INTRODUÇÃO
O Estado atende satisfatoriamente aos brasileiros no que toca à distribuição de justiça? Acreditamos que a maioria dos que lerem essa pergunta responderá negativamente, pois a má qualidade do atendimento prestado domina a opinião geral. A própria demora na prestação jurisdicional reflete a falta de qualidade desse serviço. Neste trabalho, procuraremos fazer breve análise dos fatores que distanciam a população do amplo acesso à justiça.
O que despertou o interesse pelo tema foi o fato de que o processo civil, hoje, é visto pelo processualista moderno como um instrumento a serviço da paz social[1]. Todavia de nada adiantaria todo o arcabouço da ciência processual, que tem, inclusive, princípios próprios e é estudada por ampla doutrina, se o processo não atendesse ao seu escopo maior, que é o de distribuir justiça.
Nessa direção é a dicção de Cappelletti e Garth:
O ‘acesso’ não é apenas um direito social fundamental, crescentemente reconhecido; ele é, também, necessariamente, o ponto central da moderna processualística. Seu estudo pressupõe um alargamento e aprofundamento dos objetivos e métodos da moderna ciência jurídica.[2]
Para melhor compreendermos as dificuldades a serem superadas, visando alcançar um amplo acesso à justiça, apresentaremos o nosso trabalho em três partes. Na primeira parte, apresentaremos um breve histórico das formas de pacificação dos conflitos. Na segunda, voltaremos nossa atenção para as questões de ordem administrativa, que dificultam, ou mesmo impedem, um amplo acesso à justiça. O estudo do acesso à justiça, à luz de aspectos técnicos do processo, como instrumento para promoção da paz social será o objeto de nossa apreciação, na terceira parte. Finalmente, apresentaremos nossa conclusão e ousaremos sugerir medidas que ampliem o acesso à justiça.
BREVE HISTÓRICO DAS FORMAS DE PACIFICAÇÃO DOS CONFLITOS
Antes de o homem viver em sociedade[3], encontrava-se no que Thomas Hobbes chamava de “estado de natureza”. Tal expressão refere-se à condição primitiva em que, na solução dos conflitos, prevalecia a força. Era a “guerra de todos contra todos”.[4] Pode-se dizer que foi com a adesão ao contrato social que a sociedade evoluiu e chegamos, hoje, ao Estado de Direito.
Na esteira do desenvolvimento da vida social, a administração da justiça também apresentou evoluções. Em um Estado fraco, ainda em formação, não havia leis, nem órgão encarregado de distribuir justiça. Na solução dos conflitos, prevalecia, então, a força. Tal regime é conhecido por autotutela ou autodefesa. Nele, o juiz, que também é parte, impõe à outra, a sua decisão.
Já na autocomposição, um dos litigantes, ou ambos, declinam de seu direito, ou de parte dele. Essa forma de solução de litígios se divide em três: desistência, submissão e transação. Na primeira, uma das partes desiste, renuncia ao que pretendia. Na segunda, uma das partes não opõe mais resistência à pretensão da outra. Na última, ocorrem concessões mútuas.
Com o tempo, percebeu-se a significativa parcialidade existente em todas as soluções de conflitos já citadas. A fim de se ter um julgamento imparcial, surge a figura do árbitro, como pessoa estranha ao conflito, mas da confiança das partes. Inicialmente, a arbitragem era facultativa. Posteriormente, com o fortalecimento do Estado, passou a ser obrigatória, ficando proibida a autotutela. Com o crescente fortalecimento do Estado, surge, como forma de pacificação dos conflitos, a jurisdição. O juiz, representante do Estado, examina a questão e decide[5].
Hoje, vivendo sob a égide do Estado de Direito, o homem entrega parte de sua liberdade à soberania estatal. Assim, não pode mais fazer justiça com as próprias mãos. Uma parte não pode mais interpelar a outra. É o órgão estatal competente que age em substituição às partes. Portanto, hoje, cabe ao Estado promover a paz social, através da ampla distribuição de justiça. [6] Resta indagar se o Estado brasileiro cumpre bem a sua função de Estado-Juiz...
LIMITAÇÕES DO ACESSO À JUSTIÇA
Aspectos Administrativos
A Constituição Federal, em seu art. 2º, dispõe: “Art 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.
Ao Poder Judiciário cabe frear todo tipo de arbitrariedade, inclusive as perpetradas pelo próprio Estado. Portanto ter uma independência absoluta[7] é necessidade imperiosa para que, imparcialmente, possa o Poder Judiciário bem desempenhar a sua função precípua: julgar.
Ocorre que o orçamento do Poder Judiciário é liberado pelo Poder Executivo em duodécimos. Ademais, o valor destinado ao Judiciário é muito pequeno, quando comparado, em percentuais, com os destinados ao Executivo[8] e ao Legislativo. Tendo isto em vista, parece-nos que há uma relação de dependência do Judiciário para com o Executivo. Esperamos que tal liame não fira, de maneira alguma, a independência e a harmonia entre os poderes.
Nesse sentido, e já referindo-se à próxima questão a ser tratada, ensina José Roberto dos Santos Bedaque:
Em primeiro lugar, enquanto não se destinar ao Poder Judiciário percentual razoável do orçamento estatal, a fim de que ele possa fazer frente às suas necessidades, qualquer outra medida corre sério risco de não alcançar os objetivos desejados. É preciso examinar dados estatísticos de países onde a Justiça se mostre eficiente, para verificar as causas da morosidade do processo brasileiro. Sabe-se, por exemplo, que o número de juízes no Brasil é muito inferior aos padrões ideais. [9]
Outra questão relevante, no que toca ao acesso à justiça, é o número de juízes e servidores, que está muito aquém das necessidades. Na Alemanha, há um juiz para cada 3.000 habitantes. Já aqui, no Brasil, contamos com um juiz para cada 30.000 habitantes[10]. José Roberto Nalini entende que, para atingir os padrões germânicos, teríamos que partir dos atuais 15 mil juízes e chegarmos a 150 mil. Isso acrescido ao fato de que cada juiz, para desempenhar suas funções, conta com cerca de 20 servidores, haveria a barreira de recursos financeiros e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Nalini defende a idéia de que “antes da criação de milhares de novos cargos, seria mais saudável encarar alternativas aceleradoras da produtividade do equipamento judicial.”[11]
Na nossa opinião, fica claro que há falta de juízes e de servidores. Basta considerar que, “em São Paulo, qualquer processo entre a primeira e a segunda instâncias, leva em média sete anos – e pode chegar a mais de 10 anos – para ser julgado. A distribuição de recursos demora cerca de cinco anos”[12]. Se não podemos atingir o padrão germânico na relação de juízes por habitantes, ao menos, devemos procurar nos distanciar do atual quadro, dentro das nossas limitações orçamentárias. A adoção de idéias que venham a acelerar o andamento do processo não deve excluir a majoração dos quadros de juízes e de servidores.
Encontramos boas idéias de ordem administrativa, já postas em prática, que visam ampliar o acesso à justiça. No Amapá, a juíza de direito Sueli Pereira Pini despacha em salas de aula em bairros pobres de Macapá, levando a justiça aos mais pobres. A juíza, também, comanda uma equipe de cinco juízes, que, de forma rápida e eficiente, resolve as questões judiciais das populações ribeirinhas, a bordo de um barco, em que funciona o Juizado Itinerante Fluvial. Essa população, na maioria das vezes, não possuía sequer o registro de nascimento. De igual maneira, a mesma juíza, coordena o Juizado Itinerante Terrestre, que funciona em um ônibus na periferia de Macapá.[13]
Outra experiência pioneira encontra-se em Santa Catarina. O juiz Jânio de Souza Machado, hoje juiz substituto de 2º Grau em Florianópolis, atuou, nos últimos dois anos e meio, como juiz agrário[14] itinerante. Nesse período, teve oportunidade de encontrar soluções pacíficas em situações em que a eclosão da violência era iminente. O magistrado diz que tratou os conflitos agrários como uma questão social e não policial. As questões agrárias em Santa Catarina são, pois, resolvidas de forma pacífica, graças a mais uma forma de promoção do acesso à justiça. Os exemplos citados deixam claro que há boas experiências nesse sentido.
Falta, todavia, a adoção ampla das boas idéias, especialmente as já testadas e aprovadas. O Brasil é um país cortado por rios, mas também é permeado de conflitos agrários de norte a sul. Cabe, então, perguntar por que experiências como as do Judiciário do Amapá e de Santa Catarina ainda não foram implementadas nos demais Estados.[15]
Certamente, juízes e servidores têm a oferecer muitas outras idéias, que, se implantadas, melhorariam a administração do judiciário. Às vezes, uma idéia simples, fornecida de maneira despretensiosa pode gerar grandes benefícios. Nesse sentido, encontra-se o Prêmio Innovare, através do qual o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria de Reforma do Judiciário, a Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas e a Associação dos Magistrados do Brasil, procuram “identificar e difundir práticas pioneiras e bem sucedidas de gestão do Poder Judiciário brasileiro que estejam contribuindo para a modernização, melhoria da qualidade e da eficiência da Justiça tornando os julgamentos mais ágeis ou facilitando o acesso à Justiça”.[16] Embora pareça-nos louvável tal atitude, cabe perguntar: por que o órgão do Estado envolvido em tal premiação é do Poder Executivo e não do Judiciário?
Outra relevante questão, facilmente notada por quem freqüenta os fóruns do Brasil, é o fato de que, em muitas varas, a informática ainda é pouco utilizada. Os recursos que a moderna tecnologia oferece ainda parecem estar longe de contribuir para uma Justiça mais célere. A notificação dos atos processuais por meios eletrônicos, a criação de grupos de estudos virtuais, a divulgação de experiências que obtiveram êxito, enfim, a utilização da internet para facilitar e reduzir custos de comunicação precisam estar presentes em todas as varas do judiciário brasileiro, especialmente naquela instalada no mais remoto rincão.
O nível de educação do brasileiro médio é outro obstáculo ao acesso à justiça. A publicação da Pesquisa Qualitativa “Imagem do Poder Judiciário”[17] revela o significativo nível de desconhecimento sobre a organização do Estado. A pesquisa reproduz a fala de alguns dos pesquisados. Citamos as que consideramos mais significativas:
No geral os grupos pesquisados estão mais familiarizados com os poderes Executivo e Legislativo do que com o Poder Judiciário, parecendo conhecer um pouco mais o papel e as principais funções dos dois primeiros. Mesmo nos grupos AB nota-se uma grande confusão quanto ao papel de cada poder. Sobre isso, sabe-se apenas o básico: o Legislativo faz as leis; o Executivo governa, “cumprindo ou não” as leis; o Judiciário faz com que elas sejam cumpridas. A confusão mais visível ocorre na percepção do poder de polícia, freqüentemente atribuído ao Poder Judiciário.[18]
Nos grupos de classe C/D o Judiciário está muito ligado á idéia de penalização, sendo relativamente forte o conceito de que a justiça existe para impor penas, condenar os que cometem crimes ou transgridem as leis.[19]
Os limites quanto ao papel real do Judiciário não estão claros, e tendem a ser exagerados. O cidadão o associa diretamente às questões ligadas à segurança pública de tal forma que, na mente de pessoas mais simples, agentes da polícia, por exemplo, fazem parte do sistema Judiciário.[20]
A gente tem pouca informação sobre isso. Poderia voltar a matéria de OSPB nas escolas para que as pessoas ficassem mais informadas. (Adulto, CD, Rio de janeiro)[21]
É uma estrutura meio complicadinha, a gente não tem tanta informação não! (Adulto, AB+, São Paulo)[22]
Aqueles que atuam na área trabalhista conhecem a dificuldade que existe, entre os populares, em estabelecer a diferença entre o Ministério do Trabalho e a Justiça do Trabalho.
Assim, talvez, a sugestão que surgiu na pesquisa da AMB sobre o retorno da matéria OSPB nos parece bastante razoável, pois poderia contribuir para a melhora do nível cultural[23] do brasileiro no que toca à cidadania, ao conhecimento do Estado e até ao melhor conhecimento de seus direitos e deveres, o que facilitaria o acesso à justiça. A esse respeito, Cappelletti e Garth ensinam que:
Num primeiro nível está a questão de reconhecer a existência de um direito juridicamente exigível. Essa barreira fundamental é especialmente séria para os despossuídos, mas não afeta apenas os pobres. Ela diz respeito a toda a população em muitos tipos de conflitos que envolvem direitos. Observou recentemente o professor Leon Myhew: “Existe... um conjunto de interesses e problemas potenciais; alguns são bem compreendidos pelos membros da população, enquanto outros são percebidos de forma pouco clara, ou de todo despercebidos”[24]. Mesmo consumidores bem informados, por exemplo só raramente se dão conta de que sua assinatura num contrato não significa que precisem, obrigatoriamente, sujeitar-se a seus termos, em quaisquer circunstâncias. Falta-lhes o conhecimento jurídico básico não apenas para fazer objeção a esses contratos, mas até mesmo para perceber que sejam passíveis de objeção.[25]
A linguagem utilizada no meio jurídico é outro obstáculo entre o cidadão comum e a justiça. A OAB/SP, no Jornal do Advogado, publicou reportagem cuja chamada, na capa, era “BABEL JURÍDICA”[26]. O artigo, denominado “PALAVRAS QUE DIZEM NADA”[27] mostra como uma linguagem extremamente rebuscada, com excesso de citações em línguas estrangeiras, pode dificultar a comunicação entre o mundo jurídico e a sociedade. A conclusão a que se chega é de que é hora de começar a utilizar-se uma linguagem menos rebuscada, de tal sorte a promover uma aproximação entre a Justiça e o homem comum. Parece-nos que, na comunicação, o profissional do direito deve preocupar-se menos com a forma e mais com o conteúdo.
Além da falta de informação do brasileiro, outro fator que dificulta o acesso à justiça é a falta de recursos. A falta de condições econômico-financeiras impede que se contrate um advogado e que se arque com as custas processuais. É certo que a questão das custas pode ser contornada pela Lei 1060/1950, que estabelece normas para concessão de assistência judiciária aos necessitados. Com o objetivo de eliminar as diferenças de ordem econômica entre litigantes, propiciando um maior acesso à justiça, a Constituição Federal, no inciso LXXIV, do art. 5º determina:
LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
Embora a nossa Carta Magna tenha sido publicada em 1988, até hoje, não há Defensoria Pública funcionando em todos os Estados da Federação[28], conforme prescrito no art. 134 da Constituição[29], o que dificulta o acesso à justiça.
Cumpre lembrar, ainda, interessante ponto, que foi a distinção apresentada pelo professor Gallanter entre litigantes eventuais e habituais. Tal distinção é fundada no número de encontros com o sistema judicial. Segundo Gallanter, o litigante habitual conta com várias vantagens: conhecer melhor o Direito; ter melhor planejamento; valer-se da economia de escala, pois é parte em várias ações; ter mais oportunidade de relacionar-se com os julgadores; valer-se de alguns casos, como tem muitos, para testar estratégias, visando aplicação futura em outros mais relevantes. Tudo isso faz com que os litigantes habituais, que em geral são litigantes organizacionais, obtenham maior êxito do que os individuais. Essa desigualdade formal pode ser modificada com a reunião, fundada no interesse comum, dos litigantes individuais, que podem se organizar, a fim de enfrentar, em melhores condições, o litigante habitual[30]. Parece-nos que as associações de mutuários, consumidores e outras são bons exemplos dessa “união de forças”.
Procuramos, aqui, pontuar alguns dos principais aspectos, de ordem administrativa, que dificultam o acesso à justiça.
Contribuições da Ciência Processual para Ampliar o Acesso à Justiça
Embora, possamos ousar dizer que o conceito de acesso à justiça seja quase intuitivo, melhor seria consultarmos a doutrina para melhor entendimento da questão e para que tenhamos melhor referência junto à ciência processual civil.
Da lição de Cintra, Grinover e Dinamarco, temos:
Seja nos casos de controle jurisdicional indispensável, seja quando simplesmente uma pretensão deixou de ser satisfeita por quem podia satisfazê-la, a pretensão trazida pela parte ao processo clama por uma solução que faça justiça a ambos os participantes do conflito e do processo. Por isso é que o processo deve ser manipulado de modo a propiciar às partes o acesso à justiça, o qual se resolve, na expressão muito feliz da doutrina brasileira recente em “acesso à ordem jurídica justa. (...)
Acesso à justiça não se identifica, pois, com a mera admissão ao processo, ou possibilidade de ingresso em juízo. Como se verá no texto, para que haja o efetivo acesso à justiça é indispensável que o maior número possível de pessoas seja admitido a demandar e a defender-se adequadamente (inclusive em processo criminal), sendo também condenáveis as restrições quanto a determinadas causas (pequeno valor, interesses difusos); mas para a integralidade do acesso à justiça, é preciso isso e muito mais.
A ordem jurídico-positiva (Constituição e leis ordinárias) e o lavor dos processualistas modernos têm posto em destaque uma série de princípios e garantias que, somados e interpretados harmoniosamente, constituem o traçado do caminho que conduz as partes à ordem jurídica justa. O acesso à justiça é, pois, a idéia central a que converge toda a oferta constitucional e legal desses princípios e garantias. Assim, (a) oferece-se a mais ampla admissão de pessoas e causas ao processo (universalidade da jurisdição), depois (b) garante-se a todas elas (no cível e no criminal) a observância das regras que consubstanciam o devido processo legal, para que (c) possam participar intensamente da formação do convencimento do juiz que irá julgar a causa (princípio do contraditório), podendo exigir dele a (d) efetividade de uma participação em diálogo -, tudo com vistas a preparar uma solução que seja justa, seja capaz de eliminar todo resíduo de insatisfação. Eis a dinâmica dos princípios e garantias do processo, na sua interação teleológica apontada para a pacificação com justiça.[31]
No mesmo sentido, José Roberto dos Santos Bedaque leciona que:
Acesso à justiça, ou mais propriamente, acesso à ordem jurídica justa, significa proporcionar a todos, sem qualquer restrição, o direito de pleitear a tutela jurisdicional do Estado e de ter à disposição o meio constitucionalmente previsto para alcançar esse resultado. Ninguém pode ser privado do devido processo legal, ou, melhor, do devido processo constitucional. É o processo modelado em conformidade com garantias fundamentais, suficientes para torna-lo équo, correto, giusto.[32]
Também nessa toada é a lição de Dinamarco:
(...) Falar em instrumentalidade do processo ou em sua efetividade significa, no contexto, falar dele como algo posto à disposição das pessoas com vistas a fazê-las mais felizes (ou menos infelizes) mediante a eliminação dos conflitos que as envolvem, com decisões justas. Mais do que um princípio, o acesso à justiça é a síntese de todos os princípios e garantias do processo, seja a nível constitucional ou infraconstitucional , seja em sede legislativa ou doutrinária e jurisprudencial. Chega-se à idéia do acesso à justiça, que é o pólo metodológico mais importante do sistema processual na atualidade, mediante o exame de todos e de qualquer um dos grandes princípios.[33]
E, em outra obra, citando Kazuo Watanabe, leciona:
Acesso à justiça é acesso à ordem jurídica justa (ainda, Kazuo Watanabe), ou seja, obtenção de justiça substancial. Não obtém justiça substancial quem não consegue sequer o exame de suas pretensões pelo Poder Judiciário e também quem recebe soluções atrasadas para suas pretensões, ou soluções que não lhe melhorem efetivamente a vida em relação ao bem pretendido. Todas as garantias integrantes da tutela constitucional do processo convergem a essa promessa-síntese que é a garantia do acesso à justiça assim compreendido.[34]
Já Horácio Wanderlei Rodrigues, citado por Adriana dos Santos Silva, ensina que na doutrina há dois sentidos para a expressão “acesso à justiça”. O primeiro coloca “justiça” como sinônimo de “poder judiciário”. Assim, nesse caso, acesso à justiça seria sinônimo de acesso ao Poder Judiciário. O segundo sentido da expressão acesso à justiça toma uma conotação dentro de uma escala de valores e direitos fundamentais para o ser humano, que transcende a justiça estatal. Não se esgota no Poder Judiciário.[35]
Mauro Cappelletti e Bryant Garth, também citados por Adriana dos Santos Silva, reconhecem a dificuldade de se chegar a uma definição consensual do termo “acesso à justiça”[36].
Parece-nos que o acesso à justiça deve estar vinculado mais ao conceito axiológico de justiça. Assim, contaríamos com a possibilidade de buscar a justiça, não somente por meio do Poder Judiciário, como também, pela mediação e pela arbitragem que, conforme visto anteriormente, precederam a jurisdição.
Cientes do conceito de acesso à justiça, cabe-nos investigar quais os maiores obstáculos a serem vencidos para que tal acesso seja amplo. Ao escrever sobre as “Justificativas para adoção de tutelas sumárias”, Bedaque ensina:
Inúmeras são as dificuldades enfrentadas por quem se dispõe a pleitear a tutela jurisdicional do Estado, na tentativa de obter proteção a um direito lesado ou ameaçado. A Justiça está em crise, não só no Brasil, como na maioria dos países. E crise na Justiça implica, necessariamente, Crise de Justiça....
Os fatores que contribuem para esse estado de verdadeira calamidade podem ser resumidos basicamente na exagerada demora e no alto custo do processo.[37]
Cabe, então, perguntar: como a ciência processual pode atuar para garantir e até ampliar o acesso à justiça visando reduzir a “exagerada demora[38] e o alto custo do processo”?
A resposta é ofertada pelo atual estágio de desenvolvimento da ciência processual: a fase instrumentalista, em que o processo é tido como um instrumento a serviço da paz social, a serviço da ordem jurídica justa. Cândido Rangel Dinamarco nos diz que:
(...) É a instrumentalidade o núcleo e a síntese dos movimentos pelo aprimoramento do sistema processual, sendo consciente ou inconsciente tomada como premissa pelos que defendem o alargamento da via de acesso ao Judiciário e eliminação das diferenças de oportunidades em função da situação econômica dos sujeitos, nos estudos e propostas pela inafastabilidade do controle jurisdicional e efetividade do processo, nas preocupações pela garantia da ampla defesa no processo criminal ou pela igualdade em qualquer processo, no aumento da participação do juiz na instrução da causa e da sua liberdade na apreciação do resultado da instrução.
(...)
Aprimorar o serviço jurisdicional prestado através do processo, dando efetividade aos seus princípios formativos (lógico, jurídico, político, econômico) é uma tendência universal, hoje. E é justamente a instrumentalidade que vale de suficiente justificação lógico-jurídica para essa indispensável dinâmica do sistema e permeabilidade às pressões axiológicas exteriores: tivesse ele seus próprios objetivos e justificação auto-suficiente, razão inexistiria, ou fundamento, para pô-lo à mercê das mutações políticas, constitucionais, sociais, econômicas e jurídico-substanciais da sociedade.[39]
Assim, hoje, é clara a tendência de que o processo seja um instrumento para resolver e pacificar os litígios. Dentro desse prisma, foram trazidas para o ordenamento jurídico várias normas que muito contribuíram para ampliar o acesso à justiça. Dentre elas temos a Lei dos Juizados Especiais, nº 9099/1995; a Lei da Ação Civil Pública, nº 7347/1985; o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº8778/1990; o Código da Criança e do Adolescente, Lei nº 8069/1990; a Lei nº 9079/1995, que criou a ação monitória[40] (arts. 1102a, 1102b e 1102c do CPC); a antecipação da tutela. Há ainda, as reformas do Código de Processo Civil e a Emenda Constitucional de nº 45. Essas leis em sentido lato possuem o espírito de diminuir o tempo do processo, reduzir seu custo e, com isso, ampliar o acesso à justiça. Mas, em que pesem todas as alterações, na prática, o usuário do serviço não sente significativa melhora do quadro.
Algumas leis, ao mesmo tempo em que aceleram o processo, criam mais direitos. Com isso, há maior número de lides postas à apreciação do Judiciário, que não tem sua estrutura acrescida na mesma proporção da demanda solicitada.
É relevante, também, referirmo-nos à especialização da justiça, como elemento garantidor do “acesso”[41]. Como exemplo, podemos citar as varas cíveis especializadas em questões de família e sucessões, infância e juventude, fazenda pública, dentre outras e as justiças especializadas como a Justiça Federal e a Justiça do Trabalho.
Remetendo-nos, agora, ao conceito axiológico de acesso à justiça, uma alternativa, para se evitar o total colapso do sistema judiciário, poderia ser o incentivo da utilização da mediação[42] (Projeto de Lei nº4827-B/1998) e da arbitragem[43] (Lei nº9307/1996), formas de solução de conflitos extrajudiciais.
Merece destaque, ao se falar em acesso à justiça, a nossa Constituição Federal. Ela oferece uma série de princípios e garantias que muito contribuem para ofertar acesso à ordem jurídica justa. Nos incisos do art. 5º, encontramos várias ferramentas, facilitadoras do acesso à justiça. As seguintes disposições servem de exemplo: O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor (XXXII); a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (XXXV); não haverá juízo ou tribunal de exceção (XXXVII); ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (LIII); ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal (LIV); aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (LV); são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos (LVI); a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem (LX); não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel (LXVII).
Não podemos esquecer, ainda, os “remédios constitucionais” habeas corpus, mandado de segurança, habeas data e mandado de injunção, assim como a assistência jurídica integral e gratuita. A Emenda Constitucional nº 45 acrescentou, no rol do art. 5º, o inciso LXXVIII, que garante a todos, tanto no processo judicial, quanto no administrativo, duração razoável e meios para garantir a celeridade da tramitação[44]. Há ainda, na CF, outras garantias, que também lançam reflexos no acesso à justiça, tais como as garantias da magistratura. Essa última Emenda Constitucional, também conhecida por “reforma do judiciário”, trouxe vários dispositivos que, espera-se, contribuam para o melhor acesso à justiça. Apenas como exemplo citamos os §§ 2º e 3º do art. 107, os §§ 1º e 2º do art. 115 e os §§ 6º e 7º do art. 125, que criam a justiça itinerante, bem como recomendam a descentralização dos Tribunais, na Justiça Federal, Justiça do Trabalho e nas Justiças Estaduais.
Outra questão relevante a ser considerada é a de que o maior cliente do Judiciário, é sabidamente, a Administração Pública. Assim, tanto o Executivo Federal, quanto os estaduais e os municipais, figuram em um dos pólos da maioria das ações, contribuindo significativamente para o congestionamento da máquina judiciária. Ademais, a Fazenda Pública goza de prazos diferenciados[45] e, mais, a Administração Pública Federal conta com uma justiça especializada para os casos em que figure em um dos pólos da ação (Justiça Federal)[46], além de efetuar pagamentos, regra geral, por meio de precatórios.
Mas, valendo-nos do Direito Administrativo, especialmente dos conceitos sobre interesses primário (interesse público propriamente dito) e secundário (interesses particulares, individuais do Estado, como pessoa jurídica), ensinados por Celso Antônio Bandeira de Melo[47], temos que é interesse primário da Administração Pública cumprir bem a lei. Se isso fosse realmente observado, não seria o Executivo o maior cliente dos serviços jurisdicionais.
CONCLUSÃO
Podemos dizer, sem muito receio de errar, que vivemos hoje, no Brasil, a crise do Estado. Por onde quer que se olhe, o Estado não desempenha bem suas atribuições. Não consegue apresentar bons resultados na administração da previdência social, da segurança pública, da saúde, da educação, da conservação das estradas e em tantos outros aspectos essenciais e que visam o bem comum. A prestação jurisdicional, dever do Estado, não está em situação muito diferente. Em seu discurso, na abertura do Ano Judiciário, no último dia 02 de fevereiro, o Presidente do STF apresentou a taxa de congestionamento do sistema judiciário. Disse ele que
(...) em alguns setores a taxa de congestionamento do sistema judiciário está na ordem de 20%, ou seja, a cada ano, para 100 demandas nós temos a capacidade geral de julgar 20 delas. Ou seja, o congestionamento nos levará à paralisação completa do sistema e é por isso a necessidade de formulação de mecanismos que melhorem a nossa capacidade de oferta de decisões, modernamente, na perspectiva das demandas de massa...[48]
Parece-nos que, para alguns, manter a atual situação do Judiciário é conveniente[49]. Basta pensar que os juros legais utilizados pelo Poder Judiciário, em causas postas à sua apreciação, estão bem aquém dos praticados no mercado. Assim, quanto maior for a demora na tramitação de uma ação em pagamento, maior será o benefício do devedor. Esse devedor, obviamente, não estará interessado em modificar esse status quo... Indubitavelmente, temos aqui um claro exemplo de injustiça, valendo-se da Justiça, o que desestimula o credor em acessar a justiça. Se na situação comum da vida, o devedor que atrasa a quitação, ainda que por esquecimento, deve pagar juros de mercado, o devedor, quando interpelado judicialmente, deve ser penalizado, com juros acima dos de mercado, não só por não adimplir suas obrigações no prazo contratado, mas também por congestionar o Judiciário.
A propósito, José Roberto dos Santos Bedaque leciona sobre “(...) a necessidade de o sistema processual atender ao enunciado segundo o qual o processo deve dar a quem tem direito tudo aquilo e exatamente aquilo que é previsto pela lei substancial”[50].
De pouco vale o direito material, se o direito processual não for dotado de ferramentas, que garantam o cumprimento da lei. Neste sentido, ensina Bedaque:
Efetividade da tutela jurisdicional significa a maior identidade possível entre o resultado do processo e o cumprimento espontâneo das regras de direito material. Ou seja. A parte somente necessita pedir a intervenção estatal se não houver satisfação voluntária do direito. Espera-se, pois, que essa atuação possa proporcionar ao titular do interesse juridicamente protegido resultado idêntico, ou, pelo menos, semelhante, àquele previsto no ordenamento substancial e não obtido pela vontade do obrigado.
No mesmo sentido é a dicção de Cappelletti e Garth:
De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos.[51]
Para estimular o acesso à justiça, a tutela jurisdicional deve ser rápida e efetiva. Mas para alcançar a celeridade e a efetividade ideal, parece-nos haver a necessidade de um somatório de esforços.
O processualista deve continuar atuando para tornar o processo judicial mais efetivo. Fala-se hoje no fim do processo de execução. A execução seria a continuação, lógica e natural, do conhecimento, como alguns admitem assim ser no processo do trabalho. Também, fala-se no fim do agravo de instrumento retido e na retirada do efeito suspensivo dos recursos, o que já é aplicado no processo do trabalho.
Ao lado do trabalho do processualista, há a exigência de um novo profissional, habilitado à gerência dos tribunais. Assim como nos hospitais há o administrador hospitalar, que auxilia e otimiza as rotinas, a organização e os métodos do hospital, uma vez que o médico não possui formação científica para bem administrar, ainda que possa ter o conhecimento empírico, de igual maneira, o judiciário clama por melhor administração. O juiz possui formação para bem julgar, aplicar a lei ao caso concreto, porém, as faculdades de Direito não lecionam administração, organização e métodos. Assim, a otimização dos recursos humanos e materiais e, especialmente, a otimização do tempo de permanência do processo nas prateleiras merecem estudo científico mais apurado.
De outro lado, as formas alternativas de pacificação dos conflitos como a mediação e a arbitragem devem ser estimuladas como vias alternativas de acesso à justiça, colaborando, também para que o Judiciário receba menor número de ações, reduzindo a taxa de congestionamento do sistema.
A criação de mecanismos para fiscalizar e obrigar a Administração Pública a cumprir a lei também muito contribuiria para que tivéssemos redução na demora e no custo do processo.
Por fim, a simplificação do Direito é outra interessante sugestão encontrada na obra se Cappelletti e Garth[52]. Nosso Direito é complicado e assim permanecerá. Todavia, há áreas onde a simplificação pode constituir importante elemento de acesso à justiça, pois muito contribuiria para facilitar o entendimento para a pessoa comum.
O bom funcionamento do Judiciário e o amplo acesso à justiça são indispensáveis para a manutenção do Estado de Direito. Assim, mudanças que visem melhorias da tutela jurisdicional, contribuem, também para o fortalecimento da democracia.
REFERÊNCIAS
AMB – Associação dos Magistrados Brasileiros. Pesquisa qualitativa “Imagem do Poder Judiciário”, Brasília, jul. 2004.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência. São Paulo: Malheiros, 2003.
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Notas:
[1] Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, p. 41.
[2] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 13.
[3] Não pretendemos, aqui, discutir as teorias da origem da sociedade, mas apresentar breve retrospectiva histórica. Elas são, basicamente, duas: a da sociedade natural e a que considera que a sociedade é um produto de acordo de vontades, conforme nos ensina Dalmo de Abreu Dallari, Elementos da Teoria Geral do Estado, p. 8. Filiamo-nos à segunda vertente.
[4] Ibid.
[5] Cândido Rangel Dinamarco, em suas Instituições de Direito Processual Civil, p. 104, ensina que: “Tutela jurisdicional é o amparo que, por obra dos juízes, o Estado ministra a quem tem razão num litígio deduzido em processo. Ela consiste na melhoria da situação de uma pessoa, pessoas ou grupo de pessoas, em relação ao bem pretendido ou à situação imaterial desejada ou indesejada. Receber tutela jurisdicional significa obter sensações felizes e favoráveis, propiciadas pelo Estado mediante o exercício da jurisdição.”
[6] Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, p.21 - 24.
[7] O parágrafo único do art. 101 da CF dispõe que os Ministros do STF serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria do Senado Federal. Parece-nos que essa forma de escolha pode comprometer a isenção do Ministro escolhido pelo Presidente, quando do julgamento de ações, cujo resultado interesse ao Presidente, como por exemplo as mencionadas no art. 102, “b” da CF.
[8] É claro que as demandas sobre o Poder Executivo são significativas (saúde, educação, transportes, etc), justificando o maior percentual do orçamento da União.
[9] José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, p.16.
[10] José Roberto Nalini, Faltam Juízes ou Idéias, “O Estado de São Paulo”, 7 de julho de 2004.
[11] José Roberto Nalini, Faltam Juízes ou Idéias, O Estado de São Paulo, 7 de julho de 2004.
[12] Jornal do Advogado [da OAB/SP], nº 288, nov./2004, Justiça Emperrada., p. 12 e 13.
[13] Jornal do Magistrado [da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB], março a abril de 2004, p. 6.
[14] A emenda Constitucional Nº 45 alterou o art. 126, com a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias.
[15] O Ministro Nelson Jobim, em seu discurso durante a abertura do ano Judiciário, em 01/02/05, citou a fala do Ministro Sepúlveda Pertence, que explica porque as experiências de um Tribunal não são aplicadas em outro. “O ministro (Sepúlveda) Pertence sabidamente, pela experiência que veio da Procuradoria da República como também do ativismo da Ordem dos Advogados do Brasil e junto também ao Supremo Tribunal, tem dito claramente que o Sistema Judiciário Brasileiro, com seus 96 tribunais, é um arquipélago de ilhas de pouca comunicação. E esse insulamento administrativo tem levado á ineficácia porque cada um entende que a solução dos nossos problemas passe exclusivamente pelas idiossincrasias individuais de cada um desses tribunais, quando isso é um problema de todos nós, quando isto é um problema de sobrevivência de todos nós” (disponível em: www.stf.gov.br/noticias/impresnsa/palavra_dos_ninistros/ler.asp?CODIGO=120987, acesso em: 06 de fevereiro de 2005).
[16] Disponível em: <www.mj.gov.br/reforma/premio>. Acesso em: 18 de janeiro de 2005.
[17] Pesquisa Qualitativa “Imagem do Poder Judiciário” [da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB], Brasília-DF, julho de 2004.
[18] Ibid., p.10.
[19] Ibid., p.13.
[20] Ibid.
[21] Pesquisa Qualitativa “Imagem do Poder Judiciário” [da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB], Brasília-DF, julho de 2004, p.20
[22] Ibid., mesma página.
[23] Segundo Adriana dos Santos Silva, em seu livro Acesso à Justiça e Arbitragem, p. 120, referindo-se à obra Cortes Arbitrais: doutrina, prática, jurisprudência e legislação, de Vítor Barbosa Lenza,. “Vários são os fatores que emperram o livre acesso judicial, e o que se reputa mais sério é a desinformação. O cidadão, quando se encontra em uma situação adversa, passando por um constrangimento qualquer, por ser analfabeto ou de pouca instrução, não sabe que atitude tomar, a quem ou a qual serviço procurar que possa restaurar o seu direito ameaçado ou lesado.”
[24] MAYHEL. “Institutions of Representation: Civil Justice and the Public” (Instituições da Represntação Judicial: A Justiça Comum e o Público). In Law & Society Review,v. 9, 1975, p.401,406.
[25] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 22 e 23.
[26] Jornal do Advogado [da OAB/SP], nº 272, junho./ 2003.
[27] Ibid, p. 4.
[28] No Estado de São Paulo, por exemplo, ainda não há Defensoria Pública. A assistência judiciária é feita pela Procuradoria de Assistência Judiciária, órgão da Procuradoria Geral do Estado.
[29] Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado. A Emenda Constitucional nº 45 acrescentou o §2º ao art. 134, o que dá autonomia funcional e administrativa às defensorias públicas estaduais, bem como assegura a iniciativa de sua proposta orçamentária, o que nos parece ser significativa contribuição para aprimorar o acesso à justiça.
[30] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 25 e 26.
[31] Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, p.33.
[32] José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, p.71.
[33] Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, p.372.
[34] Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, p.114 e 115.
[35] Horácio Wanderlei Rodrigues, Acesso à Justiça no Direito Processual Brasileiro, p.28, apud Adriana dos Santos Silva, Acesso à Justiça e Arbitragem, p. 95.
[36] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, Trad. Hellen Gracie Northfleet, apud Adriana dos Santos Silva, Acesso à Justiça e Arbitragem, p. 95.
[37] José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, p.28 e 29.
[38] Revelam-nos Mauro Cappelletti e Bryant Garth, no livro Acesso à Justiça p. 21 “Em muitos países, as partes que buscam uma solução judicial precisam esperar dois ou três anos, ou mais, por uma decisão exeqüível. Os efeitos dessa delonga, especialmente se considerados os índices de inflação podem ser devastadores. Ela aumenta os custos para as partes e pressiona os economicamente fracos a abandonar suas causas, ou a aceitar acordos por valores muito inferiores àqueles a que teriam direito. A Convenção Européia para Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais reconhece explicitamente, no artigo 6º, parágrafo 1º que a Justiça que não cumpre suas funções dentro de “um prazo razoável” é, para muitas pessoas, uma Justiça inacessível.”
[39] Cândido Rangel Dinamarco, A Instrumentalidade do Processo, p. 25 e 26.
[40]A ação monitória é uma forma anômala de se obter título executivo judicial, porque ele é normalmente obtido em um processo de conhecimento, que é mais demorado. Ao ajuizar a ação monitória, o juiz já expede mandado de pagamento ou de entrega do bem. Se o réu não opôs embargos imediatamente, automaticamente, já se torna um processo de execução forçada, por título judicial. A ação monitória, como um todo, é diferenciada. Não é possível enquadrá-la nem em processo de conhecimento, nem em processo de execução; ela é híbrida. Começa como conhecimento e torna-se execução, de forma automática. Ela é de conhecimento, por causa dos embargos que o réu pode opor, sem garantir o juízo, podendo opôr todas as matérias. Esses embargos “monitórios” não são embargos à execução e não sofrem restrição de matérias. Se os embargos forem apresentados, a celeridade fica, de certa maneira, comprometida, pois haverá, então, verdadeiro processo de conhecimento, com ampla defesa e morosidade, característica, hoje, de tal processo. Por outro lado, a tutela monitória é facultativa. Ainda que a parte tenha a prova escrita, sem ser título executivo, ela tem a faculdade de ajuizar a ação monitória, ou seja, pode preferir ajuizar ação de processo de conhecimento. Parece-nos que o intuito do legislador foi ampliar o acesso à justiça.
[41] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 132.
[42] Na mediação, o mediador é terceira pessoa escolhida ou aceita pelas partes e tem a função de aproximá-las, ouvi-las formular propostas, orientá-las, facilitar a solução consensual do conflito. No entanto, sua opinião não possui força de obrigatoriedade.
[43] Na arbitragem, as partes delegam a uma terceira pessoa a solução da lide. A decisão obriga as partes.
[44] Carlos Alberto Silveira Lenzi, no artigo Repensar o Judiciário, publicado pelo jornal Folha de São Paulo, em 10 de fevereiro de 2005, p.A3, diz que: “Esse preceito (ou norma programática), como outros no mesmo sentido que varejam diplomas legais pátrios, é insípido, inodoro, incolor e inócuo na executividade ou na exigência mandamental. Não possui o novo preceito instrumentalidade prática. É uma proposição ética ‘destinada a afirmar um projeto de vida, um rumo a seguir, um vir a ser”, na opinião abalizada de Walter Ceneviva.”
[45] CPC, “Art. 188 Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público.”
[46] CF. “Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I – as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.”
[47] Curso de Direito Administrativo, p. 55 e 56: “Uma vez reconhecido que os interesses públicos correspondem à dimensão pública dos interesses individuais, ou seja, que consistem no plexo dos interesses dos indivíduos enquanto partícipes da Sociedade (entificada juridicamente no Estado), nisto incluído o depósito intertemporal destes mesmos interesses, põe-se a nu a circunstância de que não existe coincidência necessária entre interesse público e interesse do Estado e demais pessoas de Direito Público.
É que, além de subjetivar estes interesses, o Estado, tal como os demais particulares, é, também ele, uma pessoa jurídica, que, pois, existe e convive no universo jurídico em concorrência com todos os demais sujeitos de direito. Assim, independentemente do fato de ser, por definição, encarregado dos interesses públicos, o Estado pode ter, tanto quanto as demais pessoas, interesses que lhe são particulares, individuais, e que, tal como os interesses delas, concebidas em suas meras individualidades, se encarnam no Estado enquanto pessoa. Estes últimos não são interesses públicos, mas interesses individuais do Estado, pois (sob prisma extra-jurídico), aos interesses de qualquer outro sujeito. Similares, mas não iguais. Isto porque a generalidade de tais sujeitos pode defender estes interesses individuais, ao passo que o Estado, concebido que é para a realização de interesses públicos (situação, pois, inteiramente diversa da dos particulares), só poderá defender seus próprios interesses privados quando, sobre não se chocarem com os interesses públicos propriamente ditos, coincidam com a realização deles. Tal situação ocorrerá sempre que a norma donde defluem os qualifique como instrumentais ao interesse público e na medida em que o sejam, caso em que sua defesa, ipso facto, simultaneamente a defesa de interesses públicos, por concorrerem indissociavelmente para a satisfação deles.
Esta distinção a que se acaba de aludir, entre interesses públicos propriamente ditos- isto – e entre interesses primários do Estado – e interesses secundários (que são os últimos a que se aludiu) é de trânsito corrente na doutrina italiana...”
[48] Disponível em: <www.stf.gov.br/noticias/impresnsa/palavra_dos_ninistros/ler.asp?CODIGO=120987&tip=DP>. Acesso em: 06 de fevereiro de 2005.
[49] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, na obra Acesso à Justiça, p. 7, observam que: “Nenhum aspecto de nossos sistemas jurídicos modernos é imune à critica. Cada vez mais pergunta-se como, a que preço e em benefício de quem estes sistemas de fato funcionam.”
[50] José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, p.24
[51] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 11 e 12.
[52] Mauro Cappelletti e Bryant Garth, Acesso à Justiça, p. 156 a 159.
(Elaborado em abril/2005)
Paulo Halfeld Furtado de Mendonça
Servidor do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região e Assistente de Juiz.Código da publicação: 914
Como citar o texto:
MENDONÇA, Halfeld Furtado de..Acesso à justiça no Brasil. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 2, nº 154. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/pratica-forense-e-advogados/914/acesso-justica-brasil. Acesso em 28 nov. 2005.
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