Resumo: O estudo apresentado neste trabalho foi desenvolvido analisando-se a lei tributária sobre a propriedade territorial rural. Sob o manto da extrafiscalidade, instituiu a União um sistema tributário especial, com alíquotas progressivas, relacionadas com o porte das propriedades rurais e seu grau de utilização. O estudo tem por objeto o sistema progressivo, com enfoque no desrespeito ao princípio da isonomia, dando a lei tratamento diferenciado, não justificável, para contribuintes em situação de igualdade.

Palavras-chaves: Imposto Territorial Rural – Setor Primário – Produtos Vegetais – Extrativas - Pecuárias – Aqüícolas – Granjeiras - Isonomia – Incoerência – Inconstitucionalidade.

1. Introdução:

Atualmente encontra-se em vigência a Lei 9.393/96, que dispõe sobre o Imposto Territorial Rural, trazendo em suas previsões um sistema de tributação progressiva, relacionado ao porte da propriedade rural e ao seu grau de utilização, sistema este complementado por instrução normativa de responsabilidade da Secretaria da Receita Federal.

O presente trabalho pretende analisar uma incoerência contida no texto legal, ferindo o princípio da isonomia.

Não tem por objetivo entrar no mérito da ineficiência do objetivo extrafiscal do Imposto Territorial Rural, completamente desvinculado de uma política mais séria de valorização da produção agropecuária, desconsiderando sua importância frente ao Produto Interno Bruto Nacional.

A hipótese que norteou o presente estudo foi a de que o sistema criado por estes instrumentos normativos apresenta-se comprometido. Na ânsia de buscar um caminho curto para a solução dos problemas sociais, descuidou-se o legislador, criando uma situação que apresenta uma anomalia, do ponto de vista do princípio da isonomia, como adiante se verá.

2. Incompatibilidade do texto legal com o princípio da isonomia:

O princípio da isonomia, erigido no art. 5º caput da Constituição Federal, necessita ser entendido com a devida cautela que lhe deve ser dispensada. Devem ser considerados os avanços democráticos que possibilitam tratamentos diferenciados aos cidadãos, justificadas pelas desigualdades da existência humana.

Assim é, por exemplo, a tributação segundo a capacidade contributiva, prevista no art. 145 § 1º da Constituição Federal.

A regra, em princípio, é a equiparação, vedando a Constituição, ao poder público, desigualar contribuintes em situações equivalentes. Exceções são admitidas, no entanto, quando outros objetivos constitucionais que legitimem desigualdades são perseguidos.

Desequiparações gratuitas e artificiais que beneficiem ou prejudiquem certos contribuintes sem realizar valores autênticos protegidos pelo ordenamento jurídico são inaceitáveis.

No caso do ITR, a Lei trata de tributação relativa a atividades do setor primário, portanto em situação equiparada.

Existe, entretanto, uma diferenciação de tratamento não justificável, no texto legal, entre as alíneas a e d e as alíneas b e c, do art. 10 § 1º, V.

A considerar o enunciado destas alíneas, percebe-se que contribuintes que dediquem a atividades pecuárias ou a explorações extrativas (alínea b e c), têm suas cargas tributárias dependentes de índices fixados pela Secretaria da Receita Federal, nos termos do art. 10 § 3º,

Por outro lado, contribuintes que se dediquem a atividades de plantio de produtos vegetais, ou explorações de atividades granjeiras e aqüícolas, (alíneas a e d), não estão vinculados a qualquer índice, para apuração de sua carga tributária.

A desigualdade de tratamento não tem qualquer fundamento constitucional ou finalidade extrafiscal que a justifique, o que demonstra uma discriminação inaceitável. Exige-se de determinados contribuintes, empresários do setor primário, pecuarista e extrativistas, índices mínimos relacionados ao desempenho de suas atividades produtivas, enquanto nada se exige de outros, agricultores e aqüicultores, também empresários do setor primário.

3. Conclusão:

Uma análise mais aprofundada mostra a diferenciação de tratamento, gratuita e artificial, não justificável, previstas nas alíneas a e d e b e c, do art. 10º § 1º, V da Lei 9.393/96.

São exigidos índices de rendimento ou lotação para atividades de exploração extrativa e pecuária, não o sendo para as atividades de plantio de produtos vegetais, ou exploração de atividade granjeira e aqüícola, o que demonstra evidente incompatibilidade com o princípio da isonomia.

Não há qualquer valor autêntico protegido pelo ordenamento jurídico que justifique a desigualdade de tratamentos no texto legal.

Esta distinção é incompatível com o princípio da isonomia: contribuintes, empresários do setor primário, dedicados à exploração pecuária e extrativista têm a tributação vinculada a índices de desempenho de suas atividades produtivas, sendo que outros empresários, também do setor primário, porém dedicados à exploração de atividades de plantio de produtos vegetais, granjeiros e aqüícolas, não têm a tributação vinculada a nenhum índice de desempenho de suas atividades.

Resta evidente, portanto, eivada de inconstitucionalidade a Lei 9.393/96, por extrapolar limites estabelecidos ao Estado, na proteção e garantia dos cidadãos, ferindo os princípios tributários fundamentais.

Corrigir a imperfeição do texto legal, por meio de instrução normativa expedida pela a Administração Pública é inaceitável, em se tratando de matéria tributária.

Cabe às instituições representativas dos empresários rurais, ou aos próprios empresários, argüirem a inconstitucionalidade deste diploma legal, não só em função de seus interesses financeiros de redução da carga tributária que lhes é imposta, mas também no exercício da cidadania, com contribuição, numa atitude educativa ao Estado, necessária para o exercício da democracia.

Referências:

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(Elaborado em 03 de maio de 2005)

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Como citar o texto:

ANGIEUSKI, Plínio Neves..O desrespeito ao princípio da isonomia na Lei 9.393/96 (Lei do Imposto Territorial Rural). Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 126. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-tributario/599/o-desrespeito-ao-principio-isonomia-lei-9-39396-lei-imposto-territorial-rural-. Acesso em 19 mai. 2005.

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