Introdução.

             As inovações ocorridas após 1994, também no denominado processo de conhecimento, visam amoldar o texto processual brasileiro as exigências modernas. No dizer de THEODORO JÚNIOR “ Todas essas inovações atestam um só e claro propósito legislativo: reforçar a eficiência do processo de execução. E quando assim age, cumpre-se o maior desígnio do processo moderno, que é o da efetividade”.

            O processo nos tempos atuais, segue o mestre mineiro, “ não pode ser visto como mero rito ou procedimento. Mas igualmente não pode reduzir-se a palco de elucubrações dogmáticas, para recreio dos pensadores esotéricos. O processo de nosso final de século ( atual século XXI) é sobretudo um instrumento de realização efetiva dos direitos subjetivos violados e ameaçados. E de realização pronta, célere e pouco onerosa. Enfim, um processo a serviço de metas não apenas legais, mas, também, sociais e políticas. Um processo que, além de legal, seja sobretudo instrumento de justiça. Assim , o devido processo legal dos tempos de João Sem Terra tornou-se, em nossa época, o processo justo”.

             Marioni, em recente e importante obra sobre os novos rumos do processo civil moderno, salienta a importância da mudança já inaugurada, considerando a postura liberal do início do século XX, em total  confronto com os regramentos constitucionais impostos ao estado social, participativo e democrático dos tempos atuais. Por  conta disto, asseverou que “ O operador jurídico, por sua vez, tem o dever de imbuir-se da mentalidade instrumentalista, já que falar em instrumentalidade do processo ou em sua efetividade significa, como diz Dinamarco, falar dele como algo posto à disposição das pessoas com vistas a fazê-las mais felizes ( ou menos infelizes), mediante a eliminação dos conflitos que os envolvem, com decisões justas. Melhor é falar-se, então, em acesso  à ordem jurídica justa: acesso á justiça que quer dizer acesso a um processo justo, a garantia de acesso a uma justiça imparcial, que não só possibilite a participação efetiva e adequada das partes no processo jurisdicional, mas que também permita a efetividade dos direitos, consideradas as diferentes posições sociais e as específicas situações de direito substancial . Acesso à justiça significa, ainda, acesso à informação  e à orientação jurídicas e a todos os meios alternativos de composição de conflitos”.

              O direito a um processo justo,, como visto, reclama uma tutela eficaz (resultados concretos) e temporalmente adequada. A morosidade, não se pode olvidar, atinge mais de perto o cidadão hipossuficiente, funcionando como formidável mecanismo de pressão à obtenção de transações injustas, sempre em favor da parte sem razão e, via de regra, mais abastada, A lentidão do processo “ pode ser convertida num custo econômico adicional, e este é proporcionalmente mais gravoso para os pobres”.

              A função social do processo civil moderno, já reconhecida por Barbosa Moreira em 1986, reclama nova postura interpretativa. Reclama mais ainda , total revisão dos institutos fundamentais do direito processual.

              Em crítica velada à autonomia do início do século e, com apoio no artigo 75, do revogado Código Civil, com muita propriedade e inteira razão asseverou Kazuo Watanabe que  “ não fosse a intransigência doutrinária, surgida na fase em que o Direito Processual aspirava á autonomia como um ramo da ciência jurídica , e o art. 75 do Código Civil poderia ter sido lido como explicitação, a nível infraconstitucional , do princípio da efetividade e da adequação da tutela jurídica processual”. O direito de ação , com vistas à efetividade do processo, pois, só pode ser bem compreendido mediante uma necessária aproximação entre os planos material e processual . Mais uma vez com apoio em Barbosa Moreira , Lê-se no art. 75 do Código Civil: ‘ A  todo direito corresponde uma ação que o assegura ‘. Esse texto, quase ação que o assegura’. Esse texto, quase setuagenário, refletia decerto idéias hoje abandonadas; mas não seria tão espantoso que uma ‘releitura’ sem  preconceitos lograsse extrair da antiga partitura sonoridade modernas”( grifei).

             O processo, por outro lado, considerado atualmente mero procedimento em contraditório, só pode estar assentado na participação igualitária das partes. Todavia, para que seja alcançado o resultado justo do processo , não basta a isonomia apenas formal, cumprindo ao operador do direito velar pelo contraditório travado com “paridade de armas”, conforme expressão cunhada por Tarzia e tão ao gosto de Marioni. Em síntese, a igualdade de tratamento das partes no processo deve ser substancial e não apenas aparente ( formal ), sendo inegável a necessidade de tratamento desigual para situações demasiadamente distintas. A realidade social não pode ser desprezada pelo que , “ cuida-se das possibilidades de estimular a marcha em direção a uma igualdade maior, no sentido da eliminação – ou, quando menos, da atenuação  - das diferenças de tratamento dos membros  da comunidade em razão de diversidades de riqueza , de posição social, de cultura, de pertinência a esta ou aquela classe , raça, credo religioso ou corrente política. De outro lado, reclama atenção a questão da capacidade pode falar numa prestação ou, em outras palavras, tutela jurisdicional . A tutela jurisdicional, em face das diferentes necessidades de proteção reveladas pelos direitos subjetivos, podem ser resumidas a três modalidades, ainda conforme Lima Guerra . São elas: a) tutela declaratória , que tem por escopo eliminar a incerteza sobre a existência ou inexistência de um certo direito subjetivo; b) tutela constitutiva , quando existe a necessidade de alteração da situação jurídica travada entre os sujeitos , para o fim de criar , extinguir ou modificar direitos subjetivos; c) tutela executiva ou satisfativa  ( Lei n. 11.232/05), quando a necessidade aponta simplesmente para a realização concreta ( material ) de certo direito subjetivo . A doutrina brasileira , mormente após Pontes de Miranda , cuidou de acrescer à concepção trinária supra , mais duas manifestações de tutela jurisdicionais , as chamadas “ tutelas executivas jurisdicionais, as chamadas “ tutelas executivas lato sensu” e mandamental “. A primeira , quando a prestação jurisdicional se encerra por sentença de eficácia imediata, dispensada a necessidade de execução posterior para realização do direito subjetivo reconhecido; a segunda , resultado de ato judicial com força dita mandamental  e que, por isto, obriga ao cumprimento por parte do vencido, sob pena da desobediência e aplicação imediata de medidas coativas  (inclusive prisão).

              Mais uma vez Marioni, com argúcia , ressalta a existência entre nós, ainda,  de uma sexta modalidade de tutela , de natureza preventiva. È  a chamada tutela inibitória que, notadamente para a proteção de direitos de conteúdo não patrimonial , visam impedir a ocorrência do ilícito, sua continuação ou repetição. A prestação jurisdicional in casu, “ necessita , na maioria das vezes, impor um não fazer ao demando, o que , evidentemente , não pode ser feito através das sentenças clássicas , já que nenhuma delas permite ao juiz ordenar sob pena de multa”.

             Conclusão o presente estudo, pois, não pode prescindir da moderna compreensão do processo civil e, para tanto, imperiosa a releitura de seus institutos fundamentos (jurisdição, processo e ação). Outrossim, revela-se inafastável nos tempos atuais, a interpretação do processo conforme a Constituição Federal, repositório principal dos direitos e garantias fundamentais do cidadão.

 

Biografia

DIDIER JR, FREDIE. Curso de Direito Processual Civil. 7ª edição. Vol. I. Salvador: Podivm, 2007.             DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 4ª edição revista e atualizada. São Paulo: Malheiros, 1994.

                        MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento. 3ª edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Ed. RT, 2006.

 

Como citar o texto:

COSTA, Flavio Ribeiro da.Novas Linhas no processo civil em sua função social. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 240. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-processual-civil/1799/novas-linhas-processo-civil-funcao-social. Acesso em 20 ago. 2007.

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