Dijonilson Paulo Amaral Veríssimo[2]

I - INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por finalidade a análise do texto de autoria do professor Lúcio Delfino, que trata da aplicação do princípio da fungibilidade das tutelas de urgência, mormente com a entrada em vigor da Lei nº 10.444/2002, a qual inseriu o §7º ao art. 273, do Código de Processo Civil.

No decorrer da resenha, foram analisados alguns problemas enfrentados pela doutrina e pela jurisprudência brasileiras quando tentativa de melhor interpretar e aplicar as disposições legislativas acerca do tema “tutelas de urgência”.

II – REFLEXÕES SOBRE A FUNGIBILIDADE DAS TUTELAS DE URGÊNCIA

A antecipação de tutela, tanto no Brasil, como em inúmeros outros países, é originada no processo cautelar, que não fazia distinção, senão em sede doutrinária, entre ambas as tutelas. Sobre a distinção das tutelas, assim se manifestou Barbosa Moreira: “A ciência processual - melhor dizendo: a ciência jurídica - precisa aceitar o fato de que, em alguns assuntos, não lhe é dado fixar marcos de perfeita nitidez entre áreas limítrofes. E, às vezes, não é útil sequer tentar fazê-lo”.(MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de Direito Processual. 8ª ed. São Paulo, Ed. Saraiva, 2004, p. 104).

Com o advento da segunda etapa da reforma do Código de Processo Civil, introduzida pela Lei 10.444, de 07 de maio de 2002, estabelece uma mudança radical quanto ao tratamento das tutelas de urgência no que se refere à aplicabilidade do princípio da fungibilidade.

Essa norma incluiu o §7º no art. 273 do CPC, que estabeleceu a possibilidade de aplicação do referido princípio em se tratando de tutelas de urgência. Senão vejamos:

“§7º. Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado”.

 

A fungibilidade é a possibilidade de conhecer de um instrumento jurídico proposto erradamente tal qual fosse o adequado, advindo de permissão legal expressa. Em nosso direito processual, antes da reforma oriunda da Lei 10.444/2002, nunca houve previsão de fungibilidade entre as ações. Havia previsões específicas como nas ações possessórias e nos recursos em geral. Por conseguinte, é inovador esse aspecto da reforma que instituiu o § 7º no art. 273 do Código de Processo Civil.

Como explicita a advogada Dayse Coelho de Almeida, em brilhante trabalho sobre o tema em comento:

A fungibilidade é a possibilidade de conhecer de um instrumento jurídico proposto erradamente tal qual fosse o adequado, advindo de permissão legal expressa. Em nosso direito processual, antes da reforma oriunda da Lei 10.444/2002, nunca houve previsão de fungibilidade entre as ações. Havia previsões específicas como nas ações possessórias e nos recursos em geral. Por conseguinte, é inovador esse aspecto da reforma que instituiu o § 7º no art. 273 do Código de Processo Civil” (ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fungibilidade e a tutela antecipada no direito processual civil moderno: tonalidade inovadora da lei nº 10.444/2002. www.jus.com.br/doutrina. Acesso em 25/05/2005).

Trata-se assim, de inequívoca aplicação do mencionado postulado, ou seja, a disposição estabelece no âmbito das tutelas de urgência a possibilidade de substituição dos procedimentos sem prejuízo ao oferecimento da tutela pretendida, seja cautelar ou antecipatória.

Nesse contexto, podemos afirmar que a introdução do §7º ao art. 273 do CPC trouxe ao nosso sistema o fenômeno chamado sincretismo processual. O sincretismo mostra-se como uma tendência do direito processual em combinação de fórmulas e procedimentos na busca de uma simplificação e efetividade ao processo.

Na exposição de motivos do anteprojeto nº 13, que foi objeto da Lei 10.444 de 2002, ao tratar da norma supracitada, os Ministros Sálvio Figueiredo Teixeira e Athos Gusmão Carneiro justificaram sua inclusão no ordenamento processual civil em razão do princípio da economia processual com a adoção da fungibilidade procedimental entre as tutelas de urgência (TEIXEIRA, Sálvio Figueiredo e CARNEIRO, Athos Gusmão. “Anteprojeto de Lei (Nº 13) Complementa as leis de reforma do Código de Processo Civil. In Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre, Síntese, ano I, n. 2, nov./dez. 1999. p. 143).

O douto José Rogério Cruz e Tucci afirma que a introdução desse novo parágrafo ao artigo 273 “vem a mitigar a exegese estritamente formalista que se verifica na prática”, pois jamais será aconselhável sacrificar o direito do jurisdicionado, principalmente em situações de urgência. Afirma, ainda, que: “essa disposição, agora, flexibiliza o caráter de autonomia das medidas cautelares, autorizando o juiz a proferi-las de forma incidental no processo de conhecimento” (TUCCI, José Rogério Cruz e. Lineamentos Da Nova Reforma do CPC. 2. ed. rev. atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002).

Na verdade, possibilitou-se a adoção de providências cautelares no processo de natureza cognitiva, sem necessidade de um processo específico e autônomo. O processo de conhecimento foi ampliado para possibilitar que em seu interior, a tomada de medidas cautelares que visem assegurar sua própria eficácia e efetividade, não dependessem mais de um outro.

Analisa esse contexto o professor Lúcio Delfino, verbis:

Com a adoção desse novo mecanismo, já utilizado independentemente de previsão legal pela jurisprudência de vanguarda, o legislador, além de enaltecer o princípio da economia processual, incrementou a idéia de efetividade e a mentalidade instrumentalista que contagia o estudo do processo hodiernamente” (DELFINO. Lúcio. Breves reflexões sobre a fungibilidade das tutelas de urgência e seu alcance de incidência. In Revista de Processo nº 122. São Paulo: RT, p. 203).

 

Com efeito, o §7º do art. 273 do CPC veio acrescentar o rol de situações previstas na lei em que o órgão julgador encontra-se autorizado a deferir medidas cautelares independentemente da propositura e existência de ação cautelar autônoma. Em sendo assim, uma interpretação sistemática dos arts. 273, §7º e 797, conduzirá o julgador ao caminho seguro do sincretismo processual, tornando desnecessária a criação de um outro processo (cautelar), minimizando a formalidade excessiva em prol do estímulo e prática dos ideais de efetividade, economia e instrumentalidade (DELFINO, 208).

A partir da inovação apontada, a doutrina passou a discutir a amplitude de tal dispositivo. A questão principal consiste na possibilidade ou não da fungibilidade de “mão dupla”, ou seja, se uma tutela pode ser substituída pela outra, sendo a recíproca verdadeira.

Nesse diapasão, uma leitura atenta nos faz perceber que o dispositivo inserido faz menção apenas a autorizar que o juiz defira tutela cautelar a título de antecipação de tutela, porém, não faz menção do caminho inverso, ou seja, requerer medida antecipatória na forma de medida cautelar. Para tanto valendo-nos da lição do professor Carpena teremos que “por via contrária lógica e pelo mesmo princípio teleológico, que se mostra possível o deferimento de medida antecipatória, requerida equivocadamente como cautelar” (CARPENA, Márcio Louzada. Do Processo Cautelar Moderno. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 108-109).

Parte da doutrina pátria vem se posicionando de maneira negativa, aduzindo que o referido dispositivo não trouxe a possibilidade de fungibilidade ampla, mas apenas em uma única via de direção (presentes os pressupostos, é claro), isto é, não está autorizado o juiz a conceder medida antecipatória de tutela quando pleiteada medida de natureza cautelar. Nesse sentido é a posição de William Santos Ferreira:

Conversibilidade inversa no pleito cautelar para antecipatório: é possível? É muito mais simples responder afirmativamente a esta pergunta, mas para nós na cautelar haver um pedido de natureza antecipatória e sua conversibilidade, não nos parece possível, pois a antecipação necessita encontrar-se no processo principal” (FERREIRA, William Santos. Aspectos polêmicos e práticos da nova reforma processual civil. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2003.)

 

Outra parte da doutrina segue a tese do “duplo sentido vetorial” capitaneada pelo Prof. Cândido Rangel Dinamarco que defende a aplicação da fungibilidade em mão dupla ocasionando a possibilidade de substituição de um instituto pelo outro e vice-versa (também com a presença dos pressupostos de uma ou de outra para a sua viabilização), o que leva ao raciocínio de que a fungibilidade não pode ser aplicada “em uma só mão de direção”.

Antes da reforma processual ocorrida em 2002, a jurisprudência de diversos Tribunais, inclusive o Superior Tribunal de Justiça, se deparou com situações, onde o argumento essencial para a denegação de pleitos cautelares se fundou exclusivamente na satisfatividade da pretensão, conforme arrestou abaixo colacionados:

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL – PETIÇÃO INICIAL – INDEFERIMENTO – MEDIDA CAUTELAR – TUTELA ANTECIPADA – 1. Petição inicial indeferida sob o entendimento de que a pretensão dita como cautelar tem, em seu núcleo, efeitos de tutela antecipada. 2. Recurso especial intentado sem enfrentar os pressupostos da medida cautelar e a convicção do julgador que impôs o indeferimento. 3. Fundamentação do recurso que aponta violação aos arts. 131, 458 e 535, II, do CPC, e aos artigos 151, II, do CTN e 19 da Lei nº 8.870/94, bem como do art. 9º, § 4º, da Lei nº 6.830/80. 4. Ausência de pressupostos para a admissibilidade do recurso especial, haja vista que a discussão está limitada, apenas, a saber se o pedido tem feição cautelar ou de tutela antecipada, aspectos não enfrentados pelos recorrentes. 5. Agravo regimental improvido. (STJ – AGRESP 283217 – RJ – 1ª T. – Rel. Min. José Delgado – DJU 13.08.2001 – p. 00058)

 

TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO DE TRIBUTOS. AÇÃO CAUTELAR. INADMISSIBILIDADE.É inadequada a ação cautelar para requerer compensação de tributos, tanto pela sua satisfatividade, como pela ausência de demonstração de perigo na demora, uma vez que a autoridade fazendária não pode impingir constrição num direito que é futuro, qual seja o de compensar créditos tributários inexistentes à época do ajuizamento da ação. (STJ – ERESP 183627 – SP – 1ª Seção - Embargos de Divergência no recurso especial – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJU 10.05.2000)

Nos casos acima transcritos, a jurisprudência do STJ havia determinado, no caso de se interpor o pedido cautelar em lugar do antecipatório, o indeferimento puro e simples. Sem embargo, a dificuldade jurisprudencial levou ao reconhecimento, pelos autores da reforma, de uma nebulosidade (que para parte da doutrina não existia, conforme explicitado pelo professor Francisco Barros Dias), fazendo inserir a fungibilidade em questão.

Afirma o mestre Dinamarco, opinando pela permissibilidade da fungibilidade em “mão dupla” das tutelas de urgência, que: “Não há fungibilidade em uma só mão de direção. Em direito, se os bens são fungíveis isso significa que tanto se pode substituir um por outro, como outro por um”. (DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma. 4ª ed, São Paulo: Malheiros, 2002, pág. 92)

Acerca da permissibilidade da fungibilidade de “mão dupla” no campo das tutelas de urgência, leciona o sempre citado Lúcio Delfino, verbis:

Contudo, a doutrina, em sua maioria, já se ergueu contra uma possível interpretação literal do art. 273, §7º, do CPC. Acertadamente, o entendimento prevalecente exalta-se no rumo de que a fungibilidade de tutelas deve ser vista em mão dupla, admitindo-se, assim, sua utilização também naquelas situações em que reclamam antecipação de tutela transvestida em pedido cautelar liminar. Esse, outrossim, o posicionamento de Cândido Rangel Dinamarco ao afirmar não haver fungibilidade em uma só mão de direção” (DELFINO, 209).

 

E continua o professor Delfino:

Portanto, muito embora o legislador tenha previsto apenas uma hipótese de aplicação à fungibilidade de tutelas, tal mecanismo também deverá ser utilizado nos casos em que a situação inversa àquela contida no texto da lei ocorrer” (DELFINO, 211).

A dificuldade de aplicação, por parte de alguns operadores do direito, do princípio da fungibilidade das tutelas de urgência, acaba-se criando situações extremamente prejudiciais aos jurisdicionados, pois, frente a uma classificação de tutelas divergentes, por diversas vezes se viu o indeferimento de medidas por erro na escolha do rito. Considera-se que o indeferimento de medida urgente por erro da natureza da medida, no mínimo se apresenta como formalismo exagerado, vez que o direito tutelado encontra-se diante de risco iminente de dano irreparável. A mola que autoriza uma decisão urgente é de cunho Constitucional (art. 5º, XXXV), de forma que qualquer divergência de rito (273 ou 798) não poderá impedir a tutela de direito, havendo por bem, de deixar-se de lado o rigorismo excessivo para deferir a tutela e, após, sendo o caso, proceder-se na devida adequação.

Nessa mesma linha de pensamento está a lição de Lúcio Delfino, in verbis:

Revela-se, daí, o princípio constitucional do direito à ação, evidenciando, dentre outras conseqüências, ser plenamente possível uma interpretação extensiva do art. 273, §7º, do CPC, a ponto de permitir a apreciação de tutela antecipada formulada num processo cautelar. (...) em casos onde a urgência reina, o juiz não deverá se ater apegado demasiadamente à forma; impõe-se a ele, ao contrário, preocupar-se com o jurisdicionado, buscando avaliar aquela situação emergencial posta ao seu conhecimento, despezando, apenas inicialmente, o rótulo dado à ação. (...) Nessa perspectiva, é crível a conclusão de que não é aconselhável ao juiz fundamentar sua suposta impossibilidade de apreciar o pedido antecipatório satisfativo, feito no bojo de um processo cautelar, com base no argumento de que ‘ a lei processual não previu tal caminho’, porquanto é a própria Carta Magna que reza que lei alguma excluirá da apreciação do Poder Judiciário ‘ameaça de direito’” (DELFINO, 210).

O que se pode constatar é que com a recente reforma, enfraqueceu significativamente o processo cautelar, que na sua forma de processo autônomo já não guarda tanta utilidade como outrora. Nas palavras de José Maria Tescheiner: “Os processos cautelares incidentes tenderão a desaparecer. Teremos processos preparatórios, com pedido de regulação provisória da lide (mediante medida de natureza cautelar ou antecipatória); e processos com pedido de regulação definitiva, com eventual decisão interlocutória, voltada à litisregulação” (TESHEINER, José Maria. Fungibilidade das medidas cautelares e antecipatórias. www.tex.pro.br. Acesso em: 25/05/2005).

Assim, existe a quebra com o modelo clássico de rígida divisão de processos (conhecimento, execução e cautelar), sendo autorizado que em uma mesma relação jurídica possa a parte valer-se de todos eles. Nas palavras de Joel Figueira Júnior: “Em síntese, o § 7º do art. 273 do CPC permite ao Juiz conhecer, acautelar e executar (= efetivar providência de natureza satisfativa), no mesmo processo”.(FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à Novíssima Reforma do CPC, 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002).

Por derradeiro, é importante colacionar a seguinte posição do sempre lembrado professor Lúcio Delfino, o qual sintetiza toda discussão acerca da temática envolvendo a fungibilidade das tutelas de urgência:

A melhor doutrina – repita-se – já vem pacificando o entendimento de que o §7º, do art. 273 do CPC realmente deve funcionar em mão dupla. Isto é, feito um pedido cautelar no bojo de um processo de conhecimento, deverá o juiz conhecê-lo e decidi-lo; se o pleito é satisfativo antecipatório, mas realizado num rito evidentemente cautelar, impõe-se ao órgão julgador, igualmente, examinar tal pedido, levando-se em consideração, por óbvio, a presença dos requisitos ensejadores à sua concessão” (DELFINO, 215).

E o mesmo, assim conclui:

“(...) autorizado está o julgador a valer-se do princípio da proporcionalidade visando os passos na trajetória relegada pela lei processual (...) Obviamente, se sopesados os interesses em jogo na demanda, o poderá o juiz decidir, com acerto, qual a melhor solução para o caso concreto: privilegiar um pedido antecipatório satisfativo urgente, muitas vezes ligado á própria vida, saúde ou dignidade do requerente, ou, pr outro lado, seguir rigorosamente a direção traçada pelo ordenamento processual, extinguindo de plano p processo. O apego à primeira opção é, sem dúvida, a via mais segura” (DELFINO, 211).

É irrelevante, portanto, para a efetiva prestação da tutela jurisdicional se a providência pleiteada é nominada ou não. A fungibilidade deve ser ampla, sem restrições, mesmo que exista previsão legal para determinada medida urgente. A inovação, se bem interpretada e aplicada pelos operadores do direito, trará benefícios palpáveis aos jurisdicionados, eis que o prejuízo pela incorreta proposição de uma medida antecipatória em desfavor de uma cautelar, não mais será motivo para o indeferimento do pleito e a conseqüente extrapolação temporal no curso processual, conforme decisões transcritas alhures.

III - CONCLUSÕES

À guisa de conclusão, podemos verificar, com base na nos textos estudados e em especial do professor Lúcio Delfino, que o novo texto do art. 273, §7º do CPC, ao disciplinar, expressamente, a necessidade de dotar a tutela de urgências de um mecanismo de fungibilidade, atendeu a reclamos que já vinham sendo formulados há algum tempo pela boa doutrina.

A aplicação do princípio da fungibilidade deve ser extensiva, autorizando o magistrado a conceder medida cautelar requerida como antecipatória. Como exposto no corpo do trabalho: quem pode o mais – antecipar, deve poder o menos – acautelar.

Ademais, a fungibilidade deve ser uma “via de mão dupla”, isto é, se a parte requerer providência antecipatória via “ação cautelar”, não há razão para não admitir o pedido, recebido como simples petição, juntada aos autos do processo principal. Cabe, se necessário, ação satisfativa preparatória, assim entendida como medida urgente não cautelar e pleiteada antes da propositura da ação principal, ressalva feita àquelas providências com efeitos irreversíveis.

Em todos os casos, deve o magistrado analisar o pedido, com o cuidado de examinar os pressupostos específicos de cada medida, concedendo-a, se preenchidos os requisitos. Nas medidas urgentes nominadas, caso não se verifique a presença dos requisitos especificados por lei, mas se a prestação da tutela jurisdicional se mostrar em risco e presentes os requisitos gerais das providências urgentes, o magistrado pode conceder medida de urgência que se mostre suficiente para afastar o risco mencionado.

Assim, requerida medida de natureza cautelar, o procedimento a ser observado é o mesmo da antecipação de tutela, isto é, a instrução do incidente nos autos do próprio processo principal. Deve-se, contudo, respeitar o contraditório antes da concessão da medida ou de forma diferida, quando a situação fática mostrar que a demora de sua execução ou a ciência do requerido poderão impossibilitar a prestação efetiva da tutela jurisdicional.

Em síntese, o processo cautelar incidental tende a desaparecer, pois a concessão de medidas cautelares no curso do próprio processo ajuizado (conhecimento ou execução) parece ser o caminho mais prático e econômico, sejam essas providências nominadas ou não. Mesmo assim, enquanto a lei que regulamenta a tutela de urgência não é objeto de profunda revisão, entende-se que a parte pode optar entre o requerimento de medida acautelatória nos autos do processo principal ou a instauração de processo autônomo.

Por fim, merece a lição do douto José Roberto dos Santos Bedaque, citado por Lúcio Delfino, ao refletir acerca da ciência processual moderna, leciona que:

‘a principal missão do processualista é buscar alternativas que favoreçam a resolução dos conflitos. Não pode prescindir, evidentemente, da técnica. Embora necessária para a efetividade e eficiência da justiça, deve ela ocupar o seu devido lugar, como instrumento de trabalho, não como um fim em si mesmo. Não se trata de desprezar os aspectos técnicos do processo, mas apenas de não se apegar ao tecnicismo. A técnica deve servir de meio para que o processo atinja seu resultado’.

 

E o mesmo Santos Bedaque arremata afirmando que:

é preciso conciliar a técnica processual como seu escopo. Não se pretende nem o tecnicismo exagerado, nem o abandono total da técnica. Virtuoso é o processualista que consegue harmonizar esses dois aspectos, que implicará a construção de um sistema processual apto a alcançar seus escopos, de maneira adequada’. (SANTOS BEDAQUE, José Roberto dos, apud Lúcio DELFINO. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997, 211)

IV - REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fungibilidade e a tutela antecipada no direito processual civil moderno: tonalidade inovadora da lei nº 10.444/2002. www.jus.com.br/doutrina. Acesso em 25/05/2005.

CARPENA, Márcio Louzada. Do processo cautelar moderno. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2004.

DELFINO. Lúcio. Breves reflexões sobre a fungibilidade das tutelas de urgência e seu alcance de incidência. In Revista de Processo nº 122. São Paulo: RT.

DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. 4ª ed, São Paulo: Malheiros, 2002.

FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Comentários à novíssima reforma do CPC, 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Temas de direito processual. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

SANTOS BEDAQUE, José Roberto dos, apud Lúcio DELFINO. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997).

TEIXEIRA, Sálvio Figueiredo e CARNEIRO, Athos Gusmão. Anteprojeto de Lei (Nº 13) Complementa as leis de reforma do Código de Processo Civil. In Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil. Porto Alegre, Síntese, ano I, n. 2, nov./dez. 1999.

TESHEINER, José Maria. Fungibilidade das medidas cautelares e antecipatórias. www.tex.pro.br. Acesso em: 25/05/2005.

TUCCI, José Rogério Cruz e. Lineamentos da nova reforma do CPC. 2. ed. rev. atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

  

[1]              Artigo baseado no texto de autoria do professor Lúcio Delfino. Retirado da Revista de processo nº 122, São Paulo: RT

[2]              Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, advogado, especialista em Direito Público pela mesma Universidade. Procurador Federal de 2ª Categoria. Chefe da Procuradoria Regional do INSS em Brasília.

 

 

Elaborado em janeiro/2013

 

Como citar o texto:

VERÍSSIMO, Dijonilson Paulo Amaral..A fungibilidade das tutelas de urgência: alcance de incidência. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1113. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/2752/a-fungibilidade-tutelas-urgencia-alcance-incidencia. Acesso em 21 out. 2013.

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