1. INTRODUÇÃO

            Trata-se de uma matéria acerca da responsabilidade das distribuidoras de energia elétrica quanto ocorrem os chamados “apagões”, tendo em vista as recorrentes reclamações acerca deste problema em todo o país.

            Percebe-se também que a sociedade brasileira de uma maneira geral não tem conhecimento da legislação pátria, especialmente consumerista, para que pleiteie seus direitos perante tais empresas.

            Desta forma, este texto busca tornar claro e simples os direitos dos particulares/consumidores acerca deste problema que infelizmente é recorrente em todo o Brasil.

2. DA RESPONSABILIDADE CONSTITUCIONAL DAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS

           

            Primeiramente é importante ressaltar que as prestadoras de serviço público, neste caso as fornecedoras de energia elétrica, tem responsabilidade objetiva para com os danos causados a terceiros, usuários ou não usuários daquele serviço, ou seja, se a prestação do serviço dessa concessionária causar algum dano ao consumidor, ela terá de arcar com os prejuízos decorrentes dessa má prestação do serviço, conforme previsão constitucional e infraconstitucional.

            Ademais, a nossa carta magna de 1988, em um dos seus artigos basilares, já institui que há previsão de indenização, seja ela moral ou material, consagrando ao ofendido a total reparabilidade dos prejuízos sofridos, conforme se abstrai do art. 5º, IV:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 

V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”.

(grifo inexistente no original)          

            E, a responsabilidade objetiva da concessionária de serviço público em caso de falha na sua prestação do serviço está disposta no art. 36, §6º da Constituição Federal, in verbis:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

 

            Desta forma percebe-se que os direitos dos particulares contra as falhas na prestação do serviço das distribuidoras de energia elétrica inicia-se na Constituição Federal, e se estendem no ordenamento jurídico infraconstitucional.

3. DA RESPONSABILIDADE INFRACONSTITUCIONAL

            Observa-se que não só há disposição constitucional para regularizar a responsabilidade das prestadoras de serviço público, existem também leis específicas para disciplinar tal assunto, qual seja, a lei 8.987/95, esta que regulamenta o regime de concessões e permissões da prestação de serviços públicos.

            No tocante ao tema aqui trazido, a lei 8.987/95 em seu art. 25, dispõe sobre a responsabilidade das concessionárias, conforme vejamos:

 

“Art. 25. Incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade.”

                                   (grifos inexistentes no original)

            Complementando os artigos supramencionados, o Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, estabelece em seu artigo 14, ser objetiva a responsabilidade civil dos prestadores de serviços, neste caso as concessionárias de serviço público, ao passo que respondem independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores, senão vejamos:

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”

(grifos inexistentes no original)

 

            O art. 210 da resolução 414/2010 da própria ANEEL traz o mesmo entendimento já demonstrado, literis:

Art. 210º. A distribuidora responde, independente da existência de culpa, pelos danos elétricos causados a equipamentos elétricos instalados em unidades consumidoras, nos termos do art. 203.

(grifos não originais)

            Para solidificar o entendimento acima demonstrado, o STF, em um agravo de instrumento no recurso extraordinário assim decidiu:

AGRAVO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DANOS MATERIAIS. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.Relatório 1. Agravo nos autos principais contra inadmissão de recurso extraordinário, interposto com base na al. a do inc. III do art. 102 da Constituição da República contra o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: “APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS. QUEDA DE ENERGIA ELÉTRICA. DANOS EM APARELHO DE EMPRESA SEGURADA. PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO. SUB-ROGAÇÃO DA SEGURADORA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO POR PARTE DA CONCESSIONÁRIA. CASO FORTUITO NÃO DEMONSTRADO. DEVER DE INDENIZAR. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES DESTA CORTE. APELO DESPROVIDO”. 2. A Agravante afirma ter o Tribunal de origem contrariado o art. 37, § 6º, da Constituição da República. Argumenta que, “independentemente da responsabilidade objetiva que possa recair sobre a recorrente por conta da concessão de serviços públicos, esta resta afastada quando não comprovado o nexo causal entre a conduta da concessionária e os danos sofridos pela parte recorrida”. 3. O recurso extraordinário foi inadmitido sob o fundamento de incidência da Súmula n. 279 do Supremo Tribunal Federal. Apreciada a matéria trazida na espécie, DECIDO. 4. Razão jurídica não assiste à Agravante. 5. O Tribunal de origem reconheceu a existência de nexo de causalidade entre o evento e o dano sofrido pelo Agravado, nos seguintes termos: “Demonstrado o dano e sendo ao ofensor (omitente) imputado a conduta lesiva que resultou na queda ou ausência de energia elétrica, cabia à empresa ré demonstrar que o defeito não pode lhe ser exigido, o que não ocorreu, ante a não juntada aos autos de prova nesse sentido. No caso em tela, não se verifica a ocorrência de nenhuma causa de exclusão de responsabilidade, portanto, configurado está o dever de indenizar, haja vista que estão presentes os três elementos da responsabilidade civil, quais sejam: o dano, a conduta ilícita civil e o nexo causal entre esta e àquela. Logo, decorre o dever de indenizar. (...). Acrescento que, ao contrário do que afirma a apelante, o documento da fl. 14 comprova o dano material suportado pela seguradora, o qual está lastreado nos demais documentos juntados aos autos (relatório de regulação de sinistro, laudos técnicos e notas fiscais - fl. 16 e seguintes)”. A apreciação do pleito recursal demandaria o reexame das provas constantes dos autos, procedimento inviável de ser adotado validamente nesta senda recursal. Incide, na espécie, a Súmula n. 279 do Supremo Tribunal Federal: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. CONTROVÉRSIA SOBRE A EXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” (AI 860.320-AgR, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe 28.3.2014). “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEMORA NO RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS (...) (art. 544, § 4º, inc. II, al. a, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 25 de agosto de 2014.Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora.

 

(STF - ARE: 830518 RS , Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 25/08/2014, Data de Publicação: DJe-167 DIVULG 28/08/2014 PUBLIC 29/08/2014)

(grifos não originais)

            Está claro que em se tratando de distribuição de energia elétrica, as concessionárias deste serviço devem ser responsabilizadas objetivamente por todos os prejuízos causados aos consumidores, independentemente de culpa conforme já explicitados acima.

4. DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

            Outrossim, a Agência Nacional de Energia Elétrica de tempos em tempos lança as resoluções normativas, e em muitas delas determina como o consumidor deverá agir caso ocorra um apagão, queda de energia que venha a danificar algum produto.     

            Ressalte-se que, até a presente data,  é a resolução normativa 414/2010 que por último regulou os procedimentos a serem seguidos pelos consumidores. No art. 204 dessa resolução esta o passo a passo a ser adotado para garantir o ressarcimento. Dispõe o artigo supracitado o seguinte:

“Art. 204. O consumidor tem até 90 (noventa) dias, a contar da data provável da ocorrência do dano elétrico no equipamento, para solicitar o ressarcimento à distribuidora, devendo fornecer, no mínimo, os seguintes elementos:

I – data e horário prováveis da ocorrência do dano;

II – informações que demonstrem que o solicitante é o titular da unidade consumidora, ou seu representante legal;

III – relato do problema apresentado pelo equipamento elétrico; e

IV – descrição e características gerais do equipamento danificado, tais como marca e modelo.

V – informação sobre o meio de comunicação de sua preferência, dentre os ofertados pela distribuidora. (Incluído pela REN ANEEL 499, de 03.07.2012)

§ 1o A solicitação de ressarcimento pode ser efetuada por meio de atendimento

telefônico, diretamente nos postos de atendimento presencial, via internet ou outros canais de comunicação disponibilizados pela distribuidora.

§ 2o Para cada solicitação de ressarcimento de dano elétrico, a distribuidora deve abrir um processo específico, observando-se o disposto no § 3o do art. 145.

§ 3o A obrigação de ressarcimento se restringe aos danos elétricos informados no momento da solicitação, podendo o consumidor efetuar novas solicitações de ressarcimento de danos oriundos de uma mesma perturbação, desde que observado o prazo previsto no caput.

            Posteriormente, a concessionária poderá optar pela verificação do equipamento, mas para isso ela deverá informar ao consumidor data e horário aproximado para isso, sendo que, tal opção da concessionária deverá ser realizada em até 10 (dez) dias após o pedido de ressarcimento do consumidor, mas se for equipamento de acondicionamento de alimentos, esse prazo cai para 1 (um) dia útil.

            É necessário destacar que caso o consumidor se recuse a deixar a verificação ocorrer, poderá ser causa de indeferimento do pedido de ressarcimento junto a prestadora de serviço público. Contudo, tal justificativa de negar o pedido de ressarcimento somente pela recusa do consumidor à averiguação pela empresa concessionária vai de encontro a lei consumerista, ou seja, é de faculdade do consumidor a liberação ou não do equipamento para essa averiguação.

            Após a reclamação, a concessionária deverá expedir o resultado do pedido de ressarcimento em no máximo 15 (quinze) dias, sendo esses contados a partir do pedido do ressarcimento ou verificação do produto. Caso seja dada razão ao consumidor, a concessionária/distribuidora deverá efetuar o pagamento/substituição do produto em no máximo 20 dias, e caso seja indeferido o pedido, terá de ser exposta todas as razões e fundamentações alegadas, comprovando os motivos do indeferimento.

            Ademais, importante ressaltar que a fundamentação acima citada se refere aos prejuízos materiais sofridos pelo consumidor pela má prestação do serviço, restando ainda a possibilidade do consumidor em pleitear/requerer danos morais causados pela falha na prestação do serviço no poder judiciário.

5. CONCLUSÃO

            Desta forma, restou patente que as concessionárias de serviço público, neste caso as distribuidoras de energia elétrica, quando causarem danos aos equipamentos de seus consumidores, deverão ressarci-los tanto materialmente quanto moralmente, sendo que este último não se conseguirá através do processo administrativo.

 

 

Elaborado em novembro/2014

 

Como citar o texto:

RIBEIRO, Vitor Soares..A Responsabilidade Civil Das Distribuidoras De Energia Elétrica Quando Do Dos Apagões. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 23, nº 1214. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-do-consumidor/3317/a-responsabilidade-civil-distribuidoras-energia-eletrica-quando-apagoes. Acesso em 2 dez. 2014.

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