A busca pelos avanços tecnológicos acenou ao fenômeno que hoje denominamos de comércio eletrônico, que em síntese, é o conjunto de operações de uma compra e venda de mercadorias ou prestações de serviços por meio eletrônico, ou em outras palavras, as transações com conteúdo econômico realizado por intermédios de meios digitais (Aldemario Araújo de Castro).  Essa nova modalidade de comércio introduzida substancialmente pela Internet proporcionou a quebra de barreiras físicas, por outrora, possibilitou a desmaterialização de um bem corpóreo (tangível ou material) para a forma do que chamaremos de bem incorpóreo (intangível ou imaterial).

            Acerca dessa transição, citemos a aquisição de um software realizado pelo sistema download, na qual a principal discussão giraria em torno do tratamento a que esse bem recebe simplesmente pelo fato de ser um bem passível de desmaterialização. A Fazenda Estadual do Estado de São Paulo, para fins de incidência do ICMS, prevê a incidência de ICMS sobre os programas de computador somente quando sua comercialização realizar-se mediante suporte físico. 

            Assim consignado pelo Decreto nº 51.619 de fevereiro de 2.007, no qual prevê:            

Artigo 1° - Na operação realizada com programa para computador ("software"), personalizado ou não, o ICMS será calculado sobre uma base de cálculo que corresponderá ao dobro do valor de mercado do seu suporte informático.

            A precária legislação e a falta de respostas (vide resposta à consulta nº 891/99 in: www.fazenda.sp.gov.br) não nos permite avaliar qual forma devemos proceder em relação aos bens adquiridos digitalmente, entretanto, é possível verificar de logo a sua incidência por caracterizar autêntica mercadoria.                         O cerne do problema está em afirmar se o software adquirido pelo download continua recebendo o tratamento de mercadoria para fins de tributação de ICMS ou a perde. A par disso, um grande escol da doutrina se prende a um conceito introduzido pelo o Direito Comercial, e que atualmente não representa a realidade, ou seja, é um conceito hoje deficiente. José Eduardo Soares de Mello, Alcides Jorge da Costa,  Hugo de Brito Machado e Sidney Saraiva Apocalypse entendem que um dos requisitos essenciais da mercadoria é a corporalidade, com isso afastaria o imposto nessas operações já que o software passou para o estado incorpóreo, entretanto, entendemos que a nova realidade introduzida pela era da informática fez com que esse requisito esteja convictamente posto em xeque, talvez esse critério caísse perfeitamente aos séculos passados, na qual as trocas eram feitas fisicamente e não havia a possibilidade de desmaterialização de bens. Portanto um conceito apropriado consiste em dizer que mercadoria é todo bem corpóreo ou incorpóreo sujeito à mercancia.

            Interessante destacar que na Alemanha essa distorção de conceitos advindos de outros ramos do direito é parcialmente observada na Lei de Adaptação Tributária do referido país, basta analisarmos o que dispõe sobre Abuso de Direito:

            ‘‘A obrigação tributária não pode ser evitada, nem reduzida pelo abuso das formas, nem pela interpretação abusiva das possibilidades formais do Direito Privado.’’             Parágrafo único. Em caso de abuso, os impostos devem ser cobrados conforme uma interpretação legal adequada aos efeitos, situação e fatos econômicos.

            Portanto, questões que levem a outra interpretação desde logo estão afastadas, pois no campo do Direito Fiscal (incidência do ICMS) não nos cabe analisar a estrutura do software, questões atinentes ao direito autoral e outras que se fazem desnecessárias. É bem verdade que alguns juristas se preocupam com a ontologia (natureza) dos vocábulos, entretanto, ficamos com a análise à vista da sua  negociação frente ao comércio.

            Lembramos apenas do posicionamento do Supremo Tribunal Federal, na qual fez necessária a classificação de dois tipos de software: ‘‘de prateleira’’ e feito por ‘‘encomenda’’. Assim a incidência de ICMS será encontrada apenas na aquisição do software ‘‘de prateleira’’, que são aqueles produzidos em massa e vendidos nos supermercados. Para Clélio Chiesa, são aqueles programas padrões, como o Windows, Word, PowerPoint, etc. No mais, acrescenta, Marcelo de Carvalho Rodrigues chamando-os de software ‘‘of the shelf’’, que possui como caracteres a venda em postos indistintos, a produção em série, e a destinação a um número indefinido de consumidores, o que exclui a sua feição de serviço.

            Por tais razões fortes, não restam dúvidas quanto à incidência do ICMS na aquisição do software adquirido digitalmente em caráter ‘‘de prateleira’’, outros pontos importantes (estabelecimento virtual, poderes da fiscalização, que não descaracterizam a incidência já aprovada) merecem seu devido destaque, todavia, por essa abordagem ser profunda será conjuntamente analisada oportunamente.

BIBLIOGRAFIA

APOCALYPSE, Sidney Saraiva. Comércio Eletrônico: Importação, Exportação, Estabelecimento Virtual - Atos Mercantis – Conflitos. Revista de Direito Tributário Atual. V.81, São Paulo, 2000. CASTRO, Aldemario Araújo de. Os meios eletrônicos e a tributação.  Versão eletrônica. CEZAROTI, Guilherme. ICMS no Comércio Eletrônico. São Paulo, MP Editora, 2005. CHIESA, Clélio. Competência para tributar as operações com programas de computador (software). Revista Tributária e de Finanças Públicas. n.36, São Paulo, RT, 2001. GONÇALVES, Renato Lacerda de Lima. A Tributação do Software no Brasil. São Paulo, Quartier Latin, 2005. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 27ª ed. São Paulo, Malheiros, 2006. RODRIGUES, Marcelo de Carvalho. Direito Eletrônico – a Internet e os tribunais. OPICE BLUM, Renato (coord.), São Paulo, Edipro. SOARES DE MELO, José Eduardo. ICMS: Teoria e Prática. 3ª ed. São Paulo, 1998.

 

Como citar o texto:

KANO, Leonardo Akira.O ICMS na aquisição de software realizado por meios eletrônicos. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 251. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-tributario/1848/o-icms-aquisicao-software-realizado-meios-eletronicos. Acesso em 11 nov. 2007.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.