I - DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COMO FONTE DE COMBATE À CORRUPÇÃO

                       A Lei de Improbidade Administrativa adveio do Projeto de Lei n.º 1.446/91, enviado ao Congresso Nacional pelo então presidente Fernando Collor de Mello, que necessitava dar um basta a corrupção que sempre assolou o país.

                       Sob o rótulo da moralidade, o Ministro da Justiça do citado Governo, Jarbas Passarinho,[1] deixou registrado em sua Exposição de Motivos que o combate à corrupção era necessário, pois se tratava de “uma das maiores mazelas que, infelizmente, ainda afligem o pais”.

                       A Lei de Improbidade surgiu com a finalidade de combater atos que afetem a moralidade e maltratem a coisa pública.

                       Exatamente para combater a corrupção e a devassidão, a Lei n.º 8.429/92, foi a responsável por regulamentar o que vem disposto no artigo 37, § 4º, da CF.

                       Cabendo ressaltar que ela é direcionada para o agente público, servidor ou não, bem como ao particular, abrangendo a pessoa jurídica.

                       Nesse sentido, as pessoas jurídicas que participem ou se beneficiem dos atos de improbidade sujeitam-se aos cânones da Lei n.º 8.429/92.[2]

                       Em abono ao que foi dito, o Ministro Hermam Benjamim, relatando o REsp n.º 1122177/MT, deixou registrado:

“O sujeito particular submetido à lei que tutela a probidadeadministrativa, por sua vez, pode ser pessoa física ou jurídica. Com relação a estaúltima somente se afiguram incompatíveis as sanções de perda da função pública esuspensão dos direitos políticos. Em tese, portanto, eventual condenação por improbidade administrativasujeita as pessoas jurídicas ao ressarcimento integral do dano, à perda dos bens ouvalores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ao pagamento de multa civil e àproibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscaisou creditícios, nos termos e limites do art. 12 da LIA.”

                       As empresas que forem responsáveis pela corrupção de agentes públicos, enriquecendo-os ilicitamente (art. 9º), ou que causem prejuízo ao erário (art. 10), ou violem os bons princípios da Administração Pública, respondem aos termos da Lei n.º 8.429/92.

                       Em sendo assim, a Lei n.º 8.429/92 já era responsável pelo combate à improbidade qualificada e também é voltada para a anticorrupção estatal, sendo o “sujeito particular” submetido à lei que tutela a probidade administrativa, a pessoa física ou jurídica.

                       Estabelece a Lei n.º 8.429/92 o elemento subjetivo do tipo relacionado à conduta dos acusados pela prática de ato ímprobo.

                       Nada mais justo e compatível com o sistema jurídico, estabelecer a responsabilidade subjetiva dos investigados nos atos de corrupção e de violação aos tipos descritos na Lei n.º 8.429/92, pois o sistema acusatório (sancionador), vincula-se a conduta.

                       Improbidade Administrativa é a violação de determinada conduta subjetiva elencada na Lei n.º 8.429/92.

                       Em sendo assim, não cabe à Lei 12.846/13 estabelecer a responsabilidade objetiva para as pessoas jurídicas, que violem a probidade, possibilitando a corrupção do Agente Público e também prejuízo ao erário, em contradição com a Lei n.º 8.429/92, que já era responsável pelo tema sub oculis.

                       Na verdade, o legislador criou uma antinomia jurídica, no afã de driblar a responsabilidade subjetiva da pessoa jurídica quando responde pelos termos da Lei n.º 8.429/92, para alçá-la na responsabilidade objetiva, com base na Lei n.º 12.846/13, apesar do ilícito ser o mesmo já previsto na Lei de Improbidade Administrativa.

                       Não se pode concordar com essa flagrante antinomia jurídica, que viola a regra da segurança jurídica e traz um conflito de normas inaceitável, como será demonstrado.

                            

II - DO CONFLITO DA LEI Nº 12.846/13 COM A LEI Nº 8.429/92

                       A Lei Anticorrupção possui conotação de responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira, optando o artigo 2º, imputar a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas, caso se comprove a prática de atos lesivos aos entes de direito público, em seu interesse ou benefício.

                       A primeira indagação que se deve fazer é quanto à validade ou não da presente cláusula de responsabilidade objetiva.

                       As pessoas jurídicas de direito público privado que prestam serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem à terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa, na forma do artigo 37, § 6º,  da CF, quando se tratar de responsabilidade civil.

                       Adotou o constituinte moderno a responsabilidade objetiva (teoria do risco administrativo), segundo o qual o dano sofrido pelo indivíduo deve ser individualizado como consequência do funcionamento do serviço público, não importando se esse funcionamento foi bom ou mal. Ocorrendo o dano ao particular, em tese o poder público ou a empresa privada concessionária do serviço público, deverão suportar determinada indenização, visando ressarcir o usuário de tal serviço.

                       Assim, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado, prestadoras de serviço público baseiam-se no risco administrativo, sendo objetiva.

                       Essa responsabilidade objetiva exige a ocorrência dos seguintes requisitos:

                       - ação ou omissão administrativa;

                       - existência de nexo entre o dano e a ação administrativa;

                       - ausência de causa excludente na responsabilidade estatal.

                       A Constituição Federal, no seu artigo 173, § 5º, estabelece a possibilidade da lei fixar a responsabilidade da pessoa jurídica e individualmente de seus dirigentes, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular, verbis:

“§ 5º - A lei, sem prejuízo da responsabilidade da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com a sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.”

                       O legislador constitucional foi bem explícito quando estabeleceu que a lei punisse a pessoa jurídica nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.

                       Em sendo assim, verifica-se que a Lei nº 12.846/13 não se presta ao papel de regulamentar o artigo 173, § 5º, da CF.

                       Quanto a isso não há a menor dúvida!

                       Ultrapassado esse aspecto legal, é de se notar que o mesmo legislador constituinte, no artigo 37, § 4º, determinou que a lei punisse os atos de improbidade administrativa, litteris:

“§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”

                       A indagação que se faz é se essa lei de improbidade administrativa se aplica à pessoa jurídica de direito privado?

                       A resposta é de que ela é plenamente aplicável à pessoa jurídica por expressa determinação do seu artigo 3º, que pune, no que couber; “aquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.”

                       Com a aplicação da Lei nº 8.429/92 à pessoa jurídica ela se condenada, deverá ressarcir integralmente quando houver dano ao erário, ficará exposta ao pagamento de multa civil variável de acordo com a violação dos tipos descritos na citada lei (art. 12, I, II ou III, da Lei nº 8.429/92) e também não poderá contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritária.

                       Sendo aplicada a Lei de Improbidade Administrativa para a pessoa jurídica, bem como para os seus dirigentes ou administradores, sobreveio a lei anticorrupção (Lei nº 12846/13), que visa combater atos devassos e imorais perpetrados em nome ou no interesse de empresas privadas que lesem a Administração Pública nacional e estrangeira. Ou seja, também é direcionada para os atos ímprobos, porquanto a corrupção e o enriquecimento ilícito são previsto na Lei n.º 8.429/92, que é constitucional, por ter regulamentado o § 4º, do art. 37 da CF.

                       Pergunta-se: onde estaria o conflito da lei de improbidade administrativa com a lei anticorrupção?

                       E para obter a resposta, é de se analisar os atos lesivos à Administração Pública que cada uma das citadas leis descrevem para se atingir uma conclusão sólida e robusta do caso sub oculis.

                       Pois bem, iniciando-se um cotejo analítico das Leis 12.846/13 e 8.429/92, que junto aos tipos infracionais que descrevem:

Lei 12.846/13:

Art. 2o  As pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente, nos âmbitos administrativo e civil, pelos atos lesivos previstos nesta Lei praticados em seu interesse ou benefício, exclusivo ou não.” (g.n.)

Lei 8.429/92:

 

Art. 3º  As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.” (g.n.)

Comentários:

                       A Lei de Improbidade Administrativa estabelece a responsabilidade do terceiro/particular, extensível às pessoas jurídicas de direito privado, segundo expressa determinação de seu artigo 3º.

                       Justamente por permitir a inclusão no pólo passivo da ação de improbidade administrativa, o particular, pessoa física, e também a empresa de direito privado ao qual se encontra vinculado, geralmente ambos figuram como acusados perante o escopo da Lei n.º 8.429/92.

                       Sobre o assunto deixamos averbado:[3]

“Aqui é interessante destacar uma grande confusão conceitual verificada em algumas demandas, onde é elencada a pessoa jurídica de direito privado no pólo passivo em conjunto com os seus sócios, em algumas ações de improbidade administrativa. Nesses casos, visa o MP receber a prestação jurisdicional contra Pessoa Jurídica em conjunto com os sócios, cobrando os mesmos valores que teoricamente teriam sido desviados, em valores bem superiores aos devidos, em face da duplicidade dos pedidos.

 

Essa situação faz com que haja a possibilidade de enriquecimento ilícito do poder público se o Magistrado não verificar que a devolução de valores por parte da pessoa jurídica de direito privado e de seus sócios, em conjunto ou separadamente, deverão ser na medida da extensão do dano,  adotando-se a regra pro rata da indenização pretendida na demanda, para que não seja verificado excesso de condenação pecuniária.”

 

                       Essa possível “conclusão” do MP quando elenca no pólo passivo a pessoa jurídica de direito privado e o seu sócio gerente, ou controlador conjuntamente, encontra limite  legal no que vem estatuído no caput do artigo 50, do Código Civil, que somente permite a desconsideração da personalidade jurídica, quando existir abuso, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial.

                       Dessa forma, prevalece a situação legal da pessoa jurídica de direito privado responder, em conjunto (solidariedade) com o agente público aos termos da Lei n.º 8.429/92, porquanto a regra estabelecida no artigo 50, do Código Civil, é excepcional, somente aplicada quando demonstradas as inequívocas malícia e má-fé do sócio, que por meio de ardil ou de má-fé, busca lesar ao erário utilizando-se da sociedade como mera “proteção” para alcançar benefício próprio.

                       Figurando a pessoa de direito privado ou o seu representante legal, no rol taxativo da Lei n.º 8.429/92, onde a improbidade administrativa toma forma legal após a verificação da conduta do imputado (elemento subjetivo do tipo), buscou a Lei n.º 12.846/13 “fugir” da responsabilidade subjetiva, para instituir a responsabilidade objetiva das empresas, na hipótese em que o ato ilícito seja o mesmo.

                       Essa “alteração” da responsabilidade das empresas, que deixa de ser subjetiva (Lei n.º 8.429/92) para tornar-se objetiva perante a Lei n.º 12.846/13, nada mais é do que uma burla a Lei que disciplina os atos de improbidade administrativa.

                       Isso porque, a Lei n.º 12.846/13 destaca a pessoa jurídica, sem excluir a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito (art. 3º, da Lei n.º 12.846/13), que em tese também estariam expostos ao crivo da Lei n.º 8.429/92 (art. 3º, da Lei n.º 8.429/92).

                       Por maior absurdo que possa parecer, ele ocorre de fato, pois a pessoa jurídica será responsabilizada objetivamente, independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais referidas no caput do art. 3º, da Lei n.º 12.846/13, sobre o mesmo ilícito.

                       Eis a dicção do artigo 3º, da Lei n.º 12.846/13:

“Art. 3o  A responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito.”

 

                       Na prática, apesar dos atos de improbidade administrativa serem regulados pela Lei n.º 8.429/92, o legislador estabelece na Lei n.º 12.846/13 a punição da pessoa jurídica de direito privado sobre os mesmos tipos já estabelecidos na Lei de Improbidade, como se tal fato fosse possível, gerando verdadeira antinomia de normas legais.

                       Essa confusão legislativa ficará mais evidenciada quando forem cotejados os tipos infracionais que as citadas normas legais regulam quando tratam dos atos lesivos à Administração Pública.

Lei 12.846/13:

 

“Art. 5o  Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1o, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:”

Lei 8.429/92:

“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente: (g.n.)

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:”

Comentários:

                       O artigo 5º, da Lei n.º 12.846/13, imputa à pessoa jurídica o tipo descrito no artigo 10, da Lei n.º 8.429/92, que versa sobre o prejuízo ao erário, praticado de forma dolosa ou culposa, bem como também descreve a violação aos princípios da Administração Pública, a que alude o artigo 11, da Lei n.º 8.429/92.

                       A única inovação que traz a lei n.º 12.846/13, é que diferentemente do que vem disposto na Lei n.º 8.429/92, constituem atos lesivos à Administração Pública Nacional ou Estrangeira, todos aqueles atos praticados por pessoa jurídica que atentem contra o patrimônio público e contra os princípios da administração pública, sendo incluída a estrangeira também nesse rol protetivo, porquanto tal fato não foi objeto de preocupação da Lei n.º 8.429/92.

                       Tirando esse único e exclusivo fato, de não estar inserido no contexto da Lei n.º 8.429/92, a violação à bens tutelados pela probidade administrativa de entidades estrangeiras, os tipos infracionais são rigorosamente os mesmos, isto porque o prejuízo ao erário, também contemplado nos atos “que atentem contra o patrimônio público” ou “contra os princípios da administração pública”, não são previstos também na Lei de Improbidade Administrativa.

                       Qualquer violação ao patrimônio e a princípios da Administração Pública, que infrinjam os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições e notadamente às situações taxadas nos incisos dos artigos 10 e 11, da Lei nº 8.429/92 são atos de improbidade administrativa e, como tal deverão ser regidos pela citada lei e não pela Lei nº 12.846/13, que não possui poderes para conflitar com a Lei específica sobre a matéria.

Lei 12.846/13:

“Art. 5º, I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada.” (g.n.)

Lei 8.429/92:

“Art. 9° - Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente: (g.n.)

 I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público.” (g.n.)

Comentários:

                       Na verdade, o enriquecimento ilícito a que alude o artigo 9º, inc. I, da Lei n.º 8.429/92 é voltado para o agente público, mas quando ele recebe vantagens ilícitas de pessoas jurídicas de direito privado ou de pessoas, os particulares se inserem no rol do presente dispositivo legal, por expressa autorização do artigo 3º, da Lei n.º 8.429/92. A empresa ou pessoa corruptora, que oferece direta ou indiretamente, vantagem indevida ao agente público, ou a terceira pessoa por ele relacionada direta ou indireta, na prática está enriquecendo ilicitamente o corrupto agente.

                       Essa situação é demais conhecida de todos e está ricamente detalhada no artigo 9º, da Lei n.º 8.429/92 e seus incisos. Assim sendo, o artigo 5º, inciso I, da Lei n.º 12.846/13, repete o enriquecimento ilícito de que trata a Lei de Improbidade Administrativa, como se fosse lícito tal expediente.

Lei 12.846/13:

Art. 5o , IV - no tocante a licitações e contratos: a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; (g.n.)

Lei 8.429/92:

Art. 10, VIII -  frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente; (g.n.)

 

 

 

Comentários:

                       O constituinte atual,[4] preocupado com a melhor contratação para o patrimônio público, instituiu a obrigação  de uma legislação infraconstitucional sobre a obrigação de licitação para as obras, serviços, compras e alienações.

                       A finalidade dessa obrigação constitucional é a preservação dos princípios da legalidade, igualdade, impessoalidade, moralidade, probidade e da própria economicidade.

                       Buscou a CF/88, seguindo a esteira das suas novas orientações, constitucionalizar formalmente os principais pontos a serem percorridos no processo de licitação, sem simplesmente apenas mencionar a obrigação de licitar como constantes do texto anterior.

                       Afirmamos em outra oportunidade:[5]        “A matriz da licitação é a Constituição Federal que estipula como regra o certame, ressalvando os casos especificados na legislação (arts. 24 e 25, da Lei n.º 8.666/93).”

                       Definimos a licitação como:[6]

“O processo instaurado pelo qual o ente público, visando o interesse da coletividade, convoca os interessados para se submeterem à regras preestabelecidas, fornecendo suas propostas comerciais, a fim de selecionar-se a que é mais eficiente e vantajosa para o Estado.”

                       O inciso VIII, do art. 10, da Lei n.º 8.429/92, versa sobre a frustração da licitude de processo licitatório ou a dispensa indevida do certame, que geram prejuízo ao erário.

                       Da mesma forma, o inc. IV, do artigo 5º, da Lei n.º 12.846/13, também coíbe a frustração ou a fraude nas licitações e contratos públicos, mediante ajuste, combinação ou qualquer ato de procedimento licitatório público.

                       Dessa forma, tanto a Lei n.º 8.429/92, como a Lei n.º 12.846/13, disciplinam o mesmo assunto, apenas com algumas especificidades que diferem uma da outra, mas com certeza, os atos que importem em enriquecimento ilícito, prejuízo ao erário e violação aos princípios da Administração Pública estão inseridos em ambos os diplomas legais citados, gerando a respectiva antinomia das citadas leis, com  grande e preocupante conflito, capaz de trazer verdadeiras distorções jurídicas, se o Poder Judiciário não tomar firme medida para coibir o equívoco apontado, quando de sua atuação jurisdicional.

III - DA ANTINOMIA JURÍDICA APARENTE DAS NORMAS – LEI N.º 8.429/92 E LEI N.º 12.846/13

                       O sistema jurídico é o conjunto de regras e de princípios jurídico, que se instituem e se adotam para regular todo o corpo de leis de uma nação.

                       Sendo o direito positivado pela lei, como consequência lógica de uma unidade do sistema jurídico, que ao tempo em que rege a regra da convivência em sociedade, traz a missão de preconizar também a paz jurídica e a segurança para todos.

                       Sucede, que no século XIX, com o surgimento do positivismo jurídico, escola que teve como base estudar o direito positivo, ou seja, aquele posto na lei em que se opõe ao jus naturalismo, ou direito natural, começaram a surgir os conflitos naturais das normas jurídicas.

                       Assim, o conflito normativo surge no apogeu do pleno domínio do positivismo jurídico, porque nos leva à concessão do direito como um sistema normativo,[7] que pode ser limitado no tempo e no espaço, adaptada a possíveis e prováveis necessidades de futuras revisões.

                       E para haver conflitos de normas elas devem estar vigentes e desempenharem um “importante papel sob o nome ‘conflito de deveres’ na Moral, tanto do Direito, especialmente na relação entre a Moral e Direito. Um conflito de normas pressupõe que valem ambas as normas que estão em conflito. Os enunciados relativos à validades de ambas as normas são verdadeiros.”[8]

                       A partir do momento que houve a crescente importância da Lei como motivação para o homem moderno do século XIX positivar as normas, através de leis escritas, começou a surgir a problemática da antinomia jurídica.

                       Maria Helena Diniz trata sob o tema:[9]

"Com a positivação cresce a disponibilidade espaço-temporal do direito, pois sua validade se toma maleável, podendo ser limitada no tempo e no espaço, adaptada a prováveis necessidades de futuras revisões.

 

Resta-nos, por derradeiro, assinalar que a teorização do problema do conflito normativo só surgiu no pleno domínio do positivismo jurídico, porque nos leva à concepção do direito como um sistema normativo.

 

Foi preciso que o direito fosse concebido como um sistema normativo para que a antinomia e sua correção se revelassem como problemas teóricos. A antinomia jurídica aparece como um elemento do sistema jurídico e a construção do sistema exigem a resolução dos conflitos normativos, pois todo o sistema deve e pode alcançar uma coerência interna.

 

O problema científico do conflito normativo é uma questão do século XIX, surgindo com o advento do positivismo jurídico e da concepção do direito como sistema, que criaram condições para o aparecimento de teses em torno da coerência ou incoerência (lógica) do sistema jurídico e da questão da existência ou inexistência de antinomias jurídicas".

                       A positivação do direito também se faz notar na realidade jurídica brasileira, que praticamente codificou nosso ordenamento, positivando as normas.[10]

                       Se diz conflito de leis a situação criada quando da aplicação da lei ao caso concreto, constata-se a existência de duas leis, que se mostram aplicáveis ao caso, surgindo dúvidas ou divergências, em relação a qual delas deve ter a primazia.

                       Destarte, a antinomia jurídica como fenômeno legal moderno aparece, dessa forma, como algo inerente ao sistema normativo em que se transformou o direito.

                       Esse conflito pode ocorrer em determinado momento e local, gerando dúvida relativamente a aplicação de duas leis, existente no mesmo país em que se destinam a regular o mesmo fato.

                       Contudo, como o sistema jurídico é a unificação lógica das normas e dos princípios jurídicos vigentes, obra da ciência do direito, para que ela atinja os seus objetivos, é dever do jurista e do operador do direito eliminar contradições porventura existentes entre as normas e entre os princípios, como averba Paulo Dourado Gusmão:[11]

“Sistema jurídico é, pois, a unificação lógica das normas e dos princípios jurídicos vigentes em um país, obra da ciência do direito. Para obtê-la, elimina o jurista contradições porventura existentes entre normas e entre princípios; estabelece hierarquia entre as fontes do direito, escalonando-as; formula conceitos, extraídos do conteúdo das normas e do enunciado dos princípios, agrupa normas em conjuntos orgânicos e sistemáticos, levando em conta a função que devem elas cumprir, como é o caso das instituições; estabelece classificações, ou seja, aponta o lugar de cada norma no sistema.”

                       Sendo os conflitos de normas ocorridos durante processo de interpretação, a antinomia pode ser solucionada através da aplicação de critérios hierárquico, cronológico e da especialidade, porquanto o objetivo da lei não é criar conflito de interpretação com outra norma jurídica, visto que o seu objetivo é trazer a paz.

                       Para Hans Kelsen[12], há antinomia quando “uma norma determina uma certa conduta como devida e outra norma determina também como devida uma outra conduta, inconciliável com aquela.”

                       E no presente caso, constata-se a antinomia jurídica entre o que vem disciplinado na Lei n.º 8.429/92, aplicável à pessoa jurídica de direito privado (art. 3º), uma vez que estabelece a necessidade de uma conduta subjetiva para fins de tipificação nos atos de improbidade administrativa, com a Lei n.º 12.846/13, que para os mesmos atos preconiza a responsabilidade objetiva, havendo o respectivo conflito positivo das aludidas leis.

                       Esse conflito não pode prevalecer, pois os atos jurídicos disciplinados pela Lei n.º 12.846/13, são, na verdade, atos de improbidade administrativa e como tal devem seguir o que vem determinado pela Lei n.º 8.429/92, visto que os atos lesivos à Administração Pública descritos em seus comandos, confundem-se com os atos ímprobos, descritos na Lei n.º 8.429/92.

                       Na verdade, o legislador não pode “driblar” a conduta subjetiva descrita na Lei n.º 8.429/92, para criar conduta objetiva, elencada na Lei n.º 12.846/13, quando os ilícitos administrativos se imbricam entre si.

                       A coerência do sistema jurídico é representado pelo princípio da não-contradição ou da unicidade, exigindo do sistema jurídico o alcance da justiça pelo direito.

                       Por essa razão, não se admite a antinomia das citadas normas jurídicas, que trarão muitas distorções, quando aplicadas ao caso concreto, visto que a responsabilidade deve ser subjetiva e não objetiva, quando se tratar de penalização sobre atos que atentem contra o erário, contra os princípios da Administração Pública, ou que tragam prejuízo aos cofres públicos.

                       A certeza de que o fato está regulamentado de uma só forma é condição sine qua non para a exteriorização do direito, pois somente assim o jurisdicionado estará possibilitado de prever a consequência jurídica para uma conduta própria ou de outrem, regulada pela lei.

                       Sobre o tema, é de se abrir parênteses para as sólidas palavras de Norberto Bobbio:[13]

"A coerência não é condição de validade, mas sempre condição para a justiça do ordenamento. É evidente que quando duas normas contraditórias são ambas válidas, e pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra, conforme o livre-arbítrio daqueles que são chamados aplicá-las, são violadas suas exigência fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência da certeza (que corresponde ao valor da paz  ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade). Onde existem duas normas antinômicas, ambas válidas, e, portanto ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, entendida como possibilidade, por parte do cidadão, de prever com exatidão as conseqüências jurídicas da própria conduta, nem a justiça, entendida com o igual tratamento das pessoas que pertencem à mesma categoria.”

 

                       O que não é admissível é que prevaleça o presente conflito aqui destacado, pois a responsabilidade da pessoa jurídica é subjetiva, na forma da Lei n.º 8.429/92, que veio regulamentar o que está estatuído no art. 37, § 4º, CF, em especial ao princípio da moralidade qualificada, aí abrangida a corrupção de uma maneira geral.

                       Não pode se admitir uma responsabilização objetiva, desatrelada da mínima coerência jurídica, no afã de punir por punir a empresa, como uma verdadeira resposta ao clamor popular.

                       Esse posicionamento é muito perigoso e traz no seu âmago a possibilidade de iniciar-se uma verdadeira “caça às bruxas”, com a realização de muitas injustiças.

                       As contradições jurídicas devem ser supridas pelo princípio da unidade do sistema jurídico, isso porque não há que prevalecer o antagonismo já declinado da conduta  descrita na Lei n.º 8.429/92, com a conduta elencada na Lei n.º 12.846/13.

                       Sobre a unidade do sistema jurídico, sobressai as considerações da professora Maria Helena Diniz:[14]

 

“A antinomia é um fenômeno muito comum entre nós ante a incrível multiplicação de leis. É um problema que se situa ao nível da estrutura do sistema jurídico (criado pelo jurista), que, submetido ao principio da não-contradição, deverá ser coerente. A coerência lógica do sistema é exigência jurídica. Por conseguinte, a ciência do direito deve procurar purgar o sistema de qualquer contradição, indicando os critérios para solução dos conflitos normativos e tentando harmonizar os textos legais.

 

                       O princípio da unicidade, também chamado da não contradição, para o direito deve ser analisado sobre o conjunto de normas formadores do sistema jurídico. E o sistema jurídico em sua totalidade possui o dever de normatizar o fato e não apenas uma lei em específico, como defendido por João Baptista Machado:[15]

“O caso é que o interesse tutelado por uma norma não pode ser isolado da totalidade dos interesses considerados e tutelados pelo sistema jurídico global. O ordenamento jurídico só pode ser entendido como um sistema de valores tomado como unidade e totalidade, dentro do qual se coordenam e hierarquizam os diferentes valores parciais afirmados pelas diferentes normas. Portanto, qualquer problema jurídico só pode ser adequadamente resolvido em função do ordenamento jurídico global- ou, para usar de novo palavras de Falzea, -o efeito determina­ se cumpridamente, não em função de cada norma especifica (o quer que isso seja), mas em função de todo o sistema”.

                       Não resta dúvida, que a ciência jurídica procura conhecer o direito como um todo, capaz de expressar sentido único, através de proposições isentas de contradição lógica, partindo do pressuposto de que os conflitos normativos podem e devem ser resolvidos pela via interpretativa.

                       Verificado o conflito normativo, deve prevalecer o princípio da unidade do sistema jurídico, em busca de respostas que possibilitem a conciliação, através da via interpretativa, em busca da aplicação correta da lei ao caso concreto.

                       A aplicação de uma lei em detrimento de outra será feita através de critérios hierárquico, cronológico e da especificidade.

                       O primeiro e mais relevante critério que possibilite a solução de antinomias é o hierárquico, visto que a norma jurídica superior suplanta a inferior, que não pode afrontá-la.

                       Isso ocorre porque a norma que representa o fundamento de nulidade de uma outra norma é, em face desta, uma norma superior.

                       A Constituição Federal é a norma máxima, que deve ser seguida por todas as demais, sem que haja a contradição ou o conflito com as suas determinações.

                       Pela hierarquia de normas, é instituído o grau de superioridade de uma sobre a outra, sempre com a finalidade de uma correta harmonização entre elas, a fim de não surgirem dúvidas ou divergências, em relação a qual delas deve ter primazia.

                       O critério cronológico possui como fundamento o que vem estabelecido no artigo 2º, § 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, no sentido de estabelecer que norma posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que trate a lei anterior.

                       Já o critério da especialidade prescreve que a norma especial prevalece sobre o geral.

                       Seu fundamento segue o que vem estatuído no artigo 2º, § 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro :

“Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

 

§ 2o A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.”

                       A revogação pode ser parcial (derrogação) ou total (abrogação) e também pode ser expressa (quando indica inequivocamente o dispositivo legal a ser revogado) ou tácita (quando regule inteiramente o assunto tratado na lei anterior e quando há incompatibilidade de conciliação entre a antiga e a nova lei).

                       In casu, o conflito de normas se constata quando a lei nova (Lei n.º 12.846/13), regulando a matéria já prevista na Lei n.º 8.429/92, estabelece a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica, quando a mesma é alçada à condição de lesar o erário, violar princípios da boa Administração Pública, ou gerar enriquecimento ilícito para a mesma.

                       Ou seja, repete os três tipos infracionais descritos nos artigos 9º, 10 e 11, da Lei n.º 8.429/92, que estabelece justamente o contrário da Lei n.º 12.846/13, porquanto preconiza a responsabilidade subjetiva da pessoa jurídica de direito privado, quando ela praticar ato ímprobo em conjunto com o agente público.

                       Em sendo assim, tanto a Lei n.º 8.429/92, como a Lei n.º 12.846/13, são convergentes quando estabelecem a responsabilidade subjetiva do agente público ou do terceiro particular, conflitando, contudo, quando se trata da responsabilidade das pessoas jurídicas.

                       Tal situação fica bem clara, quando da redação do art. 3º, da Lei n.º 12.846/13, verbis:

“Art. 3o  A responsabilização da pessoa jurídica não exclui a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores ou de qualquer pessoa natural, autora, coautora ou partícipe do ato ilícito.

 

§ 1o  A pessoa jurídica será responsabilizada independentemente da responsabilização individual das pessoas naturais referidas nocaput.

 

§ 2o  Os dirigentes ou administradores somente serão responsabilizados por atos ilícitos na medida da sua culpabilidade.”

                       Ou seja, a Lei n.º 12.846/13, de forma confusa e inconsistente com o sistema jurídico vigente, cria uma espécie de “privilégios” entre particulares quando se trata de responsabilização, visto que apesar de serem particulares, os dirigentes ou administradores de empresas privadas somente serão responsabilizados pela prática de atos ilícitos na medida de sua responsabilidade subjetiva (culpa), ao passo que as empresas não punidas à título de responsabilidade objetiva, em sentido oposto ao que vem estatuído na Lei n.º 8.429/92.

                       Segundo o critério da especialidade, a Lei n.º 8.429/92 é a lei especial que rege os atos de improbidade administrativa, regulamentado o que vem estatuído no art. 37, § 4º, da CF e, portanto, é a norma aplicável à prática de atos de corrupção na esfera cível/administrativa.

                       Sendo a Lei n.º 8.429/92 a responsável por coibir os atos de corrupção na esfera cível/administrativa, é a responsável pelo combate e pela aplicação das penalidades, estabelecendo as condutas típicas e antijurídicas.

                       Quanto a esse aspecto não há divergência teórica ou técnica. Em assim sendo, a Lei n.º 12.846/13 direcionada para os atos anticorrupção, dispondo também sobre a responsabilização administrativa e cível de pessoas jurídicas, não podem destoar da lei especial (n.º 8.429/92) quando se trata de fixação da conduta, visto que deverá prevalecer a harmonização das normas a fim de não trazer distorções ou inseguranças para o sistema jurídico.

                       A responsabilidade é subjetiva, vinculada a culpa, sendo incompatível a responsabilização objetiva administrativa e civil da empresa.

                       Os atos lesivos que porventura as pessoas jurídicas praticarem contra a Administração Pública serão punidos à título de culpa ou de dolo, em conformidade com os tipos descritos na Lei n.º 8.429/92 (art. 9º, 10 e 11). Não sendo admissível, em hipótese alguma a responsabilização objetiva de que trata o art. 2º, da Lei n.º 12.846/3.

                       A antinomia existente entre a Lei n.º 8.429/92 e a Lei n.º 12.846/13, quanto a responsabilização da pessoa jurídica, é suprida pelo critério da especialidade, prevalecendo o princípio da Lex specialis derrogat legi generali.

                       Nessa situação, é de ser aplicado o presente artigo 2º, da Lei n.º 12.846/13 em conformidade com a Lei n.º 8.429/92, vinculado a elemento subjetivo da conduta, excetuando assim a responsabilização objetiva das pessoas jurídicas.

IV - CONCLUSÃO

                       Como aduzido alhures, na prática, apesar dos atos de improbidade administrativa serem regulados pela Lei nº. 8.429/92, o legislador estabelece na Lei nº. 12.846/13 a punição da pessoa jurídica de direito privado sobre os mesmos tipos já estabelecidos na Lei de Improbidade Administrativa, como se tal fosse possível, GERANDO VERDADEIRA ANTINOMIMA DE NORMAS LEGAIS.

                       Essa confusão legislativa ficará mais evidenciada quando forem cotejados os tipos infracionais que as citadas normas legais regulam quando tratam dos atos lesivos à administração pública.

                       Em sendo assim, a responsabilidade da pessoa jurídica de direito privado é subjetiva, na forma da Lei n.º 8.429/92.

  

[1] DO de 17.08.1991, Seção I, p. 14.124.

[2] Cf. STJ, REsp n.º 1122177/MT, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJde 27.04.2011.

[3] MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Inquérito Civil e Ação Civil Pùblica de Improbidade Administrativa, Limites de Instauração. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 405.

[4] Art. 37, XXXI, da CF.

[5] MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O Contrato Administrativo. 2. ed., Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002, p. 349.

[6] MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Op. cit. ant, p. 349.

[7] Cf. DINIZ, Maria Helena. Conflito de Normas. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 5-6.

[8] KELSEN, Hans. Teoria das Normas. Trad. de DUARTE, José Florentino. Rio Grande do Sul: Sérgio Fabris Editor. 1986, p. 159.

[9] DINIZ, Maria Helena. Conflito de Normas. 4. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2001, p. 5-6.

[10] Discorrendo sobre a característica do direito brasileiro, Reis Friede averba: “Como, em nosso País, a realidade do direito se expressa, sobretudo, por  sua inerente normatividade e esta, por seu turno, em forma de produção estatal, de cunho preponderantemente legislativo, é lícito deduzir que, embora reconhecidamente o direito transcenda á exclusiva existência normativa ( e a norma jurídica ao escopo restrito de atuação da lei), a maior parte do Direito se encontra necessariamente na norma e esta, ato contínuo, na lei, obrigando-nos, por efeito, a reconhecer que o Direito (no Brasil e na esmagadora maioria das nações ocidentais) se constitui em uma realidade essencialmente normativa e preponderantemente legal.” (FRIEDE, Reis. Ciência do Direito, norma, interpretação e hermenêutica jurídica. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 127.)

[11] GUSMÃO, Paulo Dourado. Introdução ao Estudo do Direito. 27.ed., Rio de Janeiro: Forense, p. 12.

[12] KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 7. ed., São Paulo: Martins Fontes,. 2006, p. 153.

[13] BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Trad. SANTOS, Maria Celeste C.J., 10. ed. Brasília: Universidade de Brasília, p. 133.

[14] DINIZ, Maria Helena. Op. cit. ant., p. 15.

[15] MACHADO. João Baptista. Âmbito de eficácia e âmbito de competência das leis: limites da leis e conflitos de leis. Coimbra: Almedina, 1998, p. 213.

 

 

Elaborado em janeiro/2015

 

Como citar o texto:

MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. .DO CONFLITO DA LEI ANTICORRUPÇÃO (LEI N.º 12.846/13) COM A LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI N.º 8.429/92), NO QUE PERTINE A RESPONSABILIDADE DA PESSOA JURÍDICA PRIVADA – ANTINOMIA JURÍDICA. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1239. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/cronicas/3497/do-conflito-lei-anticorrupcao-lei-n-12-84613-com-lei-improbidade-administrativa-lei-n-8-42992-pertine-responsabilidade-pessoa-juridica-privada-antinomia-juridica. Acesso em 12 mar. 2015.

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