RESUMO
Este artigo apresenta resultados de uma pesquisa sobre o instituto da fraude à execução, foram estudados os requisitos para o seu reconhecimento e efetividade. Com a realização do presente estudo foi possível descrever os elementos subjetivos para a configuração da fraude à execução; verificar as hipóteses expressamente previstas em lei; levantar as consequências sofridas pelo adquirente do bem; e sobre a fraude à execução no processo tributário. Para a realização do presente estudo e garantia de resultados sobre o tema, foi utilizado uma pesquisa exploratória, bibliográfica, descritiva e documental, através de uma abordagem qualitativa e a forma de análise utilizada foi análise de conteúdo, com escrita descritiva e narrativa.
Palavras-chave: Consequências. Execução. Fraude.
ABSTRACT: This article presents results of a research on the institute of execution fraud, the requirements for its recognition and effectiveness were studied. With the accomplishment of the present study it was possible to describe the subjective elements for the configuration of the fraud to the execution; verify the hypotheses expressly provided by law; to draw the consequences of the acquirer of the property; and on fraud to execution in the tax process. For the accomplishment of the present study and guarantee of results on the subject, an exploratory, bibliographic, descriptive and documentary research was used, through a qualitative approach and the form of analysis used was content analysis, with descriptive and narrative writing.
Keywords: Consequences. Execution. Fraud.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho apresenta um estudo acerca do instituto da fraude à execução, essa pesquisa é imprescindível considerando-se o crescimento da facilidade no acesso ao crédito, de maneira que os índices de inadimplência no Brasil são elevados, acarretando vários contratos firmados, que não são pagos. Dessa forma, o que faz com que sejam ajuizadas ações de execução em face dos devedores.
A legislação que vigora é clara e explícita quanto aos bens impenhoráveis e às condições da penhora, apesar disso sabe-se que a fraude à execução ainda assim ocorre.
O método utilizado para adquirir informações para o presente estudo foram pesquisas jurisprudenciais, legislativas e doutrinárias no âmbito do Direito Tributário, Direito Processual Civil e Direito Constitucional. O presente estudo é relevante e justifica-se pelo grande número de fraudes à execução, sendo a pesquisa útil em propor um debate sobre as maneiras para a detecção de fraudes, de forma a cumprir a legislação que vigora no país.
É importante lembrar que durante um longo período, predominou o entendimento de que, quem adquiria bens do devedor, enquanto existia contra ele algum processo em andamento, presumia-se de má-fé. No entanto, ressalta-se que a má-fé daquele que adquiria diretamente do devedor era presumida, porém se houvessem alienações sucessivas, sobre os adquirentes posteriores, não havia essa presunção.
Esse entendimento mudou no ano de 2009 quando foi publicada a Súmula 375 do STJ prevendo que “o reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”.
Assim, questionou-se nesta pesquisa sobre quais seriam os requisitos para o reconhecimento e efetividade da fraude à execução. Nesse sentido, percebeu-se que o reconhecimento da fraude à execução ocorre de maneira incidental dentro do processo de execução e não acarretará reflexos na validade do negócio jurídico, mas, pode acarretar em sua eficácia.
Quando reconhecida a fraude à execução, o negócio jurídico conhecido continua sendo válido, mas os pactuantes não poderão contrariar os efeitos em face do credor, no que compreende ao crédito que foi frustrado.
1. FRAUDE À EXECUÇÃO
A fraude à execução é um instituto de natureza processual, que significa, a oneração de bens ou na alienação de bens sem reserva de patrimônio suficiente para o cumprimento de uma obrigação pecuniária que já é objeto de processo judicial.
1.1 CONCEITO DE FRAUDE À EXECUÇÃO
A fraude à execução é a alienação de bens pelo devedor, no curso de um processo capaz de reduzi-lo à insolvência, sem a reserva ao seu patrimônio de bens para garantir o débito da obrigação pecuniária.
Este instituto provoca a ineficácia do negócio jurídico, relativamente ao credor, o que poderá ser declarado no curso do processo de execução. Consiste em ato gravoso, pois gera danos aos credores e atenta contra o eficiente desenvolvimento da atividade jurídica. Constituindo-se em ato atentatório à dignidade da justiça.
Nas palavras de Montenegro Filho (2009), o palavra “fraude” significa
O comportamento adotado pelo devedor pode caracterizar fraude, entendida como embuste, tentativa de se locupletar de forma indevida, como meio ardil, malicioso, evitando que o seu patrimônio seja desfalcado para o cumprimento de obrigações assumidas anteriormente. A palavra fraude origina-se do latim fraus, sendo lexicalmente definida como dolo, burla, engano (MONTENEGRO FILHO, 2009, p. 320).
O CPC de 1973 configurava fraude à execução como ato de alienação ou oneração de bens do devedor quando o bem for litigioso ou quando, ao tempo da alienação, correr, contra o devedor, demanda capaz de reduzi-lo à insolvência, de acordo com o art. 593, I e II (CPC,73). O art. 593 do CPC de 1973, que trata da fraude à execução foi trazido para o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), em seu art. 792 (CPC, 2015) que melhorou o antigo texto.
CPC. Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução:
I - quando sobre o bem pender ação fundada em direito real ou com pretensão reipersecutória, desde que a pendência do processo tenha sido averbada no respectivo registro público, se houver;
II - quando tiver sido averbada, no registro do bem, a pendência do processo de execução, na forma do art. 828;
III - quando tiver sido averbado, no registro do bem, hipoteca judiciária ou outro ato de constrição judicial originário do processo onde foi arguida a fraude;
IV - quando, ao tempo da alienação ou da oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência;
V - nos demais casos expressos em lei.
Assis (2010, p. 301) reflete ainda sobre o art. 792 do Código de Processo Civil e afirma que “estima fraudulenta a alienação de bens quando sobre eles pender ação fundada em direito real, pelo momento da alienação no curso do processo de conhecimento.”
A fraude à execução causa prejuízo ao devedor e um agravo à efetividade da atividade jurisdicional, Didier Jr. (2009, p. 307) menciona os seguintes artigos:
Art. 615-A, § 3º Presume-se em fraude à execução a alienação ou oneração de bens efetuada após a averbação (art. 593).
(CPC). Art. 672, § 3º Se o terceiro negar o débito em conluio com o devedor, a quitação, que este lhe der, considerar-se-á em fraude de execução.
(CPC). Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga. (Lei 8.009/90).
Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. (CTN). (DIDIER JÚNIOR, 2009, p. 307).
O entendimento de Oliveira (1988) a respeito do instituto da fraude à execução é de que ela se configura como um instituto de direito público que está incluso no âmbito do Direito Processual Civil e é importante destacar que para o nobre doutrinador, a finalidade desse instituto é coibir e tornar ineficaz a prática de atos fraudulentos.
A fraude à execução só acontece com processo que encontra-se em andamento, Didier Jr. (2009) define a fraude como uma manobra ilegal, que prejudica os interesses do credor sendo, por óbvio, uma conduta contrária à boa-fé.
O legislador pátrio apresenta a fraude nos artigos 158 a 164, do Código Civil Brasileiro (CC, 2015):
Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.
§ 1 - Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente.
§ 2 - Só os credores que já o eram ao tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles.
Art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro contratante.
Art. 160. Se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a citação de todos os interessados. Parágrafo único. Se inferior, o adquirente, para conservar os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real.
Art. 161. A ação, nos casos dos arts. 158 e 159, poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido de má-fé.
Art. 162. O credor quirografário, que receber do devedor insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu.
Art. 163. Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedor insolvente tiver dado a algum credor.
Art. 164. Presumem-se, porém, de boa-fé e valem os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural, ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família. (CC, 2015):
O instituto da fraude à execução é um ato ou vários atos concretizados na existência de demanda judicial em que o devedor, oculta o seu patrimônio, para que, desse modo, não seja possível ocorrer a constrição patrimonial no âmbito judicial, isso acaba frustrando o processo executório e afronta o poder jurisdicional.
1.2 RECONHECIMENTO DA FRAUDE À EXECUÇÃO
O reconhecimento da fraude à execução acontece de forma incidental dentro do próprio processo de execução e não acarretará reflexos na validade do negócio jurídico, mas de modo relativo, poderá acarretar sim, em sua eficácia.
Quando reconhecida a fraude à execução, o negócio jurídico conhecido continua sendo válido, mas os pactuantes não poderão contrariar os efeitos em face do credor, no que compreende ao crédito que foi frustrado.
Para Didier Jr., (2009, p. 301-302):
A fraude pode ser reconhecida incidentalmente no processo executivo, ou alegada como matéria de defesa em sede de embargos de terceiro, opostos pelo beneficiário do ato fraudulento. E, uma vez reconhecida a fraude e subtraído o bem do terceiro beneficiário, caberá a esse, por ação de regresso contra o devedor, se for o caso, pleitear a restituição do que pagou a uma indenização por perdas e danos eventualmente sofridos. (DIDIER JR., 2009, p. 301-302)
O requisito que confirma o reconhecimento de fraude à execução é a averbação da certidão comprobatória de ajuizamento de ação. É por meio da averbação da certidão comprobatória de ajuizamento de ação que se dá o registro público da questão em face do devedor da dívida pecuniária.
Gonçalves (2012) também afirma que por muito tempo prevaleceu o entendimento de que o indivíduo que adquiria bens do devedor, quando existia algum processo pendente em seu desfavor era considerado de má-fé, pois era seu dever exigir do alienante certidão negativa.
Entretanto, de acordo com o que já foi mencionado, anteriormente neste trabalho, este entendimento mudou com a Súmula 375 do STJ, ou seja, se não houver registro, caberá ao credor provar que o adquirente estava agindo de má-fé.
Para Gonçalves (2012), a má fé não se presume pelo fato de o adquirente poder exigir certidões do distribuidor. É importante perceber que entre os direitos do credor e os dos adquirentes de boa-fé, o STJ optou por proteger estes últimos.
Contestando desse modo as indagações realizadas, é necessário sim que o adquirente do bem da oneração saiba que existe a pendência de ação, assim como demanda que possa reduzir à insolvência, para que esteja comprovada e configurada a fraude à execução, se tiver agido de má-fé, conforme estabelece a Súmula 375 do STJ.
Deste modo, a fraude à execução, conforme a Súmula 375 do Superior Tribunal de Justiça, ocorre na observância, ou não, do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.
Ainda citando a súmula 375 do Superior Tribunal de justiça, vejamos a seguinte decisão:
FRAUDE À EXECUÇÃO. MÁ-FÉ DO ADQUIRENTE DO BEM PENHORADO. 1. Nos termos do enunciado n. 375 do STJ, o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. 2. Caso em que os elementos contidos nos autos, ao menos por ora, não autorizam a conclusão de que o adquirente do bem imóvel penhorado nos autos da execução tenha agido de má-fé. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (Agravo de Instrumento Nº 70039920608, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 16/12/2010) (JUSBRASIL, 2010)
No momento em que o devedor da obrigação pecuniária não age de boa-fé em face do credor e aliena ou onera seus bens, após o ajuizamento do processo que reincida sobre bem, ou bens que o façam a restar insolvente, ou qualquer outro caso que esteja previsto em lei, de acordo com os termos do art. 593, CPC, estará configurada a fraude à execução.
Importante lembrar sobre o princípio da responsabilidade patrimonial que prevê que os bens do devedor devem suprir obrigação pecuniária. Desse modo, conforme doutrina Didier Jr. (2009, p. 310) “antes do reconhecimento da fraude à execução, é preciso garantir a oportunidade de o terceiro manifestar-se, principalmente antes da realização de qualquer ato de expropriação.” A configuração da má-fé é essencial para respeitar o prévio contraditório.
Se caso o adquirente do bem desejar negar a fraude de execução e desviar-se das suas consequências, dentro do prazo, ele poderá opor embargos de terceiro. Também cabe enfatizar que alienado os bens do devedor, e o mesmo não restar insolvente, não será caracterizada a fraude. O adquirente do bem ficará responsável em comprovar que não sabia da pendência de processo que pudesse levar devedor da dívida à insolvência ou que estivesse reincidência de ação de direito real sobre o determinado bem.
Por isso é indispensável a expedição de mandado ao adquirente do bem e não ao devedor, para que o mesmo cumpra o seu direito ao contraditório. De acordo com o que já foi exposto acima, doutrina e a jurisprudência, há requisitos que são fundamentais e suficientes para configurar a fraude à execução.
É necessário que seja feita uma análise do caso concreto, de acordo com as provas juntadas nos autos do processo, juntadas pelo exequente que fale na possibilidade de fraude à execução, e juntadas pelo adquirente para provar a sua boa-fé durante aquisição do bem.
E quando comprovada a fraude à execução, o legislador se garante com mecanismos que ajudam o credor para que não tenha todos os seus direitos furtados.
Pinho (2012, p. 917) afirma que:
Para que reste caracterizada a fraude à execução em virtude de alienação ou oneração de bem penhorado, não se exige prova da insolvência do devedor decorrente da venda, basta que tenha sido realizada a penhora e que haja evidência da alienação do bem constrito (PINHO 2012, p. 917).
O Código de Processo Civil não versa especificamente sobre o tema, entretanto, sabe-se que qualquer ato que torne o bem acessível será completamente ineficaz perante o processo de execução que está em andamento, “sob pena de aniquilação da efetividade e a autoridade da prestação jurisdicional.” (DIDIER JR., 2009, p. 311).
A jurisprudência atual sobre o tema, entende que:
RESPONSABILIDADE CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. BEM MÓVEL PENHORADO APÓS A INTIMAÇÃO PARA O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. FRAUDE À EXECUÇÃO (ART. 593, INC. II, CPC). SÚMULA Nº 375 DO STJ. DOCUMENTOS QUE NÃO CORROBORAM AS ALEGAÇÕES DA AUTORA. ALTERAÇÃO DA SITUAÇÃO PATRIMONIAL DO EXECUTADO NO CURSO DA DEMANDA. A constatação de fraude em execução decorrente de alienação de bens particulares necessita, além do ajuizamento da ação e a citação válida do devedor, a evidência de que o adquirente tinha ciência da constrição e agiu de má-fé. Exegese da Súmula nº 375 do STJ. Contudo, no caso concreto, ainda que ausente o registro no momento da aquisição do bem, a prova acostada aos autos que demonstra a posse do veículo é insuficiente. Ainda, o executado no curso do processo alterou a situação patrimonial, mesmo que insolvente. RECURSO DE APELAÇÃO DESPROVIDO. (JUSBRASIL, 2013).
Por fim, entende-se que, além do ajuizamento da ação e a citação válida do devedor, se faz necessária a comprovação de que o adquirente sabia da constrição, e desse modo, agiu má-fé. Não é necessário que o executado reste sem bens, precisa somente que aliene um bem específico, pois é este bem que está respondendo, ou irá responder pela dívida pecuniária, podendo levar em conta a insolvência ou não.
1.3 REQUISITOS DA FRAUDE À EXECUÇÃO
Os requisitos para a declaração da fraude à execução são a litispendência e a frustração dos meios executórios. É necessário ter a pendência de um processo judicial, seja processo de conhecimento ou processo de execução. Todavia, questiona-se qual o momento em que começa a “pendência” da ação, depois da data em que ocorreu a distribuição da petição inicial ou a partir da citação válida do réu.
A litispendência ocorre com a citação válida do réu, de acordo com o artigo 219 do Código de Processo Civil (CPC, 2015), a partir da contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis, aplicando-se somente aos prazos processuais. Sendo a citação, também a condição para que a ação faça surtir os efeitos desejados contra o demandado.
Contudo, o entendimento firmado é que para a ocorrência da fraude à execução, é essencial a citação válida do réu. De acordo com o que dispõe o artigo 312 do Código de Processo Civil (CPC, 2015): “considera-se proposta a ação quando a petição inicial for protocolada, todavia, a propositura da ação só produz quanto ao réu, nos efeitos mencionados no artigo 240, depois que for validamente citado”.
O Superior Tribunal de Justiça julgou a matéria, e posicionou-se com o entendimento de que, além de ajuizar a ação, deverá ser a realizada a citação válida do executado Neste sentido, abaixo tem-se o Voto do Ministro Barros Monteiro, relator do REsp. 2.429, 4ª Turma do STJ, citando o Ministro Fontes de Alencar:
Entendemos que, para o efeito estudado, é a citação do réu que pesa. Entre os efeitos da citação está o de tornar litigiosa a coisa, já tendo sido decidido pelo pretório Excelso: Sem a litispendência e a insolvência consequente à lide existente não se pode configurar a alienação em fraude de execução ‘. (RE nº 18.769 Rev. For. 140/180).
Correto que não se trata de litigiosidade específica em torno de determinado bem. Isso ocorre relativamente ao inc. I, do art. 593. Mas, tendo em vista que alienação torna insolvente o devedor, a litigiosidade diz com o patrimônio inteiro dele. Há uma contaminação genérica e indivisível que coloca sub judice todos os bens do devedor.
Neste modo de ver, ainda mesmo que já aparelhado se ache o processo pela distribuição ou despacho, em linha de princípio, a alienação, que se efetiva nesse interregno e antes da citação, não enseja a arguição de fraude de execução. Poderá favorecer a verificação de fraude contra credores.
Para Wambier (2004, p. 122) “não se põe como requisito da fraude à execução a intenção de prejudicar credores (o consilium fraudis. Basta: (I) no caso do art. 593, I, a pendência da demanda fundada em direito real (o que se tem com a citação do réu); (II) na hipótese do art. 593, II, a pendência da demanda e que a alienação ou 35 oneração efetivada reduzam o devedor à insolvência. Em ambos os casos, para que haja fraude à execução, não é preciso que já esteja em curso o processo executivo: é suficiente que esteja pendente ação de conhecimento”.
Outro requisito, a frustração do meio executório, ocorre quando o executado não possui mais o determinado bem desejado pelo exequente, que pode acontecer por alienação do bem, depois da declaração da pendência de processo judicial ou da constrição judicial, caso haja (art. 792, incisos I e III, do CPC, 2015), insolvência do réu (incisos II e IV do art. 792 do CPC, 2015) ou nos outros casos previstos em lei de acordo com o Código de Processo Civil.
Só caberá a penhora de algum bem se tiver insolvência da parte do executado. O exequente deverá provar que sabe da insolvência executado, salvo se tiver agido de má-fé. De tal modo, estando presentes os requisitos da litispendência e da frustração do meio executório, poderá ser declarada a fraude à execução.
De acordo com a lei, é declarada a fraude à execução com a transferência da propriedade de bens que aconteceu após a citação válida do devedor e desde que o determinado ação de disposição patrimonial possa reduzir o devedor à insolvência, não sendo possível encontrar o credor outros bens para garantir o pagamento da obrigação pecuniária, ou seja, a satisfação do crédito.
Sobre os requisitos para a configuração da fraude à execução, o doutor e mestre em direito processual civil Amadeo (2012, p. 36) afirma que “somente estaria configurada a fraude de execução se estivessem presentes: (i) a ciência do devedor a respeito da pendência da ação, ou porque já houve a citação, ou porque ficou provada por outro modo; (ii) a ciência do terceiro da pendência da ação, ou porque há notícia dela em registro público, ou porque ficou provada algum outro meio”.
A jurisprudência destaca:
APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DE TERCEIRO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE - ALEGADA FRAUDE À EXECUÇÃO - MÁ-FÉ DO ADQUIRENTE NÃO EVIDENCIADA - SÚMULA 375 DO STJ - ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBE AO CREDOR/APELANTE - PRESUNÇÃO DE BOA FÉ DO ADQUIRENTE PRESERVADA. Além dos requisitos legais encampados no art. 593 do CPC, a configuração da fraude à execução exige, por força da Súmula 375 do STJ, a comprovação da má-fé do terceiro adquirente. A míngua do conjunto probatório, preserva-se a presunção juris tantum de boa-fé do adquirente, garantindo-lhe a propriedade sobre o bem. Recurso desprovido. (TJ-SC - AC: 464191 SC 2009.046419-1, Relator: Guilherme Nunes Born Data de Julgamento: 12/08/2011, Câmara Especial Regional de Chapecó, Data de Publicação: Apelação Cível n., de Palmitos). (JUSBRASIL, 2011)
A jurisprudência adicionou outro requisito para seja configurada da fraude à execução, a má-fé do terceiro adquirente. A consideração da má-fé provém da ciência do processo executório em andamento, e se torna um elemento subjetivo e requisito para a configuração da fraude de execução.
1.4 CONSEQUÊNCIAS DA DECLARAÇÃO DA FRAUDE À EXECUÇÃO
As consequências da declaração de fraude de execução envolvem a perda do bem, pois o negócio jurídico é desfeito. Conforme o disposto no art. 774, I (CPC, 2015) há a possibilidade de aplicação de multa, ao devedor, revertida ao credor, em montante não superior a 20% do valor atualizado do debito em execução, exigível na própria execução.
Além de ilícito processual, essa modalidade de fraude também configura crime contra a Administração da Justiça, a teor do disposto no art. 179 do Código Penal (CP, 2015) ao que fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou simulando dívidas poderá ser imputada a pena de detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
A fraude à execução é causa de anulação e ainda determina a ineficácia do ato de alienação ou oneração. O entendimento doutrinário majoritário é de que ocorrerá somente a ineficácia do ato jurídico e não a sua anulação.
Para parte da doutrina, com a procedência da ação pauliana haveria a anulação do negócio como um todo; outros sustentam que o negócio continuará existindo, apenas deixando de ser eficaz perante o processo executivo do credor que promoveu a ação (tal como acontece na fraude à execução). (WAMBIER, 2004, p.122).
De acordo com o ensinamento de Wambier (2004), a fraude à execução é um ato grave, pois ocasiona dano aos credores, e além disso, ainda provoca a ineficácia do desenvolvimento da atividade jurisdicional.
Vale ressaltar que de acordo com o entendimento majoritário da jurisprudência e da doutrina, somente o exequente pode imputar a fraude à execução. A existência da fraude à execução será juntada nos autos do processo, com uma petição, que declare o incidente.
Antes da fraude à execução ser declarada, é necessário que o terceiro adquirente seja intimado para, no prazo de 15 (quinze) dias, opor embargos de terceiro de acordo com § 4º do art. 792 do Código de Processo Civil (CPC, 2015) “antes de declarar a fraude à execução, o juiz deverá intimar o terceiro adquirente, que, se quiser, poderá opor embargos de terceiro, no prazo de 15 (quinze) dias”.
Transcorrido esse prazo, precluirá a oposição dos embargos para fins do art. 675, caput (CPC, 2015). E ainda, se forem opostos, os embargos de terceiro, precisarão esperar o trâmite processual para que seja dada a oportunidade para o contraditório e ampla defesa do terceiro adquirente quanto à existência da fraude à execução.
Após o juiz declarar se ocorreu ou não a fraude à execução, esta decisão poderá ser agravada. Quando reconhecida a fraude à execução, o negócio jurídico realizado entre executado e terceiro adquirente é desfeito, pois causa a anulação e ainda determina a ineficácia do ato de alienação ou oneração, a execução vai operar sobre o bem como se não houvesse ocorrido nenhum negócio jurídico. O terceiro adquirente poderá ajuizar uma ação condenatória em face do executado para recuperar o valor que foi pago pelo bem.
É caracterizado como um ato atentatório à dignidade da justiça o comportamento praticado pelo executado que busca frustração da atividade jurisdicional e do direito material do exequente. No momento em que acontece algum ato atentatório à dignidade da justiça, provoca uma circunstância de injustiça, que atrapalha a jurisdição de desempenhar as suas funções e o credor de materializar o seu crédito.
O instituto da fraude à execução é considerado uma espécie de ato atentatório à dignidade da justiça. O artigo 600, do Código de Processo Civil, traz as hipóteses conceito de atos atentatórios à dignidade da justiça:
Art. 600. Considera-se atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que:
I - frauda a execução;
II - se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos;
III - resiste injustificadamente às ordens judiciais;
IV - intimado, não indica ao juiz, em 5 (cinco) dias, quais são e onde se encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores. (CPC, 2015)
O Estado tem como dever e obrigação impedir todo ato atentatório à dignidade da justiça. Esforçando-se para cumprir o seu dever, o Estado deverá coibir a fraude à execução.
1.5 FRAUDE À EXECUÇÃO NO PROCESSO TRIBUTÁRIO
O Código Tributário Nacional apresenta o instituto da fraude à execução tributária nas circunstâncias em que ocorre a alienação ou a oneração de bens pelo devedor, posteriormente a sua inscrição em dívida ativa, não deixando patrimônios ou bens satisfatórios para garantir e liquidar o débito da obrigação pecuniária.
O artigo 185 do Código Tributário Nacional traz a previsão para o instituto, que dispõe:
Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)
Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)
Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial. (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)
§ 1o A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite. (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005)
§ 2o Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido. (Incluído pela Lcp nº 118, de 2005) (CTN, 1966)
O artigo 185 do Código Tributário Nacional institui como únicas condições para a configuração da fraude, a inscrição da dívida anterior à oneração ou alienação e a inexistência de patrimônio, assim, frustrando o direito do credor para satisfazer o crédito.
O artigo mencionado passou a ter essa previsão no ano de 2005, com a edição da Lei Complementar 118. Anteriormente, quando o artigo foi modificado, era necessário que a alienação do bem tivesse acontecido depois da citação do devedor para ser considerado fraude à execução.
Sabe-se que o cumprimento das obrigações assumidas pelo devedor é garantida pelo seu patrimônio. O ilustre autor Ricardo Alexandre, traz em sua obra a descrição da palavra de “obrigação” definida por Washington de Barros Monteiro, declarando:
“Obrigação é uma relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida entre devedor e credor e cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo, garantindo-lhe o adimplemento através de seu patrimônio.” (ALEXANDRE, 2007, p. 255).
O cumprimento das obrigações pecuniárias adquiridas pelo sujeito passivo da execução é garantida pelo seu patrimônio, e com a alienação de bens, declarada a fraude à execução tributária, frustra a satisfação da dívida.
A Lei nº 4.320 de 17 de março de 1964, dispõe os requisitos necessários e as regras para serem adotadas na cobrança judicial dos créditos, com inscrição em dívida ativa. O artigo 39 dessa Lei expõe:
Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias. (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)
§ 1º - Os créditos de que trata este artigo, exigíveis pelo transcurso do prazo para pagamento, serão inscritos, na forma da legislação própria, como Dívida Ativa, em registro próprio, após apurada a sua liquidez e certeza, e a respectiva receita será escriturada a esse título. (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)
§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de sub-rogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais. (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)
§ 3º - O valor do crédito da Fazenda Nacional em moeda estrangeira será convertido ao correspondente valor na moeda nacional à taxa cambial oficial, para compra, na data da notificação ou intimação do devedor, pela autoridade administrativa, ou, à sua falta, na data da inscrição da Dívida Ativa, incidindo, a partir da conversão, a atualização monetária e os juros de mora, de acordo com preceitos legais pertinentes aos débitos tributários. (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)
§ 4º - A receita da Dívida Ativa abrange os créditos mencionados nos parágrafos anteriores, bem como os valores correspondentes à respectiva atualização monetária, à multa e juros de mora e ao encargo de que tratam o art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978. (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)
§ 5º - A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional. (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979) (LEI Nº 4.320, 1964)
A relação tributária é obrigacional, no momento que concretiza fato gerador, passa a existir a obrigação jurídica de satisfazer da obrigação tributária. Desse modo, o instituto da fraude à execução é fundamental para a proteção do credor. É de suma importância para garantir a recuperação dos créditos tributários e uma maior efetividade na prestação judicial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento do presente estudo possibilitou uma análise sobre o instituto da fraude à execução. Foi possível descrever os elementos subjetivos para a sua configuração. O seu reconhecimento ocorre de forma incidental no processo de execução e não causa reflexos na validade do negócio jurídico, mas de modo relativo, poderá acarretar em sua eficácia.
Já os requisitos para a declaração da fraude à execução são a litispendência e a frustração dos meios executórios. A litispendência ocorre com a citação válida do réu e a frustração do meio executório, ocorre quando o executado não possui mais o determinado bem desejado pelo credor, que pode acontecer por meio da alienação do bem, depois da declaração da pendência de processo judicial ou da constrição judicial.
As consequências da declaração de fraude de execução é a perda do bem, pois o negócio jurídico é desfeito. Esse instituto tem natureza processual e constitui ato atentatório à dignidade da justiça, logo, o Estado tem como dever e obrigação impedir todo ato atentatório à dignidade da justiça. Se esforçando para cumprir o seu dever, o Estado poderá coibir a fraude à execução.
O instituto da fraude à execução é fundamental para a proteção do credor. É de suma importância para garantir a recuperação dos créditos tributários e uma maior efetividade na prestação judicial.
Dada à importância do assunto, as informações contidas na pesquisa torna-se necessário para a detecção de fraudes, de forma a atender à legislação que vigora no país. Nesse sentido, a utilização dessas informações é essencial para a coibição a fraudes no processo de execução.
REFERÊNCIAS
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Data da conclusão/última revisão: 26/4/2019
Izabella Maria Amaral Vieira e Siberia Sales Queiroz de Lima
Izabella Maria Amaral Vieira: Graduanda do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins.
Siberia Sales Queiroz de Lima: Orientadora, Professora Mestra do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins.
Código da publicação: 4415
Como citar o texto:
VIEIRA, Izabella Maria Amaral; LIMA, Siberia Sales Queiroz de..Os requisitos para o reconhecimento e efetividade da fraude à execução. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1619. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-tributario/4415/os-requisitos-reconhecimento-efetividade-fraude-execucao. Acesso em 7 mai. 2019.
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