Resumo: O presente trabalho tem como escopo o estudo da Ética no exercício da advocacia, posto que a temática íntegra a própria essência da profissão, porquanto, de todas as profissões jurídicas a advocacia talvez seja à única que nasceu rigidamente presa a deveres éticos. Assim, é razoável que se detenha em pormenores que servirão de auspício aos temas vindouros, para tanto, é que se faz necessário lançar à análise daquilo que é a Ética, sua origem e evolução histórica, bem como a substancial importância dos preceitos esculpidos no Código de Ética e Disciplina da OAB, para o escorreito exercício da profissão.

Palavras Chave: Ética – Código de Ética – Advocacia – Moral.

1.1 – Do conceito

Todo estudo acerca da ética sempre se inicia pela análise de suas origens etimológicas e pela sua distinção ou sinonímia com o termo “moral”. Justifica-se a necessidade de explicitar a origem do termo ethos, uma vez que é de seu nascedouro que iremos encontrar as respostas para as incertezas terminológicas e imprecisões conceituais.

Ademais, não existe entre os estudiosos do tema um conceito unânime sobre ética e moral, embora haja algumas semelhanças nas definições propostas, razão pela qual faremos uma breve reminiscência as suas origens, vez que as divergências conceituais devem-se, em grande parte, aos diversos significados da palavra primitiva éthos e a sua tradução para o latim.

Segundo estudos realizados por Marilena Chauí:

                                      A palavra ética vem de duas palavras gregas: éthos, que significa “o caráter de alguém” e êthos que significa “o conjunto de costumes instituídos por uma sociedade para formar, regular e controlar a conduta de seus membros” (2012, p. 382).

 

                                      A palavra moral vem da palavra latina mos, moris, que quer dizer “o costume” no plural mores significa os hábitos de conduta ou de comportamento instituídos por uma sociedade em condições históricas determinadas (2012, p.381).

Para Adolfo Sánchez Vázquez, ambas as palavras mantém uma relação que na sua origem etimológicas não existia. Assim, certamente a palavra moral vem do latim mos ou mores, “costume” ou “costumes”, no sentido de conjunto de normas ou regras adquirido ou modo de ser conquistado pelo homem. Já a ética vem do grego éthos, que significa analogicamente “modo de ser” ou “caráter” enquanto forma de vida também adquirida ou conquistada pelo homem. Portanto, originariamente, ethos e mos, “caráter” e “costume”, assentam-se num modo de comportamento que não corresponde a uma disposição natural, mas que é adquirido ou conquistado por hábito. É precisamente esse caráter não natural da maneira de ser do homem que, na Antiguidade, lhe confere sua dimensão moral (VÁZQUEZ, 2002, p. 24).

Depreende-se então, conforme ensinamentos do autor supracitado, que aqui está origem de toda a confusão acerca do conteúdo semântico dos termos e, por conseguinte, a sinonímia ou distinção dos sentidos, pois, o significado atribuído às palavras moral e ética não nos fornece o significado atual dos dois termos, sendo que, situam no terreno especificamente humano no qual se torna possível e se funda o comportamento moral: o humano como adquirido e conquistado pelo homem sobre o que há nele a natureza, o comportamento moral pertence somente ao homem na medida em que, sobre a sua própria natureza, cria esta segunda natureza, da qual faz parte a sua atividade moral.

Corroborando com esse entendimento, são os dizeres Marcus Cláudio Acquavica:

                                     O termo Ética é de origem grega, de êthos, comportamento. O sentido de êthos passou, com o tempo, por modificações, denominando, inicialmente o local da morada, habitação, passando, depois, a significar a atitude do homem perante a sociedade, seus valores espirituais em relação ao mundo. A partir de Aristóteles (384-322 a.C), o termo denomina caráter de cada pessoa, seu modo de ser derivado de sua vida social. (2010, p.370).

Nesse sentido, temos as lições do professor José Renato Naline, vejamos:

                                      A origem etimológica da Ética é o vocábulo grego “éthos”, a significar “morada”, “lugar onde se habita”, mas também quer dizer “modo de ser” é a aquisição de características da nossa forma de vida. A reiteração de certos hábitos nos faz virtuosos ou viciados. Dessa forma, “o éthos é o caráter impresso na alma por hábito”, como os hábitos se sucedem, tornam-se por sua vez fonte de novos hábitos. O caráter seria essa segunda natureza que os homens adquirem mediante a reiteração de conduta. Sobre essa vertente, “moral” e “ética” significam algo muito semelhante. Por isso a aparente sinonímia das expressões “valor moral” e “valor ético”, “normas morais” e “normas éticas”. Todavia a conceituação de ética ora adotada autoriza distingui-la da moral, pese embora aparente identidade etimológica de significado. Ethos, em grego, e mos, em latim, querem dizer costume. Nesse sentido a ética seria a teoria dos costumes ou a ética da ciência dos costumes. Já a moral não é ciência, senão objeto da ciência (2008, p.114).

Ainda, segundo o autor supramencionado, o conceito de ética nos leva a conclusão de que esta não se confunde com a moral, embora pese aparente identidade etimológica de significado. Éthos, em grego e mos, em latim, querem dizer costume. Nesse sentido, a ética seria uma teoria dos costumes ou ciência dos costumes. Enquanto moral não é ciência, senão objeto da ciência. E como ciência a ética procura extrair dos fatos morais.

Calha anotar ainda, que a ética profissional trata da moral dos atos humanos, sendo o conjunto de princípios que regem a conduta funcional de determinada profissão, no que diz respeito a certo e errado no contexto de cada sociedade. Assim, a ética aparece como vetor de equilíbrio entre o ser humano e a sua consciência, para apoiá-lo e direcioná-lo em suas ações, com as quais a sociedade alicerça seu fortalecimento.

A ética profissional aplicada à advocacia é a parte da moral que trata das regras de conduta do advogado, vale dizer, é o conjunto de regras de comportamento do advogado no exercício de suas atividades profissionais, tanto no seu ministério privado, como na sua atuação pública.

Ao advogado é dado um papel de extrema importância para a preservação da ordem e dos direitos assegurados constitucionalmente aos cidadãos. No exercício de seu ministério privado, o profissional da advocacia possui um múnus público, sendo um agente de transformação, contribuindo para que o direito possa acompanhar as evoluções da sociedade.

2.1 – Da deontologia e diceologia

Deontologia origina se do grego deontos (dever) e logos (estudo, ciência, tratado). Etimologicamente é a ciência ou tratado dos deveres, sob um ponto de vista empírico, no âmbito de cada profissão. É definida como a ética de uma profissão, que designa o conjunto de regras e princípios que ordenam a conduta de cada profissional (BIZATTO, 2003, p. 19).

A Deontologia, também denominada de “Teoria do dever”, compõe um dos dois ramos principais da Ética Normativa, em conjunto com a axiologia, constituindo a Filosofia Moral, também conhecida por Ética, a base da Deontologia Geral, e, por conseguinte, da Deontologia Jurídica, também conhecida como Ética Profissional das carreiras jurídicas (PAVIONE, 2013, p. 40).

Já a Diceologia, ciência dos direitos, se compõe da palavra grega diceo (direito) e logos (tratado, ciência), e significa estudo dos direitos. Assim, Deontologia é a codificação dos deveres profissionais e a Diceologia será a codificação dos direitos profissionais (SODRÉ, 1991, p. 39).

2.2 - A advocacia na Constituição Federal de 1988

São mencionados na Constituição Federal de 1988, como norma de organização do Estado, diversos dispositivos assuntos e órgãos relacionados à atividade da advocacia: quinto constitucional (art.194) e a obrigatória participação da OAB nos concursos de ingresso (art. 93m inc.I, e art.129, § 3º, respectivamente); a Advocacia (art. 131 e 132) e a Defensoria Pública (art. 134 e 135); a legitimação atica para a propositura de ação de inconstitucionalidade (art. 103, inc, VIII), entre outros. Entretanto, o artigo 133 da Constituição Federal é o que trata especificamente do advogado, in verbis: “Art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

Tal dispositivo enfatiza a necessidade do profissional da advocacia na administração da justiça, vale dizer, a justiça a qual se refere à Carta da República é, na verdade, a prática do bem comum, a realização das mais altas aspirações humanas dentro de um ordenamento jurídico voltado para a coletividade, daí porque, o agir pautado na ética é tão imprescindível para o advogado.

Nesse contexto, o papel do advogado se difere dos demais cidadãos, vez que, para aqueles, há previsão legal para que assim seja, sob pena de incidir em penalidades administrativas aplicadas pelo Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB.

Desta forma, sendo indispensável à administração da vida em sociedade erguida sobre o pilar do respeito ao semelhante, tudo sob a égide das nossas leis que devem retratar exatamente este espírito.

Quando a ética profissional passa a ser objeto de regulamentação legal, convertem-se em normas jurídicas definidas, obrigando a todos os profissionais. No caso da advocacia brasileira, a ética profissional foi objeto de detalhada normatização, destinada a deveres dos advogados, no Código de Ética e Disciplina, editado pelo Conselho Federal da OAB.

2.3 – Do Código de Ética e disciplina da OAB

O Código de Ética e Disciplina traz um preâmbulo com exortação ao exercício profissional. Está dividido em dois títulos: o Título I é especifico sobre “A Ética do Advogado” em cinco capítulos, a saber: no Capítulo I, contempla as “Regras Deontológicas Fundamentais”; no Capítulo II, dispões sobre “As Relações com o Cliente”; no Capítulo III, disciplina “O Sigilo Profissional”; no Capítulo IV fixa parâmetros para “A Publicidade”; no Capítulo V dispões sobre “Honorários Profissionais”; no Capítulo VI, estabelece preconizado pela nova lei, como “Do Dever de Urbanidade”; e por último, no Capítulo VII, trata das “Disposições Gerais”.

Embora o Código de Ética não abarque tudo quanto deve o advogado observar no tocante à moral, tanto profissional, como individual ou social, a verdade é que ele, como alias vem assinalado no seu preâmbulo, está sujeito, além das normas éticas “as que deve preferencialmente observar”. (SODRÉ, 1991, p. 47).

A obediência aos preceitos do Código de Ética Profissional não é simples recomendação, é, dever inerente à própria profissão. Ademais, toda a vida profissional do advogado se reveste de invólucro moral, armadura com que se defronta na luta judiciária. (SODRÉ, 1991, p. 47).

São deveres dos advogados conforme preceitua o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil no seu artigo 2°, parágrafo único, inciso I ao IX, in verbis:

 

                              Art. 2º O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce.

 

                               Parágrafo único. São deveres do advogado:

 

                               I – preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade;

                              II – atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé;

                              III – velar por sua reputação pessoal e profissional;

                              IV – empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal e profissional;

                              V – contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis;

                              VI – estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios;

                              VII – aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial;

                              VIII – abster-se de:

                              a) utilizar de influência indevida, em seu benefício ou do cliente;

                              b) patrocinar interesses ligados a outras atividades estranhas à advocacia, em que também atue;

                               c) vincular o seu nome a empreendimentos de cunho manifestamente duvidoso;

                              d) emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana;

                              e) entender-se diretamente com a parte adversa que tenha patrono constituído, sem o assentimento deste.

                              IX – pugnar pela solução dos problemas da cidadania e pela efetivação dos seus direitos individuais, coletivos e difusos, no âmbito da comunidade.

Os advogados devem preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade; atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; velar por sua reputação pessoal e profissional; empenhar-se, permanentemente, em seu aperfeiçoamento pessoal e profissional; contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das Leis; estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo sempre que possível, a instauração de litígios; aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial. (MENDONÇA, 2013, p.66)

O Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil prevê no seu Capítulo II, artigos 8º ao 24º as premissas que devem ser respeitadas pelos advogados nas relações com seus clientes ou constituintes.

O dever de informar o cliente, com clareza, sobre os riscos da demanda e suas consequências que poderão advir da demanda, é o primeiro a ser observado, no artigo 8° do CED, vejamos:

           

                                                  Art. 8º- O advogado deve informar o cliente, de forma clara e inequívoca, quanto a eventuais riscos da sua pretensão, e das consequências que poderão advir da demanda.

 

Concluída a causa, ou no caso de desistência, o advogado tem a obrigação de devolver tudo o que recebeu do cliente, além da detalhada prestação de contas, é o que preceitua o Código de Ética e Disciplina no seu artigo 9°, in verbis:

 

                                                 Art. 9º. A conclusão ou desistência da causa, com ou sem a extinção do mandato, obriga o advogado à devolução de bens, valores e documentos recebidos no exercício do mandato, e à pormenorizada prestação de contas, não excluindo outras prestações solicitadas, pelo cliente, a qualquer momento.

 

 

Conforme redação dada pelo artigo 10 do CED, concluída a causa ou arquivado o processo, presume-se o cumprimento e a cessação do mandato.

Segundo preceitua o art.11 do CED, a sucessão na representação advocatícia poderá ocorrer se o cliente cassar a procuração do seu antigo advogado. Todavia, o advogado que aceitar o mandato revogado pelo colega anterior deve verificar nos autos a veracidade do fato, antes do pedido de juntada do novo instrumento de procuração.

O advogado não deve abandonar as causas sem motivo justo e comprovada ciência do constituinte, é o que preceitua o art. 12 do CED. Sobre a renúncia ao patrocínio e revogação do mandato judicial, segue artigos 13 e 14 do Código de Ética e Disciplina:

                                                 Art. 13. A renúncia ao patrocínio implica omissão do motivo e a continuidade da responsabilidade profissional do advogado ou escritório de advocacia, durante o prazo estabelecido em lei; não exclui, todavia, a responsabilidade pelos danos causados dolosa ou culposamente aos clientes ou a terceiros.

 

                                                 Art. 14. A revogação do mandato judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratadas, bem como não retira o direito do advogado de receber o quanto lhe seja devido em eventual verba honorária de sucumbência, calculada proporcionalmente, em face do serviço efetivamente prestado.

 

 

 

O artigo 15 do CED preceitua que o mandato judicial ou extrajudicial deve ser outorgado individualmente aos advogados que integrem sociedade. Já o artigo 16 do CED prevê que o mandato judicial ou extrajudicial não se extingue pelo decurso de tempo, desde que permaneça a confiança recíproca entre o outorgante e o seu patrono no interesse da causa.

Ainda, conforme redação dada pelo artigo 20 do CED, o advogado deve abster-se de patrocinar causa contrária à ética, à moral ou à validade de ato jurídico em que tenha colaborado, orientado ou conhecido em consulta; da mesma forma, deve declinar seu impedimento ético quando tenha sido convidado pela outra parte, se esta lhe houver revelado segredos ou obtido seu parecer.

O advogado, vivendo da confiança do cliente, e desempenhando função pública ou no exercício de atividade privada está, mais do que qualquer outra profissão, sujeita ao cumprimento de deveres éticos que informam e orientam a advocacia. Assim, o sentido ético deve predominar na relação de patrocínio, tendo em vista os elementos essenciais que figuram nesta relação, qual sejam, a confiança e a consciência (SODRÉ, 1991, p. 62).

Nos dizeres de Ruy de Azevedo Sodré, a relação entre cliente e advogado, em que aquele entrega a este seus bens, sua liberdade ou sua honra, se forja na base da confiança. É uma confiança que se entrega a uma consciência, dando a profissão o alto valor moral de que ela está revestida, a relação de patrocínio é selada pelos dois princípios, confiança e consciência. Confiança do cliente em seu advogado, sem o qual este não poderá atuar livremente, e consciência do advogado pautado pelas normas éticas a que está sujeito. (SODRÉ, 1991, p. 63).

O advogado, entre as prerrogativas de que está investido, para o fiel cumprimento de sua missão, dispõe do direito-dever do segredo profissional. O sigilo profissional é circunstância imprescindível, porque além de figurar como uma das regras morais para o exercício da advocacia, também está contemplado como crime no artigo 154 do Código Penal, que assim o define:

                                                   Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem:

                                                   Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

                                                        Parágrafo único - Somente se procede mediante representação.

O Capítulo III, do Código de Ética e Disciplina da OAB, regulamenta nos artigos 25 a 27 o sigilo profissional do advogado. Segue:

                                                 Art. 25. O sigilo profissional é inerente à profissão, impondo-se o seu respeito, salvo grave ameaça ao direito à vida, à honra, ou quando o advogado se veja afrontado pelo próprio cliente e, em defesa própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da causa.

 

                                                 Art. 26. O advogado deve guardar sigilo, mesmo em depoimento judicial, sobre o que saiba em razão de seu ofício, cabendo-lhe recusar-se a depor como testemunha em processo no qual funcionou ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou tenha sido advogado, mesmo que autorizado ou solicitado pelo constituinte.

 

                                                  Art. 27. As confidências feitas ao advogado pelo cliente podem ser utilizadas nos limites da necessidade da defesa, desde que autorizado aquele pelo constituinte.

 

                                                  Parágrafo único. Presumem-se confidenciais as comunicações epistolares entre advogado e cliente, as quais não podem ser reveladas a terceiros.

 

Na lição de Eduardo C. B. Bittar: “Também se destaca o sigilo profissional como mandamento de significação no exercício da advocacia. O advogado frequentemente se vê às voltas com informações de toda natureza (sobre delitos, sobre escândalos, sobre atos imorais, sobre acontecimentos ocultos, sobre corrupções...), que lhe são confiadas exclusivamente como profissional e para fins do patrocínio da causa do interessado. Colocar a público, ou mesmo manipular essas informações, constitui infração que importa em grave traição à confiança do interessado e de outras pessoas que possam eventualmente se encontrar envolvidas. É questão de interesse público, e não só privado, o sigilo profissional. Isso porque a segurança das relações jurídicas se vê comprometida pela veiculação desgovernada de informações que só se externam quando, em caso de necessidade, são reveladas ao profissional.” (2009. p. 484).

No tocante a publicidade da advocacia, o atual Estatuto da Advocacia e da OAB, no Título destinado a “Advocacia” (I), além de já no seu artigo 1°, proibir a “divulgação da advocacia em conjunto com outra atividade”, destina o Capítulo VIII especificamente à “ética do advogado” (arts. 31/33), obrigando o a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina.

Por sua vez, o      Código de Ética e Disciplina da OAB, disciplina no seu Capítulo IV acerca da publicidade na advocacia. O objetivo do estatuto é evitar a mercantilização da advocacia, bem como a capitação de clientela atraída por placas sugestivas, posto que a advocacia não é um negócio ou atividade mercantil com vistas ao lucro, em razão dos mumus público que exerce o advogado, devendo-se pois, que ele evite tais práticas, a fim de resguardar-lhe sua dignidade e evitar-se sua mercantilização (Mendonça, 2013, p.108).

A Ordem dos Advogados do Brasil permite a publicidade dos serviços advocatícios e o faz expressamente no Código de Ética e Disciplina, Capítulo IV, artigos 28 a 37. O Provimento 94/2000 da OAB, posteriormente, regulamentou o referido Capítulo (MENDONÇA, 2013, p.108).

Estabelece o Código de Ética e Disciplina da OAB, no seu Capítulo IV, artigos 28 e 29:

                                                 Art. 28. O advogado pode anunciar os seus serviços profissionais, individual ou coletivamente, com discrição e moderação, para finalidade exclusivamente informativa, vedada a divulgação em conjunto com outra atividade.

 

 

                                                   Art. 29. O anúncio deve mencionar o nome completo do advogado e o número da inscrição na OAB, podendo fazer referência a títulos ou qualificações profissionais, especialização técnico-científica e associações culturais e científicas, endereços, horário do expediente e meios de comunicação, vedadas a sua veiculação pelo rádio e televisão e a denominação de fantasia.

 

 

 

A publicidade permitida poderá ser feita somente na mídia escrita, sendo vedada a sua veiculação pelo rádio e televisão e a denominação de fantasia, pois esta é característica própria mercantil prevista no artigo 29, §§ 1° e 2°, do CED.  Igualmente são vedadas nos anúncios referências a valores dos serviços, tabelas, gratuidade ou qualquer referência a pagamento facilitado, informações que possam iludir ou confundir o público, inclusive fazendo menção à qualidade e à estrutura da sede profissional, o que pode caracterizar forma de captação de clientela, previsto no artigo 31, § 1°, do CED. Não é permitido mencionar em anúncio, direta ou indiretamente, qualquer cargo ou função pública ou relação de emprego que o advogado tenha exercido, tais como: ex-juiz, promotor de justiça aposentado, ex-procurador, etc, previstos no art. 29, § 4°, do CED. (MENDONÇA, 2013, p. 109).

O artigo 32, paragrafo único e art. 33 do CED, são claros ao dizer que a participação do advogado em entrevistas deve ser feito de caráter esporádico e não habitual, sem propósito de promoção pessoal ou profissional, devendo ocorrer sempre direcionada ao esclarecimento de matérias de interesse geral e de temas jurídicos.

 

O advogado é um profissional que trabalha e precisa receber por seus préstimos. Toda remuneração proveniente da prestação de serviços realizada pelo advogado recebe o nome de honorários, que é a recompensa pela atuação meritória, sem caráter obrigatório, como o termo foi originalmente concebido. O conceito enfatiza a responsabilidade social do advogado, que deve atuar em prol da justiça, e não em função dos interesses primários da causa. (Mendonça, 2013, p. 92).

Nos dizeres Ruy de Azevedo Sodré: “Os honorários advocatícios constituem um dos problemas mais sérios e graves da profissão, se não o maior deles, em que a delicadeza e o tato se impõem, para solução satisfatória, tanto mais quanto é preciso ter presentes, de um lado os conceitos basilares e os princípios informadores da profissão, e, de outro, a pessoa do profissional” (1991, p. 489).

Segundo ele, há uma série de preconceitos, a que estamos presos por uma cadeia de fortes tradições e determinados princípios éticos, aos quais não se podem fugir, norteadores da profissão, uns e outros, entretanto, chocam-se violentamente com a dura realidade materialista dos dias em que vivemos (Sodré, 1991, p. 489).

No Brasil, os honorários advocatícios tem natureza alimentar e a Lei n° 8.906, de julho de 1994, preconiza que os advogados têm direito não só aos honorários convencionados como também aos fixados por arbitramento e na definição de verbas sucumbenciais (art. 22). Já o artigo 23 é explicito ao estabelecer que os honorários incluídos na condenação, por arbitramento de sucumbência, pertence ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor (MENDONÇA, 2013, p. 92).

O Código de Ética e Disciplina da OAB, objeto de análise do presente estudo, no seu Capítulo V, artigos 35 a 43, versa sobre os honorários advocatícios, vejamos:

                                                  Art. 35. Os honorários advocatícios e sua eventual correção, bem como sua majoração decorrente do aumento dos atos judiciais que advierem como necessários, devem ser previstos em contrato escrito, qualquer que seja o objeto e o meio da prestação do serviço profissional, contendo todas as especificações e forma de pagamento, inclusive no caso de acordo.

O valor dos honorários e o serviço a ser executado devem constar de um contrato escrito, onde o cliente sabe de antemão o valor a pagar e o tipo de serviço executado pelo advogado.

Os tipos de honorários são três, vale dizer, convencionados, arbitrados judicialmente e de sucumbência e podem ser convencionados livremente entre o advogado e seu cliente, observadas as normas que restringem a total liberdade contratual (MENDONÇA, 2013, p. 92).

Conforme preceitua o artigo 36 do CED, os honorários advocatícios devem ser fixados com moderação, in verbis:

 

                                        Art. 36. Os honorários profissionais devem ser fixados com moderação, atendidos os elementos seguintes:

 

                                        I – a relevância, o vulto, a complexidade e a dificuldade das questões versadas;

                                        II – o trabalho e o tempo necessários;

                                        III – a possibilidade de ficar o advogado impedido de intervir em outros casos, ou de se desavir com outros clientes ou terceiros;

                                        IV – o valor da causa, a condição econômica do cliente e o proveito para ele resultante do serviço profissional;

                                        V – o caráter da intervenção, conforme se trate de serviço a cliente avulso, habitual ou permanente;

                                       VI – o lugar da prestação dos serviços, fora ou não do domicílio do advogado;

                                       VII – a competência e o renome do profissional;

                                       VIII – a praxe do foro sobre trabalhos análogos.

Tal moderação tem sua sustentação em dois conceitos: a advocacia como um ramo da administração pública, e a confiança, selando as relações entre clientes e advogado. O nosso Estatuto consignou, com rara felicidade, o caráter público da profissão de advogado, inserindo, no seu art. 68, princípio de que o advogado presta serviço público, como elemento indispensável à administração da justiça e, como tal, não podem os profissionais de advocacia negociar com a justiça. Devem ser remunerados, mas não transformar a profissão em comércio para fazer dinheiro (SODRÉ, 1991, p. 507).

O advogado deve respeitar os valores da Tabela de Honorários advocatícios, que definem valores para afastar o aviltamento de sua remuneração. A elaboração dessas tabelas compete aos Conselhos Seccionais e, por esse motivo, os valores são variáveis em função de peculiaridades regionais (Mendonça, 2013, p. 93).

Não havendo determinação em contrário, os honorários são fixados observando a Tabela e os limites decorrentes do princípio da moderação, previsto no art. 36 CED.

Os honorários sofrem variações ditadas por vários elementos (art.36 do CED), salvo motivo justificável. Portanto a Tabela não estabelece um teto ou limite máximo, entretanto, a fixação abaixo dos valores da Tabela é proibida (art. 22, § 2° do EAOAB e art. 41 do CED), salvo motivo justificável.

Os valores fixados abusivamente, poderá sujeitar o advogado à pena de suspensão por locupletamento, infração disciplinar definida no art. 34, inciso XX, do EAOAB.

Os honorários são cobrados mediante processo de execução. Extrajudicialmente, para contratos escritos que preencha aos requisitos dos arts. 221, 593 e seguintes do Código Civil, a ser adotado como padrão pelo advogado e Judicialmente, para as decisões que os fixar na sucumbência ou os arbitrar no caso de ausência de contrato escrito.

Os honorários advocatícios constituem crédito privilegiado em qualquer hipótese em que haja concurso de créditos, no mesmo nível dos créditos trabalhistas, pois ambos têm a mesma natureza, isto é, trabalho humano (Mendonça, 2013, p. 96).

O artigo 43 do Código de Ética e Disciplina da OAB, norteia que o advogado deve renunciar ao patrocínio da causa e constituir outro advogado para fazer a cobrança judicial dos honorários.

Entre os deveres éticos impostos aos advogados encontram-se o de ‘urbanidade’ regrado pelos artigos 44, 45 e 46 do Código e Ética e Disciplina. Por urbanidade entende-se como sinônimo de cortesia, como a qualidade de um ser humano, isto é, civilizado e cortês. O CED determina que o advogado, no exercício de sua profissão, deve tratar o público, colegas e autoridades e os funcionários do Juízo com o devido respeito, discrição e independência, e exigir, em contrapartida, igual tratamento, procurando, em seu mister, sempre zelar pelas prerrogativas a que tem direito (art. 44  CED), impondo-se ao mesmo, lhaneza, emprego de linguagem escorreita e polida, esmero e disciplina na execução dos serviços (art. 45 CED). (MENDONÇA, 2013, p. 69).

Ao advogado é exigido o dever de urbanidade, isto é, o dever do respeito á decência, à honradez, à probidade, expressões que se resumem na ética, substrato e componente imprescindíveis do comportamento profissional. (Silva, 1996, p. 393).

Nas palavras de Ruy de Azevedo Sodré: o dever de dignidade impõe ao advogado o tratamento cortês e urbano, para com os colegas. Deve respeitar neles essa dignidade, que é o apanágio da profissão. ‘Se não houvesse esse sentimento de confraternidade, que deve ser inato, no advogado, a nossa profissão seria um rosário de amargores, um suplicio a ser exercido em clina de ódios e rancores’ (1991, p. 198).

Esclarece o art. 33 do EAOAB que o advogado obriga-se a cumprir rigorosamente os deveres consignados no CED, e que tais deveres relacionam-se com a comunidade, o cliente, e outro profissional.

José Renato Nalini assevera que, a grandeza de um causídico se avalia pela sua postura em relação aos colegas. Relacionar-se de maneira ética, ser leal e prestativo, apenas evidencia a segurança do advogado e aumenta seu prestígio. É própria dos incapazes a insegurança que se traduz em agressões gratuitas, ainda que sob a simulação de tenacidade natural ao encargo advocatício (2012, p. 512).

Conclusão

 

Com base ao que fora proposto, buscamos o entendimento dos valores éticos no exercício da advocacia, para tanto, uma breve reminiscência a suas origens e evoluções ao longo da história se fez necessária, de forma a caracterizar o conceito primo e desvencilhar de possíveis outros que causassem confusão.

O nosso proposito nesse modesto trabalho foi uma reflexão acerca da necessidade dos profissionais da advocacia amoldar a sua conduta, sua vida, aos princípios básicos dos valores éticos de sua missão e seu fim, em todas as esferas de suas atividades, vez que, hodiernamente observa-se um desvirtuamento de conduta destes profissionais refletindo nas mais variadas formas de comportamento, materializando-se na falta de valores morais.

Ao advogado é dado um papel de extrema importância para a preservação da ordem e dos direitos assegurados constitucionalmente aos cidadãos. No exercício de seu ministério privado, o profissional da advocacia possui um múnus público, sendo um agente de transformação, contribuindo para que o direito possa acompanhar as evoluções da sociedade.

Destarte, os preceitos éticos e morais devem nortear a conduta do advogado, quer o exterior e social, quer o íntimo e subjetivo, contribuindo para a formação de uma consciência profissional composta de hábitos dos quais resultem integridade e probidade, distinguindo-se por seu talento e ética.

Vale ressaltar que, o exercício da advocacia com fito exclusivamente nos interesses materiais poderá ser, por vezes, de grande proveito, todavia perderia parte do que constitui a nobreza da profissão, vale dizer, solapariam a sua dignidade e perderia o respeito que uma tradição secular lhe assegurou.

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[1] Acadêmica do curso de Direito da UniEVANGÉLICA de Anápolis.

[2] Professor de Etica. Doutor em Educação (PUC-GO). Mestre em filosofia (UFG). Contato: edsonsbrito@gmail.com

 

 

Elaborado em outubro/2013

 

Como citar o texto:

CARVALHO, Eliana Alves de; BRITO, Edson de Sousa..Da ética no exercício da advocacia. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 31, nº 1113. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/2762/da-etica-exercicio-advocacia. Acesso em 23 out. 2013.

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