Estamos falando das ações afirmativas, cotas raciais e cotas sociais previstas no Projeto de Lei n° 73/1999, elaborado pela Deputada Nice Lobão que tramita na câmara em conjunto com os projetos de lei: 3627/04, do Poder Executivo, que prevê a reserva de, no mínimo, 50% das vagas das universidades públicas federais para estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas; 615/03, do deputado Murilo Zauith, que estabelece reserva de vagas para índios e descendentes; 1313/03, do Deputado Dr.Rodolfo Pereira, que também institui cotas para a população indígena.

O que tem de ser explicado é que existe uma profunda diferença entre as terminologias. As ações afirmativas ou reserva de cotas para negros e indígenas que se pretende implementar em larga escala no Brasil reserva 50% das vagas para a população negra ou indígena que cursou o ensino médio em escolas públicas.

Tal dispositivo não se confunde com as cotas sociais, ou sejam a mesma separação de vagas para uma determinada classe de indivíduos, mas com critério diferente.

Neste último não se discute a cor de pele do beneficiado. A tratativa é sua condição social.

Exatamente nesta diferença reside o cerne de nossa discussão. Expliquemos: o Projeto de Lei prevê a implementação da distribuição de cotas para negros e indígenas, por haver um entendimento da existência de discriminação nas Universidades a esses candidatos.

Neste caso haveria justiça na distribuição das cotas? Que existe discriminação no Brasil não se discute. Entretanto não se pode afirmar ser apenas contra negros e indígenas. Quantas mulheres temos em altos postos de comando? A proporção é a mesma para homens? Quantos portadores de deficiência temos com destaque na sociedade brasileira?

 

Um País que conviveu com a escravidão por mais de trezentos anos não elimina o ranço da noite para o dia. Afinal temos pouco mais de cem anos de abolição da escravidão negra. A herança cultural é muito maior no âmbito negativo do que no positivo.

A crise no ensino é muito maior do que as cotas raciais. Esta não é a solução. A política de investimento no ensino fundamental é completamente equivocada e o aluno formado na rede pública de ensino não aprende muita coisa. A malfadada extinção da repetência contribuiu muito para piorar as coisas.

O que somente denota a baixa qualidade de ensino. Um estudante advindo do ensino público com 17 anos e preste a ingressar no processo seletivo não tem a menor condição de disputar uma vaga em igualdade de condições com alunos que tiveram um ensino efetivo no âmbito privado.

Eis a nossa preocupação: o que fazer com esses alunos? O prêmio que eles merecem receber é a criminalidade? Não que seja uma tendência, mas estes jovens serão excluídos socialmente pelo ensino deficitário, por conseguinte, suas oportunidades de emprego também serão adstritas. Sendo assim, a marginalidade conseguirá atrair boa parte dessa população.

E nesta questão não existe cor!!! O problema do ensino público é o mesmo para brancos, amarelos, mestiços, multados ou negros.

A culpa é do sistema educacional brasileiro que por décadas se mostra insuficiente e ineficaz. E, mesmo que seja implementada uma grande mudança com real investimento o retorno somente será verificado em algumas décadas.

Por isso mesmo a nossa intenção de escrever sobre o tema, o que fazer com os alunos da rede pública? Eles merecem o prêmio do descaso?

Os investimentos num ensino de base são indispensáveis e não há como negar que a política adotada é errônea. Um plano deve ser desenvolvido por nossos governantes, e não será a política de cotas raciais que irá resolver toda a crise do ensino brasileiro, ao contrário, somente irá incrementar o problema.

As ações afirmativas devem ser implementadas, porém, no âmbito social. O que as pessoas precisam compreender é que no processo seletivo não serão todos os que ingressarão no ensino particular, mas somente os melhores dentre os menos favorecidos.

Com isso é nítido que haverá uma diferença de aprendizado entre os alunos da rede particular para os da rede pública, por isso a necessidade de um acompanhamento especial para tentar eliminar essa desigualdade sem prejudicar o nível de aprendizado dos demais.

Investir nessas pessoas será apostar numa parte da população que estava destinada ao descaso e ao ostracismo. Não é a solução ideal, é verdade, todavia, será muito mais salutar do que jogar o jovem a sua própria sorte.

O processo seletivo não deve se amoldar ao ensino público, e sim o inverso. Por isso o acompanhamento é necessário. As cotas raciais para os melhores alunos não são necessárias, um negro, um amarelo, mulato com ensino qualificado preferirão disputar uma vaga com os demais para demonstrar sua capacidade.

No entanto, por melhor que seja um aluno do ensino público ainda estará longe de um processo seletivo normal. Os próprios jovens que estudaram a vida toda em boas escolas ainda se matriculam em cursos preparatórios para o vestibular. Um sinal claro de que o ensino não é tão forte assim....

A solução ideal não são as cotas afirmativas, mas se ficarmos no plano ideal haveria tantas outras coisas a serem mudadas. A culpa é da política educacional do governo imperfeita há muitos anos.

A obrigação é nossa de uma vez mais fazer o que aqueles em quem votamos não fizeram. Temos de oferecer condições aos jovens do nosso País, independente de seu tom de pele. Quando houver um ensino adequado poderemos debater se as cotas são ou não necessárias no que tange as raças.

 

Como citar o texto:

GONÇALVES, Antônio Baptista..Qual é o problema das cotas? E o por que de tanta resistência?. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 4, nº 211. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direitos-humanos/1646/qual-problema-cotas-tanta-resistencia. Acesso em 7 jan. 2007.

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