da Lei nº 12.850/13, e ainda a efetividade deste meio de investigação na elucidação de crimes praticados por organizações criminosas.

Desta forma, todo este trabalho teve por objetivo identificar organizações criminosas e verificar se a colaboração premiada é um eficaz meio de investigação, obtenção de provas e, ainda, objeto de combate às supramencionadas organizações.

 

I – DEFINIÇÃO DE ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

Antes de iniciar o estudo a respeito do meio mais eficaz de investigação, a colaboração premiada, é necessário fazer uma abordagem sobre as organizações criminosas.

O presente capítulo, portanto, tem como objetivo delimitar o surgimento das organizações criminosas no âmbito mundial, bem como seu marco inicial na história nacional brasileira. Uma tarefa árdua, tendo em vista que não existe um consenso entre os doutrinadores quanto ao surgimento das mesmas.

Tal análise se mostrará de grande relevância mais adiante, uma vez que possibilitará um estudo mais aprofundado sobre a origem das principais organizações criminosas bem como a composição das primárias organizações comparadas ao conceito imposto no ordenamento jurídico, sendo evidenciada, ainda, as diferenças e semelhanças entre as mesmas.

Será possível, ainda, observar uma grande divergência entre os nobres objetivos das primárias instituições e as atuais organizações criminosas corrompidas, possibilitando uma adequada compreensão do objeto investigado.

 

1.1  – Evolução histórica sobre organizações criminosas.

Relatos indicam que as primeiras organizações criminosas de que se têm notícias surgiram na China, as denominadas Tríades Chinesas, com início marcado, aproximadamente, no século XVI (SILVA, 2015).

Referidas organizações não objetivavam, inicialmente, a prática de crimes, mas sim os movimentos de proteção contra o autoritarismo do Estado perante a sociedade bem como as arbitrariedades cometidas com os menos favorecidos, como afirma Rafael Pacheco (2011).

Apesar de o início ser marcado pelas Tríades Chinesas, as organizações criminosas mais famosas são as Máfias Italianas, que tiveram início nos movimentos de resistência contra o Rei de Nápoles (SILVA, 2015).

As máfias Italianas surgiram após o Rei de Nápoles baixar um Decreto, em 1812, que reduzia os privilégios feudais e limitava os poderes dos príncipes, o que fez com que estes contratassem os famosos “homens de honra” (uomini d’onore) para proteger as investidas contra a região, e que logo após passaram a ser denominados como “máfia” (SILVA, 2015).

Em 1865, após o desaparecimento da realeza e, consequentemente, a unificação do território italiano, as máfias começaram a lutar contra as forças invasoras, visando a independência da região, conquistando, assim, a simpatia da população, tendo em vista as ações em prol do patriotismo, passando, após a segunda metade do século XX, a se dedicarem à prática de atividades criminosas (SILVA, 2015).

Renato Brasileiro de Lima (2014) relata em sua obra outro grupo de grande influência para o surgimento das organizações criminosas, sendo ele a Yakusa. De origem japonesa, tal organização se dedica a diversas outras práticas criminosas, além do tráfico de drogas, e possui algumas características, a saber:

De origem japonesa, a Yakusa tem formação exclusivamente masculina, porquanto consideram as mulheres fracas e incapazes de lutar como homens. Sua atuação engloba não apenas o tráfico de drogas, notadamente das anfetaminas, como também prostituição, pornografia, jogos de azar, extorsão e tráfico de pessoas. Dotada de um código interno extremamente rigoroso, elaborado com base na justiça, lealdade, fidelidade, fraternidade e dever para com a organização, inúmeras obrigações são impostas a seus integrantes, dentre elas: não esconder dinheiro do grupo, não se envolver com drogas; não violar a mulher ou os filhos de outro membro, etc. Geralmente, seus membros têm tatuagens de samurais, dragões e serpentes, que servem não apenas para identificar seus integrantes, mas também para estabelecer o grau de liderança por eles exercido dentro da organização (LIMA, 2014, p. 473).

Além das supracitadas espécies de organizações registradas na história, também podem ser definidos como tais, apesar de grande controvérsia em razão de sua forte conotação religiosa, os grupos terroristas, cujas primeiras notícias são marcadas pelo atentado terrorista que militares anarquistas franceses realizaram contra Napoleão III, em 1855 (SILVA, 2015).

Hoje, o grupo terrorista que mais tem sido evidenciado é o do Estado Islâmico, que possui duas vertentes distintas, sendo elas, a luta pelas criações de Estados islâmicos independente e a rejeição da influência ocidental no mundo islâmico (SILVA, 2015).

Vários são os grupos criminosos que marcaram a história do continente norte-americano, porém “Os Reguladores de Lincoln”, liderado por Billy The Kid, foi o mais conhecido, sendo uma milícia particular que participou do conflito que ficou conhecido como Guerra do Condado de Lincoln, no Novo México, cujo objetivo era capturar e levar à Justiça os assassinos do empresário e fazendeiro John H. Tunstall. (GARDNER, 2018)

As Organizações Criminosas também se encontram presentes na história do continente sul-americano, sendo marcadas pelo tráfico de Cocaína na Colômbia, que comercializava de forma ilegal para os Estados Unidos e para a Europa por meio dos violentos cartéis do narcotráfico que, de certa forma, contribuíram de forma significativa para o crescimento econômico da região, como relata Eduardo Araújo da Silva (2015):

A comercialização ilegal desse entorpecente para os Estados Unidos da América e para a Europa passou a ser comandada por diversos grupos organizados da região, que deram origem aos poderosos e violentos cartéis do narcotráfico, sediados principalmente nas cidades colombianas de Cali e Medellin, os quais hoje também se dedicam ao cultivo e comercialização do ópio. Atualmente, calcula-se que metade da economia nacional desse país, direta ou indiretamente, seja gerenciada por narcotraficantes. (SILVA, 2015, p.8).

Desta maneira é possível perceber a evolução das organizações criminosas, que começaram com o intuito de proteger a sociedade contra o autoritarismo do Estado, mas que se expandiram para a prática de crimes com o intuito de obter vantagens econômicas, principalmente.

 

1.2  – Atuação histórica das organizações criminosas no Brasil

Não se é certo o marco inicial das organizações criminosas no Brasil, porém, há autores que defendem ser marcado pelo movimento do cangaço, bando liderado por Virgulino Ferreira da Silva (Lampião), que atuou no sertão nordestino em função das péssimas condições sociais às quais eram submetidos o povo nordestino (LIMA, 2014).

O movimento do cangaço era organizado de forma hierárquica, e com o tempo passaram a atuar em várias frentes ao mesmo tempo, dedicando-se a saquear vilas, extorquir dinheiro mediante ameaças e sequestrar pessoas importantes com o intuito de exigir resgate (SILVA, 2015). Tudo isso justificado pelas injustiças sociais observadas na região nordeste do país.

Posteriormente ao cangaço, surgiram diversas outras associações criminosas voltadas, principalmente, à prática de jogos de azar, tráfico de drogas, armas, e animais silvestres (LIMA, 2014).

Para Ivan Luiz da Silva (1998, p.52) são duas as fontes de origem do crime organizado: a primeira delas consiste na evolução natural e no crescimento da atividade criminosa individual para a prática de crimes através de quadrilhas especializadas em determinados tipos de crimes; a segunda fonte de origem seria a ajuda transmitida pelos presos políticos aos presos comuns, uma situação frequente durante o regime militar quando presos políticos e comuns foram encarcerados conjuntamente.

Por volta dos anos de 1967 e 1975, surgiram, na cidade do Rio de Janeiro, dentro das penitenciarias, organizações criminosas formadas por chefes de quadrilhas especializadas em roubos de bancos. (SILVA, 2015).

Conforme Eduardo Araújo da Silva explica em sua obra, as organizações criminosas no Brasil tem o seu nascedouro no Estado do Rio de Janeiro e, depois, se alastram pelo país, a saber:

Outras organizações mais recentes e violentas emergiram nas penitenciárias da cidade do Rio de Janeiro nas décadas de 1970 e 1980: a ‘Falange Vermelha’, formada por chefes de quadrilhas especializadas em roubos a bancos, nasceu no presídio da Ilha Grande, entre 1967 e 1975; o “Comando Vermelho”, uma evolução da “Falange Vermelha”, comandado por líderes do tráfico de entorpecentes, surgiu no presídio Bangu 1 em meados da década de 1970; o “Terceiro Comando”, uma dissidência do “Comando Vermelho”, foi idealizado no mesmo presídio, em 1988, por presos que não concordavam com a prática de sequestros e com a prática de crimes comuns nas áreas de atuação da organização; a ADA (“Amigos dos Amigos”) surgiu durante os anos 1990, aliando-se ao “Terceiro Comando” e, 1998, na tentativa de minimizar a  influência do “Comando Vermelho”; o “Terceiro Comando Puro”, criado no Complexo da Maré em 2002, resultou da extinção do “Terceiro Comando”, após o assassinato do seu líder. A partir dos anos 1990, grupos parapoliciais (milícias), igualmente com perfil de organizações criminosas, passaram a atuar nas favelas cariocas, com a suposta finalidade de expulsar as facções criminosas que controlavam o tráfico de drogas local. (SILVA, 2015, p. 9).

Raúl Cervini (1997) afirma que não se deve limitar o surgimento das organizações criminosas, no Rio de Janeiro, aos comandos carcerários, porém reconhece a importância e o nível de organização, planejamento, hierarquia, divisão e funções e estruturação dos presentes grupos.

Para José James Gomes Pereira, além dos grupos criminosos presentes nas penitenciárias de todo o país, outras organizações criminosas que aterrorizam o país são aquelas relacionadas ao tráfico de entorpecentes, presentes em favelas (comunidades) e bairros onde a população honesta é submetida ao domínio dos criminosos, áreas também conhecidas como “áreas de risco” (2014).

Nestas “áreas de risco” o tráfico de drogas é mantido por organizações entre os próprios traficantes, que exercem funções específicas a fim de obter vantagens, seja de ordem moral, pecuniária, material, sexual ou qualquer outra, sendo que tais organizações mantêm seu domínio apenas nas comunidades onde se localizarem, enfrentando oposições por parte de outras organizações rivais (ABREU, 2017).

Outra modalidade de organização criminosa tem surgido e tomado grandes proporções no Brasil. São as organizações comandadas por políticos, onde o principal objetivo é o desvio de verbas públicas para contas particulares abertas em paraísos fiscais. Via de regra, são organizações que atuam sem o uso da violência, por isso eram menos visíveis aos olhos populares, até ser noticiado o escândalo envolvendo a grande empresa estatal, PETROBRAS. (SILVA, 2015).

Quando a população teve conhecimento dos bastidores das obras e financiamentos a governos estrangeiros, por parte do Governo Nacional, houve uma revolta e um clamor popular para que tornassem as investigações e punições quanto aos crimes praticados pelo “colarinho branco” mais efetivas (SILVA, 2015).

Dentro das organizações criminosas comandadas pelo “colarinho branco” é possível visualizar duas práticas criminosas, sendo elas a corrupção por meio de organizações criminosas a fim de assegurar a obtenção de vantagens indevidas (VERAS, 2017).

Diante da ausência de legislação específica acerca das organizações criminosas, para que se tornassem efetivas as investigações e condenações dos criminosos em questão, se fez necessário a regulamentação, por meio de lei, das referidas organizações.

 

1.3  – Legislação acerca das Organizações Criminosas

A atual legislação que estabelece um conceito para as Organizações Criminosas é a Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013, porém, diversos outros dispositivos anteriores trouxeram a previsão das mesmas, bem como os meios de obtenção de provas, mas foram falhos quanto a conceituação e tipificação das mesmas no ordenamento jurídico (GRECO FILHO, 2014).

A primeira previsão legal das Organizações Criminosas foi a Lei nº 9.034 de 03 de maio de 1995, fruto do Projeto de Lei do Senado de autoria da Senadora Serys Slhessarenko (GRECO FILHO, 2014), que em seu artigo 1º estabelecia que: “Esta Lei define e regula meios de prova e procedimentos investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo” (BRASIL, 1995).

Desta maneira, é possível perceber que houve uma falha quanto a conceituação das Organizações Criminosas, uma vez que a Lei em questão trouxe apenas a previsão das mesmas e as possibilidades de obtenção de provas, fazendo com que o diploma legal tivesse atuação restrita às quadrilhas e às associações criminosas, por já estarem tipificadas e conceituadas dentro do ordenamento jurídico, conforme o artigo 288 do Código Penal. (LIMA, 2014):

Associação Criminosa

Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. (BRASIL, 2013). (Grifo do autor).

Assim, a limitação no conceito de organização criminosa, faz com que o legislador equipare e trate da mesma forma os crimes graves e os crimes leves, como afirma Eduardo Araújo da Silva em sua obra:

Assim, ao limitar a definição de organização criminosa, o legislador equiparou o tratamento de quadrilhas que praticam pequenos ou médios crimes (furto e receptação de toca-fitas, roubo e receptação de relógios) a grandes organizações que se dedicam ao crime organizado (tráfico ilícito substâncias de entorpecentes e de armas, grandes fraudes fiscais), em frontal contradição com a tendência contemporânea de separar as diversas modalidades de crimes. (2015, p. 21)

O legislador buscou inovar e apresentar diferenças entre “organizações” e “associações” criminosas, por meio da edição da Lei nº 10.2017/01, entretanto, tal diferenciação se mostrou irrelevante juridicamente, pois não existia na doutrina essa separação entre os vocábulos em questão para fins jurídico-penais, como expõe Eduardo Araújo da Silva (2015).

Diante disto, todos os dispositivos de investigação que se aplicariam as organizações criminosas, previstos na Lei 9.034/95, perderam sua eficácia, conforme defende Luiz Flávio Gomes (2002), não se tratando, portanto, em hipótese de revogação, uma vez que tais dispositivos voltariam a ter eficácia, posteriormente, quando nova legislação trouxesse um conteúdo integral.

Após o advento da lei 9.034/95, os operadores do direito começaram a utilizar o conceito de grupo criminoso organizado fornecido pela Convenção de Palermo, para tipificar as Organizações Criminosas, por meio do direito comparado, enquanto a lei brasileira não fornecesse um conceito legal (LIMA, 2014).

A Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado, ou Convenção de Palermo é um tratado multilateral, voltado à cooperação entre os Estados partes que visa prevenir o crime organizado transnacional. Aprovada em resolução da Assembleia Geral da ONU em 15 de novembro de 2000, foi promulgada no Brasil, por meio do Decreto Legislativo nº 5.015, em 12 de março de 2004 (GRECO FILHO, 2014).

Artigo 2

Terminologia

Para efeitos da presente Convenção, entende-se por:

a)    “Grupo criminoso organizado” - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material (BRASIL, 2004).

A partir daí surgiu um conceito para referidas organizações, porém não houve a tipificação das mesmas no ordenamento jurídico pátrio, o que resultou em grandes discussões doutrinárias a respeito da aplicação deste conceito, especialmente pelo fato de a Lei 9.613/98 (Lavagem de Dinheiro), em seu texto original, punir a conduta de “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime” quando praticados, também, por organizações criminosas, oportunidade em que se questionou a possibilidade de aplicar o conceito empregado pela Convenção de Palermo para fins de tipificação do crime de lavagem de dinheiro (MASSON; MARÇAL, 2018).

Diante de tal discussão surgiram duas posições doutrinárias. A primeira, acolhida pelo STF (HC 96.007, DJe 08.02.2013), defendia a impossibilidade de definição das organizações criminosas por meio do Decreto 5.015/2004 uma vez que implicaria em violação à garantia constitucional de que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. A segunda corrente (minoritária) defendia que o antigo inciso VII do artigo 1º da Lei 9.613/98 se tratava de uma norma penal em branco que se completava com o conceito de crime organizado inscrito na Convenção de Palermo (MASSON; MARÇAL, 2018).

Porém, tendo em vista que o Direito Penal Brasileiro se baseia no princípio da legalidade, pelo qual se estabelece que não há crime sem lei anterior que o defina, logo, começou-se um debate questionando condenações embasadas em uma Convenção internacional, uma vez que, segundo Renato Brasileiro de Lima (2014), definir crimes ou penas por meio de Tratados Internacionais, seria o mesmo que permitir que o Presidente da República desempenhasse o papel de regulador do direito penal incriminador.

Desta forma, diante da insuficiência da Lei nº 9.034/95 quanto a tipificação do crime organizado, foi instituída a Lei nº 12.694/12 como um meio de complemento, que trouxe um conceito para Organizações criminosas.

A Lei nº 12.694, com vigência em 23 de outubro de 2012, instituiu no direito brasileiro uma definição de organização criminosa, bem como a previsão de julgamento colegiado em primeiro grau para os crimes praticados por organizações criminosas, visando uma proteção maior aos juízes, tendo em vista o alto grau de periculosidade de tais organizações. Porém, da mesma forma que a Convenção de Palermo, o dispositivo legal em questão conceituou as Organizações Criminosas, mas não tipificou (MASSON; MARÇAL, 2018).

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional (BRASIL, 2012).

Posteriormente, em 02 de agosto de 2013, surgiu a Lei nº 12.850 a fim de conceituar e tipificar as Organizações Criminosas. Referido dispositivo legal revogou a Lei 9.034/95, definiu organização criminosa, dispôs sobre investigação e procedimento criminal, meios de obtenção de prova e ainda tipificou as condutas de “promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa” (MASSON; MARÇAL, 2018).

Apesar de a Lei 12.850/13 ter revogado expressamente a Lei 9.034/95, ela não revogou a Lei 12.694/12, surgindo então questionamentos a respeito de qual conceito deveria prevalecer para configuração dos grupos organizados ou se poderia utilizar os dois conceitos (MASSON; MARÇAL, 2018).

Uma primeira corrente (minoritária), defendida por Rômulo Andrade Moreira, entende que vigoram dois conceitos de organização criminosa, um conceito para fins exclusivos da Lei nº 12.694/12 e outro de abrangência geral trazido pela Lei nº 12.850/13, tendo em vista que essa segunda não revogou expressamente a primeira (MASSON; MARÇAL, 2018).

Porém, por mais que a Lei nº 12.850/13 não tenha feito qualquer referência à revogação parcial da anterior, especificamente com relação ao conceito das organizações criminosas, não se deve aceitar a aplicação de dois conceitos, uma vez que traria uma forte insegurança jurídica (LIMA, 2014).

A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) determina que uma lei poderá ser revogada de três formas, sendo: expressa, quando lei nova traz em seu texto a revogação da anterior; quando a lei nova for incompatível com a anterior; e quando a lei nova regular, inteiramente, a mesma matéria da anterior (MAÇON; MARÇAL, 2018).

Vale ressaltar que a Lei Complementar 95/1998 em seu artigo 7º, inciso IV, estabelece que o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei no ordenamento jurídico, vide:

Art. 7º O primeiro artigo do texto indicará o objeto da lei e o respectivo âmbito de aplicação, observados os seguintes princípios:

[...]

IV – o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subsequente se destine a complementar lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa (BRASIL, 1998).

Segunda corrente (majoritária), defendida por Luiz Flávio Gomes, Cezar Roberto Bitencourt, Renato Brasileiro de Lima, entre outros autores renomados, entende que a Lei nº 12.850/13 revogou tacitamente o artigo 2º da Lei nº 12.694/12, o que faz com que exista apenas um conceito de organização criminosa, sendo este o presente na Lei do Crime Organizado que entrou em vigência no ano de 2013 (MASSON; MARÇAL, 2018).

Importante destacar que a revogação da Lei nº 12.694/12 não prejudicou eventuais juízos colegiados que tiveram sido instalados antes da vigência da Lei nº 12.850/13, uma vez que a nova norma processual tem aplicação imediata, preservando-se os atos praticados ao tempo da lei anterior, em razão do princípio do “tempus regit actum”, ou seja, “o tempo rege o ato” (MASSON; MARÇAL, 2018).

Renato Brasileiro de Lima (2014) ressalta em sua obra que, apesar de o artigo 2º da Lei nº 12.694/12 ter sido revogado de forma tácita pela Lei 12.850/13, os demais dispositivos da mesma permanecem com plena vigência:

Se, de um lado, sustentamos que o conceito de organização criminosa deve ser unificado em torno da definição constante do art. 1º, §1º, da Lei nº 12.850/13, daí não se pode concluir que a Lei nº 12.694/12 teria sido integralmente revogada. Ora, por mais que tenha havido a revogação tácita do art. 2º da Lei nº 12.694/12 pela Lei nº 12.850/13, os demais dispositivos constantes desta Lei permanecem com plena vigência. Afinal, o objeto desses dois diplomas normativos é distinto: enquanto a Lei nº 12.694/12 dispõe sobre a formação do juízo colegiado para o julgamento de crimes praticados por organizações criminosas, a Lei nº 12.850/13 define para o crime de organização criminosa, infrações penais correlatas, regulamentando a investigação criminal e meios de obtenção de prova. Subsiste, pois, a possibilidade de formação de juízo colegiado para o julgamento de crimes praticados por organizações criminosas, tal qual disposto no art. 1º da Lei nº 12.694/12. Porém, para fins de conceituação de organizações criminosas, há de ser utilizada a definição constante do art. 1º, §1º, da Lei nº 12.850/13, que revogou tacitamente o disposto no art. 2º da Lei nº 12.694/12. (LIMA, 2014, p. 479).

Assim é possível perceber certa dificuldade por parte do legislador brasileiro em estabelecer, no ordenamento jurídico, uma lei completa que aborde todos os principais assuntos a respeito das organizações criminosas.

 

II – IDENTIFICAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

O presente capítulo tem por objetivo identificar as organizações criminosas, conceituando as mesmas conforme os parâmetros estabelecidos pela Lei nº 12.850 de 02 de agosto de 2013, apresentando ainda os requisitos mínimos para configuração das referidas organizações criminosas.

É mister o estudo aprimorado a respeito da Lei 12.850/13 que trata das organizações criminosas e não apenas um estudo simplificado para fins acadêmicos, tendo em vista que se trata da criação de um tipo penal que pune especificamente os praticantes desta modalidade criminosa.

Outro ponto a se destacar é a forma de atuação das mesmas na atualidade, que se difere muito dos grupos de criminalidade organizada que deram início aos demais, uma vez que as primárias organizações tinham objetivos sociais, atuando contra as arbitrariedades do Estado em prol dos menos favorecidos, e as organizações criminosas da atualidade atuam dentro de alguma proibição estatal, como mercado de drogas, de órgãos, jogos de azar, dentre outras práticas.

 

2.1 – Conceito de organizações criminosas segundo a Lei 12.850/13

Em sentido diverso ao que se sustentava no ordenamento jurídico anterior, a Lei 12.850/13 optou por fornecer uma definição de organização criminosa, a fim de suprimir a omissão das Leis nº 9.034/95 e 12.694/12 (GRECO FILHO, 2014).

As Organizações Criminosas se tratam, em suma, de associação de agentes de forma hierárquica e estável, devidamente estruturada com divisão de tarefas entre seus integrantes com o fim de obter qualquer vantagem ilícita, sendo assim, as organizações criminosas possuem em sua estrutura um alto grau de especialização para a prática de crimes considerados de natureza grave (NUCCI, 2019).

Após acaloradas discussões entre os juristas brasileiros a respeito da conceituação das sobreditas organizações, a Lei nº 12.850, de 02 de agosto de 2013, trouxe para o ordenamento jurídico o seguinte conceito, em seu artigo 1º, §1º:

Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional (BRASIL, 2013).

Com base no presente artigo, percebe-se de imediato elementos importantes para a definição de organizações criminosas, quais sejam: associação de pessoas; divisão de tarefas; objetivo econômico; e a prática de infrações graves (ANSELMO, 2017).

Em breve comparativo entre a Lei nº 12.694/12 e a Lei nº 12.850/13, são observadas três diferenças fundamentais, dentre as quais: a) o número mínimo de integrantes para configurar uma organização criminosa passou de três pessoas, para quatro; b) a finalidade de obter vantagem de qualquer natureza passou a se dar, também,  com a prática de infrações penais de caráter transnacional, e não apenas de crimes, como era previsto na Lei nº 12.694/12; c) a natureza jurídica, uma vez que a Lei 12.850/13 trata-se de um tipo penal incriminador, ao qual é cominada pena de reclusão de 3 a 8 anos e multa, diferente da Lei nº 12.694/12, que sujeitava o agente apenas a regime disciplinar diferenciado e formação do juízo colegiado (LIMA, 2014).

A figura das organizações criminosas deixou de ser considerada uma simples forma de se praticar crimes e se tornou um tipo penal incriminador autônomo que pune a promoção, constituição, financiamento ou o simples ato de integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa, com uma pena de reclusão de 3 (três) a 8 (oito) anos (LIMA, 2014).

A definição legal apresentada pela Lei nº 12.850/13, trouxe outro questionamento, uma vez que para determinada corrente doutrinária, não são propriamente os crimes decorrentes da atuação da organização criminosa que lhe confere essa condição, mas sim a organização em si, logo, não se deveria vincular a caracterização de uma organização criminosa pela prática de infrações penais cujas penas ultrapassem 4 anos (MASSON; MARÇAL, 2018).

Sem adentrar ao mérito de vinculação das organizações criminosas à prática de crimes cujas penas ultrapassem 4 anos além de outros requisitos especificamente previstos da lei, estando diante deste conceito legal estabelecido pela Lei nº 12.850/13, é possível perceber variadas formas de manifestação das organizações criminosas, que atuam em diversas vertentes, como afirma Cleber Masson e Vinícius Marçal (2018) em sua obra:

À guisa de introdução, impende observar que dentro do espectro desse conceito legal é possível que se verifique a existência de variadas formas de manifestação da criminalidade organizada, cada qual com características bem peculiares, amoldadas às suas próprias necessidades e facilidades que encontram em seu respectivo nicho de atuação. Com efeito, a maior ou menor presença das instituições de persecução penal em determinado local, bem como o somatório de fatores políticos, econômicos e sociais, influem para o delineamento dessas características, com preponderância para umas ou outras, sempre com vistas a tornar mais viável a operacionalização das infrações penais planejadas e o escopo de obter maior rentabilidade (2018, p. 55).

Não se pode negar a existência de diferentes formas de organizações criminosas. Há quem diga que criminalidade organizada está relacionada apenas ao tráfico de drogas, tráfico de pessoas, porém, vai muito além, inserindo em seu contexto os crimes praticados no âmbito de empresas legal e licitamente constituídas, bem como crimes praticados em ambiente político (MASSON; MARÇAL, 2018).

Pode-se notar pela análise dos sobreditos autores que as organizações criminosas possuem o mais alto grau de sofisticação para o alcance das suas finalidades com a prática de crimes de alta lesividade, incluindo-se, como tais, tráfico de drogas e delitos que envolvem até mesmo a administração pública, entre outros.

Para apenas delimitar de forma genérica nesta parte, são conhecidas quatro formas de organizações criminosas, dentre as quais se pode citar: a) Tradicional (clássica): aquelas que atuam de forma autônoma, difusa e permanente, cujo principal exemplo são as Máfias; b) Rede (Network): aquelas que se formam através de um grupo de especialistas sem ritos, vínculos ou critérios de composição hierárquica; c) Empresarial: formada dentro de empresas constituídas e mantidas de forma lícita, atuando secundariamente na prática de crimes fiscais, ambientais, cartéis, fraudes em licitações, lavagem de dinheiro, dentre outras práticas criminosas; d) Endógena: aquelas espécies de organizações criminosas que atuam dentro do próprio sistema estatal, formada primariamente por políticos e agentes públicos de todos os escalões (MASSON; MARÇAL, 2018).

As organizações criminosas são, portanto, instituições orgânicas com atuação desviada, como explica Gilson Langaro Dipp em sua obra:

Uma organização criminosa de modo geral se revela por dotar-se de aparato operacional, o que significa ser uma instituição orgânica com atuação desviada, podendo ser informal ou até forma mas clandestina e ilícita nos objetivos e identificável como tal pelas marcas correspondentes. A organização criminosa pode também, eventualmente ou ordinariamente, exercer atividades lícitas com finalidade ilícita, apesar de revestir-se de forma e atuação formalmente regulares. Um estabelecimento bancário que realiza operações legais e lícitas em deliberado obséquio de atividades ilícitas de terceiro, é o exemplo que recomenda cuidado e atenção na compreensão de suas características (2015, p. 11).

Percebe-se que as organizações criminosas se tratam de associação de, no mínimo, quatro agentes organizados de forma hierárquica e estável, estruturada com divisão de tarefas para a prática de crimes cuja pena máxima seja superior à 4 anos ou de caráter transnacional e que atuam em diversas vertentes, desde a  prática de crimes de tráfico a lavagem de dinheiro em empresas privadas, e até mesmo instituições públicas.

 

2.2 – Requisitos mínimos para que se configure as organizações criminosas

As organizações criminosas foram conceituadas pela Lei nº 12.850 de 02 de agosto de 2013, e dentro de seu conceito é possível observar requisitos para que sejam configuradas como tal (SILVA, 2015).

Levando em consideração o previsto no artigo 1º da Lei nº 12.850/13, Eduardo Araújo da Silva (2015) observa e determina três requisitos para classificação das mesmas, quais sejam: a) estrutural; b) temporal; c) finalístico.

Em relação ao requisito estrutural, buscando maior eficiência na repressão ao crime organizado, houve inovação legislativa quanto ao número de participantes para se constituir uma organização criminosa, sendo estabelecido um mínimo de quatro pessoas, hierarquicamente ordenadas, sendo necessária a figura de um chefe ou líder para dirigir a organização planejando previamente a execução dos crimes (SILVA, 2015).

A Lei 12.850/13 trouxe essa inovação referente ao número mínimo de participantes para configurar uma organização criminosa, a fim de diferenciar o crime retromencionado do crime de associação criminosa estabelecido no Código Penal, que traz a previsão de um mínimo de três agentes associados para o fim específico de cometer crimes (SILVA, 2015).

Seguindo no requisito estrutural, as organizações criminosas devem possuir uma hierarquia entre seus membros, ou seja, é necessário a existência de um líder que dita as regras e tarefas de seus subordinados (inferiores hierárquicos), uma vez que, seguindo o entendimento de Renato Brasileiro de Lima (2014) em sua obra:

As organizações criminosas se caracterizam pela hierarquia estrutural, planejamento empresarial, uso de meios tecnológicos avançados, recrutamento de pessoas, divisão funcional das atividades, conexão estrutural ou funcional com o poder público ou com agente do poder público, oferta de prestações sociais, divisão territorial das atividades ilícitas, alto poder de intimidação, alta capacitação para a prática de fraude, conexão local, regional, nacional ou internacional com outras organizações. A divisão direcionada de tarefas costuma ser estabelecida pela gerência segundo as especialidades de cada um dos integrantes do grupo, a exemplo do que ocorre com o roubo de veículos, em que um agente fica responsável pela subtração, e outros pelo desmanche, falsificação de documentos e revenda (p. 482).

Quanto ao requisito temporal, para que se configure como organização criminosa, as reuniões de grupo devem ser estáveis e ocorrer com frequência a fim de se dividir tarefas e funções, não bastando um mero vínculo ocasional. Tal estabilidade se faz necessária para que não sejam punidos de forma mais grave, com base na lei do crime organizado, aqueles que atuam em mero concurso de agentes (SILVA, 2015).

Em atendimento ao requisito finalístico, o legislador demonstrou a gravidade com base nas penas impostas, logo, serão julgados como organização criminosa a prática de crimes cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou infrações penais de caráter transnacional (SILVA, 2015).

Por ilícito transnacional, se tratando do requisito finalístico, como afirma Renato Brasileiro de Lima:

Se compreende aquele que transcende o território brasileiro, ou seja, que envolve águas ou solo ou espaço aéreo que vão além do território nacional, que abrange o solo, as águas internas, doze milhas de mar e o espaço aéreo respectivo. Na hipótese de o crime ultrapassar os limites do território brasileiro, será considerado transnacional, ainda que não envolva diretamente qualquer outro país soberano (2014, p. 483).

Deve ser levado em consideração, ainda, que o crime de organização criminosa se trata de um delito permanente, ou seja, aquele cuja consumação, pela natureza do bem jurídico ofendido, pode protrair-se no tempo, detendo o agente o poder de fazer cessar a prática delituosa a qualquer momento (LIMA, 2014).

Na jurisprudência nacional, tem prevalecido o entendimento de que os requisitos para a caracterização do crime de organização criminosa são: a) associação de quatro ou mais pessoas; b) estrutura ordenada pela divisão de tarefas; e c) obtenção de vantagem direta ou indireta, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja superior a quatro anos de reclusão (STJ, 2019).

Vicente Greco Filho, em sua obra, faz um desmembramento de todo o artigo primeiro e extrai quatro requisitos que caracterizam uma organização criminosa, a saber:

a) Associação (reunião com ânimo associativo, que é diferente de simples concurso de pessoas) de quatro ou mais pessoas.

b) Estrutura ordenada que se caracteriza pela divisão de tarefas ainda que informalmente.

c) O fim de obtenção de vantagem de qualquer natureza (portanto, não apenas econômica) mediante a prática de crimes (excluídas as contravenções).

d) Crimes punidos, na pena máxima, com mais de quatro anos ou que os crimes tenham caráter transnacional, independentemente da quantidade da pena (2014, p. 20).

Esse entendimento do autor supracitado demonstra o requinte a sofisticação das organizações criminosas, as quais transpõem o caráter clássico do delito em sua estrutura básica e atende a necessidade premente de repressão a tal figura delitiva.

São apresentados, ainda, por grande parte da doutrina, oito características para identificar uma organização criminosa, enumeradas por Greco Filho em sua obra (2014), a saber:

a) Estrutura organizacional, com cédulas relativamente estanques, de modo que uma não tem a identificação dos componentes da outra.

b) Especialização de tarefas, de modo que cada uma exerce uma atividade predominante. Tomando como exemplo uma organização criminosa para o tráfico ilícito de entorpecentes, dir-se-ia que tem atividade definida o importador, o transportador, o destilador, o financeiro, o traficante de área e distribuidor e o traficante local, como uma rede, das artérias aos vasos capilares.

c) A existência de vários níveis de hierarquia, em que os subordinados nem sempre, ou quase nunca, conhecem a identidade da chefia de dois ou mais escalões superiores ou ainda que conheçam a chefia mais elevada não têm contato direto com ela e não podem fornecer provas a respeito.

d) A possível existência de infiltração de membros da organização em atividades públicas, nos Poderes Executivo, Legislativo, Ministério Público e Judiciário e corrupção de agentes públicos.

e) A tendência de durabilidade.

f) A conexão com outras organizações, no mesmo ramo ou em ramo diferente, quando não a atividade em vários ramos.

g) A coação, mediante violência, chantagem ou aproveitamento da condição de pessoas não participantes, mas que passam a ser auxiliares ou coniventes e que vivem sob a imposição de grave dano em caso de delação.

h) Mais de três pessoas (2014, p. 20).

Desta feita, tendo em vista a análise de todos os requisitos para se configurar uma organização criminosa, não se vislumbrando esses elementos condicionantes, trata-se de irrelevante penal, ou pode configurar outro crime, como a associação criminosa, tipificada no artigo 288 do Código Penal.

 

2.3 – Formas de atuação das organizações criminosas na atualidade

As organizações criminosas são formadas pela associação de quatro ou mais pessoas hierarquicamente estruturadas, de forma permanente a fim de se praticar crimes, ou infrações penais, cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou sejam crimes de caráter transnacional. Desta forma, percebe-se que as organizações criminosas são, em regra, uma estrutura ordenada que atua na prática de crimes de grave potencial ofensivo (NUCCI, 2019).

Com atuação em diversas vertentes, as organizações criminosas estão presentes em empresas licitamente constituídas, em periferias onde a população foi, de certa forma, abandonada pelo Estado, e até mesmo dentro do Poder Público (AZIZ, 2016).

O sujeito passivo do crime de organização criminosa, é a coletividade, ao passo que o sujeito ativo é qualquer pessoa, pessoalmente ou até mesmo por interposta pessoa, que promover, constituir, financiar ou integrar organização criminosa (GRECO FILHO, 2014).

O verbo promover se trata de colocar em execução, ser a causa, gerar, provocar, divulgar, estimular, fazer propaganda, e até mesmo anunciar. Por ser um crime comissivo, pode constituir-se em um ou mais atos (GRECO FILHO, 2014).

O verbo constituir se configura com o ato de criar, montar ou formar, se consumando o crime quando quatro ou mais pessoas, com o devido ajuste associativo, criam e estruturam, ainda que de forma básica, um grupo, com divisão de tarefas, objetivando uma finalidade criminosa (GRECO FILHO, 2014).

Financiar, nas palavras de Vicente Greco Filho (2014, p. 27), é aportar recursos para fornecer os valores necessários

Prover ou aportar recursos, fornecer numerário de apoio ao funcionamento da entidade. Significa, também, prover as despesas de custear, bancar ou dar como financiamento. […] é elemento característico na organização criminosa a divisão de tarefas, entre as quais é fundamental a financeira. Financiador é o que investe, ou seja, o que aporta recursos prévios e concomitantes para viabilizar a organização. É o que empresta dinheiro para receber rendimentos […]

Importante ressaltar que o crime de financiar organização criminosa não exige habitualidade, ou seja, basta um ato de financiamento consciente de que o valor destina-se à organização (GRECO FILHO, 2014).

O crime de integrar organização criminosa se consuma da seguinte forma, como afirma Vicente Greco Filho (2014):

Integrar: é participar como membro, é estar encarregado de uma das tarefas dentro da organização, ainda que não venha a praticar nenhum ato relativo aos crimes fins. Basta que o agente aderido a ser membro da organização e estar à disposição de exercer a sua parte da tarefa que lhe for destinada quando for o caso, desde que tal adesão tenha por fim, direta ou indiretamente, a obtenção de vantagem de qualquer natureza.

Como mencionado anteriormente, seguindo o pensamento de Cleber Masson e Vinícius Marçal, as organizações criminosas atuam de quatro formas distintas, dentre as quais podemos citar: a) forma tradicional; b) forma de rede; c) forma empresarial; d) forma endógena.

A forma tradicional, como se pode presumir pelo nome, são as organizações clássicas. O principal exemplo são as máfias, que possuem uma estrutura hierárquico piramidal, onde o líder se encontra no topo da pirâmide, e seus subordinados em sua extensão, devendo obedecer as regras específicas que lhes forem estipuladas. Outra forma de atuação das organizações criminosas é a network, ou rede, cuja origem está marcada no fim do século XX e início do século XXI, decorrendo, principalmente, do fenômeno da globalização (MASSON; MARÇAL, 2018).

Diferentemente das organizações que atuam de forma tradicional, as organizações de rede não possuem uma hierarquia bem definida, nem rituais e estrutura permanente, se tratando, portanto, de grupos que, esporadicamente, se organizam em volta de criminosos profissionais para desenvolver suas atividades ilícitas e posteriormente se dispersarem, sem deixar qualquer rastro (MASSON; MARÇAL, 2018).

Outro formato de atuação das organizações criminosas é no âmbito empresarial, onde empresas lícitas, devidamente constituídas, por meio de seus empresários, praticam crimes fiscais, como afirmam Cleber Masson e Vinícius Marçal em sua obra:

Neste formato, também modernamente chamadas de organizações criminosas, os empresários se aproveitam da própria estrutura hierárquica da empresa. Mantém suas atividades primárias lícitas, fabricando, produzindo e comercializando bens de consumo para, secundariamente, praticar crimes fiscais, crimes ambientais, cartéis, fraudes (especialmente em concorrência – licitações, dumping, lavagem de dinheiro, falsidades documentais, materiais ideológicos, estelionato, etc.) (2018, p. 56).

Por fim, têm-se na classificação doutrinária a forma endógena de organização criminosa, classificada por Cleber Masson e Vinícius Marçal como organizações que corrompem o Estado em todas as suas estruturas e esferas, a saber:

Espécie de organização criminosa que age dentro do próprio Estado, em todas as suas esferas – Federal, Estaduais e Municipais, envolvendo, conforme a atividade, cada um dos Poderes, Executivo, Legislativo ou Judiciário (2018, p. 56).

Tendo em vista se tratar de uma organização que atua dentro do poder público, as organizações criminosas endógenas são formadas essencialmente por políticos e funcionários públicos, como Cleber Masson e Vinícius Marçal ressaltam em sua obra:

É formada essencialmente por políticos e agentes públicos de todos os escalões, envolvendo, portanto, necessariamente, crimes praticados por funcionários públicos contra a administração pública (corrupção, concussão, prevaricação etc.). Mas também, quase que inevitavelmente outras infrações penais como aquelas que se relacionam direta ou indiretamente (2018, p. 56).

Percebe-se que as organizações criminosas atuam em diversas vertentes, tanto de formas integralmente ilícitas, quanto de forma parcialmente ilícita em empresas constituídas licitamente, porém com a mesma finalidade, qual seja, a prática de crimes e obtenção de vantagens de qualquer natureza.

 

III – A COLABORAÇÃO PREMIADA NO CONTEXTO DAS ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS

Com o passar do tempo as organizações criminosas foram evoluindo, de forma que se tornou uma árdua tarefa a identificação e o combate das mesmas, sendo necessária a introdução de meios mais eficientes de investigação e obtenção de provas em prol do combate a esta indústria criminosa.

Um dos meios de investigação mais eficiente instituído pela Lei de Organização Criminosa foi a colaboração premiada, tendo em vista que, por meio de acordo, em troca de alguns benefícios, um dos integrantes da organização criminosa revela detalhes essenciais à elucidação dos fatos e identificação dos demais coautores, bem como dos autores.

 

3.1 Conceito de colaboração premiada

Se assemelhando a legislação premial italiana de combate ao crime organizado (patteggiamento) instituída no âmbito da operação Mãos Limpas, e ainda com a plea bargaining, um instituto de origem nos países de sistema common law, a Delação Premiada foi instituída no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº 12.850/13 que trata do combate ao crime organizado (MASSON; MARÇAL, 2018).

De difícil identificação sobre o início da aplicação da colaboração premiada no direito italiano, presume-se que sua adoção foi incentivada em meados dos anos 1970 a fim de combater atos de terrorismo, em especial a extorsão mediante sequestro, se mostrando altamente eficaz nos processos que visavam a investigação de máfias criminosas (SILVA, 2015).

No direito Norte-Americano é realizada uma proposta de acordo entre a acusação e o acusado, denominada plea bargaining o que, nas palavras de Eduardo Araújo da Silva (2015), facilita a obtenção de uma colaboração premiada objetivando a condenação dos chefes do crime organizado:

Nos Estados Unidos da América, os acordos entre acusação e acusado (plea bargaining) também estão incorporados na cultura jurídica, o que facilita a obtenção de uma colaboração premiada. Essa sistemática é resultante da tradição calvinista, na qual confessar publicamente a culpa, praticar um ato de contrição, revelam uma atitude cristã que deve ser valorizada pelo direito. Em tempos remotos, antes do início do julgamento, o juiz indagava o acusado quanto a sua pretensão de declarar-se publicamente culpado, pedir perdão e aceitar livremente a punição do seu crime. Atualmente, a admissão de culpa não se destina à satisfação da moral pública, podendo resultar numa eficaz estratégia do Ministério Público para obter a condenação dos chefes do crime organizado. Aceitando a proposta do procurador para “testemunhar” em favor da acusação, o colaborador é incluído num witness profession program, no qual poderá usufruir de uma nova identidade, alojamento, dinheiro e outra profissão (p. 54).

Seguindo a linha de pensamento de Guilherme de Souza Nucci (2019), ‘colaboração’ se trata de cooperação, o que, associada ao termo ‘premiada’ que representa uma espécie de recompensa, entende-se ser uma cooperação de um agente com a justiça, que permite o Estado identificar fatos a cerca de uma respectiva infração penal, no que concerne à materialidade e autoria.

Apesar de ter tomado uma maior proporção com o advento da Lei nº 12.850/2013, a colaboração premiada já foi prevista em outras leis dentro do ordenamento jurídico brasileiro, como ressalta Eduardo Araújo da Silva (2015):

No direito brasileiro, a delação premiada foi primeiramente disciplinada pela Lei nº 8.072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos, prevendo o art. 8º, parágrafo único, dessa lei, que ‘o participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando o seu desmantelamento, terá pena reduzida de um a dois terços’. Posteriormente, a Lei nº 8.137/90, que define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, também tratou da matéria, prevendo o art. 16, parágrafo único, que em relação aos crimes ‘cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou partícipe que através da confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços)’. Também a Lei nº 9.269/96 tratou da delação premiada em relação ao crime de extorsão mediante sequestro, ao introduzir o § 4º no art. 158 do Código Penal, prevendo a redução da pena de um a dois terços para aquele que denunciar o crime à autoridade, facilitando a liberação do sequestrado. Especificamente em relação ao crime organizado, seguindo a tendência internacional, a Lei nº 9.034/95, que trata dos meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas, dispôs que ‘nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria’ (art. 6º). Mais recentemente, com a edição da Lei nº 9.807/99, tentou-se uniformizar o tratamento da matéria, prevendo o legislador a possibilidade de concessão de perdão judicial ou a diminuição da pena dos acusados que colaborarem de forma voluntária e eficaz com a Justiça (p. 53).

A Colaboração premiada é uma das principais formas de investigação e obtenção de provas de organizações criminosas, com previsão no artigo 3º, inciso I, bem como na seção I da Lei nº 12.850 de 02 de agosto de 2013, por meio da qual o coautor ou partícipe, visando um prêmio legal, coopera com os órgãos de persecução penal apresentando informações relevantes que levam ao conhecimento dos demais integrantes da organização, bem como os crimes praticados por eles e as vantagens obtidas (MASSON; MARÇAL, 2018).

De acordo com Eduardo Araújo da Silva (2015) a colaboração premiada ocorre quando o acusado, ainda em fase investigativa, confessa seus crimes para as autoridades de forma a evitar a consumação de outras infrações e ainda auxiliar a polícia no recolhimento de provas contra os demais coautores.

A colaboração premiada pode ser tratada como um negócio jurídico bilateral, uma vez que se consuma na forma de um contrato, em razão de uma contraposição de interesses, onde o Ministério Público, ou autoridade policial, espera conseguir, com a colaboração do investigado, a identificação e coleta de elementos de prova (MOURA; BOTTINI, 2018).

No HC 127.483-PR o STF definiu a colaboração premiada como um negócio jurídico processual, tendo em vista que, além de ser classificada expressamente como um meio de obtenção de prova, seu objeto é a cooperação do investigado para uma eficiente investigação e ainda para o processo criminal (NUCCI, 2019).

Embora a lei se utilize da expressão “colaboração premiada”, se trata, na verdade, de uma delação, tendo em vista que o instituto em questão não se destina a qualquer espécie de cooperação, mas sim à aquelas em que se identifica autoria ou materialidade do delito, o que só é possível por meio de uma delação, consistente em acusar ou denunciar (NUCCI, 2019).

De acordo com Renato Brasileiro de Lima (2014), a colaboração premiada pode ser conceituada como uma técnica especial de investigação por meio da qual um dos integrantes da organização criminosa, além de confessar sua atuação no fato criminoso, concede às autoridades responsáveis pela instrução penal informações realmente eficazes para a consecução de um dos objetivos previstos em lei, recebendo em contrapartida, determinado prêmio legal.

Sem adentrar ao mérito da nomenclatura, de forma resumida entende-se esse instituto como um meio de investigação consistente na cooperação do investigado com a autoridade policial, de forma a revelar informações importantes sobre a estrutura da organização criminosa, mediante alguma vantagem ou premiação, que pode ser redução da pena privativa de liberdade, ou substituição desta por restritiva de direitos.

 

3.2 – Requisitos mínimos para que a colaboração premiada seja efetivada e garantida em seus benefícios

Em conformidade com o artigo 4º da Lei 12.850/13, o juiz poderá, em caso de efetiva colaboração, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado, de forma voluntária, com a investigação e com o processo criminal (LIMA, 2014).

A delação premiada instituída no ordenamento jurídico brasileiro teve forte influência do direito italiano, bem como anglo-saxão, como dito anteriormente, entretanto, em sua gênese, não era estabelecido a forma como se efetivaria a colaboração, tampouco as regras de proteção ao colaborador, entretanto, com a entrada em vigor da Lei nº 12.850/13 surgiram algumas regras para a fixação do acordo, como explica Cleber Masson e Vinícius Marçal em sua obra (2018):

Surgiram regras claras para a celebração do acordo; magistrado foi afastado da negociação; exigiu-se requerimento e homologação judicial; foram previstos direitos ao colaborador; tipificou-se como crime a revelação indevida de sua identidade; surgiram novos prêmios (p. 176).

Tem-se por efetiva colaboração aquela que se faz eficaz para a consecução dos seguintes objetivos previstos em lei: a) identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; b) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; c) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; d) a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; e) a localização de eventual vítima com sua integridade física preservada (LIMA, 2014).

O artigo 4º da Lei nº 12.850/13 estabelece os seguintes requisitos para a aplicação do prêmio consequente da delação, quais sejam, segundo Guilherme de Souza Nucci (2018): a) colaboração efetiva e voluntária com a investigação e com o processo criminal; b) personalidade do colaborador, natureza, circunstâncias, gravidade, repercussão do fato criminoso e eficácia da colaboração; c) identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas; d) revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa; e) prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa; f) recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa; g) localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

Quanto à efetividade e voluntariedade com a investigação Eduardo Araújo da Silva (2015) estabelece que a efetividade da colaboração é consistente no dever do agente em colaborar de forma contínua e permanente com as autoridades se colocando à disposição para a elucidação dos fatos investigados, de forma voluntária, ou seja, sem qualquer coação seja física ou moral.

Como afirma Guilherme de Souza Nucci, a jurisprudência nacional tem fixado o entendimento de que:

Não cabe o reconhecimento da delação premiada se a cooperação da acusada não foi plena, isto é, não houve colaboração durante o inquérito policial e durante a ação penal de modo a possibilitar a identificação dos demais membros da organização criminosa, bem como a recuperar total ou parcialmente o produto do crime (2019, p. 59).

O requisito de que trata o parágrafo primeiro do artigo 4º da Lei nº 12.850/13, referente a personalidade do colaborador, natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão do fato criminoso, estabelece, em um só contexto, elementos de ordem subjetiva e objetiva, se destacando a personalidade do agente como o elemento subjetivo por meio do qual deve-se analisar o conjunto das características pessoais do indivíduo, ou seja, se é uma pessoa calma ou agressiva, responsável ou irresponsável, trabalhador ou ocioso, de forma a identificar se a personalidade do agente influenciou para a prática do fato delituoso (NUCCI, 2018).

Quanto à identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas, é importante que as informações devem se referir ao crime investigado (ou processado) para o qual o colaborador também tenha concorrido em concurso de agentes, de forma que, se o agente resolver colaborar prestando informações relacionadas a crimes diversos que não são objeto do procedimento investigatório contra ele instaurado, não fará jus aos benefícios previstos em lei (LIMA, 2014).

A revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa visa que o agente denuncie a composição e escalonamento da organização, de modo a contribuir para que o Estado identifique os coautores e partícipes ou ainda a materialidade das infrações (NUCCI, 2018). Entretanto, deve-se analisar com cautela as informações fornecidas pelo colaborador, vez que, pouco provavelmente o agente em colaboração terá conhecimento de todos os integrantes do grupo, uma vez ser comum que o ocupante de uma posição inferior na hierarquia organizacional tenha acesso aos integrantes superiores (LIMA, 2014).

O colaborador deverá ainda fornecer informações relevantes de forma a prevenir infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa. Entretanto, este requisito deverá ser aplicado cumulativamente com a identificação de coautores e partícipes, vez que a aplicação deste de maneira isolada, é quase inviável (NUCCI, 2018).

Para que seja premiada, a colaboração deverá contribuir ainda para a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa, tendo-se por produto da infração penal o resultado imediato da operação criminosa, ou seja, os bens que chegam aos agentes por meio do crime, de modo que sejam todos retornados às vítimas (LIMA, 2014).

Requisito importante, ainda, para a concessão do prêmio legal é a localização de eventual vítima com sua integridade física preservada nos crimes de sequestro ou extorsão mediantes sequestro (NUCCI, 2018).

Faz-se de extrema importância para a concessão do benefício que a integridade física da vítima esteja preservada, ou seja, caso a colaboração leve à localização do cadáver da vítima, mesmo que presumisse ainda estar em vida, será inviável a concessão de qualquer benefício (LIMA, 2014).

A colaboração e os efeitos, por sua vez, não resultam de forma automática o direito ao benefício, e sempre dependerão da avaliação da personalidade do agente, a natureza e as circunstâncias, a gravidade e a repercussão do fato criminoso e a eficácia da colaboração, que serão levadas em consideração, ainda, pelo juiz ao dosar o benefício ao momento da sentença de mérito (GRECO FILHO, 2014).

Para que a colaboração seja aceita e efetivada em seus benefícios, é necessário que o colaborador cumpra os requisitos de forma cumulativa, tendo em vista que ambos estão interligados, de modo que o cumprimento de apenas um dos itens citados, não acarreta, necessariamente, no benefício.

 

3.3 – Efetividade das colaborações premiadas na investigação de organizações criminosas

Em busca da elucidação de infrações penais e crimes mais complexos, aos quais a lei prevê penas máximas superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional, dentre outros meios efetivos de investigação, ao Estado é permitido o uso do instituto da colaboração premiada, que consiste, basicamente, em um meio pelo qual um dos acusados de um crime, colabora de forma eficiente para sua elucidação, identificando os demais envolvidos, revelando a hierarquia da organização criminosa, adquirindo, em contrapartida, o benefício da redução da pena ou até mesmo sua extinção (CRUZ, 2006).

A efetividade da colaboração premiada é determinada pelo cumprimento dos requisitos previstos nos incisos do artigo 4º da Lei nº 12.850/13, a saber:

Art. 4º O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:

I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;

II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

IV – a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;

V – a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada (BRASIL, 2013).

A colaboração premiada pode ser realizada tanto em fase investigatória quanto durante a instrução processual, e em ambos os casos o acordo é fornecido pelo delegado com a manifestação do Ministério Público, sendo vedada a participação do juiz na fase de negociação e acordo, conforme explica Guilherme de Souza Nucci (2018, p.63):

A delação pode dar-se tanto na fase investigatória quanto em juízo. Considerando-se a sua ocorrência, durante o inquérito, pode dar-se da seguinte forma: a) o delegado, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, representa pela aplicação do prêmio máximo, que é o perdão judicial, causador da extinção da punibilidade, cessando-se a persecução penal; b) o delegado, nos autos do inquérito, representa e, antes de seguir ao juiz, passa pelo Ministério Público para colher sua manifestação, seguindo-se o pleito de perdão judicial; c) o Ministério Público, valendo-se do inquérito, requer ao magistrado a aplicação do perdão judicial.

A participação do Juiz de Direito somente será permitida na segunda fase, onde será feita a homologação do acordo por meio de uma simples decisão interlocutória, não produzindo nenhum efeito imediato de coisa julgada, tampouco concessão do benefício (GRECO FILHO, 2014).

A colaboração premiada se mostra de grande efetividade tendo em vista que, por meio desta, tem o Poder Judiciário, com auxílio da autoridade policial e representante do Ministério Público, maiores chances de solucionar, diminuir ou repreender a criminalidade organizada no Brasil, vez que, mesmo com uma condenação iminente, o réu em colaboração contribui para o desembaraço da organização a qual pertencia, e ainda a recuperação dos produtos dos crimes, entre outras medias (MENDONÇA, 2014).

Para que seja efetivada pelo Juiz de Direito, a colaboração premiada deverá ser feita por escrito e conter: a) o relato da colaboração e seus possíveis resultados; b) as condições da propositura do Ministério Público ou delegado de polícia; c) a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor; d) as assinaturas do representante do Ministério Público ou do Delegado de Polícia, do colaborador e de seu defensor; e) a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário (LIMA, 2014).

Ao realizar um acordo de colaboração premiada, visando maior proteção à sua integridade, o réu colaborador adquire alguns direitos, quais sejam, de acordo com o previsto no artigo 5º da Lei de Organização Criminosa:

Art. 5º São direitos do colaborador:

I – usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica;

II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados;

III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;

IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;

V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;

VI – cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados (BRASIL, 2013).

Uma das leis que visam a proteção dos colaboradores a qual se refere o primeiro inciso do artigo 5º é a Lei de Proteção a Testemunhas nº 9.807/99, a qual estabelece normas para organização de programas de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas que tenham prestado efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal (SILVA, 2015).

Após sua homologação pelo magistrado, o colaborador fica sujeito às seguintes espécies de prêmios: a) perdão judicial; b) redução da pena privativa de liberdade em até dois terços; c) redução da pena até a metade, se a colaboração for posterior à sentença; d) progressão de regime, ainda que ausentes os requisitos objetivos, se a colaboração for posterior à sentença; e) substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos; f) não oferecimento de denúncia, se o colaborador não for o líder da organização criminosa e for o primeiro a prestar efetiva colaboração (MASSON; MARÇAL, 2018).

Tem-se por efetiva a colaboração que cumpre com os requisitos previstos no artigo 4º da Lei nº 12.850/13, sendo este um meio investigativo de grande importância ao combate das organizações criminosas por permitir que o investigado ofereça informações relevantes para a identificação de demais autores e partícipes com o intuito de dar fim à atividade criminosa em questão.

 

CONCLUSÃO

Diante do exposto é possível perceber que as primárias organizações criminosas iniciaram suas atividades com o nobre intuito de proteger a sociedade contra o autoritarismo estatal, porém, no decorrer do tempo, evoluíram de modo a praticar crimes com o intuito de obter, principalmente, vantagens econômicas.

Com o aumento da criminalidade organizada, fez-se necessária a instituição de legislação específica a fim de tipificar tal conduta como crime, e ainda tornar efetiva as investigações e condenação dos criminosos em questão.

No decorrer dos anos, foram instituídas diversas leis a fim de tipificar, como crime, a prática de delitos por organização criminosa, entretanto, os legisladores brasileiros encontraram certa dificuldade em estabelecer, no ordenamento jurídico, uma lei completa que aborde todos os principais assuntos referentes a organizações criminosas, até que entrou em vigor a Lei nº 12.850/13.

A Lei de Organizações Criminosas tipificou como crime a associação de, no mínimo, quatro agentes organizados de forma hierárquica e estável, estruturada com divisão de tarefas para a prática de crimes ou infrações penais cuja pena máxima seja superior a quatro anos, ou ainda de caráter transnacional.

As organizações criminosas, em um primeiro momento, eram conhecidas pela prática de tráfico de drogas, de pessoas, e ainda animais, entretanto, com o passar dos anos, a conduta foi se expandindo, alcançando o interior de empresas licitamente constituídas para que se praticassem a lavagem de dinheiro.

Além de tipificar como crime, a Lei nº 12.850/13 apresentou requisitos para que configure uma organização criminosa, ao passo que, não se vislumbrando tais elementos condicionantes, trata-se de um irrelevante penal, ou configura outro crime, como associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal.

Foram estabelecidos, no texto legislativo em questão, as formas de investigação e os meios de obtenção de prova, estando a colaboração premiada prevista nos artigos 4º ao 7º.

Trata-se a Colaboração Premiada de um efetivo meio de investigação, vez que o colaborador firma um acordo com a autoridade policial, em troca de alguns benefícios processuais, e aponta informações relevantes sobre a estrutura e atuação da organização criminosa, de modo a possibilitar que a autoridade policial tenha resultados verdadeiramente eficientes em sua investigação.

 

REFERÊNCIAS

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BRASIL, Lei nº 9.034, de 03 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9034.htm Acesso dia: 15. Mai. 2019.

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Data da conclusão/última revisão: 30/1/2020

 

Como citar o texto:

LIMA, Adriano Gouveia; NEIVA, Patrícia Nunes..A colaboração premiada como forma de investigação em organizações criminosas. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1690. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/4678/a-colaboracao-premiada-como-forma-investigacao-organizacoes-criminosas. Acesso em 18 fev. 2020.

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