RESUMO

O presente artigo, se destina a realizar um estudo acerca da efetividade das medidas socioeducativas em detrimento das propostas de redução da maioridade penal. Ter-se-á uma análise das medidas socioeducativas e seus pressupostos de aplicação. Esta pesquisa se debruça também sobre a evolução do direito menorista no Brasil, com a intenção de possibilitar uma maior compreensão da tutela jurisdicional do menor infrator. Por conseguinte, serão elucidados os aspectos divergentes, quanto a uma possível solução para a diminuição da delinquência juvenil, abalizando aos aspectos motivadores das propostas de redução da maioridade penal, e revelando a importância do zelo pela efetivação da legislação menorista então vigente no ordenamento jurídico brasileiro.

PALAVRAS-CHAVE: Direito menorista; Estatuto da Criança e Adolescente; maioridade penal; medidas socioeducativas.

ABSTRACT

The present study is intended to conduct a study about the effectiveness of socio-educational measures to the detriment of proposals to reduce the age of criminality, an analysis of socio-educational measures and their assumptions of application. This research also deals with the study of the evolution of the right of the minority in Brazil, with the intention of making possible a greater understanding of the judicial protection of the minor infrator. Therefore, the divergent aspects will be elucidated as to a possible solution for the reduction of juvenile delinquency, emphasizing the motivating aspects of the proposals to reduce the age of criminality, revealing the importance of zeal for the effectiveness of the minorist legislation then in force in the Brazilian legal system.

KEYWORDS: Minorist law; Statute of the Child and Adolescent; criminal majority; educational measures.

INTRODUÇÃO

Realidade no que diz respeito à responsabilização penal dos jovens infratores é tema principal das discussões acerca da efetividade quanto à imposição das medidas socioeducativas, possuidoras do dever de restaurar e reintegrar esses menores à sociedade. Investiga a respeito do êxito na aplicação e posteriormente depois de identificada a deficiência em relação à execução do mecanismo para coibir esses menores, busca-se o recurso eficaz para reprimir esse problema social.

A inércia do Estado perante a situação crítica em que se encontra a criminalidade, em referência aos menores amparados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), gera para a sociedade certa visão de impunidade, uma vez que notórias as irregularidades e a ineficiência quanto à redução de adolescentes e jovens na vida do crime, e consequentemente a reincidência.

O fato de ser evidente a carência no exercício legal corrente acarreta um clamor social no sentido de se criar alguma medida que regularize o cenário atual, trazendo medidas concretas para sanar essa crise pública. Sugere-se então a redução da maioridade penal. Essa abordagem traz consigo divergências com relação às deliberações que cada sugestão proporcionará.

O artigo trará três principais abordagens, sendo a primeira delas: a “evolução histórica do direito menorista no Brasil”, explanando desde o período pré-colonial ao ECA, passando pelos indispensáveis códigos anteriores.

Posteriormente se discorrerá sobre a “prática dos atos infracionais”, onde será caracterizado e diferenciado quanto à responsabilização entre crianças e adolescentes, para o fim de aplicar as medidas impostas a esses menores, para em seguida especificar cada medida socioeducativa imposta na legislação correspondente.

Na terceira e ultima abordagem, denominada “Estudo das proposituras da redução da maioridade penal” serão destacado os principais pontos de vista no que se refere ao questionamento proposto neste tópico.

A revisão sistemática de literatura foi a metodologia empregada para a instrumentalização deste estudo, foram utilizadas como base de dados as bibliotecas da Católica do Tocantins, Escola da Magistratura Tocantinense e os sítios eletrônicos biblioteca virtual da Faculdade de Direito, Revista online da Universidade Federal de Santa Catarina, entre outros.

Ademais, salienta-se que este trabalho foi elaborado como requisito parcial de obtenção de aprovação na matéria de TCC II do curso de Direito da Católica do Tocantins.

1 O DIREITO MENORISTA NO BRASIL E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Desde as primeiras leis penais ao início do século XX, adultos e crianças eram tratados igualmente, inexistia o conceito de indivíduo em fase peculiar de desenvolvimento, todos recebiam os mesmos tratamentos em diversas áreas do direito, não havia distinção na esfera trabalhista, por exemplo, e consequentemente na penal, onde crianças recebiam as mesmas punições que adultos. (FACHINETTO 2003)

As normas primitivas que tange o Direito Penal Menorista, durante o período pré-colonial vigorava o mesmo sistema jurídico de Portugal, deste modo, as Ordenações Reais, em conjunto pelas Ordenações Afonsinas (1446), Ordenações Manuelinas (1521) e, posteriormente, resultando da união das Ordenações Manuelinas com as leis singulares em vigência, pode se dizer que, a que teve maior influência inicialmente, as Ordenações Filipinas. (SARAIVA 2003)

As relações jurídicas passaram a ser regidas pelas Ordenações Filipinas, sendo estas promulgadas por D. Filipe III em 1603, vigendo até o Código Criminal de 1830, onde iniciou a viabilização da sanção aos menores.

É válido e certo considerar, que o sistema punitivo imposto aos menores infratores era rígido e inflexível, uma vez que a base do sistema imposto era intransigente em todos os aspectos, nesse sentido pontua José Fábio Rodrigues Maciel (2018, n.p) que ”as penas previstas nas Ordenações Filipinas eram consideradas severas e bastante variadas, destacando-se o perdimento e o confisco de bens, o desterro, o banimento, os açoites, morte atroz (esquartejamento) e morte natural (forca). ”

A ordenação indicava que a imputabilidade penal se daria aos 7 anos de idade, sendo então até a idade indicada, ressalvada da pena de morte, tendo a concessão de uma redução de pena, no entanto, dos 17 aos 20 anos a sistemática era outra, tornando-se mais severo, podendo dependendo do ato, ser até mesmo condenado à morte, segundo a avaliação do julgador, podendo aplicar  a pena total ou diminuí-la, consoante sua persuasão, baseando se na análise do ato cometido, bem como nas circunstâncias e análise da pessoa do menor.

E se for de idade de dezasete anos até vinte, ficará em arbitrio dos julgadores dar-lhe a pena total, ou diminuindo-lha.   E em este caso olhará o julgador o modo com que o delicto foi commettido, e as circumstancias delle, e a pessoa do menor; e se o achar tanta malícia, que lhe pareça total pena dar-lhe-ha, posto que seja de morte natural. (REINO DE PORTUGAL, 1595).

Perante a análise realizada é perceptível que desde os primeiros dispositivos legais a vigerem no Brasil é possível observar já havia uma tutela penal retribuía que se direcionava ao o menor que transgredisse preceitos sociais. Nesta senta, é imperioso mencionar que as penas impostas aos menores eram extremante severas. (MACIEL, 2006)

1.1 CÓDIGO PENAL REPUBLICANO

Posteriormente advindo da Proclamação da República, foi promulgado o Código Penal dos Estados Unidos do Brazil, instituído por meio do Decreto n° 847, de 11 de outubro de 1890, sendo então o primeiro Código Penal brasileiro.

O Código foi criado pela urgente necessidade de reformar o regimento penal vigente à época. Nesta consolidação buscou-se, por uma metodologia de aplicabilidade penal, que se pautava na análise do desenvolvimento mental do indivíduo, surgindo então uma preocupação acerca da capacidade cognitiva de crianças e jovens. (REBELO, 2010)

Nele havia uma definição no que tange aos ciclos eminentes do menor, de acordo com o art. 27, caracterizando a infância, “Não eram considerados criminosos: § 1º Os menores de 9 annos completos; § 2º Os maiores de 9 e menores de 14, que obrarem sem discernimento; ” (BRASIL, 1890).

Já o art. 30 do mesmo Diploma determinava que os maiores de 9 anos e menores de 14, que tiverem agido com discernimento, seriam recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriais, pelo tempo que o juiz determinar, desde que o recolhimento não excedesse a idade de 17 anos. 

Verifica-se aqui o cuidado que o legislador tinha ao estabelecer medidas disciplinares, demonstrando a preocupação com a recuperação do menor, nesta fase também. Este quadro permaneceu até 1927, quando entrou em vigência o Código de Menores do Brasil, que também ficou conhecido como o Código de Mello de Matos.

1.2 CÓDIGO DE MELLO DE MATTOS -1927

Através do Decreto n° 17.943-A, de 12 de outubro de 1927 nasce o primeiro Código Sistemático de Menores do País, elaborado por José Cândido de Albuquerque Mello Mattos, foi o primeiro juiz de menores do Rio de Janeiro e da América Latina, possuía grande carinho pela área infantil, e para com os desprivilegiados da sociedade. Este código representou uma era itinerária no que diz respeito a legislação infantil no cenário brasileiro. (AZEVEDO, 2007).

Vigorava aqui a assistência ao menor de 18 anos, criando Vara Especializada para os menores em situações irregulares, passando a ser objeto do direito brasileiro tendo então tratamento diferenciado daqueles até então recebidos. (AZEVEDO, 2007) 

No primeiro artigo deste código, já se visualizava uma nova sistemática no que diz respeito aos menores de 18 anos, ao preceituar o seguinte: “Art. 1º O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que tiver menos de 18 annos de idade, será submettido pela autoridade competente ás medidas de assistência e protecção contidas neste Codigo.”

Para Mello Mattos o principal objetivo era manter a ordem social, logo, aqueles menores que possuíam famílias não eram objeto do Direito à essa época. Já as crianças pobres, abandonadas ou marginalizadas, que se encontravam em situação irregular sim. (PAES, 2013). Caracterizavam situação irregular aqueles menores de idade (18 anos) que estivessem expostos, abandonados, ou fossem delinquentes, legitimados nos artigos seguintes do Código Mello de Mattos:

Em razão da exposição:

Art. 14. São considerados expostos os infantes até sete annos de idade, encontrados em estado de abandono, onde quer que seja.

Se tratando de abandono:

Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 annos:

Pelo fato de delinquir:

[...] Art. 69. O menor indigitado autor ou cumplice de facto qualificado crime ou Contravenção, que contar mais de 14 annos e menos de 18, será submettido a processo especial, tomando, ao mesmo tempo, a autoridade competente as precisas informações, a respeito do estado physico, mental e moral delle, e da situação social, moral e economica dos paes, tutor ou pessoa incumbida de sua guarda.

No Código de Mello de Mattos, o legislador, enxergou na proteção a integridade do menor em situação de risco, uma forma de garantir a manutenção da ordem social. Neste dispositivo, em face desse caráter é perceptível um significativo avanço no que diz respeito à legislação menorista.

1.3 CÓDIGO PENAL DE 1940

Instituído através do Decreto Lei n° 2.848, de dezembro de 1940, o Código Penal de 1940 estabilizou a demarcação da inimputabilidade aos menores de dezoito anos, aderindo ao critério biológico, referindo-se à inimputabilidade perante a idade estabelecida, como pontua Nucci ao dizer que “no Brasil, em lugar de se permitir a verificação da maturidade, caso a caso, optou-se pelo critério cronológico, isto é, ter mais de 18 anos”. (2013, p. 315)

O Art. 23 desta lei determinava que os menores de dezoito anos seriam penalmente irresponsáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial. Assim também confirma Oliveira “a partir do Código Penal de 1940 qualquer que seja a idade do menor, este não será submetido a processo criminal, mas a procedimento previsto em legislação especial. ” (2003, p. 03).

Deste modo, o menor que praticasse algum fato definido como crime, em termos comuns, era considerado pelo ordenamento jurídico como incapazes de compreender e designar.

Assim depreende-se que o menor infrator não possui capacidade de assimilar o fato tido como infração penal e que lhes falta vontade soberana, jamais podendo ser julgado como uma pessoa adulta, pois o fato de ser menor é pressuposto para livrá-lo da condenação a que um adulto sofreria por ser considerado inimputável. (OLIVEIRA, 2003).

1.3 CÓDIGO DE MENORES 1979

Em 1979 foi instaurado um novo código de menores, seguindo os moldes do código anterior de 1927, trazendo todo um viés direcionado a doutrina da proteção integral já existente no ponto de vista posterior do ECA, (Estatuto da Criança e do Adolescente), porém a estrutura primordial era fundamentada em consonância com o código de 1927, baseado em uma ótica auxiliar e repressiva, quanto às condições social e psicológica do menor. (QUEIROZ 2008)

Sob esse enfoque, caracterizavam-se os menores que se encontravam em situações desproporcionais, identificando-os como indivíduos em situação de desigualdade, criando assim o termo até hoje constantemente utilizado, “menor em situação irregular”. (SPOSATO 2006)

A configuração para os menores em situações irregulares se dava para: crianças e adolescentes até 18 anos, que cometessem atos ilícitos, sendo utilizado o termo “atos infracionais”, e, por conseguinte aquelas que sofriam negligências pela família, como maus tratos, como aquelas descuidadas, abandonadas e indefesas pela sociedade.

Importante ressaltar que o Código de Menores não se designava a prevenção dos atos acometidos, somente cuidava do conflito já existente. Observe o que ordena o art 2° da referida lei:

Art. 2º. Para os efeitos deste Código, considera-se em situação irregular o menor: I - privado de condições essenciais à sua subsistência, saúde e instrução obrigatória, ainda que eventualmente, em razão de: a)           falta, ação ou omissão dos pais ou responsável; b)           manifesta impossibilidade dos pais ou responsável para provê-las; II - vítima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsável; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrário aos bons costumes; b)exploração em atividade contrária aos bons costumes; IV - privado de representação ou assistência legal, pela falta eventual dos pais ou responsável; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptação familiar ou comunitária; VI - autor de infração penal.

Paulo Lúcio Nogueira em análise ao artigo acima mencionado, elucida que este dispõe quanto a classificação das categorias da “situação irregular” e o autor ao citar Nogueira, explica que para este, a “situação irregular” deve ser entendidas como:

Situação de perigo que poderão levar o menor a uma marginalização ampla, pois o abandono material e moral é um passo para a criminalização... A situação irregular do menor é, em regra, consequência da situação irregular da família, principalmente com a sua desagregação. (LIBERATI, apud NOGUEIRA, 1988, p. 13).

Contudo, não se pode deixar de reconhecer que, em alguns casos, a situação do menor é decorrente da própria situação familiar, seja pelo estado de pauperismo (abandono material), seja em virtude de riqueza (desvio de conduta).

Por mais de dez anos em vigor, o Código de Menores procurou atender à situação da época da forma mais condizente possível com a Lei Maior.

1.4 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A partir da constituição de 1988 começou a projetar uma nova política de proteção e de assistência ativa à infância e à juventude, que diferentemente da anterior considerava criança e adolescente possuidores de direitos nas mais amplas espécies, desde a existência digna, à saúde, à educação e principalmente ao suporte jurídico. (MOREIRA, at all. 2016)

Foi então em junho de 1990 por meio da lei 8069/90 que ocorreu no Brasil um marco significativo no cenário jurídico, havia necessidade de uma nova lei enraizada, com mudanças no protótipo das leis anteriores, com a finalidade de redefinir os direitos e as responsabilidades dos menores, baseado nas diretrizes da Constituição Federal de 1988 e que tivesse sua base no Princípio da Proteção integral, surge então o Estatuto da Criança e do Adolescente conhecido como ECA. Essa legislação formou uma mudança no padrão das leis anteriormente vigentes: os Códigos de menores de 1927 e de 1979. (MOREIRA, at all. 2016)

Com a instituição do ECA, formou-se uma nova orientação jurídica conhecida como Doutrina Da Proteção Integral do Menor.

O protótipo de proteção integral surgiu baseado na Convenção Internacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Organização das Nações Unidas (ONU). No Brasil, este princípio está sagrado no Texto Constitucional no artigo 227, que reza:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Desta forma, depreende-se que o Estatuto da Criança e Adolescente, dentro do ordenamento jurídico é dispositivo legal que tem como função precípua dar efetividade à princípios e garantias constitucionalmente instituídos.

Como nas palavras de Jason Albergaria (1991) a base do Estatuto da Criança do Adolescente deveria partir do princípio da proteção da pessoa do menor ou da clemência, partindo do pressuposto da imaturidade psíquica do menor.

Outro aspecto importante que é basilar para definir a proteção do menor é o princípio da exigência do exame médico-psicológico e social da personalidade do menor, como pressuposição para a individualização da medida tutelar. ( MOREIRA, at all. 2016)

De acordo com o ECA consideram-se crianças, os menores de doze anos, e adolescentes, os que têm entre doze e dezoito anos.

Seguindo os moldes do estatuto, menor independentemente da situação, não comete crime, e sim atos infracionais, assim sendo, atos infracionais possuem caráter administrativo, jamais penal. Logo, um menor que comete delito, não é considerado um criminoso e sim um infrator, e as penas a ele estabelecidas serão de acordo com a infração cometida. (MOREIRA, at all. 2016)

Utiliza-se para a identificação o critério biológico: Neste caso, para provar a inimputabilidade, basta simplesmente à comprovação da menoridade do sujeito, ou seja, ainda que o menor tenha capacidade para compreender a natureza da ilicitude do ato, ainda que ele tenha consciência do ato que cometeu, ainda que ele tivesse condições de agir de outra maneira, o fato dele ser menor de dezoito anos, por si só já o torna inimputável. Pois adota a presunção de que todo menor de dezoito anos não é capaz de entender o caráter ilícito de sua ação.  (MIRABETE, 2016)

Conforme prevê o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 104, o menor de 18 anos é inimputável porém capaz, inclusive a criança, de cometer ato infracional, podendo então receber aplicação de medidas socioeducativas, sendo elas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade, internação em estabelecimento educacional e, por fim, qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI, estabelecendo também que a autoridade competente poderá determinar de acordo com o caso concreto a medida mais adequada, conforme o art. 105 do ECA

2 DA PRÁTICA DE ATOS INFRACIONAIS

De acordo com o ECA consideram-se crianças, os menores de doze anos, e adolescentes, os que têm entre doze e dezoito anos.

Seguindo os moldes do estatuto, menor independentemente da situação, não comete crime, e sim atos infracionais, assim sendo, atos infracionais possuem caráter administrativo, jamais penal. Logo, um menor que comete algum delito, não é considerado um criminoso e sim um infrator, e as penas a ele estabelecidas serão de acordo com a infração cometida. Quando houver menores infratores, o legislador levará em consideração o critério ou os critérios para a aplicação das medidas ao menor. (MARCOS BANDEIRA, 2006)

Compreendendo as imposições que preceitua o ECA e após distinguir as expressões “criança“ e “adolescente” e delinear quem são as pessoas que estão sujeitas às medidas socioeducativas e aquelas que não estão. É de suma importância ressaltar que o próprio ECA se incumbiu de definir, no âmbito de seus limites estatutários, os “inimputáveis”, como também estabeleceu a responsabilização juvenil infracional a partir dos doze anos completos, como já foi exposto. No seu Art. 2º recomenda-se o seguinte: “Considera-se criança, para os efeitos desta lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. ”

A responsabilização destes jovens, de acordo com o ECA, começa aos doze anos e vai até aos dezoito anos incompletos, ou seja, somente os adolescentes, entre 12 e 18 anos incompletos, a quem for atribuído a prática de qualquer ato infracional estará sujeito à determinação de medidas socioeducativas e/ou protetivas, estabelecida nos arts. 112 e 101 do ECA, aplicadas pela autoridade judiciária competente.

O art. 103 do ECA dispõe sobre a configuração do ato infracional. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.

Entretanto é fato que não há uma diferença, objetivamente falando, entre o cometimento de um crime previsto no Código Penal ou se tratando de uma contravenção penal por exemplo para a definição de ato infracional.

Nessa mesma perspectiva Marcos Bandeira cita Damásio de Jesus ao tratar deste mesmo assunto, não há distinção entre crimes, contravenções e atos infracionais. Consoante o escólio do professor Damásio de Jesus:

Há quatro sistemas de conceituação do crime: a) formal; b) material; c) formal e material; d) formal material e sintomático [...]. No sentido substancial, para Manzini, delito é a ação ou omissão, imputável a uma pessoa, lesiva ou perigosa a interesse, penalmente protegido, constituída de determinados elementos e, eventualmente, integrada por certas condições, ou acompanhada de determinadas circunstâncias previstas em lei [...]; sob o aspecto formal, crime é um fato típico e antijurídico. Explicita objetivamente mais uma vez: [...] os quatro sistemas, dois predominaram: o formal e o material. O primeiro apreende o elemento dogmático da conduta qualificada como crime por uma norma penal. O segundo vai além, lançando olhar às profundezas das quais o legislador extrai os elementos que dão conteúdo e razão de ser ao esquema legal [...]. Não há diferença ontológica, de essência, entre crime (ou delito) e contravenção. O mesmo fato pode ser considerado crime ou contravenção pelo legislador, de acordo com a necessidade da prevenção social. Assim, um fato que hoje é contravenção pode no futuro vir a ser definido como crime. (JESUS, apud BADEIRA, 2006, p.27)

Extrai dessa fundamentação que se crime e contravenção, naturalmente, não diferem um do outro, o mesmo se aplicaria aos atos infracionais, pois a distinção seria abstrata, meramente subjetiva, ou seja, se a figura típica e ilícita, prevista como crime ou contravenção, estiver sendo praticada por um imputável penalmente, ele estará cometendo um crime ou contravenção e poderá sofrer uma pena, enquanto se esse mesmo ato estiver sendo cometido por um adolescente, nesse caso, estaria configurado um ato infracional, onde seria ele sujeito à imposição de uma medida socioeducativa e/ou protetiva - seguindo os moldes do ECA, em seus arts. 101 e 112. N

Marcos Bandeira (pág. 49) também esclarece quanto o cometimento dessas infrações perante o Estatuto “Os atos infracionais praticados por criança serão apreciados pelo Conselho Tutelar, o qual terá a atribuição de aplicar qualquer das medidas de proteção previstas no Art. 101, I a VI do ECA, ou seja, terá competência para aplicar medidas protetivas à criança que estiver numa situação de risco social ou moral, por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; e pela prática de algum ato infracional – por sua conduta”

3 ANÁLISE DAS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

Passando do viés legal para a sistemática das medidas socioeducativas fazendo uma análise acerca do surgimento e a funcionalidade de cada medida socioeducativa. É sabido que medidas socioeducativas são medidas aplicáveis a adolescentes autores de atos infracionais, possuindo previsão legal no art. 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). E mesmo atendendo como uma sanção como resposta à prática de um delito, apresentam um caráter predominantemente educativo.

É nítido, nos veículos de mídia em geral, que o sistema possuidor da obrigação de restaurar necessita de uma análise profunda, para que compreendam o trabalho feito pelo estado e a partir daí absorva a essência e assim diagnostique onde há de fato o fator que requer uma reforma e uma aplicabilidade eficiente.

O Estatuto da Criança e do Adolescente disponibiliza a previsão de medidas  de proteção, aplicadas   às   crianças   e   as   medidas   socioeducativas destinadas aos adolescentes que praticam atos infracionais, e tem por objetivo não a punição, mas a efetivação de formas para reeduca-los e reinseri-los   de volta à sociedade, sendo estas  medidas  jurídicas  de  caráter  repressivo  e  atuante de maneira pedagógica. (LIBERATI, 2006)

Mesmo com a afirmação de que as medidas socioeducativas tenham caráter administrativo e não penal alguns doutrinadores possuem posições divergentes a este assunto.

Em relação a essa temática KONZEN (2005) detém a opinião de que o bojo da medida socioeducativa, ou seja, seu aspecto material, possui natureza penal, em razão do reconhecimento lógico do seu caráter.

O autor propõe que ao questionar a um adolescente infrator qual a impressão que se tem relacionado à determinação de uma medida socioeducativa, provavelmente, a resposta será que se considera em uma situação punitiva.

A medida socioeducativa compõe uma esfera instrumental, que corresponde à finalidade acossada quando da sua aplicação, que deverá ser predominantemente socioeducativa.

Danielle Rinaldi Barbosa ensina que, a priori, a medida socioeducativa em nada difere da punição criminal:

Uma vez que ambas correspondem à resposta unilateral e obrigatória do Estado diante da configuração de um ato típico, ilícito e inaceitável no meio social. Já no tocante à esfera instrumental da medida, não se nega que a pena decorrente da prática de crime também possui o seu caráter ressocializante. (2009, p.54)

E acrescenta a autora:

Inobstante isso, em razão da situação do adolescente de pessoa que se encontra em fase precípua de desenvolvimento, o caráter pedagógico da intervenção estatal deverá ser para ele mais evidente, à vista das maiores possibilidades de reformulação dos seus valores e virtudes. (2009, p.54)

Marcos Antônio Santos Bandeira, explica que

à gravidade da infração e aos péssimos antecedentes do menor não são sufi cientes para motivar a privação total de sua liberdade, até mesmo pela própria excepcionalidade da medida socioeducativa de internação, restando caracterizada afronta aos objetivos do sistema. [...] A gravidade da infração e os péssimos antecedentes, a toda evidência, não são motivação bastante para privar o adolescente de sua liberdade, alento. (2006, p.34)

O autor ainda leciona sobre o caráter excepcional da internação e a classifica como “a forma mais drástica da intervenção estatal na esfera individual do cidadão, pois o poder sancionatório do Estado alcança o jus libertatis do adolescente, o maior bem que possuímos depois da vida”. (2006, p.183)

Segundo o autor o maior desafio de todos os que se envolvidos na reeducação do adolescente infrator é transformá-lo, tornando-o cidadão respeitado, evitando que venha a tardiamente tornar-se um delinquente imputável. Nessa perspectiva expressa o seguinte:

As medidas socioeducativas, portanto, devem pautar-se fundamentalmente na adoção pedagógica de mecanismos de inclusão social, que sejam capazes de introjetar no jovem ainda em formação valores que penetrem na sua centelha divina, aumentando a sua auto-estima, ampliando os seus horizontes e a sua condição de sonhar com a grande possibilidade que é a vida. Sonhar que é capaz de ser um cidadão respeitado e capaz de desenvolver todas as suas potencialidades que ficaram esquecidas diante da vida dura e desumana que o fez esquecer de “ser” e o obrigou a lutar para sobreviver. (2006, p.137)

Esse é o principal objetivo de desvincular o menor infrator de um criminoso em potencial, tratando-o diferenciado para que não se auto qualifique como um adulto não passível de reparação, quando na verdade possuem toda uma vida de possibilidades pela frente, pois encontra-se no início de sua formação, sem poderes para discernir e compreender, algumas vezes, o que se passa ao seu redor e quais as dimensões que sua atitude infracional resultaria.

Em relação às modalidades disponibiliza o ECA em seu art. 122 o seguinte:

Art. 112 – Verificada a prática de ato infracional, a autoridade  competente   poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I -advertência;

II -obrigação de reparar o dano;

III -prestação de serviços à comunidade;

IV- liberdade assistida;

V- inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da  infração.

§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local      adequado às suas condições [...].

O proposto no artigo acima efetivará aos adolescentes uma das medidas citadas, adequando-a sempre a prática do ato infracional cometido. Observando o compromisso com a justiça e garantindo que seus direitos sejam mantidos, proibindo então a aplicação de medidas diversas das enunciadas no artigo 112 do Estatuto. Essas medidas detém a função de formação do tratamento tutelar com o objetivo de reestruturar e transformar o adolescente para por fim atingir a normalidade da integração social.

As especificações de cada medida individualmente possuem um objetivo restaurador e de acordo com o ato praticado por cada menor, vejamos:

Advertência: O menor infrator será advertido e receberá conselhos e orientações da autoridade judiciária na presença de seus pais ou de seu responsável legal, respeitando o adolescente advertido e tratando-o com dignidade; lembrando que é ainda, pessoa na condição peculiar de desenvolvimento e não poderá ser exposto ou submetido a constrangimento.

A essa temática Liberati esclarece: “A medida será aplicada em audiência judicial e consubstanciada em termo próprio, onde constarão as exigências e orientações que deverão ser cumpridas pelo adolescente. (Liberati, 1991, p. 57)”

Como a advertência sobrevém da prática de infracional, o sentido do ato de advertir, terá natureza repressivo/opressivo efetivando o poder do Estado sobre o indivíduo.

Obrigação de reparar o dano: Em concordância com o que dispõe o artigo 116 parágrafo único do Estatuto da Criança e do Adolescente, o infrator poderá ser obrigado a reparar os danos/prejuízos causados pela prática da infração. Na visão de Afonso Armando Konzen, a obrigação de reparar o dano:

constitui-se na imposição de formas de restituição, ressarcimento ou compensação. O nomem júris da medida inclui a palavra obrigação. Independente dos eventuais reflexos cíveis dessa medida e de sua importância pedagógica, enquanto instrumento destinado à percepção pelo adolescente das consequências notadamente econômicas de seus atos, a imposição unilateral não só da restituição, mas especialmente das formas de ressarcimento do prejuízo do ofendido ou a instalação de qualquer outra providencia de compensação, significa, para o adolescente, o reconhecimento público da inadequação do ato praticado. (KONZEN, 2005, p. 46).

Essa medida socioeducativa possui caráter impositivo de reposição ou restituição do bem prejudicado como forma de provocar o adolescente infrator de forma econômica tendo ainda, função reflexiva pedagógica.

Prestação de serviço à comunidade: A prestação de serviços à comunidade atua como uma ação variável da internação, possibilitando que o infrator cumpra tais imposições junto da sua família, com a sua comunidade e sem ter que desligar-se dos seus afazeres. Representa uma das medidas com maior eficácia, pois permite ao infrator, de acordo com as suas capacidades laborativas, a realização de tarefas junto a sua própria comunidade. Demostrando um caráter pedagógico. Caráter pedagógico da medida socioeducativa da prestação de serviços à comunidade:

A medida possibilita o alargamento da própria visão do bem público e do valor da relação comunitária, cujo contexto deve estar inserido numa verdadeira praxis, onde os valores de dignidade, cidadania, trabalho, escola, relação comunitária e justiça social não para alguns, mas para todos, sejam cultivados durante sua aplicação. (ROBERTO BERGALLI, APUD MARCOS MANDEIRA, 2006 PÁG. 150)

Importante ressaltar que a medida não pode ser imposta contra a vontade do adolescente, pois configura a trabalho forçado. Deste modo pode ocorrer substituição da medida, se decorrer o descumprimento pelo adolescente. O trabalho deve ser não oneroso, interagindo com a comunidade e desenvolvendo a cidadania, aspecto importante. De outro modo, caso o infrator juvenil, venha descumprir a norma positivada e se comprovado a sua culpabilidade, poderá ter sua sentença declarada unilateralmente pela autoridade judiciária competente. (MARCOS BANDEIRA, 2006)

Da liberdade assistida: Essa medida socioeducativa foi estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e está prevista em seu artigo 118 e parágrafos seguinte, Tem como finalidade orientar e acompanhar o infrator juvenil, e deve criar mecanismos para inclui-lo e reforçar os vínculos entre ele e o seu grupo social e familiar.  Como sugere o próprio nome, a liberdade assistida é o acompanhamento do infrator juvenil na administração de sua liberdade, já que ele se mostrou incapaz de exercê-la sozinho. O infrator deve ser acompanhado, auxiliado e orientado para se sentir seguro e amparado.

Haverá um acompanhamento na vida familiar e social do menor, lhe dedicando orientação e auxílio. O reeducando permanece junto de sua família, mas deve comparecer à entidade de atendimento periodicamente, procedendo a entrevistas com o setor técnico (ISHIDA, 2010, p. 235).

Contribuindo com o ilustrado Liberati explica que:

Para melhor resultado dessa medida será conseguido pela especialização e valor do pessoal ou entidade que desenvolverá o tratamento tutelar com o jovem. Deverão os técnicos ou as entidades desempenhar sua missão através de estudo do caso, de métodos de abordagem, organização técnica da aplicação da medida e designação de agente capaz, sempre sob a supervisão de juiz. (LIBERATI, 1991,p. 61).

Caso o infrator descumpra a medida imposta na Liberdade Assistida, a exemplo desse descumprimento por exemplo: Deixar de frequentar os cursos obrigatórios e não demonstrar bons rendimentos, terá sua medida substituída por outra, podendo até perder a liberdade invertendo na internação sanção por até três meses.

Semiliberdade e internação: As medidas de privação da liberdade em que há a institucionalização do adolescente infrator, e a ruptura com os laços familiares e sociais, de certo modo são as que mais geram incômodos, assegurados sempre os requisitos da celeridade e excepcionalidade. O infrator deverá cumprir as normas estabelecidas pelos dirigentes das instituições e por seus comandados. É a medida mais polêmica, pois se assemelha ao sistema prisional, dividindo opiniões. O Estado se reveste de prerrogativas para proteger a sociedade desses indivíduos, que mesmo sendo considerados sujeitos de direito e em situação especial, pois estão em desenvolvimento, possuem as mesmas características negativas de um agente adulto quando se relata à criminalidade, devendo o Estado, inclusive, utilizar de força física e condução coercitiva. (PASSAMANI & ROSA, 2009)

Prevista no art. 120 do ECA,

Trata-se, na verdade, de um modelo similar ao regime semi-aberto destinado aos imputáveis, os quais, normalmente, exercem atividades escolares e profissionalizantes externas sob a supervisão do responsável pela colônia agrícola, industrial ou similar e retornam para o pernoite, permanecendo, também, nos domingos e feriados no estabelecimento do regime semi-aberto. (BANDEIRA, 2006, p.163-164)

O Estado detém a privação de liberdade do infrator em prol da paz e da segurança social, a privação da liberdade do infrator juvenil representa o que de mais grave lhe pode, legalmente, acontecer em razão de sua conduta munida de culpabilidade, antijuridicidade e tipicidade

3 ESTUDO DAS PROPOSITURAS DA REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

O fato da criminalidade na infância e adolescência ter aumentado substancialmente com o passar dos tempos, fez com que o poder público em geral debatesse essa temática com frequência e com caráter de urgência. Fator comprobatório da importância em discutir esse tema é o resultado de pesquisas de opinião pública apontando que há um clamor social por uma resolução, para que haja alguma medida eficaz que controle o aumento de infrações cometidas por esses menores.

Uma possível solução para uma parte da sociedade, muito comentada e discutida pelas autoridades públicas, é a diminuição da maioridade penal, não somente para a população, bem como para o Senado onde prosseguem variadas Propostas de Emenda à Constituição, as chamadas PEC’S, sugerindo, nesse caso, a adoção desta medida como solução para a criminalidade e violência.

Como já apresentado no decorrer do trabalho, houve uma evolução tanto legal quanto em relação ao aumento da criminalidade. Conforme o passar do tempo foram criados diversos mecanismos para tentar sanar a deficiência que se instalava e até hoje vem destruindo a infância e juventude de milhares de jovens pelo Brasil.

Rogério Greco apresenta uma sugestão no sentido preventivo, segundo ele “a prevenção geral pode ser estudada sob dois aspectos. Pela prevenção geral negativa, conhecida também como pela expressão prevenção por intimidação, a pena aplicada ao autor da infração penal tende a refletir junto à sociedade, evitando-se, assim, que as demais pessoas, que se encontram com os olhos voltados na condenação de um de seus pares, reflitam antes de praticar qualquer infração penal”. Em seguida traz o posicionamento de Hassemer onde expõe acerca da prevenção por intimidação “existe a esperança de que os concidadãos com inclinações para a prática de crimes possam ser persuadidos, através da resposta sancionatória à violação do direito alheio, previamente anunciada, a comportarem-se em conformidade com o direito; esperança, enfim, de que o direito penal ofereça sua contribuição para o aprimoramento da sociedade.” (HASSEMER, apud. GRECO, R. p.490)

Greco ao citar Paulo de Souza Queiroz preleciona que “para os defensores da prevenção integradora ou positiva, a pena presta-se não à prevenção negativa dos delitos; seu propósito vai além disso; infundir, na consciência geral, a necessidade de respeito a determinados valores, exercitando a fidelidade ao direito; promovendo, em ultima análise, a integração social. ”(QUEIROZ, apud GRECO p.490)

Entretanto é fato que essa ação preventiva passa a ser questionável no quesito eficácia, uma vez que ao analisar dados, verifica-se mesmo com a aplicabilidade de crimes punidos com esse tipo de pena, não demonstrando resultados positivos no que diz respeito à ausência ou diminuição ao se utilizar tal sanção.

A utilização dessa ação no Brasil teria uma importância significativa, uma vez que há índices que demonstram a ineficácia da tutela punitiva em todas as esferas, principalmente no tocante menores infratores.

Para Rebelo as falhas nas investigações funcionam como estímulo à prática delituosa. Prossegue dizendo que no caso do menor, o problema é ainda mais acentuado quando a conduta delituosa tem o condão de lhe trazer ganho financeiro, como ocorre em crimes de furto, roubo, extorsão mediante sequestro e outros crimes. (REBELO, 2010)

Por vezes o fato de afirmar que não poderá ser atribuída a responsabilidade por um ilícito, em particular a um menor, é diretamente relacionado a impunidade, porém é um equívoco uma vez que no próprio ECA, como já foi demonstrado anteriormente, pressupõe de previsão de medidas rígidas para um sujeito que se encontra em formação.

Rebelo (2010, p.55) defende que “acreditar que a diminuição da maioridade penal possa ser uma alternativa viável à segurança pública é, na essência, uma visão deturpada e minimalista da questão.” E segue dizendo que “As cadeias são fábricas de crimes, pois a superlotação carcerária representa um aspecto negativo no que se refere às repercussões na esfera da educação, reabilitação e ressocialização dos presos.

Se extrai do posicionamento mencionado que para a imputação aos menores de 18 anos, vir a ser benéfica para a sociedade, o sistema prisional teria que passar por uma reforma geral, adquirindo condições materiais e suporte para a quantidade de presos que superlotam o país. Do contrário, a diminuição da maioridade penal, sob uma ótica apartada, representaria um problema a mais para a segurança, em vez de solucionar o conflito que já está instalado.

Fernando Capez compreende divergentemente, não se posicionando favorável a proteção que estabelece o ECA, para o autor o Estatuto é um afronto jurídico e principalmente, um atentado à justiça social, incentivando a criminalidade através da impunidade dos criminosos menores de idade, pois sob sua visão o ECA tem o despudor de proibir a divulgação de seus nomes, e que suas fotos só podem ser estampadas mediante uma tarja de proteção.

É nítido que o tema proposto para a abordagem divide opiniões e gera posicionamentos distintos. Para facilitar a compreensão será destacado quatro pontos de vista diferentes, sendo eles: a) manutenção da maioridade penal aos 18 anos, e a não alteração da legislação específica. b) manutenção da maioridade de 18 anos, aumentando o período de internação. c) redução da maioridade penal para 16 anos; e d) redução da maioridade penal para 14 anos.

3.1 MANUTENÇÃO DA MAIORIDADE PENAL AOS 18 ANOS, E A NÃO ALTERAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA.

No primeiro subtópico, que diz respeito à manutenção da maioridade penal aos 18 anos, e a não alteração da legislação específica, os apoiadores desse posicionamento alegam que esses menores possuem uma imaturidade própria à pessoas com a idade inferior a 18 anos, utilizando da ideia de que se encontram em formação referente a suas mentes e seus valores éticos. Por se encontrarem em estágio de mudança, argumentam que nesse período ainda seria possível correção as deturpações possivelmente sofridas, restituindo-os ao seio social sem precisar sofrerem penas tão severas, em relação às que são submetidas aos maiores de 18 anos.

3.2 MANUTENÇÃO DA MAIORIDADE DE 18 ANOS, AUMENTANDO O PERÍODO DE INTERNAÇÃO.

Para uma melhor compreensão veja o que determina o art. 121 paragrafo 3 do ECA

Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.

§ 3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.

O artigo limita quanto o período máximo de internação aos menores, sendo este de três anos. A posição em abordagem, neste tópico, é colocada no sentido de que uma possível solução para toda a questão levantada neste trabalho, não seria de fato a diminuição da maioridade penal, mas a dilatação do período máximo de internação, havendo divergência somente quanto à quantidade de anos taxativa, podendo ser de cinco, oito ou dez anos.

Há atualmente alguns projetos de leis e emendas com o intuito de alterar o estatuto nesse sentido. O objetivo principal seria o aumento das sanções para atos infracionais considerados menos gravosos, estabelecendo a eles o período máximo de três anos de internação, e para as infrações mais graves esse prazo aumentaria, sendo de três anos o mínimo e se tratando de hediondos e equiparados o prazo poderia chegar a cinco anos.

Para quem argumenta favoravelmente à ampliação é harmônica a percepção de que os menores não têm que ficar impunes, muito menos devem ser submetidos às mesmas penalidades dos adultos, devendo ser explorado uma saída intermediária como solução.

3.3 REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

Será explanado pontos cruciais quanto a redução da maioridade tanto para quem sugere aos 14 quanto para aos 16 anos.

A fundamentação para quem defende a redução cinge no fato de que o Código Penal pregressa ao passado retroagindo à década de 40, onde prevalecia o critério biológico, por acreditarem á época, que não possuíam discernimento, visto que não havia acesso à informação, diferentemente dos menores atualmente.

Outra situação bastante questionada para os defensores desta aplicação é o fato de que se o menor de 16 anos pode votar, exercer sua cidadania, tendo a possibilidade de modificar o futuro do país, porque não ser responsabilizado criminalmente da mesma maneira.

Há também aqueles que utilizam de uma justificativa um tanto mais radical, para estes a não responsabilização criminal pelo ato praticado seria um estimulante ao cometimento de delitos, em virtude de acreditar que nada iria lhes ocorrer caso o fizessem, contando ainda com o elemento favorável à eles de que nem mesmo teriam registros em seus antecedentes criminais.

Rebelo em contraponto elucida que “ se tal impunidade ou mesmo se tal inconsequência é inerente tão somente aos menores de 18 anos ou 21 anos? Como ponto de observação, deve se mencionar que apenas 15% dos crimes são praticados por menores de 21 anos. Utilizar a redução da maioridade penal como solução para a criminalidade juvenil, sem enfrentar os graves problemas sociais que se revelam como causadores maiores da violência, revela-se em um raciocínio meramente utilitarista”. Ou seja, acredita na ideia de que algumas injustiças podem acontecer, como a impunidade de alguns jovens, neste caso, em prol de um bem maior.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreendido toda a questão levantada ficou evidenciado que as medidas socioeducativas são meios eficazes para a retribuição do mal provocado por menores infratores, e portanto, não devem persistir as propostas de redução da maioridade penal. 

O que deve haver é a adoção de políticas públicas que viabilizem a plena efetivação da aplicação das medidas já previstas pelo ECA, visto que são inviáveis as propostas de redução da maioridade penal por determinados fatores.

A aplicação da pena possui uma finalidade pedagógica, entretanto o que se busca também é a retribuição do mal causado, porém esse objetivo só poderia ser alcançado com a correta aplicação das medidas socioeducativas já existentes, não cabendo aplicar mecanismos punitivos mais rígidos, e sim o Estado se empenhar na aplicação das medidas socioeducativas, para que haja de fato resultados positivos no trabalho de ressocialização do menor.

Se torna tanto quanto contraproducente, em razão de que tanto a hipotética aplicação seções penalidades aos menores de 18 e maiores de 16 anos quanto a aplicação correta das medidas socioeducativas aos inimputáveis possuem na prática o mesmo efeito desejado por quem defende a redução da maioridade que é a retribuição da parcela do mal causado, e em ambos os casos o problema não se refere à punibilidade, mas se encontra em outra natureza. 

Nesse sentido deveria ser explorado o modo como tem sido desenvolvida a atuação do Estado, quanto ao desenvolvimento das medidas socioeducativas e suas finalidades. Se o argumento principal para diminuição da maioridade penal cuida da necessidade de executar penas mais severas, e a grande recorrência de delitos praticados por menores. O que se invalida, pois como se verifica essa premissa é uma falácia replicada pela mídia. 

Raciocinar quanto à aplicabilidade da punição mais severa faz constatar que não é por esse caminho que chegaria a solução desejada. Quando se analisa a questão carcerária atual, por exemplo, e diagnostica-se o déficit existente, associando à superlotação, o despreparo quanto à reintegração dos apenados à sociedade e principalmente a reincidência destes, situação esta reconhecida como “estado de coisa inconstitucional” pelo STF.

Entende-se que a solução não seria inserir jovens em formação, e com alguma possibilidade de serem reintegrados à sociedade, em um sistema penitenciário falido, como é o atual sistema brasileiro.

O problema da criminalidade entre jovens de 16 e 18 anos será solucionado quando se deixar de pensar na pena, e o Ente Estatal passar a investigar as causas que dão origem a conduta delituosa. Quando o Estado se preocupar com desenvolvimento e aplicação de políticas públicas que visem promover a efetivação dos direitos e garantias fundamentais que estão previstos na Constituição Federal, sobretudo no que diz respeito aos direitos sociais.

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Data da conclusão/última revisão: 5/11/2018

 

Como citar o texto:

KARIELLY, Elizabeth; BARBOSA, Igor de Andrade..A (ine)ficácia da tutela penal do ECA (Estatuto da Criança e do adolescente) à luz da divergência sobre a redução da maioridade penal. Boletim Jurídico, Uberaba/MG, a. 30, nº 1573. Disponível em https://www.boletimjuridico.com.br/artigos/direito-penal/4226/a-ine-ficacia-tutela-penal-eca-estatuto-crianca-adolescente-luz-divergencia-reducao-maioridade-penal. Acesso em 7 nov. 2018.

Importante:

As opiniões retratadas neste artigo são expressões pessoais dos seus respectivos autores e não refletem a posição dos órgãos públicos ou demais instituições aos quais estejam ligados, tampouco do próprio BOLETIM JURÍDICO. As expressões baseiam-se no exercício do direito à manifestação do pensamento e de expressão, tendo por primordial função o fomento de atividades didáticas e acadêmicas, com vistas à produção e à disseminação do conhecimento jurídico.