As diretrizes e o conteúdo do curso de direito são definidos pela Portaria do MEC n.º 1.886, de 30 de dezembro de 1994.

         Consoante essa Portaria, o curso jurídico deve privilegiar o desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e extensão, interligadas e obrigatórias, segundo programação e distribuição aprovadas pela própria Instituição de Ensino Superior, de forma a atender às necessidades de formação fundamental, sócio política, técnico-jurídica e prática do bacharel em direito.

Para satisfazer essa exigência, a própria Portaria declara que o ensino, a pesquisa e a extensão serão desenvolvidos, conforme dicção do seu art. 4º, mediante seminários, simpósios, congressos, conferência, monitoria, iniciação científica e disciplinas não previstas no currículo pleno.

Adiante, no art. 9º, dispõe que “Para conclusão do curso, será obrigatória apresentação e defesa de monografia final, perante banca examinadora, com tema e orientador escolhidos pelo aluno”.

Percebe-se do texto da Portaria que, muito embora se privilegie a prática da pesquisa, elege-se apenas um único instrumento obrigatório para tanto, qual seja, a monografia de final de curso.

Por reflexo dessa omissão, observa-se na prática do ensino jurídico que a monografia é, senão o único, um dos poucos trabalhos escritos produzidos pelo acadêmico durante o curso, mediante a consciência de que o conteúdo do mesmo será lido e avaliado por terceiros. A monografia de final de curso é publicada no âmbito de instituição de ensino; além da avaliação feita pelos professores, o seu texto é posto à evidência na biblioteca da Instituição.

Demais disso, algumas raras instituições de ensino promovem concurso entre os alunos, prometendo a publicação do trabalho de final de curso na Revista da Faculdade ou em Revista Jurídica de notabilidade.

Os demais escritos desenvolvidos pelo aluno ficam restritos ao conhecimento do professor que os corrige e avalia e são, na maioria das vezes, trabalhos cuja forma de exposição da idéia são, em sua maioria, definidas previamente pelo educador. Tem-se como exemplo os trabalhos desenvolvidos na disciplina de Direito Penal, em que a formatação básica consiste na elaboração de tópicos abordando as características de um dado crime, tais como tipo penal, classificação do crime, tipo subjetivo, tipo objetivo, elementares do crime, consumação e tentativa, jurisprudência a respeito.

Em que pese a importância do conhecimento dessas peculiaridades pelo acadêmico de Direito, a realização de um trabalho contendo essa formatação acaba por inibir o raciocínio jurídico e a demonstração da criatividade do aluno, os quais, a propósito, são elementos imprescindíveis para que se possa externar suas idéias sobre o direito a terceiros, mediante a publicação de escritos.

O problema é que, na atual conjuntura do ensino jurídico, o estudante não é preparado para escrever sobre aquilo que pensa, para publicar suas idéias e conclusões a terceiros, que não somente o professor. Ele escreve na faculdade aquilo que o professor quer que ele escreva, excluído o caso da monografia, onde o tema é escolhido pelo aluno e onde tem este certa liberdade para definir a forma de exposição do pensamento.

Os trabalhos de conclusão de curso geralmente têm início no antepenúltimo período. Quer isso dizer que antes desse tempo, o aluno, a não ser que por livre iniciativa, nunca escreveu um texto destinado à publicação. Essa constatação é preocupante, seja porque o aluno não desenvolve por quase a totalidade do curso de direito a habilidade para externar suas opiniões através da escrita para terceiros, bem como porque do antepenúltimo semestre até a data da entrega da monografia de final de curso, curtíssimo é o tempo para desenvolver essa habilidade. Por conseguinte, enorme será a dificuldade para o aluno confeccionar a monografia de final de curso.

Fosse o estudante habituado a escrever desde o segundo semestre do curso, provavelmente teria menor dificuldade para ingressar na pós-graduação, posto que além da publicação de produção bibliográfica (texto em jornal ou revista, artigos, trabalhos em eventos etc), poderia o mesmo identificar mais facilmente sua simpatia com uma área do Direito, bem como desenvolver sua criatividade, seu raciocínio jurídico e seu poder de crítica, aptidões inerentes ao perfil do pesquisador. Além dos benefícios para o desenvolvimento de uma atividade acadêmica, estaria muito mais preparado para desempenhar suas funções junto à carreira pela qual optasse.

Diante dos visíveis benefícios que a escrita na faculdade de direito, exercida com o compromisso de transmitir uma mensagem a terceiros, pode ensejar ao profissional, justa é a consideração quanto à necessidade de a mesma ser inserida entre as exigências curriculares constantes da citada portaria.

Na opinião do professor Sérgio Rodrigo MARTINEZ[i], fossem promovidas alterações no curso jurídico, que exigissem uma postura mais ativa do estudante, o mesmo deixaria de ser um mero repetidor de conceitos e definições de outrem.

A título de sugestão, a apresentação de um trabalho escrito, destinado à publicação, poderia ser obrigatória para aprovação junto à disciplina de Metodologia do Trabalho Científica, geralmente ministrada no segundo semestre do curso. No desenvolvimento dessa disciplina, junto com a abordagem teórica, o aluno deveria ser orientado pelo professor, no trabalho de confecção de um artigo, de um ensaio, nada muito extenso e nem muito complexo, mas que tivesse condições de ser compreendido por terceiros.

No período seguinte, as habilidades para a redação de um ensaio, um artigo etc, poderiam ser reforçadas na disciplina de Hermenêutica e Argumentação Jurídica.

Tido esse primeiro contato com a escrita e suas técnicas, o aluno poderia ser compelido a apresentar um escrito por semestre sobre questões correlatas às disciplinas ministradas no respectivo semestre letivo. A avaliação desse trabalho seria feita pelo professor da disciplina sobre o qual versa.

Diante da constatação ora posta, urge uma campanha voltada a estimular as instituições de ensino a desenvolverem entre os graduandos de direito a confecção de textos, hábeis a serem publicados à comunidade jurídica, bem como para que o MEC insira essa atividade entre as exigências curriculares.

Notas:

 

 

[i] MARTÍNEZ, Sérgio Rodrigo. Experiências metodológicas no ensino jurídico . Jus Navigandi, Teresina, a. 3, n. 28, fev. 1999. Disponível em: . Acesso em: 27 jan. 2006.

 

Como citar o texto:

ESTIGARA, Adriana..O preparo do acadêmico de Direito para a comunicação escrita e insuficiência da monografia de final de curso para este fim. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 3, nº 163. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/pratica-forense-e-advogados/1024/o-preparo-academico-direito-comunicacao-escrita-insuficiencia-monografia-final-curso-este-fim. Acesso em 30 jan. 2006.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.