RESUMO

A aferição da condição de necessitado estabelecida pela lei 8742/1993 – Lei Orgânica da Assistência Social representa divergência de valorações quando se analisa decisões proferidas junto à autarquia previdenciária - Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), responsável pela análise administrativa, e o Poder Judiciário. O parâmetro estabelecido pelo ente administrativo por vezes não corresponde à realidade econômica do país, se distanciando da realidade daqueles que se encontram em vulnerabilidade social. A análise efetivada pelo Poder Judiciário, a partir da concretude posta nos autos, acompanhado de elementos probantes, exprime colisão de entendimento. O caminho perseguido pelo assistido, diante do não amparo administrativo, tem na esfera judicial destino certo, judicializando como regra, comprometendo o mínimo de organização orçamentária, além de prolongar o percurso para obtenção do benefício, não obstante a urgência da necessidade.

Palavras-chave: Assistência Social. Lei Orgânica da Assistência Social. Benefício de Prestação Continuada. Requisito da miserabilidade.

Abstract: The assessment of the needy condition established by Law 8742/1993 - Organic Law of Social Assistance represents divergence of valuations when analyzing decisions handed down by the social security authority - National Institute of Social Security (INSS), responsible for administrative analysis, and the Judiciary . The parameter established by the administrative entity sometimes does not correspond to the economic reality of the country, distancing itself from the reality of those who are in social vulnerability. The analysis carried out by the judiciary, based on the concreteness of the case file, accompanied by evidence, expresses a collision of understanding. The path pursued by the assisted, in the face of non-administrative support, has in the judicial sphere a right destination, judicializing as a rule, compromising the minimum of budgetary organization, in addition to prolonging the path to obtain the benefit, despite the urgency of the need.

Keywords

: Social Assistance. Organic Law of Social Assistance. Continued Benefit Benefit. Requirement of miserability.

 

INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativo do Brasil – CRFB/1988, em seu artigo 203, inciso V, garante independentemente de prévia contribuição à seguridade social, a concessão do valor correspondente a 01 (um) salário mínimo a título de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que não possuam meios de prover a própria subsistência ou tê-la provida por sua família. Tal comando constitucional fora disciplinado pela Lei 8.742/93, em seu artigo 20, regulamentado pelo Decreto n.1.744/95, com alterações no requisito etário pelas leis n. 8.720/98 e n. 10.741/03, fixando-o em 65 anos.

Assim, definiu-se como destinatários de tal benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência e ao idoso com mais de 65 anos, desde que comprovem não reunir meios de prover seu próprio sustento ou tê-lo provido por seus familiares.

Pertinente à hipossuficiência, a norma prevê renda per capita limitada a 1/4 (um quarto) do salário mínimo vigente, no entanto, tal dispositivo foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal por considera-lo defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.

O Ministro do Superior Tribunal de Justiça - STJ Napoleão Nunes Maia Filho, também entende que o critério de renda inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo para cada integrante do núcleo familiar não poderia ser admitido indistintamente, cabendo ao magistrado utilizar, no caso concreto, outros meios de prova da condição de miserabilidade da parte interessada.

Ademais, “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum” (art. 5º da LICC), excluindo-se assim, a aplicação de uma exigência simplista e literal art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93. Este posicionamento jurisprudencial que se firmou está em consonância com os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, proclamados na Magna Carta de 1988, atinente à dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III), à erradicação da pobreza, da marginalização, redução das desigualdades sociais (art. 3º, inciso III) e garantia do bem comum (art. 3º, inciso IV) além dos objetivos da Ordem Social definidos no art. 193.

Apesar do art. 20 da Lei 8.742/93 exigir o respeito ao limite da renda de 1/4 (um quarto) do salário mínimo, legislações posteriores que disciplinaram as políticas de amparo e assistência social promovidas pelo Governo Federal estabeleceram o critério de 1/2 (meio) salário mínimo como patamar definido na linha de pobreza (Leis n. 10.836-01 Bolsa Família, n. 10.689-03 Programa Nacional de Acesso à Alimentação e n.10.219-01 Bolsa-Escola).

 

1 O SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL

A evolução socioeconômica faz com que as desigualdades se acentuem entre os membros da mesma comunidade e da comunidade internacional. A pobreza não é um problema apenas individual, mas sim social. (SANTOS, 2016).

A extrema concentração de renda, os salários baixos, o desemprego, a fome, a desnutrição juntamente com mortalidade infantil, marginalidade e violência entre outros fatores são expressões dos resultados das desigualdades sociais no Brasil.

Contudo o homem sempre buscou vencer essas dificuldades e assim garantir o sustento de sua família, porem existem algumas situações que exigem amparo do Estado para prevenir ou reparar suas necessidades, como situações de carência econômica, enfermidades, diminuição de capacidade de trabalho, entre outros.

Segundo Marisa Ferreira dos Santos, a evolução histórica da proteção social pode ser dividida em três etapas: assistência pública, seguro social e seguridade social. (SANTOS,2016).

A assistência pública foi a primeira etapa como proteção social, sendo desempenhada mais tarde através de instituições públicas. Mais uma vez, na visão de Marisa Ferreira dos Santos, não bastava apenas a caridade para o socorro dos necessitados em razão de desemprego, doenças, orfandade, mutilações etc. Era necessário criar outros mecanismos de proteção, que não se baseassem na generosidade, e que não submetessem o indivíduo a comprovações vexatórias de suas necessidades.

O seguro decorria do contrato, e era de natureza facultativa, isto é, dependia da manifestação da vontade do interessado. Mas a proteção securitária era privilegio de uma minoria que podia pagar o prêmio, deixando fora da proteção a grande massa assalariada. Era necessário, então, criar um seguro de natureza obrigatória, que protegesse os economicamente mais frágeis, aos quais o Estado deveria prestar assistência. (SANTOS, 2016).

Nas palavras de Fabio Zambitte Ibrahim, a seguridade social pode ser conceituada como rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações para o sustento de pessoas carentes, trabalhadoras em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida digna.

 

2 A ASSISTÊNCIA SOCIAL E SUA COBERTURA

Na carta magna, os direitos sociais encontram descritos no caput do artigo 6º: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. ” (BRASIL, 1988)

Moro (2001, p. 560) defende que a assistência social proporciona “a igualdade em uma economia de mercado”, por entender que “o Estado age para garantir o atendimento das necessidades de grupos sociais fragilizados no contexto da economia de mercado. ”

Na CRFB, o amparo (assistência social) aos membros da sociedade sem meios para fazer frente à própria subsistência se dá com os seguintes objetivos: família, maternidade, infância, adolescência, velhice, proteção e integração ao mercado de trabalho, habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.

O art. 203 da CF prescreve que a Assistência Social “será́ prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social”. Ou seja, àquelas pessoas que não possuem condições de manutenção própria (BRASIL, 1988).

A assistência social é regida por lei própria (lei no 8.742/93), que estabelece seu próprio conteúdo, disciplina e requisitos para concessão de benefícios e serviços. Trata-se de política pública não contributiva, destinada àqueles que provem os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento as necessidades básicas.

Os vulneráveis da sociedade precisam da assistência social para a sua inserção ou reinserção social e se não for a obstinação de todos para que os direitos destes hipossuficientes sejam atendidos, o próprio Estado Democrático de Direito estará irremediavelmente comprometido, bem como os seguintes fundamentos da República Federativa do Brasil: (cidadania, no sentido largo), dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho, sem prejuízo de outros.

Os objetivos da Assistência Social estão enumerados no art. 203 da CRFB/88: a proteção à família, à maternidade, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a habilitação e a reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Conforme determina a constituição, a ação estatal na assistência social será realizada com recursos do orçamento da seguridade social e baseada na descentralização político-administrativa.

Filho (1989, p. 39) refere-se ao Estado como: “Segundo ensina a doutrina tradicional, o Estado é uma associação humana (povo), radicada em base espacial (território), que vive sob o comando de uma autoridade (poder) não sujeita a qualquer outra (soberana). ”

E, o Estado brasileiro, nos termos do art. 18, da CRFB/88, tem definida a sua organização político-administrativa na qual compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, portanto, todos estes têm a obrigação de prestar a assistência social.

 

3 OS CRITÉRIOS AVALIATIVOS PARA CONCESSÃO DO BENEFICIO DA PRESTAÇÃO CONTINUADA

O Benefício de Prestação Continuada, também denominado de amparo assistencial, é a tradicional prestação pecuniária da Assistência Social. Instituído pela Lei n. 8.742/93, a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, que regulamentou o artigo 203, V, da Constituição Federal.

Conforme o artigo 20 da LOAS, tal benefício assistencial pode ser entendido como a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

O art. 4º do Decreto n. 3.298/99 conceitua a pessoa com deficiência como a que se enquadra nas seguintes categorias, que também tem definição especifica: deficiência física, deficiência auditiva, deficiência visual, deficiência mental e deficiência múltipla.

Como não se trata de benefício previdenciário, em razão da lógica de seu funcionamento, e tendo em vista o fim para o qual é destinado, não há que se falar em contribuição do assistido. Consequentemente, não existe período de carência, sendo apenas necessário a comprovação da condição de hipossuficiência econômica. Ou seja, para fazer jus ao amparo assistencial, o beneficiário não precisa ter contribuído para a Seguridade Social, basta não possuir outra fonte de renda.

Conforme o artigo 12, I, da Lei n. 8.742/93, compete à União responder pela concessão e manutenção dos Benefícios de Prestação Continuada, incluindo o seu financiamento. Já a responsabilidade pela operacionalização e execução das concessões é delegada ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, conforme o artigo 3º, do Regulamento de Prestação Continuada – RBPC, aprovado pelo Decreto n. 6.214/07.

O amparo assistencial não pode ser cumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da Seguridade Social ou de qualquer outro regime, exceto os de assistência médica e de pensão especial de natureza indenizatória.

Além do princípio da universalidade, o benefício assistencial em questão tem caráter personalíssimo, sendo consequentemente, intransferível. Portanto, tal prestação não gera direitos sucessórios, como também não dá direito a pensão por morte. Com o falecimento do assistido, o benefício assistencial é cancelado, não havendo possibilidade de transmissão desse mesmo benefício, por exemplo, para seus filhos ou cônjuge com a justificativa de que existiria uma relação de dependência. O que pode ocorrer, no caso em exame é, talvez o cônjuge ou o filho se enquadrarem nos critérios do benefício assistencial fazendo jus ao recebimento dessa prestação. Entretanto, é importante comentar que, o valor não recebido em vida pelo assistido será pago aos herdeiros, conforme artigo 23 do Regulamento do Benefício de Prestação Continuada, aprovada pelo Decreto n. 6.214/07.

É importante comentar que o benefício assistencial poderá ser pago a mais de um membro da família, desde que esses indivíduos comprovem os requisitos para sua concessão.

No que se refere às hipóteses de cessação do pagamento do amparo assistencial, pode ser citado a superação das condições que lhe deram origem, como por exemplo, o indivíduo deixou de ser considerado necessitado. A morte do assistido também é considerada outra hipótese de cessação do benefício, assim como a morte presumida declarada em juízo e a ausência do beneficiário declarada na forma da lei civil. Outra hipótese, é a não apresentação da declaração de composição do grupo e renda familiar quando da revisão do amparo assistencial. No que tange ao assistido que teve seu benefício deferido em razão de ser pessoa com deficiência, o não comparecimento ao exame médico pericial acarretará na cessação do pagamento do benefício.

Vale frisar que o Benefício de Prestação Continuada deve ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. O objetivo dessa revisão é evitar fraudes. Ademais, o benefício será cancelado quando constatado qualquer irregularidade na sua concessão ou utilização.

Destaca-se que, é possível que ocorra uma nova concessão do amparo assistencial ao indivíduo que teve o seu benefício cessado, em razão de ter conseguido trabalho remunerado, mas que sua situação regrediu novamente, voltando ao estado de hipossuficiência econômica, em virtude de ter sido demitido, por exemplo.

 

4 A VULNERABILIDADE SOCIAL E O CRITÉRIO DE MISERABILIDADE

O conceito de vulnerabilidade, pela sua capacidade de apreensão da dinâmica dos fenômenos, tem sido, na opinião de muitos autores, apropriado para descrever melhor as situações observadas em países pobres e em desenvolvimento, como os da América Latina, que não podem ser resumidas nas dicotomias pobres e ricos, incluídos e excluídos.

Dentre os vários enfoques atribuídos ao termo vulnerabilidade social, observa-se uma aceitável concordância, em volta de uma questão nodal: a capacidade do termo em captar situações intermediárias de risco localizadas entre situações extremas de inclusão e exclusão, dando um sentido dinâmico para o estudo das desigualdades.

Os estudos sobre vulnerabilidade social, nos países menos desenvolvidos, estão associados também à ideia de risco frente ao desemprego, à precariedade do trabalho, à pobreza, à falta de proteção social ou acesso aos serviços públicos, à fragilidade dos vínculos familiares e sociais.

A noção de vulnerabilidade social exprime, ainda, várias situações de precariedade e não apenas a de renda, como destaca Oliveira (apud YAZBEK, 2001, p.19):

Uma definição econômica de vulnerabilidade social é insuficiente e incompleta, mas deve ser a base material para o seu enquadramento mais amplo, incluindo também outras precariedades, como a fragilização de vínculos afetivos, tanto os relacionais como os de pertencimento, decorrentes também das discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, dentre outras.

A pobreza e as situações de grave miséria econômica trazem, em seu bojo, situações de extrema vulnerabilidade social caracterizada pela vida em condições adversas, esfacelando ou ainda impedindo laços de convivência social e familiar, levando ao abandono, ausência de cuidados e dos vínculos relacionais, devido ao cotidiano de luta pela sobrevivência.

As desigualdades de renda impõem sacrifícios e renúncias para toda a família. Petrini (2003) afirma que à medida que a família encontra dificuldades para cumprir satisfatoriamente suas tarefas básicas de socialização e de amparo/serviços aos seus membros, criam-se situações de vulnerabilidade. A vida familiar, para ser efetiva e eficaz, depende de condições para sua sustentação e manutenção de seus vínculos. A situação socioeconômica é o fator que mais tem contribuído para o declínio da família, repercutindo diretamente e de forma vil nos mais vulneráveis desse grupo; os filhos (crianças sem creche, escola; adolescentes, jovens sem expectativas), os idosos, as pessoas com deficiência, os sem trabalho.

A ausência do cumprimento da legislação de proteção social, aliada à ausência de políticas públicas de apoio, remete muitas famílias à condição de vulnerabilidade, às quais nem sempre conseguem cumprir sua função provedora e protetora, acarretando muitas vezes na perda da convivência familiar. Conforme entendimento de Gomes e Pereira (2005, p.361) o Estado reduz suas intervenções na área social e deposita na família uma sobrecarga que ela não consegue suportar tendo em vista sua situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Assim, considerando que a pobreza é apenas uma das diversas expressões da questão social, pondera-se pertinente a reflexão sobre a gravidade do quadro de pobreza e miséria, no Brasil, e sua influência no campo social e, principalmente, na área de atuação junto às famílias, na qual as políticas públicas ainda se ressentem de uma ação mais expressiva. Sobre esta questão Yazbek (2003, p.62) definiu que são pobres aqueles que, de modo temporário ou permanente, não têm acesso a um mínimo de bens e recursos sendo, portanto, excluídos em graus diferenciados da riqueza social.

 

5 ANALISE COMPARATIVA ENTRE A AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA FEDERAL E O PODER JUDICIÁRIO

Atualmente, existe grande divergência de entendimento entre a Administração Pública, representada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o Poder Judiciário, e também entre os próprios membros do judiciário acerca do requisito da miserabilidade trazido pelo parágrafo 3º, artigo 20, da Lei Orgânica da Assistência Social. O problema é saber se é possível ou não haver uma flexibilização desse critério em casos que seja claramente visível a condição de necessitado da pessoa com deficiência ou do idoso, no entanto, quando do cálculo da renda per capita familiar desse indivíduo, o valor supera 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

Para o INSS, o requisito da renda mensal familiar per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo é o único critério a ser levado em consideração para a aferição do estado de necessitado do indivíduo que almeja o recebimento do Benefício de Prestação Continuada.

O requisito trazido pela LOAS é considerado, pela grande maioria da doutrina e pelos tribunais pátrios, como um critério objetivo para a verificação da condição de necessitado do indivíduo. Entretanto, esse critério objetivo não deve ser o único levado em conta, pois, existem critérios subjetivos que deverão ser considerados quando da análise do caso concreto. Deve-se analisar e buscar todas as variáveis possíveis para assim se alcançar a justiça social.

Vale transcrever entendimentos jurisprudenciais do Egrégio Tribunal Regional Federal da 4º Região:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ADULTO, MAIOR, INVÁLIDO. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO DEVIDAMENTE DEMONSTRADA PELA PROVA MATERIAL. VULNERABILIDADE SOCIOECONÔMICA DO GRUPO FAMILIAR. ESTUDO SOCIAL. TEMA DA COMPOSIÇÃO DO CÁLCULO DA RENDA FAMILIAR PER CAPITA, QUANTO AO LIMITE OBJETIVO POSTO PELA LOAS (LEI ORGÂNICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL). 1. O Amparo Assistencial deve ser concedido às pessoas portadoras de deficiência, pela demonstração de não possuírem meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Quanto ao requisito da incapacidade, é suficiente para a concessão do benefício em questão que reste comprovada a incapacidade do segurado para o trabalho, sendo que o fato de ser o autor capaz para a vida independente não pode obstar a percepção do benefício, não se exigindo, pois, para tanto, que possua vida vegetativa ou seja incapaz de locomover-se. 3. O requisito econômico para a concessão do benefício consistente na exigência de que a renda familiar per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo (art. 20, caput e §3º da Lei nº 8.742/1993), deve ser entendido como um limite objetivo, sendo que a avaliação da miserabilidade do grupo familiar, na hipótese de superação daquele limite, seja procedida não de modo abstrato, mas considerando as peculiaridades do caso concreto. Afinal, despesas decorrentes dos necessários cuidados com a parte autora, em razão de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, importam em gastos - notadamente com medicamentos, alimentação, taxas, impostos, moradia, tratamento médico, entre outros -, que são, nesse sentido, relevantes para a avaliação da real situação econômica do grupo familiar. (TRF4, AC 2008.70.99.002936-1, Quinta Turma, Relatora Maria Isabel Pezzi Klein, D.E. 29/03/2010)64. (Grifo nosso)

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ARTS. 203, V DA CF/88 E 20 DA LEI 8.742/93. RENDA MÍNIMA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA. CUSTAS. 1. A concessão do amparo assistencial é devida às pessoas portadoras de deficiências e idosos, mediante a demonstração de não possuírem meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Tem entendido esta Corte, na linha de precedente do STJ, que o limite de ¼ do salário mínimo como renda familiar per capita representa apenas um parâmetro objetivo de miserabilidade, podendo ser excedido se o caso concreto assim o justificar. 3. A vida independente de que trata o art. 20, §2º da LOAS deve ser considerada sob a perspectiva da capacidade financeira, tanto que no dispositivo citado do parágrafo anterior foi inserido o conceito -chave "autonomia", a indicar que ao portador de necessidade especial não pode ser exigido que abra mão da sua individualidade para alcançar a mercê em questão, como que devendo depender de forma permanente de terceiros no seu dia-a-dia. 4. A correção monetária deve ser calculada pelo IGP-DI, incidindo a partir da data do vencimento de cada parcela, nos termos dos Enunciados das Súmulas 43 e 148 do STJ. 5. Os juros moratórios são devidos à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, na forma dos Enunciados das Súmulas 204 do STJ e 03 do TRF da 4ª Região e precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 6. Os honorários advocatícios, a cargo do INSS, são devidos no patamar de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação deste julgado, excluídas as parcelas vincendas, a teor da Súmula 111 do STJ e conforme entendimento pacificado na Seção Previdenciária deste TRF. 7. O INSS está isento do pagamento de custas quando litiga na Justiça Federal. (TRF4, AC 2002.70.10.001103-1, Quinta Turma, Relator Victor Luiz dos Santos Laus, DJ 13/07/2005)65. (Grifo nosso)

Ademais, corroborando a mesma linha de pensamento, cabe transcrever entendimento jurisprudencial do Colendo Tribunal Regional Federal da 2º Região:

PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PORTADORA DE EPILEPSIA E RETARDO MENTAL MODERADO. ESTADO DE MISERABILIDADE DA FAMÍLIA COMPROVADO. LEI Nº 8.742/93. - O benefício de amparo assistencial foi instituído para garantir a subsistência da parcela da população impossibilitada de trabalhar e sem meios próprios de subsistência, devido à idade avançada ou por ser portadora de deficiência, independentemente de qualquer reciprocidade contributiva. - O parâmetro objetivo da renda familiar per capita, em certas hipóteses, não pode derivar de uma interpretação estritamente literal de dispositivo legal que apenas cria um parâmetro, para casos independentemente de prova, especialmente naqueles casos em que, diante de circunstâncias peculiares, a renda prevista não assegura a efetiva sobrevivência e cuidados a que faz jus o ente familiar, em que se inclui o pretendente ao benefício (conf. voto do Ministro Gilmar Mendes, na Reclamação 4374 MC/PE, publicada no Informativo do STF nº. 454). - Assim, a comprovação da situação econômica do beneficiário e sua real necessidade não se restringe à hipótese do artigo 20, § 3º, da Lei 8.742/93, que estipula renda mensal familiar per capita não superior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo, pois tal condição pode ser verificada por outros meios de prova. - Na hipótese, o Estado de Miserabilidade está comprovado pela instrução do feito, documentos e depoimento pessoal, demonstrando que a Autora não tem condições de prover a própria subsistência ou ser mantida pela família, com direito ao tratamento médico de que necessita. - Agravo interno que se nega provimento. (TRF-2 - REO: 343911 RJ 2004.02.01.004858-4, Relator: Desembargadora Federal MARCIA HELENA NUNES/no afast. Relator, Data de Julgamento: 11/11/2008, PRIMEIRA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: DJU - Data: 19/12/2008 - Página: 44)66. (Grifo nosso)

O Egrégio Tribunal Regional Federal da 1º Região também apresenta a mesma linha de pensamento ora defendida neste trabalho. É o que se vê em linhas abaixo:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LEI Nº 8.742, DE 1993 (LOAS). REQUISITOS LEGAIS. IDADE SUPERIOR A 65 ANOS. HIPOSSUFICIÊNCIA. CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE. 1. Por se tratar de sentença líquida, aplicável o § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, razão pela qual a sentença não está sujeita ao duplo grau de jurisdição. 2. O benefício de prestação continuada é devido à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de têla provida por sua família. 3. A família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário-mínimo não é capaz de prover de forma digna a manutenção do membro idoso ou portador de deficiência física (§ 3º, art. 20, Lei 8.742/93). Contudo, o legislador não excluiu outras formas de verificação da condição de miserabilidade. Precedentes do STJ, da TNU e desta Corte. 4. Outro benefício assistencial ou previdenciário, de até um salário-mínimo, pago a idoso, ou aposentadoria por invalidez de valor mínimo paga à pessoa de qualquer idade, não deverão ser considerados para fins de renda per capita; devendo-se excluir tanto a renda quanto a pessoa do cômputo para aferição do requisito (PEDILEF 200870950021545, JUIZ FEDERAL SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, TNU - Turma Nacional de Uniformização, DJ 15/09/2009). 5. A parte autora atendeu aos requisitos legais exigidos: idade superior a 65 anos e renda per capita inferior a ¼ do salário-mínimo, viabilizada pela exclusão da renda do cônjuge idoso e do filho portador de necessidades especiais (fls. 10 e 24/48). 6. Embora a antecipação de tutela tenha sido deferida de forma irregular em razão da ausência de pedido expresso da parte autora, deve ser mantida, porque os recursos eventualmente interposto contra o Acórdão tem previsão de ser recebidos apenas no efeito devolutivo. 7. Apelação não provida. (TRF-1 - AC: 2200 MG 2005.38.04.002200-2, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Data de Julgamento: 05/12/2012, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.28 de 22/01/2013)67. (grifo nosso)

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a renda per capita familiar inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo configuraria uma presunção absoluta de miserabilidade, dispensando outros meios de provas. Entretanto, ultrapassando o limite estabelecido, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de necessitado, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência. Em outras palavras, o STJ entende que o requisito da miserabilidade trazido pela LOAS não é um critério absoluto, pois deve ser considerado como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência da pessoa com deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade do requerente.

Percebe-se que critérios subjetivos são importantes para a aferição no caso concreto do cumprimento do requisito da miserabilidade. Deve-se mesclar, baseado nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o critério objetivo trazido pela lei com o subjetivo, que dependerá de cada caso concreto.

Com base no que foi exposto, é possível perceber que desde a promulgação da LOAS em 1993, houve um processo de inconstitucionalização do artigo 20, parágrafo 3º.

Essa inconstitucionalidade progressiva do dispositivo em comento fez com que vários magistrados estabelecessem o valor de metade do salário mínimo como requisito para aferição da condição de miserabilidade do indivíduo, pois, é o estabelecido atualmente pelos programas de Assistência Social no Brasil, como referencial econômico para a concessão de benefícios.

Reforçando o pensamento aqui defendido, cabe transcrever outro trecho da mesma decisão do Ministro Gilmar Mendes, citada acima na Reclamação 4374 – LOAS – Benefício Assistencial:

Nesse meio tempo, observou-se certa proliferação de leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas; e o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03). Isso foi visto pelos aplicadores da LOAS como um fato revelador de que o próprio legislador estaria reinterpretando o art. 203 da Constituição da República. Abria-se, com isso, mais uma porta para a concessão do benefício assistencial fora dos parâmetros objetivos fixados pelo art. 20 da LOAS. Juízes e tribunais passaram a estabelecer o valor de ½ salário mínimo como referência para a aferição da renda familiar per capita [...]68.

É perceptível a divergência de interpretação entre a Administração Pública e o Poder Judiciário, e também entre os próprios membros do judiciário acerca do requisito de miserabilidade da LOAS. Esse critério para aferição da necessidade do indivíduo é considerado inconstitucional pela maioria dos doutrinadores e pelos tribunais do nosso país. Por isso, deve haver a sua flexibilização em situações que sejam claramente visível a condição de necessitado ou de extrema pobreza da pessoa com deficiência ou do idoso, que, no entanto, quando do cálculo da renda per capita familiar desse indivíduo, o valor seja superior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

Poderá ser utilizado tanto a interpretação que mescla o critério objetivo trazido pela LOAS com requisitos subjetivos, que dependerão da análise do caso concreto, bem como a interpretação que considera como parâmetro para aferição do critério da miserabilidade o valor de meio salário mínimo. Estas duas interpretações são coerentes com o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da solidariedade social e o princípio da justiça social. Esta medida deverá ser tomada até o momento que o Poder Legislativo crie outro critério condizente com a realidade fática e social em que vivemos.

 

6 O ART.20 § 3º DA LEI 8.742/93 SOB A PERSPECTIVA DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

A teoria jurisprudencial do mínimo existencial argumenta que a dignidade da pessoa humana, preceito ético e fundamento constitucional, exige do Estado não apenas o respeito e proteção relativos aos direitos de abstenção, chamados direitos fundamentais de primeira geração, mas também a garantia de efetivação dos chamados direitos sociais, de segunda geração. Trata-se da garantia e preservação de condições mínimas para uma vida digna, de assegurar o acesso a condições materiais mínimas dos cidadãos para realização pessoal.

É, segundo Ingo Sarlet (2005, p. 93), não apenas "um conjunto de prestações suficientes apenas para assegurar a existência (a garantia da vida) humana, [...] mas uma vida com dignidade, no sentido de vida saudável".

As origens da teoria residem nas ideias de dois filósofos: John Rawls e Immanuel Kant. Kant, ao definir o homem como um fim em si mesmo e não uma função do Estado que atribui ao ser humano uma dignidade ontológica, intrínseca. A partir dessa construção ideológica é que pode se exigir que o direito e o Estado estejam organizados em benefício dos indivíduos e não o contrário. Rawls, por sua vez, estabelece sua ideia de justiça a partir do mínimo existencial, a que ele define como condições prévias para o exercício dos direitos fundamentais, sendo que abaixo de certo nível de bem-estar material e social, de treinamento e de educação, as pessoas simplesmente não podem participar da sociedade como cidadãos, e muito menos como cidadãos iguais. (KANT, 2005) (RAWLS, 2008).

A decisão dos Ministros do Supremo Tribunal Federal no julgamento dos Recursos Extraordinários e da Reclamação supramencionada está alinhada com a teoria do mínimo existencial. Ainda que a expansão do critério quantitativo para além de seu texto original signifique gastos adicionais ao erário público, prevalece o ideário de concretização do direito fundamental à assistência social, presente na Constituição Federal. Ademais, como já explanado anteriormente, o aumento nos gastos com benefícios de prestação continuada não significaria um gasto maior do que a União seria capaz de suportar.

O texto da Carta Magna deixa claro um dos objetivos do ordenamento pátrio: promover a justiça por meio da inclusão social. Garantir as condições mínimas para uma existência digna é uma obrigação perante a sociedade da qual o Estado não pode se omitir com a desculpa de que o Legislativo entendeu ser melhor assim. Há tempos discute-se a crise de legitimidade do Legislativo e, ainda que boa parte dessas críticas valha também para o Judiciário, nos parece que sua decisão de renovar um critério obsoleto reflete muito mais os anseios da sociedade que obedecer a um texto de lei estagnado em nome de uma suposta obediência a princípios constitucionais. Fosse esse o casso, ainda defenderíamos o princípio que entendemos mais importante no ordenamento jurídico e aquele que deve nortear o processo legislativo em todas suas fases: o princípio da dignidade da pessoa humana.

Segundo a lição de Immanuel Kant de que cada indivíduo é um fim em si mesmo, sendo a dignidade um valor intrínseco da humanidade, lhe parece impossível delimitar a análise da miserabilidade a um critério que não contemple em sua totalidade o objetivo da norma constitucional: amparar um ser humano desprovido inclusive dos meios físicos para garantir o próprio sustento. Utiliza também o argumento da solidariedade social, defendendo a ideia de que é obrigação do indivíduo a preocupação com outros indivíduos inseridos na mesma sociedade que a sua, um “valor comunitário” da dignidade humana, presente no art. 3º, inciso I, da Constituição Federal. Finalmente, utiliza o argumento do mínimo existencial, segundo o qual “existe certo grupo de prestações essenciais básicas que se deve fornecer ao ser humano para simplesmente ter capacidade de sobreviver e que o acesso a tais bens constitui direito subjetivo de natureza pública” – independente do argumento da reserva do possível, acrescentaríamos nós. (KANT, 2005).

Questiona-se a suficiência do critério na totalidade dos casos ao usar como exemplo o caso concreto que deu origem à ação, em que a requerente, que morava com seu esposo e um filho deficiente, teve o pleito de seu benefício negado por ultrapassar em R$ 17,00 o limite do parâmetro legal – na época, recebia aposentadoria no valor de R$ 400,00, correspondente a R$ 133,00 per capita, tendo o salário-mínimo da época o valor de R$ 350,00 e, portanto, excedendo infimamente o limite de R$ 116,00, segundo os critérios adotados pela lei. Levando em consideração o avanço da inflação e os reajustes insuficientes do salário mínimo, entendeu que a quantia prevista em lei era insuficiente para superar a linha da pobreza. Além disso, ressaltou o perigo em reduzir miserabilidade unicamente ao critério de renda, uma vez que situações específicas, como no caso de uma família de membros com necessidades especiais ou com idosos em situação de saúde debilitada, podem significar um aumento anormal nos gastos do núcleo familiar em comparação com outras famílias.

 

CONCLUSÃO

A Assistência Social constitui um dos pilares da Seguridade Social, juntamente com a Saúde e a Previdência Social. Conforme os artigos 194, caput e 203, caput da Constituição Federal, tem-se a Seguridade Social como um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à Saúde, à Previdência e à Assistência Social, e que esta última será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à Seguridade Social.

Nesse palmilhar, a Constituição Federal garante em seu texto constitucional vida digna a cidadãos; torna-se imprescindível analisar o contido na Constituição Federal em seu artigo 203, inciso V, regulamentado pela lei 8.742 de 1993, em seu artigo 20 da Lei Orgânica de Assistencial Social (LOAS), no qual firmou uma série de garantias de proteção aos direitos sociais, implicando assim, maior amparo aos direitos individuais.

O benefício de prestação continuada é previsto como garantia à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, desde que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família, neste sentido indaga-se: o critério de 1/4 (um quarto) para aferição do benefício de prestação continuada da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) atende à dignidade humana?

Dessa forma, levantou-se a hipótese, que o julgador deve se reportar à Constituição, que pugna pela dignidade da pessoa humana, combate à pobreza e construção de uma sociedade livre, justa e solidária buscando no caso concreto a verificação efetiva e concreta da hipossuficiência do requerente do benefício de prestação continuada.

O julgador deve estar ciente que a análise dos pressupostos da concessão do benefício assistencial envolve uma reflexão que vai além dos limites objetivos absolutos que a Lei nº 8.742/1993 e seus decretos regulamentadores originariamente pretenderam estabelecer. Isto porque o exame da necessidade da concessão da prestação assistencial abarca diversas questões fáticas, que devem ser avaliadas caso a caso. Com efeito, os critérios legais podem ser flexibilizados dependendo das condições pessoais do postulante ao benefício. A análise da concessão, deve se reportar ao princípio da dignidade da pessoa humana.

 

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Data da conclusão/última revisão: 17/9/2019

 

Como citar o texto:

PLOIA, Saldanha Rodrigues; CHAVES, Fábio Barbosa..(In)constitucionalidade do critério de miserabilidade para concessão do benefício de prestação continuada. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1664. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-previdenciario/4610/-in-constitucionalidade-criterio-miserabilidade-concessao-beneficio-prestacao-continuada. Acesso em 6 nov. 2019.

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